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CAPÍTULO II – ORGANIZAÇÕES E MUDANÇAS ORGANIZACIONAIS

2.2 Mudanças organizacionais

As organizações apresentam-se, pois, como sistemas abertos, inseridos em um universo de conjuntos também abertos, que agem e interagem com e no meio externo, num processo dinâmico e infinito. Essa noção nos leva ao entendimento de que as organizações estão constantemente sujeitas a serem afetadas e modificarem-se mediante o movimento do meio circundante. Neste estudo, avaliamos que, à medida que o fenômeno da globalização se manifesta em alguma de suas formas e alcances, as organizações absorvem seus reflexos, agem e interagem, buscando o princípio da adaptabilidade, para se manterem integradas e sobreviverem ao mercado/ambiente modificado e em constante movimento.

Conforme já apresentado no capítulo inicial desta pesquisa, a globalização é um fenômeno real e são incontestáveis os impactos que promoveu e vem promovendo de forma crescente junto ao cotidiano de milhares de indivíduos, grupos sociais e organizações. Ceribeli e Merlo (2013, p. 135) apoiam-se em Morgan para apresentar, entre outras perspectivas, a de que as organizações podem ser vistas como “sistemas permanentemente em fluxo […], interagindo com o ambiente e se transformando”. Essa visão de continuidade reforça o parecer de Weick e

Quinn (1999, p. 381), em que entendem que as mudanças nas organizações “nunca começam, porque elas nunca param” e propõem uma alteração do vocabulário, em que a palavra “mudança” poderia ser substituída por “mudando”, para indicar a continuação das ações praticadas em uma organização sistêmica e interdependente de seu meio. Os autores (1999) referem-se às trajetórias das mudanças organizacionais como “mais espiraladas e abertas do que lineares”. Por fim, Weick e Quinn (1999, p. 382) concluem:

“A preocupação com a "mudança" significa uma maior apreciação de que a mudança nunca se desliga, que suas cadeias de causalidade são mais longas e menos determinadas do que antecipamos, e que, se o ponto de vista de alguém é global ou local faz a diferença na taxa de mudança que será observada, as inércias que serão descobertas e o tamanho das realizações que terão sido celebradas.”

A abordagem sobre o tema de mudanças organizacionais transita nas áreas da administração e da comunicação, interligadas nesse campo de estudos. Conforme Wood Jr. (2009, p. 5) constata, “a quase totalidade dos artigos e livros sobre mudança organizacional é iniciada por comentários sobre a velocidade fantástica das mudanças sociais, econômicas, políticas e tecnológicas neste começo de século, e sobre como as organizações precisam adaptar-se para fazer frente a essas mudanças”, pois trata-se de uma realidade vivenciada no mundo contemporâneo. Bulé et. al. (2014, p. 2) consideram que as inúmeras mudanças praticadas no atual mundo globalizado são provenientes da “disseminação da informação, da união de países e culturas, da integração de mercados, da crescente mobilidade de mercadorias e fatores de produção”, fatores estes que têm acirrado a competitividade para “patamares cada vez mais elevados”, apresentando-se como ameaças e também como oportunidades que devem ser levadas em conta pelas empresas. Vemos assim desenhado um cenário onde as organizações e a totalidade do ambiente externo se movimentam e interagem entre si.

Harrison (2015) observa que existem quatro tipos de projetos de mudanças, considerados, para o autor, como os mais comuns: reestruturação da empresa; fusões e aquisições; mudanças culturais; e mudanças com base em processos de TI (Tecnologia da Informação). Entendemos que esses itens possam ser desdobrados em muitos outros, com proporções variadas, estendendo-se pela organização como um todo ou atingindo setores específicos. FitzPatrick e Valskov (2014) baseiam-se em Bridges e Mitchell (2000) para propor uma visão diferenciada entre mudanças e transições (ou transformações). Para os autores, a ideia de mudança está ligada a coisas que mudam, enquanto as pessoas se transformam: “Assim, um projeto pode envolver mudanças práticas ou transformação de pessoas — ou ambas” (FitzPatrick e Valskov, 2014, p. 168). Nosso estudo enfatiza que toda e qualquer mudança praticada em uma

