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Momento em que ocorre o trânsito em julgado

6.2 T RÂNSITO EM J ULGADO

6.2.1 Momento em que ocorre o trânsito em julgado

A questão que nos parece primordial no tocante ao trânsito em julgado é o momento em que ele ocorre, haja vista que é a partir deste ponto que se iniciará a contagem do prazo de dois anos previsto no art. 295 do CPC para o ajuizamento da ação rescisória.

José Carlos Barbosa Moreira aponta essencialmente duas hipóteses: (i) sentença é originariamente irrecorrível: neste caso o trânsito em julgado ocorre no momento da publicação da sentença; e (ii) sentença é recorrível, hipótese em que o trânsito em julgado se dá no momento em que

ela deixe de ser recorrível (término do prazo para interposição de recurso), ou em razão da desistência de recurso interposto.151

Necessário destacar que, se contra a sentença que se interpôs recurso e este foi encaminhado ao tribunal ad quem, só se pode dizer que houve o trânsito em julgado na hipótese de este órgão deixar de conhecer o recurso ou, circunstância idêntica, o relator o rejeitar por inadmissível (conforme previsto, apenas como exemplo, no § 5.º do art. 896 da CLT). Nesta hipótese, o trânsito em julgado se operou no momento em que o recurso - tido como inadmissível ou não conhecido - foi interposto.

O argumento de José Carlos Barbosa Moreira está baseado na idéia de que a decisão que não conhece o recurso possui natureza declaratória, já que apenas reconhece que não foram preenchidos os requisitos de admissibilidade recursal e, conseqüentemente, gera efeitos ex tunc, retroagindo a constituição da coisa julgada ao momento em que a decisão recorrida poderia ser atacada por recurso admissível.152

Os argumentos de José Carlos Barbosa Moreira enfrentam, contudo, um obstáculo de difícil solução, pois, se o tribunal somente julgar inadmissível o recurso interposto pela parte depois de dois anos da publicação da decisão recorrida, a parte terá perdido a oportunidade de ajuizar a ação rescisória pelo decurso do prazo previsto no art. 495 do CPC.

A solução encontrada pelos Tribunais foi entender que a interposição de recurso, cujo cabimento é questionável e não reflete um erro

151

Comentários ao Código de Processo Civil, p. 115.

152

grosseiro ou má-fé da parte, impede o trânsito em julgado da decisão recorrida, ainda que o órgão ad quem dele não conheça.153

Se o tribunal ad quem, por outro lado, conhecer o recurso interposto, a decisão recorrida não transita em julgado: ou é anulada, ou é substituída por outra prolatada pelo tribunal, ainda que para rejeitar o apelo interposto. Daí concluir não ser possível desconstituir sentença contra a qual foi interposto recurso conhecido pelo órgão superior.

Vale também mencionar as duas hipóteses destacadas por Vicente Greco Filho para a mesma circunstância: recurso interposto fora do prazo legal.

Nesse caso, tal qual a discussão sobre a admissibilidade ou não do recurso debatida linhas acima, se a intempestividade é manifesta e indiscutível, o trânsito em julgado se materializa no término do prazo que deveria ter sido observado para a interposição do recurso. Por outro lado, se a intempestividade é questionável, o trânsito em julgado ocorrerá somente após o encerramento do prazo para interposição de recurso contra a decisão que dirimiu a dúvida e reconheceu a intempestividade do apelo.

Não seria razoável, entende Vicente Greco Filho, que a parte fosse punida com a redução (ou até mesmo a perda) do prazo para o ajuizamento da rescisória quando ainda existe recurso interposto com possibilidade razoável de ser conhecido pelo órgão ad quem.154

153 Ao referir-se à matéria, Athos Gusmão Carneiro se apóia em Nelson Luiz Pinto e Vicente Greco Filho para afirmar que “a contagem do biênio decadencial para o ajuizamento de ação rescisória iniciar-se-á a partir do trânsito em julgado da última decisão, seja de mérito ou não, excetuados os casos de recurso manifestamente incabível ou intempestivo; ter-se-á, assim, evitado a má-fé de quem queira interpor sucessivos recursos para procrastinar a coisa julgada” (Ação rescisória. Embargos de declaração e sua influência na contagem do biênio decadencial, p.157).

