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Montadoras iniciam Reestruturação da Rede de Distribuição

3.4 A Crise do Setor

3.4.1 Montadoras iniciam Reestruturação da Rede de Distribuição

Como foi visto no capítulo anterior, no final da década de setenta o setor automotivo mundial foi abalado pela Crise do petróleo e pela invasão dos automóveis japoneses no ocidente. O novo cenário, altamente competitivo e de queda na demanda de veículos nos principais mercados do mundo, motivou as empresas automobilísticas ocidentais, durante os anos seguintes, a iniciarem uma grande reformulação em toda a cadeia automotiva em busca de eficiência e competitividade. Primeiramente foi o próprio setor produtivo que foi atingido pela reestruturação, a estrutura organizacional e os métodos produtivos foram reavaliados e redefinidos. Com grande poder nas mãos, os fabricantes impuseram mudanças à rede de fornecimento de autopeças, assim, esse setor começou sofrer pressões em termos de eficiência, preço e qualidade dos produtos. Até então, apenas um compo- nente da cadeia automotiva não tinha sido atingido pelas alterações que ocorriam no setor automotivo, a rede de distribuição.

É preciso destacar que, ao longo da história do setor automotivo, a rede de distribuição de automóveis sempre ocupou um papel secundário. Desde o início da popularização do

automóvel, na década de vinte, até a década de setenta, o automóvel era um bem que “se vendia sozinho”, ou seja, a grande demanda tornava a simples disponibilização do produto nas lojas suficiente para o surgimento dos consumidores nesses locais (Chanaron & Jullien, 1999). Dessa maneira, a rede de distribuição de veículos foi crescendo de maneira descoordenada, sem a necessidade de grandes investimentos em infra-estrutura, treinamento de pessoal ou qualidade de gestão.

No início da década de noventa, as mudanças promovidas na cadeia automotiva dimi- nuíram a distância competitiva entre os veículos ocidentais e os japoneses, entretanto, a vantagem dos automóveis asiáticos continuava. A baixa demanda de carros nos princi- pais mercados do mundo acirrava ainda mais a competição por novos consumidores. Em meio a essa realidade, as montadoras deveriam encontrar novos caminhos para diminuir os custos do veículo para o consumidor final e aumentar suas vendas.

Em meados dos anos noventa, a solução encontrada pelas montadoras foi reestruturar a rede de distribuição de veículos em busca de eficiência e competitividade. Mercer (1994) estimou que somando as margens e incentivos aos revendedores, os bônus e outras des- pesas, a distribuição de veículos representava 30% do preço total pago pelo consumidor. Isso fazia que grande parte da competitividade fosse perdida no sistema de distribuição. Sendo assim, as montadoras iniciaram um processo de redução das margens de lucro das concessionárias.

O produto automóvel tinha mudado bastante nas últimas décadas. A grande concor- rência entre as marcas, os investimentos em modularização, em eletrônica embarcada e em racionalização dos chassis diminuíram as diferenças existentes entre os modelos das diversas marcas e do mesmo segmento. Desde então, a grande similaridade entre os pro- dutos vem fazendo que o ato da venda ganhe cada vez mais importância, podendo se transformar no grande diferencial entre os fabricantes. Segundo o estudo realizado por Hoffmeister (1995), o consumidor de automóveis tende a retornar à concessionária onde foi melhor atendido, independente da marca comercializada. Sabendo disso, as montado- ras têm passado a cobrar de suas franquias uma maior investimento em especialização do setor de vendas.

Ainda procurando reestruturar as concessionárias, as montadoras começaram a reali- zar esforços para associar o local de comercialização de veículos, de distribuição de peças e de prestação de serviços as suas marcas (Hoffmeister, 1995). Para isso, passaram a obrigar suas revendas a investir em reformas da estrutura física, em busca da padroniza- ção definida pelo fabricante, em novos equipamentos e ferramentas de manutenção e na padronização do atendimento (Grande, 2004).

Segundo Arbix e Veiga (2003), na opinião dos fabricantes de automóveis, os recursos injetados no sistema de distribuição eram excessivos e mal direcionados, muitos desses recursos seriam utilizados em descontos, campanhas específicas e de consolidação da marca que não geravam um retorno satisfatório. Com isso em mente, as montadoras passaram a requerer a seus revendedores melhorias na gestão das suas franquias, consumindo de forma mais eficiente os recursos investidos, por exemplo, na forma de programas de satisfação e de fidelização do consumidor, programas de qualidade do atendimento, entre outros (Hoffmeister, 1995; Mercer, 1994; Grande, 2004).

Fica claro que a busca por eficiência e competitividade atinge de vez a rede de dis- tribuição de automóveis. Os efeitos das ações promovidas pelas montadoras logo foram sentidos pelas concessionárias.

Os altos custos dos investimentos que as concessionárias passaram a ter que efetuar, a diminuição da demanda por automóveis e a baixa margem de lucro imposta às franquias criaram um cenário impossível a sobrevivência das pequenas empresas do setor (Mercer, 1994; Buzzavo & Volpato, 2001). Desse modo, as pequenas revendas passaram a ser incorporadas pelas médias e grandes franquias, até mesmo concessionárias de porte inter- médiario passaram a se fundir, procurando economia de escala de operação e redução de custos (Grande, 2004). Esse fênomeno passou a ocorrer em todo o mundo, no ocidente de forma mais contundente.

O sistema de distribuição então começou a se adaptar à nova realidade ditada pelas montadoras. Em muitos países a venda de carros novos, que antes predominava como principal fonte de lucro das revendas, passou a ser vista com desconfiança graças à redução na margem de lucro. A partir de então, a alternativa encontrada pelas concessionárias tem sido investir no setor de peças e serviços na tentativa de recuperar parte dos ganhos

perdidos com a venda de veículos novos. Outro ponto positivo dessa nova postura é a menor exposição das revendas a novas reduções na margem de lucro dos carros novos.

A tendência de crescimento da participação do setor de peças e serviços na formação do lucro é observada, atualmente, no sistema de distribuição dos Estados Unidos e da Europa, como foi visto. No Japão a venda de veículos novos continua sendo a mais importante fonte de lucro, mas vale lembrar que as concessionárias nipônicas possuem uma estreita relação com as montadoras, e as marcas japonesas encontram em posição privilegiada no mercado. Já no Brasil, embora o setor de serviços venha ganhando importância, as concessionárias ainda apóiam seus ganhos fundamentalmente nas vendas carros novos (Grande, 2004), deixando a rede de distribuição brasileira mais vulnerável às reduções nas margens de lucros.

O setor de distribuição de veículos em todo o mundo, negligenciado por décadas pelas montadoras, tem procurado, de todas as maneiras, se adaptar às mudanças impostas pelos fabricantes. Mudanças essas que de forma resumida podem listadas em três principais:

• Redução na margem de lucro, principalmente na venda de veículos novos;

• Obrigatoriedade de investimento na padronização da estrutura física, do atendi- mento, da qualidade e na melhoria dos equipamento e ferramentas de manutenção; • Eficiência na utilização dos recursos e melhoria da gestão.

Pode-se afirmar que a corrida pela eficiência e competitividade imposta pelas mon- tadoras foi o estopim da crise que vem acometendo o setor. Entretanto, outras forças também têm exercido grande pressão na rede de distribuição de veículos.