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6. Concelho de Castelo de Vide

06.24. Monte do Mascarro

CMP 335 / CNS 531 / N 39º 24’ 35.0’’ / 7º 30’ 47.0’’ / Bibliografia / Villa Um sítio dotado dos mais relevantes conteúdos, essencial para compreendermos diversas dinâmicas (culturais, temporais, funcionais...) e que por isso necessita de uma reavaliação atenta. As informações sobre as realidades identificadas são confusas.

A descoberta do sítio verifica ‑se a partir do achado de uma moeda visigótica em ouro cunhada por Egica (687 ‑702). A visita de Conceição Rodrigues ao local indica que “Depois de percorrermos uma área de cerca de 6000m2 no local onde a moeda tinha sido encontrada constatámos, pelos numerosos fragmentos de tegulae, imbrices, dolias, alinhamentos de paredes e fragmentos de colunas de granito [...]”, o potencial do sítio.263 Segue ‑se uma escavação, “junto a um

261 1975: 166.

262 Pita & Magusto, 1996: 69.

dos alinhamentos de paredes”, cuja estratigrafia parece ser a seguinte: a trinta centímetros de profundidade “um pavimento feito de tijolo moído que assentava sobre uma camada de seixos dispostos regularmente”, seguramente o seu alicerce. A referência seguinte menciona uma sepultura (descoberta por “um operário” enquanto a autora procedia a prospecções) de inumação que não apresentava espólio. A fotografia apresentada264 não mostra qualquer relação com estruturas,

mas depreende ‑se que estaria próximo do referido pavimento. Entretanto havia sido descoberto “um muro de alvenaria de pedra e cal, opus mixtum” que no ano seguinte viria a ser escavado. Aqui, a dez centímetros de profundidade “apareceu um pavimento formado por argamassa de tijolo moído”, ou seja, de opus signinum, sendo que a estampa CVII mostra um pavimento com meia cana. Da referência a “um fragmento de tijolo que se supõe ter pertencido ao estabelecimento de banhos” e a este pavimento depreendeu Pilar Reis265 que estaríamos perante um

edifício termal, mas tal não é necessariamente relacionável. Deverá tratar ‑se de um tanque, sobreposto a “outro pavimento, mas diferente do primeiro”, pois a setenta centímetros surgiram “grandes ladrilhos”, ou seja, um piso de tijoleiras. A autora dos trabalhos imediatamente conclui a existência de “duas correntes culturais diferentes, uma de base romana outra visigótica”, certamente não pelas estruturas, todas romanas, mas pelas moedas, a que, acrescento, poderemos juntar a sepultura. Na escavação não se mencionam materiais. Os que a autora apresenta são achados de superfície – colunas de granito, “vários fragmentos de ladrilho calcinados e vidrados”266 e moedas romanas em colecção particular (bronzes de

Galieno, Macrino, Quietus, Teodósio (?), Magnêncio e Constâncio, ou seja, uma colecção coerente entre o início do século III e os finais do IV), a que se junta uma outra visigótica, de ouro, entretanto vendida267.

Resta ‑nos ainda um elemento cultural do maior interesse: “próximo do local anteriormente descrito”, ou seja, em propriedade vizinha, foi recolhida uma ara votiva. Desta forma, não é tão seguro que seja proveniente do lararium doméstico, como anteriormente supus268, mas de templo situado no fundus.

Dedicada a uma divindade inominada, o que indica a inclusão em estrutura cultual própria, tem o aspecto mais interessante no contraste entre o cuidado suporte pétreo, irrepreensivelmente esculpido, e a fruste gravação, desalinhada e imperfeitamente desenhada, o que mostra que a peça foi comprada algures e gravada no local por indicação do proprietário.

