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Capítulo IV – Relatos de homossexuais masculinos seropositivos contaminados pela via sexual: as histórias de vida de Eduardo e Fábio

2. As narrações de Fábio: “E, aí, eu acho que até prolonga mais a vida do seropositivo (…) A gente valoriza mais a vida Não é? (…) Eu me preocupo mais

com o futuro, eu já penso em não fazer muita coisa agora, para eu ter uma vida saudável no futuro…”

Fábio, um operador de “telemarketing” e utente da Abraço/Delegação Norte, é natural do Rio de Janeiro, capital do estado com o mesmo nome, no Brasil, onde nasceu no dia 19 de Julho de 1985. O lugar de classe de origem deste jovem brasileiro é a pequena burguesia de execução. O pai trabalha como auxiliar num posto de bombeiros, enquanto que a mãe é doméstica (esta é proveniente de uma família operária industrial; quanto aos avós paternos, o jovem brasileiro nunca os conheceu).

No período infantil, o agregado familiar de Fábio era constituído pelos pais e pelo irmão, dois anos mais velho. Entre os 4 e os 6 anos de idade, dado que a mãe agenciou uma ocupação em “part-time”, este indivíduo residia na casa da avó e da tia maternas de 2ª a 6 ª Feira e passava o fim-de-semana com os pais e irmão (a avó e a tia maternas também moravam no Rio de Janeiro, no município de Nova Iguaçu, a cerca de

“uns 40 minutos de viagem”, de acordo com as suas palavras, da casa dos pais).

A relação intra-familiar foi sempre aprazível no decorrer da infância de Fábio, que repartia o seu tempo entre a escola, a prática religiosa, o convívio familiar e com os amigos. No entanto, com cerca de 7 anos de idade, foi vítima de um abuso sexual por parte do pai de um amigo, episódio que descreveu como a pior recordação da sua infância (da família de Fábio, somente o irmão tomou conhecimento do abuso, mas nunca chegou a denunciar o caso à polícia):

“Foi, tipo, eu ia para casa de um amigo para jogar “video-game”… Daí, o pai dele começou a me assediar sexualmente… (…) Não, não chegou a ter penetração, porque, imagina, eu era uma criança… Não tinha nem noção… (…) Sim, eu ficava tocando nele… Sexo oral…”

Este jovem brasileiro recebeu uma educação liberal, se bem que com um acentuado ascendente religioso. Fábio, o pai e o seu irmão pertencem à Religião Espírita, ao passo que a mãe é católica (Fábio cumpriu, todavia, o sacramento do Baptismo, o único vínculo que tem com a Igreja Católica). No Rio de Janeiro, o actual utente da Abraço/Delegação Norte deslocava-se ao Centro Espírita na companhia do pai

e do irmão para praticar a sua religião todos os Sábados. Igualmente uma vez por semana, praticava um culto cristão integrado na Religião Espírita com o pai e o irmão, em casa, à 4ª Feira. Este indivíduo desenvolveu, inclusive, o estudo sistematizado da Religião Espírita, que corresponde à catequese na Religião Católica.

Para os pais de Fábio, o tema da sexualidade constituiu sempre um tabu. Estes também se eximiram a abordar a problemática do VIH/Sida com o filho, conquanto o alertassem para usar o preservativo nas trocas sexuais.

Até entrar para a escola primária, aos 6 anos de idade, este indivíduo frequentou um jardim-de-infância por dois anos. Revelando maior capacidade de aprendizagem do que os seus colegas, adiantou-se um ano no nível de escolaridade, por altura da 1ª Série do Ensino Brasileiro. O jovem brasileiro completou o 2º Grau do Ensino Brasileiro (que equivale ao 12º Ano de escolaridade em Portugal) sem reprovações, aos 17 anos, desenvolvendo o seu percurso em instituições privadas. Desde tenra idade que Fábio patenteou a ambição de ingressar no ensino superior. O seu pai encarou a ideia sempre com alguma reserva:

“Não, eu lembro que o meu pai, ele sempre falava assim: “Ai, você não pode fazer a faculdade, porque é muito caro… E os livros são muito caros… E você não vai conseguir”…”

