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O movimento dos trabalhadores rurais maranhenses pela re-ocupação das terras

Mapa 3: Brasil distribuição dos assentamentos, por unidade federativa –

4.2 O movimento dos trabalhadores rurais maranhenses pela re-ocupação das terras

Na história recente do Maranhão, a evolução dos conflitos agrários significa também a construção da resistência dos trabalhadores rurais. Concretamente, essa resistência forja-se, primeiramente, em meio ao avanço das cercas sobre as posses e do gado sobre as plantações de subsistência, e, mais recentemente, sob a traiçoeira ameaça de pistoleiros, a repressão policial sistemática e a arbitrariedade de setores reacionários do Poder Judiciário, autoritários e empenhados na defesa de interesses privados. Assim, nesta seção buscar-se-á reafirmar a idéia de que é como conseqüência direta da resistência organizada dos trabalhadores rurais, no conjunto do movimento social, que surgem e se expandem os assentamentos de reforma agrária no Maranhão.

O processo de organização dos trabalhadores rurais no Maranhão configura- se numa trajetória de lutas na qual emergem entidades sindicais e associativas73, com ativa presença de setores da igreja católica e, mais tarde, do Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra e do Centro de Educação do Trabalhador Rural74.

Observada de modo panorâmico, essa trajetória de organização permite identificar pelo menos quatro momentos específicos. O primeiro deles, que se inicia em meados do século XX e estende-se até o final da década de 1970, caracteriza-se pela luta contra o avanço das cercas de arame sobre antigas e potenciais áreas de roça e moradia, período em que os trabalhadores procuravam resistir através da derrubada das cercas e sacrificando animais. Entretanto, com decisivo apoio do aparelho policial do Estado e também de seguranças particulares, os novos donos levaram adiante o cercamento de extensas faixas de terra e lograram, finalmente, efetuar a limpeza, ou seja, a desocupação dessas áreas.

O segundo momento, entre fins da década de 1970 e meados dos anos de 1980, caracteriza-se pela acentuada presença das famílias que foram expulsas da terra, nos acampamentos às margens das rodovias ou na periferia das cidades. Esse momento, todavia, parece ter funcionado positivamente para aproximar os trabalhadores, reduzindo o isolamento e permitindo melhor identificação de interesses e organização da luta.

O terceiro momento, que se inicia em meados da década de 1980 e espera- se que continue em aberto enquanto for necessário, demarca o retorno dos trabalhadores à terra, quando a situação exige uma organização que promova o agrupamento desses trabalhadores para enfrentarem a vigilância das fazendas. A partir desse momento é que ocorrem diversas ocupações de imóveis considerados improdutivos, num processo nem sempre passível de controle por parte das lideranças.

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Exemplo significativo dessas entidades é constituído pela ATAM, Associação dos Trabalhadores Agrícolas do Maranhão (1956), sucedida pela Federação dos Trabalhadores Rurais do Maranhão (1964) e depois pela FETAEMA, Federação dos Trabalhadores na Agricultura do Estado do Maranhão (1972). Para um exame detalhado desse processo de organização, principalmente em relação a sua origem nas décadas de 1950 e 1960, ver Almeida (1981).

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Sediado na cidade de Imperatriz, o CENTRU é uma entidade fundada em meados da década de 1980 por lideranças sindicais, tendo como objetivo principal atuar na educação política, sindical, comunitária e cooperativa dos trabalhadores rurais.

O quarto momento não é necessariamente datado, pois ocorre a partir da conquista da terra, quando se coloca o desafio de organizar a produção de forma mais eficiente, considerando-se que o caráter das técnicas dominantes na produção de subsistência não favorece a competição com a produção mecanizada e industrializada.

A compreensão do primeiro desses momentos acima mencionados deve ser buscada a partir da ocupação do campo maranhense pelos posseiros nos anos de 1950, discutida em seção anterior. Observa-se que a prática geral dos lavradores consistia na iniciativa de desbravar a mata em busca de terras férteis para o plantio. Essa, aliás, era a possibilidade mais imediata que se colocava no momento, diante das circunstâncias enfrentadas. No entanto, em seguida chegavam os fazendeiros para ocupar as terras desmatadas e os lavradores eram obrigados a procurar novas áreas e promover novo deslocamento da fronteira agrícola, num processo em que os posseiros realizavam o desmatamento facilitador do avanço da pecuária.

