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4.5 MOVIMENTOS SOCIAIS E MST: REFORMA AGRÁRIA E EDUCAÇÃO

4.5.5 O MST e a educação

No interior da organização do MST, nos acampamento e assentamentos, desde o início de sua história, é possível observar as ações em torno da educação que o movimento social se propõe a fazer. A relação do MST, pois, com a questão da educação acompanha desde sua formação nas preocupações mais elementares como escola para as crianças dos acampamentos e assentamentos até as lutas mais elaboradas por políticas públicas em educação, reelaboração da teoria pedagógica para o interior das escolas do campo.

Considerando a forma de organização do movimento, que compreende a garantia de uma organização política para as frentes de luta, estratégias, assim como para garantir a forma de organização interna nos acampamentos e assentamentos, um dos setores de trabalho é o setor de educação que existe desde o início do movimento.

Esse setor que têm composição de direção, lideranças e base, se responsabiliza na organização política interna da discussão acerca da educação e da materialização de lutas e ações em torno dessa questão.

Quando falamos em educação no MST estamos nos referindo à três aspectos que remetem à intencionalidade do MST em levantar internamente a questão da educação.

A primeira questão refere-se ao entendimento interno desse movimento de que as ações político-organizativas têm um aspecto educativo e formativo para todas as pessoas que dele participam. As ações do MST, portanto, têm um caráter pedagógico e o MST pauta algumas de suas estratégias educativas nesse entendimento. Alguns pesquisadores analisam essa questão. Olham para os movimentos sociais como espaços educativos onde os sujeitos que deles participam, nesse fazer educativo através da participação, são educados para a conquista da cidadania. Mas, além disso, destacam que os movimentos sociais que lutam por educação reeducam a cultura política e colocam a escola como um direito, reelaboram a teoria pedagógica

que se contrapõe à lógica dominante e geram iniciativas educativas no âmbito da discussão e da luta por educação. (GOHN, 1999; ARROYO, 2003).

Um segundo aspecto refere-se às inúmeras iniciativas de formação e educação (não- formal)9que o MST tem realizado a partir da atuação dos coletivos, setores e escolas (centros de

formação) nos diversos assentamentos e acampamentos do país.

Nesse sentido podemos citar que no Paraná existem 4 centros de formação do MST que estão localizados em assentamentos ou áreas cedidas por entidades: Escola Milton Santos em Maringá, ITEPA – Instituto Técnico de Pesquisa da Reforma Agrária em São Miguel do Iguaçu no Assentamento Antônio Tavares Pereira, CEAGRO - Centro de Formação em Agroecologia e Desenvolvimento Sustentável em Cantagalo nos Assentamentos Jarau e Ouro Verde e Escola Latino-americana de Agroecologia na Lapa, no Assentamento Contestado. Esses são os Centros de Formação reconhecidos pela direção do MST. Mas existem outras iniciativas de formação de pequenos centros espalhadas pelo Paraná. Essas iniciativas são realizadas pelas lideranças de base nas diversas regiões do Estado, a saber: Centro de Formação CEPAG – Querência do Norte10, Centro de Formação do Assentamento Iapará – Tibagi, Centro de Formação e Produção

Agroecológica do Pré-Assentamento Emiliano Zapata em Ponta Grossa, entre outros diversos. Nesses centros de formação acontecem cursos de formação política para base do MST, juventude, assim como para as lideranças e formação de quadros. São espaços também para reuniões de setores, coletivos enfim, referentes à gestão do MST.

Desde os 90, também nesses centros de formação acontecem cursos formais resultantes das parcerias do MST com Universidades. Exemplo disso são os cursos Técnico e Tecnólogo em Agroecologia em parceria com a Universidade Federal do Paraná, o governo do Paraná e o Governo da Venezuela, que acontecem nos os quatro centros de formação citados anteriormente. 9 Estamos nos referindo à educação não-formal como aquela realizada por grupos organizados, em espaços

educativos definidos, com projeto político-pedagógico também definido, mas sem o reconhecimento oficial, sem estar vinculada a política educacional e à regulamentação educacional do Estado. E a Educação formal é aquela garantida pelo Estado, subsidiada pela Lei de Diretrizes e Bases da Educação Brasileira, através de suas várias determinações, e das leis e regulamentações estaduais, reconhecida, portanto formalmente como direito dos cidadãos e dever do Estado e da sociedade civil. Ela está atrelada à políticas educacionais, apresenta estrutura político pedagógica e preferencialmente acontece no interior das escolas do país.

