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Motivo da pedra (vv 3-4)

No documento Ressurreição e fé pascal (páginas 125-128)

Descoberta do túmulo vazio nas narrativas evangélicas

3. Motivo da pedra (vv 3-4)

Durante a viagem, as santas mulheres interrogavam-se:'' Quem nos rolará a pedra da entrada do túmulo? E levantando os olhos, viram que a pedra já tinha sido removida. Ora, a pedra era muito grande!"

30 Cf. F. N E I R Y N K , "Anateilantos tou heliou (Mc 16, 2 ) " , 81, n.61.

3 1 B . R I G A U X , o.e., 1 9 0 .

33 Cf. J . J E R E M I A S , Die Abendmahlsworte Jesu, 11-12.

34 Cf. L . S C H E N K E , o.e., 59-65.

35 Cf. L. S C H E N K E , o.e., 87-93; F. N E I R Y N C K , "Anateilantos tou heliou (Mc 16, 2 ) " , 91-94.

É estranho que as mulheres não se tenham apercebido da difi- culdade de remover a pedra senão quando já iam a caminho. Aliás, só no v. 4b se diz que a pedra era muito grande. O v. 3 não tem sentido senão em função do v. 1: o rolamento da pedra só se justifica pela intenção das mulheres — ungir o corpo de Jesus. Sendo redaccional o motivo da unção — como parece — também o tema da pedra deverá ser atribuído ao último redactor do evangelho. A análise literária confirma esta conclusão37.

A observação do v.4b a propósito da pedra, que' 'era muito grande", está ligada à preocupação das mulheres expressa no v.3:' 'Quem nos rolará a pedra da entrada do túmulo?'' Por isso, também o v. 4 deverá ser consi- derado como redaccional38.

Apesar do carácter secundário dos w . 3 - 4 , devemos reconhecer que o motivo da pedra exerceu função importante na tradição primitiva (cf. Jo 20,1)39. Em si mesma, a pedra representa um impedimento, quer para

a entrada dos vivos quer para a saída dos mortos. A pedra rolada, pelo contrário, aparece como possibilidade de se entrar no túmulo e verificar que ele está vazio. Tal motivo é referido, não para suscitar a admiração, mas enquanto sinal, que provoca a abertura para a fé na ressurreição de Jesus. Esta função da pedra pode ser considerada como apologética. Em relação ao cadáver, encerrado no túmulo, a sua remoção assume carácter epifânico, como nos atesta o relato de Mateus sobre a morte de Jesus: "Abriram-se os túmulos e muitos corpos dos santos falecidos ressusci- taram" (Mt 27,52). Rolada a pedra, deixa a morte de exercer qualquer domínio sobre o homem, vencida que foi pela vida40.

C — A n g e l o f a n i a (vv.5-7)

As mulheres entram no túmulo e, deparando com um jovem sentado à direita, vestido com uma túnica branca, ficam atemorizadas. Depois de

37 Cf. L. S C H E N K E , o.e., 4 0 - 4 3 ; M . - É . B O I S M A R D , Synopse I I , 4 4 2 .

38 Cf. L . S C H E N K E , o.e., 38-44; X. L É O N - D U F O U R , o.e., 154-156;J. S C H M I T T , DBS

10, 533. Diversa é a análise de E. GUTWENGER, a.c., 274, que vê uma "ligação harmo- niosa' ' do v. 4 com o v. 2 . Por seu lado, J. G N I L K A , Markus II, 338-341, retém como tradi- cionais os vv. 3-4, interpretando a grande dificuldade das mulheres, expressa no v. 3 e simbolizada na dimensão da pedra (v. 4), como preparação da grandeza do aconteci- mento que se segue.

3 9 C f . X . L É O N - D U F O U R , o.e., 1 5 4 - 1 5 6 .

40 Cf. D . D O R M E Y E R , o.e., 230; X . L É O N - D U F O U R , o.e., 155-156; G N I L K A , Mar- kus 11, 341.

as tranquilizar, a visão celestial anuncia-lhes a ressurreição de Jesus e confia-lhes uma mensagem para transmitirem aos discípulos e a Pedro (Mc 16,5-7). A crítica hesita em classificar o mandato conferido às mulheres (v.7) como elemento tradicional, mas é quase unânime em acei- tar o anúncio pascal (vv. 5-6) como primitivo 41.