A hipótese apontada por Vicente Greco Filho já foi alvo de discussões nos nossos Tribunais e levou o Tribunal Superior do Trabalho a pacificar o debate por meio da Súmula 100, item III:

III – Salvo se houver dúvida razoável, a interposição de recurso intempestivo ou a interposição de recurso incabível não protrai o termo inicial do prazo decadencial (ex-Súmula 100, Res. 109/2001, DJ 18.04.2001).

6.2.1.1 Hipótese de interposição de recurso parcial

Outro aspecto a se observar no tocante ao momento em que ocorre o trânsito em julgado refere-se à hipótese de impugnação apenas parcial da sentença, conforme autoriza o art. 505 do CPC: “A sentença pode ser impugnada no todo ou em parte”.

A jurisprudência já fixou o entendimento de que, impugnada apenas parte da sentença, o trânsito em julgado ocorrerá em momentos e em Tribunais diferentes; a parte da decisão não impugnada transitará em julgado iniciando-se, de imediato, a contagem do prazo de dois anos para o ajuizamento da ação rescisória; por outro lado, contra a parte da decisão que foi impugnada pelo apelo interposto, o trânsito em julgado ocorrerá perante o órgão ad quem e em um outro momento.

O Tribunal Superior do Trabalho pacificou o entendimento a respeito do assunto resolvendo a questão no item II da Súmula 100:

II – Havendo recurso parcial no processo principal, o trânsito em julgado dá-se em momentos e em tribunais diferentes, contando-se o prazo decadencial para a ação rescisória do trânsito em julgado de cada decisão, salvo se o recurso tratar

de preliminar ou prejudicial que possa tornar insubsistente a decisão recorrida, hipótese em que flui a decadência a partir do trânsito em julgado da decisão que julgar o recurso parcial.

No entanto, duas diferentes situações foram apontadas por Estevão Mallet como hipóteses em que, mesmo o recurso sendo apenas parcial, toda a decisão proferida não passará em julgado de imediato, não se iniciando, obviamente, a contagem do prazo para a rescisória: a primeira situação se manifesta quando o recurso interposto encontra-se dotado de efeito devolutivo amplo e, a segunda, quando a decisão contém capítulos dependentes, tendo sido interposto recurso contra um deles.155

No tocante à primeira hipótese, o autor explica que

há aspectos do litígio cujo exame pelo tribunal não fica em nada prejudicado pelo caráter limitado da impugnação. Trata- se de matérias suscetíveis de apreciação de ofício, como os pressupostos processuais ou as condições da ação.

Com fundamento no § 4.º do art. 301 do CPC, o autor assinala que “essas matérias devem ser conhecidas pelo juízo independente de provocação, já que de ordem pública e, portanto, indisponíveis para os litigantes, não se sujeitando à preclusão”.

Com esse raciocínio, Estevão Mallet conclui que qualquer recurso de natureza ordinária devolve ao tribunal não apenas o conhecimento da matéria impugnada, mas também outras, como as condições da ação ou pressupostos processuais.

Desta forma, na medida em que o tribunal poderá apreciar de ofício questões de ordem pública não suscitadas pelo recorrente resultando em modificações na integralidade da sentença, não há, enquanto pendente de julgamento, trânsito em julgado de qualquer capítulo da decisão, ainda que o apelo tenha sido apenas parcial.

A segunda hipótese apontada por Estevão Mallet refere-se à decisão que contenha mais de um capítulo e uma relação de dependência entre eles. Assim, havendo impugnação ao “capítulo principal”, o inconformismo do recorrente será automaticamente estendido ao “capítulo dependente”, ainda que não mencionado no recurso. Acolhido o apelo quanto ao ponto principal, poderá o tribunal provê-lo, também, quanto ao “capítulo dependente”.156

Rejeitado, por outro lado, o recurso, o tribunal não poderá sequer apreciar o ponto dependente.