10 Sobre atividades de formação e caracterização do MST nessa região (noroeste do Paraná), incluindo os aspectos

da educação não-formal e das práticas de parcerias do MST com Universidades, ver trabalho de HIROSE, Kiyomi. A mística e a educação no MST da Região Noroeste do Paraná. 2004. Dissertação (Mestrado em Educação) – Universidade Estadual de Maringá, Maringá, 2004.; OLIVEIRA, Alaíde Paulino Machado de. Ideologia e Educação: a proposta pedagógica do MST e as Escolas do Campo de Querência do Norte – PR. 2006. Dissertação (Mestrado em Geografia) – Universidade Estadual de Maringá, Maringá, 2006; DELIBERATOR, Luiza M. Yamashita e Vieira, Ana Carolina Rampazzo. Comunicação e Educação para a cidadania em uma cooperativa de assentamento do MST.

Acessado em HTTP://REPOSCOM.PORTCOM.INTERCOM.ORG.BR/DSPACE/HANDLE/1904/17970 em 03 de junho de 2008 – site da

Ainda com relação à educação não formal, o MST do Paraná tem uma escola de formação política chamada Escola Estadual Rosa Luxemburgo que semestralmente realiza cursos de formação política para jovens militantes de todo o Paraná que são sediados tanto nos centros de formação quanto em acampamentos do Estado. Em 2007 eram 150 jovens estudando na Escola Estadual do MST que estava sendo sediado no acampamento Maila Sabrina em Ortigueira – PR. Essa Escola é coordenada pela direção Estadual do MST e pelo Setor de Formação que também é vinculado à organização nacional do MST para a formação política representada principalmente pela Escola Nacional Florestan Fernandes.

E por último as ações em torno da garantia do direito à educação formal que esse movimento vem reivindicando também desde sua origem, mas com mais força a partir da luta pela política pública de Educação do Campo, a partir da década de 90. Essa mobilização em torno dessa forma de luta pela educação se dá no contexto da participação do Movimento nas lutas pelas políticas públicas, na aproximação do MST em relação ao Estado proporcionada especialmente pela conjuntura política dos governos de esquerda no país, e ainda considerando a abertura política e a construção dos espaços de participação democrática no Brasil.

Sobre essa questão, as políticas públicas de educação, de educação rural, de Educação do Campo juntamente com as de reforma agrária são estudadas em trabalhos que buscam compreender essa forma de garantia de direitos, e a possibilidade da construção da cidadania, da democracia11.

Nessa perspectiva, Santos (2005) destaca que a trajetória de resistência do MST em confronto com a necessidade de participação nos governos liderados pelo PT levou a um rico processo de democratização da sociedade brasileira. A aproximação do MST, enquanto um setor excluído da sociedade brasileira, com o Estado através da participação no espaço político do poder público, foi um acontecimento histórico inédito. E que essa participação se dá no contexto das relações de negociação e conflito entre os agentes históricos envolvidos na efetivação de diversas políticas de reforma agrária, os quais se dão no contexto desses governos incluindo as de educação. Nesse estudo, a autora destaca que, apresentaram-se algumas possibilidades concretas de um pós-neoliberalismo, por meio da construção de um projeto econômico, social e político alternativo ao que estava posto. É, portanto, a partir dessa construção, considerando 11 Podemos citar aqui o trabalho de SANTOS, Andrea Paula dos. Reforma Agrária entre a polarização, a

negociação e o conflito: resistência e participação do MST nos governos do PT no Mato Grosso do Sul e no Rio Grande do Sul. 2003. Tese (Doutorado em História Econômica) – FFLCH - USP, São Paulo, 2003, que analisa as políticas de reforma agrária e como uma dessas políticas a de educação do campo no contexto dos governos de esquerda e discute a participação do MST nesse espaço público, os conflitos e a possibilidade de construção da democracia brasileira.

todos os conflitos e as negociações que se dão nesse processo, que as políticas de Educação do Campo se colocam em nível local, e mais recentemente em nível nacional.