organização vai, naturalmente, afetar as pessoas que atuam nesses locais, em maior e/ou em menor grau. Então, mesmo que esses autores delimitem uma linha que diferencia mudança (para coisas) e transformação (para pessoas), eles oferecem um exemplo onde não é possível dividir esses conceitos, nem dissociar um do outro. No exemplo apresentado, eles dizem que uma empresa que introduz uma nova plataforma de TI (Tecnologia da Informação) irá gerenciar uma “mudança prática”, com instalação de novos equipamentos e programas. Na sequência, esses mesmos autores afirmam que, nesse processo, a empresa vai querer que os colaboradores tenham conhecimento da chegada dos novos equipamentos e da instalação de softwares, pois essas pessoas estarão inseridas nesse processo e deverão saber utilizar esses novos equipamentos. Nesse exemplo, FitzPatrick e Valskov (2014) indicam que, no momento em que os colaboradores são acionados para participar dessa mudança, está ocorrendo uma “transição” ou “transformação pessoal”, pois a empresa pede ao seu pessoal que adote novas formas de trabalhar, a partir da “mudança prática”. Assim, a ideia de mudança sempre implicará transformações em pessoas, que serão afetadas direta ou indiretamente, ficando entendido que essas “transições” e/ou “transformações” já estão contidas no conceito de mudança.

Souza (2010) considera que mudança e inovação são “aspectos primordiais” para a sobrevivência das empresas. No âmbito empresarial, o autor (2010, p. 91) traduz a palavra mudança como “transformação, inovação, criação, ousadia, modificação”, onde podemos ainda acrescentar vocábulos como troca, remodelação, alteração, transição, variação, reinvenção e muitas outras palavras que encerram a ideia das mudanças como movimento ou reengenharia organizacional. Souza (2010) utiliza os termos mudança e inovação como sinônimos para descrever as mudanças que ocorrem nas organizações e classifica as razões que levam uma empresa a promover mudanças: Razões Internas e/ou Razões Impostas (de ordem externa). No primeiro grupo (Razões Internas), Souza (2010, p. 91) relaciona razões oriundas de 1. Grupos de pressão (colaboradores, sindicatos); 2. Reposicionamento estratégico (visão, missão, objetivos, metas, valores ou crenças); 3. Recursos operacionais excedentes ou deficientes; 4. Aspectos financeiros (controle de custos, parcerias planejadas, reposicionamento de preço, etc.). Já no segundo grupo (Razões Impostas/Externas), Souza (2010, p. 91) refere-se às fontes externas, “que não podem ser diretamente controladas pelos gestores” e, ainda, que “a conjuntura externa deve ser constantemente monitorada para que os processos de mudança sejam, sempre que possível, antecipados e transformados em mudanças planejadas”. O autor (2010) elenca os fatores referentes a essas forças externas como sendo a própria sociedade (valores sociais, pressões e imposições culturais, mídia, etc.); aspectos políticos; acontecimentos econômicos; e desenvolvimento tecnológico. Mesmo que Souza (2010) tenha

apresentado um recorte de mudanças organizacionais divididas nesses dois grandes grupos, ainda assim podemos entender que muitas mudanças consideradas de ordem interna podem ser influenciadas por forças de circunstâncias externas que provocam essas reformulações internas. Com mesmo enfoque, Shirley (1976) explica que o processo de mudanças organizacionais é desencadeado a partir do surgimento de forças, que podem criar uma necessidade de mudança em parte ou partes da organização. O autor então classifica como forças exógenas, de caráter externo, ou forças endógenas, formadas a partir do interior do organismo. Shirley (1976) cita como forças exógenas aquelas referentes a novas tecnologias, valores sociais, oportunidades e limitações do ambiente, tais como fatores econômicos, políticos, legais e sociais. Esses aspectos configuram forças que vão provocar necessidade de mudança organizacional interna, com vistas a se ajustarem às circunstâncias externas. Para se referir às forças endógenas, situações internas que criam necessidade de mudanças estrutural e de comportamento, o autor (1976) indica fatores relativos a tensões organizacionais, que efetivamente nascem dentro do contexto interno da empresa, e que inclui tensão, interações e sentimentos, que podemos traduzir como administração de conflitos e ajustes a serem acompanhados por áreas de recursos humanos, alinhadas às relações públicas para estabelecer condições de equilíbrio na consecução dos trabalhos.

Conforme já indicamos ao longo deste capítulo, as mudanças organizacionais são processos complexos, envolvendo inúmeros fatores de ordem interna e externa, estrutural e funcional, com trânsito nas áreas da administração e da comunicação, com os devidos desdobramentos decorrentes do planejamento e implantação dessas transformações que, em determinados momentos, são necessárias e inevitáveis. Apresentam-se, pois, diversos enfoques para definir as mudanças nas organizações, que nos permitem construir um quadro de definições que nos oferecem sempre novos olhares e entendimento sobre o tema, pois trazem uma revisão conceitual.