Este operador de “telemarketing” concretizou a sua aspiração com a entrada numa Universidade privada do Rio de Janeiro, num curso de Português/Inglês, ainda com 17 anos. Paradoxalmente, foi graças a uma indemnização que o pai recebeu por ter perdido o emprego da época que reuniu recursos financeiros para o ingresso no ensino superior. Porém, ao fim de seis meses, foi obrigado a abandonar temporariamente o curso por falta de dinheiro para o pagamento das propinas. Meio ano depois, tendo conseguido empregar-se como auxiliar de cartório, regressou à faculdade. Fábio viria a desistir do curso de Português/Inglês depois de concluir o 2º Ano (faltou-lhe apenas um ano para a formatura), por um lado, devido à experiência negativa que teve no decorrer do estágio como professor num colégio público, por outro, porque encontrou motivação para partir para Portugal.

A sua adolescência foi vivida com “muita intensidade”, como o próprio referiu. Relativamente à sua orientação sexual, já na infância Fábio percebeu que eram as pessoas do mesmo sexo que lhe despertavam interesse:

Capítulo IV – Relatos de homossexuais masculinos seropositivos contaminados pela via sexual

“Sempre fui “gay”, sempre… (…) Eu sou só homossexual… Eu nunca “transei” com mulher, nem pretendo… (…) É assim, na verdade, eu acho que eu sempre soube que eu era, desde criança… Eu sempre (hesitante)… Na escola, eu olhava mais para os meninos do que para as meninas e tal…”

A iniciação sexual deste indivíduo deu-se aos 10 anos de idade, com um primo (actualmente casado com uma mulher), cinco anos mais velho (Fábio utilizou preservativo). Com 15 anos, conheceu, através da Internet, um jovem de 23 anos, com quem teve uma única relação sexual na casa daquele (Fábio utilizou preservativo).

O primeiro namoro sério de Fábio aconteceu aos 18 anos com um indivíduo da mesma idade que conheceu através de um amigo do irmão (o seu irmão é heterossexual). Esta relação findou passado um ano por iniciativa do namorado de Fábio que alegou ter deixado de o amar. Durante os quatro meses iniciais do namoro, o par fez uso do preservativo nas trocas sexuais. Depois de realizarem, um e outro, testes de despiste do VIH, com resultados negativos nos dois casos, abdicaram dessa protecção para ampliarem o prazer sexual.

Entre os 15 anos e o início do primeiro namoro, o jovem brasileiro teve relações sexuais casuais com cerca de trinta indivíduos diferentes que conheceu por meio da Internet ou em discotecas “gay” do Rio de Janeiro (fez sempre uso do preservativo nestas trocas sexuais).

Aos 16 anos, confessou aos pais e ao irmão a sua opção sexual. Com excepção do irmão, que ficou abalado, a princípio, a reacção à notícia foi pacífica. Todavia, Fábio afirmou que a sua homossexualidade fere a susceptibilidade dos pais e do irmão, que se eximem a abordar esse tema directamente com ele:

“Eles reagiram bem… É assim, eles não reagiram mal… Meu pai disse: “Ah, onde é que foi que eu errei?”… (risos) Brincando, não é?... E a minha mãe, tipo, também aceitou numa boa… Me respeitou sempre… (referindo-se ao irmão) Na verdade, ele já desconfiava porque ele entrava na Internet e lia o meu histórico… Na época era o ICK… Não sei se (hesitante)… Foi antes do MSM Messenger… Era tipo o MSM Messenger, só que era mais arcaico… Aí, ele lia o meu histórico, das minhas conversas… Ao princípio, ele ficou meio, assim (hesitante)… Atónito… Mas, depois ele (hesitante)… Aceitou… Só que, é assim, (referindo-se aos pais e ao irmão) eles aceitam, mas não tocam no assunto, sabe?… Não falam… Não perguntam: “Ei, está namorando?”…”

As primeiras saídas nocturnas do protagonista desta história de vida ocorreram, também, aos 15 anos. Fábio mergulhou, a partir dessa data, nos ambientes “gay” da cidade do Rio de Janeiro, em especial nas discotecas. Menor de idade, falsificou um bilhete de identidade para poder frequentar esses espaços de animação nocturna ao fim- de-semana, por regra.