Porém, cada vez mais encurralados no interior da mata e politicamente desorganizados, os lavradores passam a descobrir a impossibilidade de sustentação dessa forma itinerante, tendo que estar sempre abrindo novas frentes de expansão. A própria mata impunha-se como principal obstáculo, uma vez que, considerando-se as condições técnicas da exploração, logo seus limites físicos seriam atingidos. Assim, impõe-se a necessidade de construírem sua organização a partir de entidades que favorecessem uma capacidade de reação diante das ameaças. Os agrupamentos e a consciência organizativa passam a surgir entre os lavradores75.

Diante da forte concentração da terra, estrutura sob a qual historicamente são engendradas relações de produção específicas, os trabalhadores rurais de todo o país buscaram manifestar seus anseios por uma reforma agrária ampla. Assim, reunidos na II Conferência Nacional dos Trabalhadores Agrícolas, no ano de 1954, esses trabalhadores procuraram avançar na construção das condições para a reforma agrária, ao adotarem como estratégia de ação a formação de comissões regionais, integradas por representantes dos trabalhadores, profissionais liberais, estudantes e membros da igreja católica. Entre outras incumbências, essas

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A síntese desse processo de organização dos trabalhadores rurais no Maranhão, apresentada a seguir, foi elaborada com base em um texto do antropólogo Alfredo Wagner (ALMEIDA, 1981).

comissões deviam promover o debate sobre a questão agrária no Brasil, do qual resultou um abaixo-assinado encaminhado ao Congresso Nacional.

No estado do Maranhão foi criada naquele mesmo ano a Comissão Estadual de Reforma Agrária, que procurou viabilizar no âmbito local as resoluções da II Conferência e teve a capacidade de suscitar a constituição de outras comissões no interior do estado, integradas por representantes de diferentes categorias. Em conseqüência do trabalho dessas comissões surgiram várias associações profissionais, congregando arrendatários, meeiros, parceiros, posseiros e pequenos proprietários.

No âmbito nacional, as muitas associações existentes convergiram para a formação da ULTAB (União dos Lavradores e Trabalhadores Agrícolas do Brasil), cuja finalidade era direcionar as aspirações dos trabalhadores para a concretização de uma reforma agrária democrática através da distribuição das terras dos

latifundiários aos trabalhadores rurais e aos lavradores sem terra ou proprietários de terras insuficientes face à dimensão de seu grupo familiar (ALMEIDA, 1981, p. 11).

Já no âmbito estadual, as associações reuniram-se na Conferência Estadual da Reforma Agrária e, em 1956, fundaram a ATAM (Associação dos Trabalhadores Agrícolas do Maranhão). Entre as resoluções tiradas dessa conferência estava a luta pela delimitação das zonas de criação de gado e de lavoura no território do estado.

Conforme destaca Almeida (1981), nos anos que se seguiram manteve-se a expansão das associações de lavradores nos municípios do Maranhão, tendo algumas delas sido divididas em agências, para possibilitar uma ação descentralizada e mais próxima dos problemas cotidianos de cada povoado. A reação à organização foi imediata por parte dos latifundiários, os quais recorreram a

métodos de coação e violência, mantendo em ação constantes bandos de jagunços

(ALMEIDA, 1981, p. 24) para expulsar de suas terras os referidos lavradores. Diante das retaliações dos latifundiários aos lavradores que participavam das associações, a ATAM decidiu convocar a II Conferência Agrária do Maranhão, no ano de 1958. Além dos trabalhadores rurais, esta conferência contou com ampla participação de representantes do poder público, igreja, estudantes, profissionais liberais e de outras categorias profissionais. Entre suas resoluções destaca-se a que se refere à distribuição das terras consideradas devolutas, conforme se segue:

CONSIDERANDO que o Estado tem grandes áreas de terras devolutas; CONSIDERANDO que essas terras estão sendo adquiridas por latifundiários, ou pessoas interessadas em possuir latifúndios;

CONSIDERANDO que estas medidas prejudicam os lavradores e entravam o desenvolvimento agrícola do nosso Estado.

A II Conferência Agrária do Maranhão sugere às autoridades constituídas que tais terras, de acordo com a Constituição Federal, sejam distribuídas com [sic] os lavradores sem terras e aos que nelas queiram trabalhar. (apud ALMEIDA, 1981, p. 24).