Ceribeli e Merlo (2013, p. 136) interpretam Araújo (1982) ao definirem mudança organizacional como “qualquer alteração significativa, articulada, planejada e operacionalizada por pessoal interno ou externo à organização, que tenha o apoio e a supervisão da administração superior e atinja, integradamente, os componentes de cunho comportamental, tecnológico e estratégico”. Bertero (1976, p. 29) explica que “as primeiras manifestações da teoria e da prática administrativas objetivaram mudanças do tipo estrutural, pois acreditava-se que a perda da eficácia organizacional era devida a uma distribuição inadequada do trabalho, ou seja, uma estrutura de tarefas imprópria”, remetendo à ideia de que a eficácia da empresa era dependente do fluxo de tarefas praticadas, numa visão exclusivamente voltada para a estrutura, não

considerando outros inúmeros fatores que hoje entendemos que sejam igualmente importantes. Na sequência, esse mesmo autor complementa que a segunda maneira de tratar as mudanças organizacionais é aquela que “enfatiza alterações no comportamento dos membros da organização”, deixando claro que as mudanças estruturais somente serão eficazes, se houver uma alteração no comportamento dos membros participantes da organização, em que eles tenham a compreensão das mudanças e que se sintam devidamente envolvidos e comprometidos com as mesmas. Essa colocação elucida o fato de que as ações administrativas necessitam considerar o sujeito na organização.

Ainda com referência a Bertero (1976, p. 30), este estudioso diz que se poderia formular um ideal de mudança organizacional, sendo “uma estrutura perfeitamente adequada à estrutura de tarefas, com suficiente flexibilidade para comportar formulações e reformulações de estratégia e/ou de objetivos e onde os indivíduos-membros sintam-se plenamente integrados, participantes e capazes de realizar suas aspirações e expectativas no âmbito da organização”, indicando, mais uma vez, o acompanhamento necessário junto aos públicos internos6 de uma empresa no enfrentamento de mudanças, para que sejam bem-sucedidas.

Shirley (1976) apresenta uma classificação de cinco tipos de objetivos para mudanças organizacionais. Entretanto, alerta que esses objetivos, a seguir listados, não são excludentes entre si, podendo acontecer de dois ou mais tipos serem operados simultaneamente, pois pode haver sobreposição nas necessidades e intenções de mudanças: 1. Estratégicos: são aqueles objetivos de mudança em que há preocupação em alterar a relação entre a organização como um todo e seu ambiente. 2. Tecnológicos: referem-se aos objetivos que são diretamente relacionados com mudanças de tecnologia da produção, fábricas, equipamentos e “outras partes físicas da organização”. 3. Estruturais: são objetivos de mudança relacionados com alterações nas relações de hierarquia (subordinação e chefia); processos de comunicação e decisão; relações de autoridades e outros aspectos similares. 4. Comportamentais: são os objetivos voltados para “mudanças das crenças, valores, atitudes, relações interpessoais, comportamento grupal, comportamento intergrupal e fenômenos humanos similares”, envolvendo os recursos humanos da organização. 5. Programa: são objetivos de mudança voltados à alteração da estrutura ou de aspectos referentes aos projetos de implantação técnica na produção; marketing; pesquisa e desenvolvimento.

6 “O público interno é aquele que apresenta ligações socioeconômicas e jurídicas com a empresa onde trabalha, vivenciando suas rotinas e ocupando espaço físico na instituição” (França, 2009, p. 218). Para França (2009), existem ainda outras definições mais amplas que contemplam grupos de pessoas que, além dos dirigentes e funcionários, também se relacionam com a empresa.

Schmitz (2012) refere-se à capacidade organizacional para efetivar mudanças explicando que se trata da “capacidade geral” que tem uma organização para se preparar ou responder a demandas provenientes do contexto ambiental, as quais o autor entende que são cada vez mais imprevisíveis e voláteis. Schmitz (2012) baseia-se em Peter Vaill para usar uma metáfora em que o estudioso argumenta que os executivos conduzem suas organizações remando em ‘águas calmas’7, onde eles acreditam que são capazes de possuir controle de seus ‘barcos’, mas esse é

um controle parcial da situação. Entretanto, a navegação efetiva de um barco em ‘corredeiras’ exige a participação de todos, no sentido de reagirem de forma eficiente e eficaz aos fenômenos externos para que, todos juntos, alcancem novamente as ‘águas calmas’, conscientes de que elas são temporárias, pois novos desafios e necessidades de mudança se farão necessárias. O autor ressalta que as organizações com capacidade de mudança relativamente alta podem enfrentar situações externas e manterem-se estáveis. Em todas as situações, quaisquer perspectivas de mudanças nas organizações preveem desafios e resistências em sua implementação, onde os gestores precisam definir estratégias específicas de ação para cada etapa do processo.