Certos autores, apesar de defenderem a existência de um relato arcaico sem angelofania 42, retêm que a aparição angélica foi aí intro-

duzida em fase pré-marciana. Outros chegam mesmo a dar à totalidade da tradição do túmulo vazio explicações estritamente redaccionais 4-\ Do

lado oposto, situam-se exegetas — como por exemplo R. Pesch, céptico perante as soluções da crítica literária que se recusam a aceitar qualquer corte no relato de Mc 16,1-8 44.

Dificuldades maiores são as que se prendem com a origem do man- dato conferido pela visão angélica às mulheres (v.7). A reacção destas - que respondem com o silêncio (v.8b) apresenta-se como desobe- diência formal. A crítica literária oscila entre duas possíveis soluções: o reconhecimento do v. 7 como dado tradicional, fazendo parte do esquema da angelofania45, e a sua atribuição ao evangelista, a quem igualmente se

deve a promessa anterior: "Depois de eu ressurgir, preceder-vos-ei na

41 C f . F. NEIRYNCK, " M a r c 16, 1 - 8 " , 72.

42 Esta tese foi defendida outrora por A . Bauer ( 1 9 1 2 ) , M. Goguel ( 1 9 3 3 ) , J. M. C. Crum ( 1 9 3 6 ) , R. Thiel ( 1 9 3 8 ) e, sobretudo, E . Hiersch ( 1 9 4 1 ) . Cf. F. N E I R Y N C K , "Mare 1 6 , 1 - 8 " , 5 7 - 5 8 . Mais recentemente, A . V O E G T L E , "Literarische Gattungen und Formen. Die Evangelien'', Anzeiger fuer die katholische Geistlichkeit, 7 4 ( 1 9 6 5 ) 2 - 3 ; M. É . B O I S M A R D , Synopse I I , 4 4 2 ; W. S C H E N K , o.e., 2 5 9 - 2 7 1 . A crítica ao relato primitivo sem angelofania foi feita por L . S C H E N K E , o.e., 6 5 - 7 3 , por J . D E L O R M E , "Résurrection et tombeau de Jésus: Mc 16, 1-8 dans la tradition évangélique", em P. de Surgy, La

résurrection du Christ et l 'exégèse moderne, Paris 1969, 105-151, p. 138; e ainda por

X. L É O N - D U F O U R , o.e., 1 6 1 , 2 2 4 . Observe-se que A . V O E G T E , em A . Voegtle R.Pesch (ed.). Wie kam es zum Osterglauben?, Duesseldorf 1975, 94, aceitou as críticas que lhe foram movidas e reconheceu " o anúncio do anjo como conteúdo central da narração". É a tese de N . O . H A M I L T O N , a.c., 415-421; J . D . C R O S S A N . Q . C . , 135. 145-152; M. GOULDER, " T h e Empty T o m b " Theol 79 (1976) 206-214.

44 Cf. R . P E S C H , Markusevangelium I I , 7 . 1 0 .

45 Para D . D O R M E Y E R , o.e., 226, a entrega da mensagem faz parte do esquema

normal da angelofania, que comporta seis elementos: 1. aparição do anjo; 2. o medo; 3. a mensagem; 4. a objecção; 5. o sinal confirmador; 6. a verificação do sinal. Por tal motivo, o v. 7 não pode ser considerado adição secundária. R. P E S C H , Markusevangelium

II, 522, reconhece em Mc 16, 5-8 a forma literária (Gattung) angelofãnica com os motivos da entrega (Auftrag) e do sinal confirmador (beglaubigendes Zeichen) no v. 7. A . L I N D E M A N N , a.c., 306-307, entende que a explicação mais fácil do v. 7 é aquela que

Galileia" (Mc 14,28) 46. A segunda hipótese recomenda-se, não tanto

pelo facto de a sua supressão dar lugar a uma sequência lógica entre os vv. 6-747 - dado que o motivo do silêncio das mulheres no v.8b é em geral

tido como redaccional48 - mas mais por retomar o logion de Mc 14,28,

considerado como inserção redaccional. Recomenda-se ainda em razão da presença do verbo' 'preceder'' (proagein), que em referência à relação de Jesus com os seus discípulos denota o estilo de Marcos (cf. Mc 10,32;

14,28). A tradição original concluiria, pois, com o anúncio da ressurrei- ção e a defesa do justo sofredor, seguindo-se a reacção do grande medo, como acontece no Antigo Testamento em relatos de encontros com Deus ou o seu anjo. Já nos vv. 5b e 6a se menciona a estupefacção das mulheres. Agora, a tremer e possuídas pelo terror, elas fogem do lugar em que se viram confrontadas com o mensageiro-divino 49.

No documento Ressurreição e fé pascal (páginas 125-128)