A realização da II conferência coincide com a época em que o Governo federal – respondendo a pressões relativas à densidade populacional nas principais cidades do Nordeste, cuja estrutura fundiária e a ocorrência de periódicas secas não permitem a absorção da mão-de-obra disponível no campo – resolve estabelecer diretrizes visando à ocupação das terras devolutas na Pré-Amazônia maranhense. Então, começam a chegar ao Maranhão os contingentes de imigrantes nordestinos, dispostos a abrir novas frentes agrícolas, o que vai ocorrer principalmente nos vales dos rios Mearim e Pindaré, conforme já se discutiu em seção anterior. Nessas áreas

os conflitos de terra aumentaram consideravelmente, pois a ação dos grileiros em muitos casos se antecipava ao movimento da frente nordestina fazendo picadas e se apropriando das terras devolutas (ALMEIDA, 1981, p. 35)

A segunda metade da década de 1950 foi, aliás, especialmente importante para a organização dos trabalhadores rurais no Maranhão. Em 1958, por exemplo, ocorreu também um fato fundamental para o fortalecimento dessa organização, que foi o Pacto de Unidade Sindical, proposto pelo Sindicato da Construção Civil, objetivando discutir e organizar a luta por melhorias das condições de vida dos trabalhadores. Envolta pela grave situação de violência no campo, a ATAM procurou articular-se com as demais entidades integrantes do pacto. No final daquele ano, essas entidades promoveram, na capital do Estado, a Passeata da Fome, um protesto contra o alto custo de vida, e realizaram o I Congresso dos Trabalhadores Maranhenses, em meados de 1959, dando uma demonstração do fortalecimento logrado com o pacto sindical. Nesse evento, foi elaborada a Declaração de Princípios dos Trabalhadores Maranhenses, na qual ficou reafirmada de forma nítida a necessidade da reforma agrária.

Particularmente na década de 1960, mas também antes, na década anterior, há que dar ênfase à contribuição da Igreja católica ao processo de organização dos trabalhadores rurais. O caráter dessa contribuição é preponderantemente apaziguador, refletindo as preocupações da instituição com a gravidade dos conflitos entre lavradores e

grandes proprietários de terra. A ação da Igreja buscava atingir a comunidade como um todo, incluindo desde lavradores a pecuaristas locais. Almeida (1981) chama atenção para o fato de que essa interferência significava também uma competição da instituição em relação aos órgãos oficiais e demais grupos interessados no direcionamento da organização dos trabalhadores rurais. Percebendo essa peculiaridade, a ação católica estendia-se à assistência de crédito, à assistência técnica e ao ensino formal.

Quanto à assistência técnica, procurava difundir novas técnicas de cultivo, com utilização de adubos, ferramentas e máquinas até então desconhecidas desses lavradores. No tocante ao ensino formal, em 1954, foi fundada uma Escola Normal Rural no município de Morros, objetivando a formação de professoras para atuarem no então Ensino Primário no meio rural.

No início da década de 1950, a Arquidiocese fundou a Cooperativa Banco Rural do Maranhão, visando estimular o cooperativismo entre os trabalhadores rurais. Nessa época surge também o Movimento Intermunicipal Rural Arquidiocesano (MIRA), direcionado aos trabalhos de extensão rural, tendo como estratégia a formação de equipes locais. Em convênio com o Ministério da Agricultura, o MIRA logrou realizar uma série de eventos, denominados Semanas Ruralistas, através dos quais procurava mobilizar conjuntamente autoridades, políticos, trabalhadores rurais, estudantes, fazendeiros, entres outros. Um documento relativo a um desses eventos elucida o pensamento da Igreja sobre os problemas agrários e suas soluções:

O problema da terra, bem resolvido, mas, sobretudo resolvido a tempo e custo módico, com a participação de todas as forças vivas do Estado, colocará esta unidade da Federação numa posição invejável em comparação com o resto do Brasil: eis o pensamento dos organizadores da Semana. Sim, porque salta aos olhos de todos que uma das causas de atrofiamento da economia maranhense está justamente na distribuição irregular da terra, criando duas classes distintas, a dos privilegiados que tudo possuem e a dos miseráveis que não têm sequer onde plantar um pé de couve. (COMISSÃO ORGANIZADORA DA VIII SEMANA RURALISTA apud ALMEIDA, 1981, p. 50)

Tendo alcançado êxito na ação de incentivar o crédito cooperativo76, a Igreja iniciou suas próprias experiências de reforma agrária. Assim, entre 1960 e 1961, foram desenvolvidas três experiências-piloto nos municípios de Morros/Vargem

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Almeida (1981) destaca, por exemplo, a rápida evolução do quadro de sócios da cooperativa que, num período de cinco anos, cresceu de 278 para 3.000 pessoas.

