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Modos de Educação

No documento PAULA.COLARES.Relacao.Pais.Professores (páginas 65-69)

2 2 A Estrutura da Família

5. Modos de Educação

“O direito primário dos pais de educar os filhos, deve ser tido em conta em todas as formas de colaboração entre pais, mestres e autoridades escolares, particularmente nas formas de participação encaminhadas a dar aos cidadãos uma voz no funcionamento das escolas, e na formulação e aplicação da política educativa”.

Carta dos Direitos da Família, (Santa Sé, Outubro 1983, artº V, alínea e)

A educação tem um papel fundamental na produção e reprodução cultural e social e começa no lar/família, lugar da reprodução física e psíquica quotidiana (higiene, alimentação, descanso, afecto, cuidado com o corpo) que constituem as condições básicas de toda a vida social e produtiva.

Para Carvalho (2004), a educação funciona como um processo de socialização com duas dimensões distintas: uma social, onde a herança cultural é transmitida às novas gerações através do trabalho de várias instituições; e uma individual, onde a aquisição de conhecimentos, as habilidades, as competências e os valores estão em constante desenvolvimento.

No entanto, a dimensão individual está subordinada à social no contexto de interesses, objectivos e relações de poder dependentes da idade, seja na família ou na escola.

No decorrer do seu trabalho, a autora atrás referida, sugere que para muitas famílias da nossa sociedade educar significava criar crianças restringindo-se aos cuidados físicos. Desde

o início que a educação era um trabalho a que correspondia uma divisão sexual do trabalho na sociedade patriarcal: trabalho reprodutivo das mulheres e trabalho produtivo intelectual dos homens.

Etimologicamente, em latim, educação referia-se a um sujeito feminino enquanto docência e instrução referiam-se a um sujeito masculino. Ainda segundo a mesma autora, essa distinção refere-se a dois lugares: um lugar original de relações físicas e afectivas espontâneas, de nutrição como contexto de desenvolvimento infantil, o lar, a família; e outro lugar, de relações intencionais, racionais, de treino especifico, de controlo e regulamentação explícita, que expressa uma visão masculina da educação, a escola.

Ao longo da história e em diferentes sociedades, os modos de educação e de reprodução social variaram entre os grupos e classes de uma mesma sociedade. Historicamente, Gonzalez, (1996), considera que educar, no sentido geral de criar crianças, não é atribuição exclusiva quer dos pais /mães biológicos, quer da família, quer da escola. O cuidado dos mais jovens, a transmissão da cultura do grupo social (o ensino dos modos do conhecimento, de produção, de relação e de participação) e a preparação para os papéis de adultos (na guerra, no trabalho, na sexualidade, na família e na cidadania) eram tarefas assumidas por vários indivíduos, grupos e instituições (mães, pais, idosos, professores, famílias extensas, clãs, tribos, vizinhança, comunidade, igrejas e escolas) que tratavam da sua organização e manutenção.

Antes do surgimento da escola como um lugar separado e especializado de educação formal, as crianças e jovens educavam-se na família e na comunidade, inclusive pela participação nas práticas produtivas e nos rituais colectivos. A educação como transmissão cultural distinguia-se em popular (oral e prática) e erudita (letrada, formal), sendo esta última reservada às classes de nível sócio-económico mais alto, vulgarmente chamadas – elites - em casa com preceptores residentes, ou em colégios internos.

Tyler (1983) escreve sobre esta temática, dizendo que nas sociedades ditas primitivas, a educação das crianças era uma tarefa comunitária, informal e imersa na vida prática, como ainda ocorre em áreas rurais e urbanas das regiões pobres do mundo. Na Europa pré-moderna, as crianças eram criadas por outros adultos que não os pais /mães biológicos. A educação formal, sinal de distinção cultural e de classe, era exclusiva dos que tinham nascido no topo da escala social. Por exemplo, o filósofo francês Michel de Montaigne, nascido em 1533, numa família de senhores de terras, foi criado inicialmente por servos antes de ser considerado pronto para a educação formal com tutores e mais tarde num colégio interno.

Havia diversas maneiras de transmitir sentimentos, valores, conhecimentos, desenvolver habilidades e competências que depois fossem socialmente valorizadas (o currículo), podendo variar em relação à organização e práticas (onde, quando, como, por quanto tempo), em relação ao conteúdo (quais os saberes que se devem tornar hábitos, habilidades, matérias escolares), agências e agentes encarregados (quem é responsável pela organização e ensino) e sujeitos alvo (de acordo com categorias, como idade, sexo, classe e raça). Mulheres, pessoas pobres, negras e indígenas foram excluídas durante muito tempo, ou tiveram acesso a escolas e currículos diferenciados.