Das políticas de Educação do Campo se desdobram e materializam ações em torno da educação formal nos assentamentos e acampamentos de reforma agrária no país. Existem também nessa perspectiva de educação formal as inúmeras iniciativas de parcerias entre o MST e Universidades para cursos de formação de educadores da reforma agrária e trabalhos com alfabetização de jovens e adultos, como os acontecidos através dos financiamentos do PRONERA – Programa Nacional de Reforma Agrária, assim como os cursos universitários de Pedagogia da Terra, História para Movimentos Sociais do Campo, Geografia, Agronomia, Agroecologia, entre outros.12

A luta pelas políticas públicas de educação relacionadas com o MST, portanto, se desdobram em ações educativas formais em escolas em acampamentos e assentamentos, em processo de gestão das políticas públicas com a participação desse movimento. Através delas é garantido formalmente o acesso à educação, mas também refletem todos os conflitos da ressignificação e reelaboração da política pública a partir da realidade na qual ela é desenvolvida. Esse é o caso da política da Escola Itinerante no Paraná entre outras inúmeras experiências escolares desenvolvidas nas áreas de reforma agrária.13

Assim, o próximo capítulo deste trabalho se propõe a tratar das políticas de educação no Brasil e das políticas de educação rural e de Educação do Campo, abrindo possibilidades para se fazer a reflexão sobre a Escola Itinerante como uma política pública.

12 Ver trabalhos a esse respeito de: OSTA, Marilda de Oliveira. Programa Nacional de Educação na Reforma

Agrária: o caso do curso Pedagogia da Terra da Universidade do Estado de Mato Grosso, Cáceres/MT. 2005. Universidade Federal do Rio Grande do Sul, Porto Alegre, 2005; COSTA , Antônio Cláudio Moreira. Os impactos do PRONERA no assentamento Reunidas: as relações entre universidade X movimentos sociais X Governo Federal. 2004. Tese (Doutorado) – UNESP, São Paulo, 2004. FRAGOSO, Maria Beatriz Pinheiro Guimarães. Programa Nacional De Educação Na Reforma Agrária: A Responsabilidade Social Da Universidade. 2001. Dissertação (Mestrado em Educação) Universidade Federal Fluminense – Rio de Janeiro, 2001.

13 Ver trabalhos que estudam as escolas formais do MST como: MORIGI, Valter. Escolas do MST: uma utopia

em construção. 2003. (livro); NETO, Luiz Bezerra. Sem Terra aprende e ensina: um estudo sobre as práticas educativas e formativas do Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra – MST – 1879 – 1998. 1998. Dissertação (Mestrado em Educação) – Faculdade de Educação – UNICAMP, Campinas, 1998. ANDREATTA, Marcelo de Faria Corrêa. Instituto de Educação Josué de Castro: Paulo Freire e a “escola diferente”. 2005. Dissertação (Mestrado em Educação) – UFRGS, Porto Alegre, 2005. COELHO, Nilva Maria Gomes. Uma escola pública para crianças e jovens no campo: desafios, perspectivas e repercussões da LDB nos assentamentos Che Guevara (Itaberaí) e São Domingos (Morrinhos) em Goiás. 2003. Dissertação (Mestrado em Educação) – Universidade Católica de Goiás, Gioânia, 2003.

5 ESCOLA ITINERANTE “CAMINHOS DO SABER” NO CONTEXTO DAS POLÍTICAS PÚBLICAS DE EDUCAÇÃO DO CAMPO E DO MST: CULTURA ESCOLAR E IDENTIDADE