Grande, Pedreiras e Colinas. Todavia, o resultado não atendeu às expectativas, sofrendo críticas das entidades filiadas à ATAM, o que levou a Igreja a reformular sua atuação junto aos trabalhadores rurais no Maranhão.

O clero passou a interessar-se pelo problema das organizações sindicais e numa ação paralela à ULTAB iniciou um trabalho de educação sindical e de criação de sindicatos. Foi mobilizado o laicato católico no sentido das organizações representativas e a Igreja dispôs o Movimento de Educação de Base – MEB como instrumento para a fase preparatória de educação sindical. Começaram a ser fundados os sindicatos que ficariam conhecidos como os sindicatos dos padres (ALMEIDA, 1981, p. 56).

No âmbito nacional, o início da década de 1960 foi marcado pela tentativa de maior aproximação entre a União dos Lavradores, o Movimento de Trabalhadores Sem Terra e as Ligas Camponesas. Durante o I Congresso Nacional de Lavradores e Trabalhadores Agrícolas, essas entidades buscaram superar divergências relativas à organização e à condução das lutas, avançaram em direção a um programa básico, contemplando interesses comuns. No documento final, os trabalhadores reivindicam uma reforma agrária radical, que represente o fim da propriedade monopolista da terra, a qual deveria se substituída pela propriedade camponesa. Iniciou-se em seguida a Campanha pela Sindicalização Rural. As Associações de Lavradores e Trabalhadores Agrícolas foram transformadas em Sindicatos de Produtores Autônomos. No final de 1963, esses sindicatos compõem a Confederação Nacional dos Trabalhadores Agrícolas – CONTAG, entidade que veio substituir nacionalmente a ULTAB.

Após seu retorno, a representação dos trabalhadores maranhenses no referido congresso procurou organizar comícios com a finalidade de divulgar as resoluções do evento. O passo seguinte foi a fundação, no início de 1964, da Federação dos Trabalhadores Rurais do Maranhão, substituindo a ATAM. Porém, em 1 de abril, o país amanheceu sob golpe militar, institucionalizando-se a repressão aos movimentos de organização dos trabalhadores em geral.

Conforme a interpretação de Almeida (1981)77, naquele momento o movimento dos trabalhadores rurais no Maranhão já vinha perdendo seu caráter

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O fato de se agruparem em associações voluntárias dispondo de recursos próprios, ainda que limitados,

permitia aos trabalhadores rurais uma grande autonomia de expressão. Não se encontravam subordinados e nem dependiam dos órgãos governamentais ou da ação da Igreja. [...] Eventualmente as associações atuavam articuladas com os partidos políticos. O estabelecimento de compromissos político-eleitorais estava subordinado às vicissitudes dos conflitos de cada município ou povoado. Estas variações no alinhamento político partidário tornavam as associações não facilmente arregimentáveis ou manipuláveis por forças externas ao movimento organizatório dos trabalhadores. (ALMEIDA, 1981, p. 18-20).

relativamente autônomo e espontâneo, expresso pelas associações na década de 1950. Ainda que adotassem práticas de cunho assistencialista perante as famílias a elas vinculadas, essas associações logravam condensar aspirações de rompimento das relações de produção desfavoráveis que subjugavam os trabalhadores rurais. A transformação das associações em sindicatos teve efeitos muito fortes para a trajetória de organização dos camponeses, pois passaram a se submeter às normas oficiais, ficando atrelados e fiscalizados pelo Estado.

Até a primeira metade da década de 1960, os trabalhadores rurais no Maranhão enfrentavam a violência dos latifundiários e da polícia, localmente subordinada a interesses particulares. Com o advento do golpe de 1964, no entanto, esses trabalhadores tornam-se alvo da perseguição do Estado autoritário, que intentava sufocar sua capacidade de livre organização. Segundo Almeida (1981), somente nesse contexto político é que se pode compreender o apoio decisivo dos trabalhadores rurais para a eleição do candidato da UDN ao governo estadual, o então deputado federal José Sarney, no ano de 196578.