Neste período, iniciou-se no consumo de “maconha” com uma rapariga que conheceu durante o Carnaval. Durante cerca de um ano, fumou esta substância muito esporadicamente.

A partir dos 16 anos, o consumo de “maconha” foi regular e teve maior expressão ao fim-de-semana (em muitas ocasiões, Fábio consumiu “maconha” na companhia do seu irmão).

Até aos 15 anos, este indivíduo viveu com os pais e o irmão. Em virtude de uma mudança de estabelecimento de ensino, passou a residir, aos 16 anos, na casa da avó e da tia maternas a tempo inteiro. Amiúde, esta tia materna manifestou desprezo pela sua orientação sexual (inclusivamente, divulgou, por iniciativa própria, a homossexualidade de Fábio junto de familiares afastados) e pertença religiosa:

“A gente se dava bem, só que, às vezes, ela me desrespeitava um pouco por duas coisas, uma pela minha religião, que eu sou Espírita, e outra pela minha opção sexual… (…) Mas, eram coisas irrelevantes, nada de (hesitante)… (…) Tipo, ela dizia que eu ia para o Inferno… Por ser homossexual e por estar na minha religião, também… Dizia que Deus não aceitava isso… Que Deus criou o homem para a mulher… Que isso é fornicação… Ela dizia… Perversão sexual, fornicação… Que eu estava com um espírito mau… Era a minha tia que dizia… (…) Mas, ela dizia com frequência… Depois, ela parou de falar… Depois de um tempo… Só que, logo que ela descobriu, também, ela começou a contar para a família toda… Tipo, parentes distantes que não tinham nada a ver com a minha vida, que nem me perguntavam se eu estava vivo ou se eu estava morto…”

Nos seus 16 anos, os pais do jovem brasileiro separaram-se por incompatibilidades. Fábio reagiu bem à separação dos pais, embora nunca tenha compreendido a sua causa.

Este indivíduo considerou que desde a infância que tem total conhecimento acerca dos meios de transmissão e implicações do VIH/Sida, principalmente pela enorme visibilidade pública que o assunto tem no Brasil:

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“Sempre tive, desde criança… Ah, esse sempre foi um tema muito abordado no Brasil, através de todos os meios de comunicação… Através dos “media”, através da escola, através de amigos, através da religião… Através de tudo… Ah, eu não posso dizer, propriamente, assim: “Foi através da media”… “Foi através da escola”… Foram… Quer dizer, foi tudo importante… Os amigos, assim…”

Como já foi mencionado, a experiência de Fábio no mundo laboral principiou-se com uma ocupação como auxiliar num cartório, no Rio de Janeiro, aos 18 anos. Nesta ocupação, as suas tarefas consistiam na entrega de notificações na rua e no atendimento ao cliente no balcão. O jovem brasileiro trabalhava todos os dias úteis (prestava 8 horas diárias de trabalho, entrando às 9 horas e saindo às 17) e auferia um salário de cerca de 300 Reais (o equivalente a 96 Euros) por mês. Fábio manteve-se como auxiliar neste cartório um ano e oito meses, conciliando, paralelamente, a frequência do curso de Português/Inglês, em regime nocturno, que não chegou a concluir.

A seguir a esta ocupação, realizou um estágio de quatro meses como professor numa escola pública, uma experiência de que guarda más recordações por desrespeito dos alunos perante si.

Em Setembro de 2005, com 20 anos, este indivíduo abandonou a casa da avó e da tia maternas e partiu para São Paulo, onde se instalou na casa de um primo. Tendo-se desavindo com o primo, que o acusou de falta de responsabilidade, foi viver para a casa de um estilista homossexual, em São Paulo, que conheceu através de um amigo (Fábio e o estilista tiveram um pequeno “affaire”, a princípio, mas depois permaneceram amigos – utilizaram preservativo nas trocas sexuais –). Até Dezembro de 2005, auxiliou o seu amigo estilista na confecção das peças, executando recortes e responsabilizando-se pela revisão.