Em 1983 regressaram os trabalhos de escavação, mas de modo tão desarticulado que motivaram uma intervenção a cargo do então SRAZS269. Seguiram ‑se duas

264 Est. CVIII, fig. 1 e 2. 265 Reis, 2004: nº 86. 266 Rodrigues, 1975: 170. 267 Estampa CXV. 268 Carneiro, 2009 ‑2010.

campanhas, momento em que se procede, pela primeira vez, à obtenção de um levantamento topográfico e de uma sequência estratigráfica rigorosa.

No sector A definiu ‑se uma primeira camada de derrube de cerâmica de construção270, sobreposta a um outro, por sua vez sobre uma camada de

terra arenosa, com mais um bronze de Constantino e um fundo de ânfora. Aqui se situa um piso estreito, lajeado, nas proximidades de um tanque com meia ‑cana anteriormente detectado (na campanha de 1972?), o que leva o autor da escavação a propor “uma construção relacionada com a obtenção de vinho ou azeite”. No sector C predominou uma camada de cinzas, escória de ferro e “borra de vidro”. Definiram ‑se duas pequenas estruturas rectangulares com pavimento em tijoleira muito fracturado por contínua sobre ‑exposição a altas temperaturas. Nesta zona haveria uma soleira de porta com entrada para o interior de uma estrutura não descrita, recolhendo ‑se vários fragmentos de canalização em chumbo. No sector D procedeu ‑se à limpeza da zona anteriormente intervencionada por Conceição Rodrigues, com “uma extensa divisão habitacional” que apresenta um “piso de tijolo moído sobre um nível de calhaus rolados”. É então que temos a informação sobre a existência, não de uma, mas de duas sepulturas, “sobre o piso de tijolo moído”, a um dos extremos do compartimento. Foram ainda detectados muros sob este pavimento, e um piso de tijoleiras onde assentaria uma coluna visigótica, da qual ainda não havíamos tido notícia. As sepulturas, rompendo o piso de cima, tinham a sua base nestas tijoleiras. Salienta ‑se a ausência de “cerâmica fina” (sigillata ou paredes finas) e de mosaicos, apontando ‑se como possível localização para a

pars urbana o próprio monte de Mascarro.

A campanha de 1985 acrescenta detalhes e confirmações: no sector A um outro reservatório para líquidos com opus signinum em meia cana e uma canalização de granito. Nesta área, sob derrubes, recolheram ‑se seis moedas de Constantino. No sector C, confirmou ‑se a presença de escórias de ferro, cinzas e cerâmicas com excessiva cozedura, apontando ‑se uma “oficina ou anexos de ferreiro”.

Desta forma temos uma estrutura fundiária, provavelmente uma villa com a monumentalidade conferida pelas colunas em granito. Temos duas estruturas relacionadas com a água, estando uma sobreposta a um momento mais antigo constituído por um pavimento de laterae. As cerâmicas calcinadas indicam uma estrutura de produção e o numeroso espólio monetário mostra a plena inserção nos circuitos comerciais. Todavia, não há qualquer referência a elementos de importação. É legítimo concluir que nas proximidades estaria

Castelo de Vide, Agosto de 1984 [dactilografado], constantes no processo do IPPAR e entregue aos Serviços Regionais de Arqueologia da Zona Sul.

270 Referem ‑se “grande número de fragmentos de tijoleira com marca de pata de cão”, o que é fruto da secagem destes materiais em eiras ao ar livre, antes da cozedura no forno. Esta menção deve ser relacionada com os materiais vidrados e sobre ‑cozidos que indicam um forno de produção de cerâmica.

um templo privado inserido na propriedade. Em momentos finais o espaço (produtivo?) necropoliza ‑se mas o local mantém a vitalidade nas correntes de âmbito comercial e em economias monetarizadas, com duas moedas de ouro visigóticas a marcarem a continuidade de ocupação (agora em perfil funerário). Existe uma sepultura escavada na rocha nas imediações.

Outras referências: Proc. IPPAR nº 4.05.002; Processo IPA 86/1(113) e S – 00531; Almeida, 1971: 224 ‑226; Gorges, 1979: 463; IRCP nº 613; RP 6/57.