Mesmo diante da delicada situação política vivida no País, alguns setores do movimento sindical no Maranhão conseguiam se manter ativos e esses trabalhadores passaram a depositar no processo eleitoral suas esperanças de soerguimento das entidades sindicais, uma vez que a reabertura dessas agremiações era elemento recorrente no discurso do candidato em questão. De fato, ainda que circunstancialmente, essa era a candidatura que congregava opositores do grupo político dominante, o qual era diretamente responsável, em grande medida, pela situação de opressão imposta aos trabalhadores rurais. Com essa expectativa, os trabalhadores participaram ativamente da campanha eleitoral, porém, o êxito do candidato representou a frustração dos que acreditaram nessa alternativa.

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Para melhor entendimento desse fato, é preciso lembrar que até meados da década de 1960, o grupo político hegemônico no Maranhão era liderado pelo então senador Vitorino Freire, cujo partido, o PSD, vencia as eleições seguidamente desde os anos de 1940. Através de abusivos métodos de controle do eleitorado rural, esse grupo conseguia garantir a defesa de seus interesses nas instâncias do poder público. Por sua vez, a UDN, então o principal partido de oposição, cuja base eleitoral era essencialmente urbana, procurava arregimentar forças capazes de ameaçar a hegemonia vitorinista no meio rural. Àquela época, mais que hoje, o Maranhão era um estado essencialmente rural, pois conforme o Censo Demográfico de 1960 (www.fibge.gov.br), apenas 18% dos quase 2,5 milhões de habitantes viviam nas cidades. O eleitorado rural, portanto, era decisivo. Por essa razão a UDN procurou aliar-se estrategicamente a entidades representativas dos trabalhadores rurais. Para uma análise crítica da trajetória política da principal personagem do grupo que se tornou hegemônico no Maranhão a partir de meados da década de 1960, José Sarney, ver Gonçalves (2000), e das formas de renovação e tentativa de continuidade dessa hegemonia, com a construção de uma nova personagem na linha sucessória, ver Gonçalves (2006). Essa trajetória só muito recentemente (29.out.2006) foi interrompida com a derrota eleitoral da senadora Roseana Sarney, em sua tentativa de um terceiro mandato como governadora do Maranhão.

Logo após a posse do governador os grupos de trabalhadores rurais que haviam participado da campanha eleitoral no vale do rio Pindaré tentaram reabrir os sindicatos, mas foram desencorajados pelas autoridades municipais e estaduais, seus aliados de véspera. (ALMEIDA, 1981, p. 64). Em seu cotidiano, os trabalhadores rurais continuaram a enfrentar as mesmas atrocidades, com a ação dos grileiros avançando sobre a posse da terra e o gado alimentando-se das lavouras. A omissão das autoridades locais não deixou muitas alternativas aos lavradores, que passaram a sacrificar o gado encontrado em suas roças e a envolver-se cada vez mais em confrontos armados contra os jagunços dos latifundiários. A atuação dos representantes do Estado, nitidamente favorável aos grandes proprietários e poderosos, a partir de então, veio a incitar ainda mais a violência no campo maranhense. O direcionamento escolhido pela burocracia estadual, revestido com o discurso do estímulo ao progresso, reservaria um destino severamente incerto para os trabalhadores rurais. No final da década de 1960, o governo estadual adotou uma série de medidas para o campo, criando a reserva estadual de terras, as delegacias de terras e, em seguida, a lei de terras, a qual, como já se mencionou, permitiu a venda de terras devolutas do estado a grupos empresariais, sem necessidade de licitação.

Essas medidas expressam uma determinação do então governador em transformar o Maranhão em um espaço atraente para o capital. Nesse sentido, foi criada a imagem de um estado das oportunidades para os “homens de negócio”, idéia que o próprio governador tratou, pessoalmente, de disseminar nos diversos fóruns empresariais pelo país, para os possíveis investidores interessados, nacionais e estrangeiros.

O Maranhão é, em verdade, um fenômeno econômico irreversível e a grande oportunidade para os investimentos compulsórios, tanto na faixa da SUDAM/ Banco da Amazônia, quanto na área da SUDENE/ Banco do Nordeste. [...]. De imediato e a médio prazo será sem dúvida o Maranhão a unidade integrante da região Amazônica que soma as melhores oportunidades e oferece as maiores perspectivas para o investimento privado. (SARNEY, 1970, apud GONÇALVES, 2000, p. 171-172)

A propaganda que se passou a fazer a respeito do Maranhão, a rigor e por si só, não era nenhuma novidade. No início do século XVII, por exemplo, o comandante