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4.3.1 | O Museu como parte da Cidade

No documento Cenografias urbanas e cidades cenário (páginas 174-178)

O museu Judaico de Berlim é um projecto de Arquitectura, que ao con- siderar aspectos históricos - relacionados não só, com os aspectos trau- máticos da história judaica, mas também, com os efeitos do Holocausto na Alemanha – integra-os no projecto de Arquitectura. O arquitecto Da- niel Libeskind239, ganhou um concurso para projectar o museu em 1988,

abrindo as portas ao público em 2001.

Destacamos este exemplo, na medida em que a Arquitectura mesmo quan- do criada de raiz, pode envolver-se com o local e a história oferecendo uma vasta experiência física, intelectual e emocional. Este processo de criação arquitectónica revela um complexo núcleo de referências históricas e lite- rárias, que a experiêcia arquitectónica nem sempre consegue comunicar, no entanto, tanto podemos conhecer um edifício ao ler sobre ele, assim como ao visitá-lo fisicamente. Deste modo, destacamos a relevância da parte conceptual de um projecto, que ao suportar-se em meios culturais poderá adquirir outro nível de complexidade, mantendo presente, ainda que conceptualmente, a memória de uma cidade.

Existem três ideias básicas que originaram o projecto actual do Museu Judaico: a primeira foi a impossibilidade em compreender a história da ci- dade de Berlim sem compreender a enorme contribuição dos cidadãos ju- deus, a nível intelectual, económico e cultural para a cidade; a segunda foi a necessidade da integração do significado, quer físico quer espiritual, que o Holocausto imprimiu na consciência e memória da cidade de Berlim; e por fim, a conclusão de que apenas pela transferência do conhecimento e da incorporação deste acontecimento, poderá a história de Berlim e de

239 Daniel Libeskind, (1946) arquitecto de referência, filho de sobreviventes do Holo-

causto. A sua arquitectura usa uma linguagem que se socorre de imponentes ângulos e geometrias interssectadas através de fragmentos, vazios e linhas exuberantes. Foi o arquitecto de diversos museus e galerias, incluindo o Museu Judaico de Berlim, o Museu Felix Nussbaum em Osnabrück e o Imperial War Museum North em Man- chester. Desenvolveu também o projeto do One World Trade Center, a torre central do novo complexo World Trade Center, que se encontra actualmente em construção no Ground Zero.

toda a Europa prosseguir rumo a um futuro mais humano.240

No piso da cave são oferecidas ao visitante três caminhos (eixos) distintos. O mais longo leva o visitante até à escadaria principal e até salas despidas com grandes vazios verticais que são visíveis através dos cortes diagonais dos vãos. Através destas janelas rasgadas diagonalmente para a superfície exterior é possível percepcionar, pela primeira vez, a superfície metálica ex- terior que envolve o edifício. Para Libeskind, estas salas vazias representam a continuação da história da cidade de Berlim241.

O segundo caminho, leva o visitante até ao exterior onde existe um jardim que representa o exílio e a emigração da comunidade judaica.

Finalmente, o terceiro percurso, encaminha o visitante para uma sala fria e escura no fim do corredor. Assim que a porta maciça e pesada se fecha, o visitante, ao ser atingido por uma luz distante que vem de cima, apercebe- -se que se encontra numa torre alta e escura sem saída. Para Libeskind esta torre é a interpretação física da materialização do vazio:

‘’ (...) to take emptiness and to materialize it as a building.’’ 242

240 LIBESKIND, Daniel cit. por RENDELL, Jane, op. cit., p.141. 241 RENDELL, Jane, op. cit., p.142.

242 Tradução livre: ‘‘(...) pegar no vazio e materializá-lo num edifício.’’ LIBESKIND, Dan-

iel cit. por RENDELL, Jane, op. cit., p.143.

Figura 51.

Museu Judeu em Berlin, Daniel Libeskind.

Figura 50.

Museu Judeu em Berlin, Daniel Libeskind.

Este projecto assentou em quatro premissas conceptuais: a tradição entre a relação da tradição judaica com a cultura alemã – que envolveu uma componente gráfica de impressão das moradas de Judeus de modo a criar um emblema em forma de estrela, emblema esse, que depois gerou a planta do edifício:

‘‘(...) a compressed and distorted star: the yellow star that was so frequently worn on this very site’’ 243

A segunda preocupação conceptual esteve conectada com uma ópera, Ar- nold Schönberg’s Moses and Aaron (1932), cujo terceiro acto não possui acompanhamento musical e as vozes que chamam pelo ‘’mundo’’ são acompanhadas por instrumentos que tocam todos uma nota apenas. Para Libeskind, essa ausência de música no espaço musical (‘’spacing of the music’s soundlessness’’ 244), pode estar associada com o espaço vazio e nulo

na Arquitectura (‘’the space of the void in architecture’’245). Foi também rele-

243 LIBESKIND, Daniel cit. por RENDELL, Jane, op. cit. p.142. 244 LIBESKIND, Daniel cit. por RENDELL, Jane, op. cit., p.142. 245 LIBESKIND, Daniel cit. por RENDELL, Jane, op. cit., p.142.

Figura 52.

Símbolo Judaico: A Estrela de Davi, de- senhada sobre o mapa de Berlin.

Figura 53.

Estudo volumétrico do Museu, com seus eixos principais.

vante neste processo, para o arquitecto, o facto do compositor desta ópera ser um professor de música Judeu em Berlim e ter sido exilado da cidade na altura em que escreveu esta ópera.246 A terceira premissa envolveu o uso

de um documento que lista todos os nomes, datas de nascimento, datas de deportação e previsões de locais de assassinatos aos Judeus em Riga e nos campos de concentração.

Por fim, o último elemento conceptual foi o livro ‘’One Way Street’’ de Wal- ter Benjamin, em que a sua estrutura é dividida em 60 partes, esta foi utili- zada para definir o número de pontos para os espaços vazios no edifício247.

246 RENDELL, Jane, op. cit., p.142. 247 idem, p.142.

Figura 54.

Museu Judeu em Berlin, Daniel Libeskind.

Figura 56.

Memorial do Museu Judeu em Berlin, Daniel Libeskind.

Figura 55.

Detalhes da fachada do Museu Judeu em Berlin, Daniel Libeskind.

No documento Cenografias urbanas e cidades cenário (páginas 174-178)