Na mesma linha de pensamento que Tyler (1983), encontramos um outro autor, Monroe (1989) que nos esclarece sobre a confusão que se gerou quando educação passou a ser sinónimo de escola. Ela deve ser distinguida da escolarização. A educação escolar tornou- se o modo de educação predominante nas sociedades modernas democráticas, a partir da escolarização compulsória nos finais do século XIX com uma organização específica: currículo seriado, sistema de avaliações, níveis, diplomas, professores, professoras e outros profissionais especializados. Esta organização funciona como um processo multifacetado de aprendizagem e de desenvolvimento humano, baseado na experiência e participação nas várias práticas e espaços sociais ao longo da vida. O facto de ser tornado sinónimo de escola é um fenómeno histórico.

Também não podemos esquecer o papel importante que a televisão, por exemplo, tem na educação informal e que também ocorre na escola, dentro e fora da sala, no contexto de currículo em acção e do currículo oculto (Freire, 1997).

Nas sociedades actuais a educação e a família diferenciaram-se e especializaram-se. Esta transformação deu origem a grandes mudanças na vida familiar com a transferência da produção e controle económico da casa para as fábricas e para os mercados e no modo de organizar o sistema educacional, tal como o conhecemos, com os seus profissionais. Por outro lado, a família extensa, incluindo parentes e agregados, transformou-se em família nuclear restrita (pai, mãe, filhos) perdendo parte das suas funções reprodutivas, económicas e educacionais, tal como nos refere Carvalho (2004).

Numa altura em que a sociedade já compreendeu que não basta garantir o acesso à educação, é preciso centrar os esforços na democratização do sucesso porque o investimento na educação apresenta, a médio prazo, uma taxa elevada de retorno para os orçamentos públicos. Grande parte da aprendizagem ocorre na família, com os media e com as instituições sociais, parecendo ter chegado o momento de melhorar os elos de ligação ou

mesmo criar novas ligações, entre as escolas e outras instituições, e, entre as escolas e as famílias, em que o professor/mediador, seja o elemento conhecedor do processo de aprendizagem.

A escola não é a única responsável pela educação dos jovens que mais tarde contribuirão para a melhoria das condições de vida dessa mesma sociedade. O estabelecimento de ligações entre a escola e a comunidade envolvente, e o acompanhamento por pessoas com formação e com conhecimento da realidade educativa, permite renovar a educação de uma forma construtiva, reafirmar a aposta na qualidade da aprendizagem, quebrar o isolamento das escolas, e, integrar um maior número de famílias e de alunos.

Citando um provérbio africano “É preciso toda uma aldeia para educar uma criança” o que nos leva a pensar que até nas sociedades mais primitivas as responsabilidades educativas sempre estiveram distribuídas por várias instituições e grupos de pessoas.

Em suma, o ambiente familiar criado pelos pais, irmãos e outros familiares permitem desenvolver, ou não, as condições que influenciam decisivamente a criança durante os seus estádios de desenvolvimento cognitivo (social e emocional). A influência da família não se limita, porém à primeira infância e às suas consequências em idades posteriores. Quando a criança começa a interagir directamente com a escola e com outras instituições, a família continua a filtrar e a interpretar essas outras influências educativas. Falar em sucesso educativo é falar na qualidade de aprendizagem, o que significa falar em qualidade de educação e esta foi considerada por Adler (1982) como “the heart of the matter”.

A educação enquanto processo é confluente com o processo do crescimento humano cuja finalidade última pretende, nas nossas sociedades democráticas, o desenvolvimento de valores humanistas, e sociais e, como tal a educação pode ser perspectivada como um processo social. Para Adler, trata-se duma “actividade de toda a vida” que decorre em vários contextos.

Nesta mesma linha de pensamento encontramos outro autor, Fantini, (1983) que nos refere estes contextos como os ambientes favoráveis à aprendizagem, quer existam em casa quer em qualquer instituição comunitária.

A sociedade moderna tem revelado um renovado interesse pela família e pela comunidade, quer esta seja constituída pelos vizinhos, quer por outras estruturas de mediação. A família deve ser considerada como um parceiro a que não faltam recursos e é sobre estes que devemos construir, apelando para o desenvolvimento de novas estratégias e técnicas de

investigação que Bloom (1982) denominou “contribuições metodológicas”, isto é, aproveitar os modos de ser, os métodos, de cada família, pois todos terão contribuições positivas a dar, fruto das suas vivências internas e que bem aproveitados servirão para exemplificar ou esclarecer como se pode melhorar. Deste modo podemos considerar que relativamente ao desenvolvimento da problemática do envolvimento parental existem contribuições substantivas e contribuições metodológicas.

Todos temos ideias e concepções sobre este assunto fazendo, de uma maneira geral, o que entendemos como sendo o mais correcto quer por experiência própria, isto é, resultou comigo irá resultar com o meu filho ou pela negativa e não queremos que se repita quer por termos conhecimento de outras práticas que consideramos boas, e, que por isso mesmo queremos aplicar à nossa realidade.

Devemos aproveitar e promover todos os tipos de envolvimento parental que contribuam para o desenvolvimento de todos os seres humanos, principalmente das crianças por elas serem mais vulneráveis e dependentes.

No documento PAULA.COLARES.Relacao.Pais.Professores (páginas 65-69)