Terminada a aventura de quatro meses em São Paulo, Fábio regressou ao Rio de Janeiro e passou a viver sozinho, alugando um quarto. O primeiro emprego que teve depois do retorno à cidade natal foi como designer gráfico, num “Cyber-café”. Aqui, trabalhava de 2ª Feira até Sábado (cumpria 8 horas por dia, pelo que entrava às 12 horas e saía às 20) e recebia um ordenado de 300 Reais (o equivalente a 96 Euros). No final de Março de 2006, abandonou esta actividade. Os três meses seguintes foram passados numa ocupação em “part-time” a distribuir “flyers” à entrada de discotecas, que lhe valia 10 Reais (o equivalente a 3,2 Euros) por noite.

Nesta fase da sua vida, fumava “maconha” todos os dias, mesmo nos intervalos do horário de trabalho destinados ao almoço. Dadas as desilusões que teve neste período, com especial destaque para o fim do primeiro namoro, experimentou outros tipos de drogas, entre elas, cocaína (por via nasal), crack, “special key” (uma droga sintética), “poppers” (igualmente, uma droga sintética) e “loló” (um solvente). No entanto, por não ter apreciado o efeito destas drogas, não as voltou a utilizar. Foi também por volta dos seus 20 anos que começou a consumir álcool regularmente ao fim-de-semana, em particular cerveja.

Numa noite do mês de Julho de 2006, sob o efeito de muita “maconha” e álcool, o jovem brasileiro teve aquela que julga ter sido a relação sexual desprotegida que lhe causou o contágio pelo VIH, com um indivíduo seis anos mais velho que conheceu numa discoteca “gay” do Rio de Janeiro algum tempo antes:

“Foi justamente nessa altura, quando eu estava com 20 anos… Eu estava assim bebendo muito e (hesitante)… Fumando muito… E daí, foi numa dessas relações que eu, tipo, não me dei conta e tal… A pessoa não fez questão, eu também não fiz… (…) Era coisa de seis anos mais velho… Mas, não era muito mais velho, não… Foi na noite… Era um conhecido… A gente já se falava e tal, mas nunca tinha rolado nada… Nesse dia, acabou acontecendo… Eu estava alcoolizado… E daí, foi nessa hora… (…) Não, eu já tinha a noção porque eu sabia do risco… Quando uma pessoa “transa” sem camisinha, sente isso… (…) Eu cheguei aqui com 21 (anos)… Foi, tipo, uns seis meses depois que eu fiquei sabendo… Tipo, eu me contaminei em Julho… Quando eu vim para cá, em Novembro de 2006 (hesitante)… (…) Um amigo meu me levou no CAD…”

Fábio atribuiu o desleixo face ao preservativo nesta relação sexual à influência de álcool e “maconha”. Ressalve-se que este operador de “telemarketing” teve outra troca sexual desprotegida com um indivíduo bissexual a anteceder aquela que considerou ter sido a fatal. Neste caso, fundamentou a sua desatenção pela vontade em ampliar o prazer sexual e pelas crenças de que a orientação bissexual daquele parceiro casual representaria, possivelmente, um garante de saúde, e de que não seria através de uma única relação sexual desprotegida que se iria contaminar com o VIH:

“Eu não fiz questão de usar… (…) Sim, para ter mais prazer… Também, porque o cara disse-me que também era heterossexual e eu pensei: “Ah, não

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deve ter perigo”… Não foi só isso, não… Tipo, na hora, sei lá, não fiz questão de usar camisinha, não… Pensei: “Uma vez assim só, não tem problema”…”

Em Junho de 2006, Fábio logrou uma ocupação numa revista de arte, de novo como designer gráfico. Na referida revista de arte, laborava de 2ª a 6ª Feira um total de 8 horas diárias (entrava às 9 horas e saía às 17). O ordenado mensal era de 700 Reais (o equivalente a 225 Euros).

Depois de ter terminado a relação com o primeiro namorado, o actual utente da Abraço/Delegação Norte estabeleceu contacto através da Internet com um homossexual português (vinte anos mais velho) residente na cidade do Porto, com quem foi trocando mensagens frequentemente. Em Novembro de 2006, após ter abandonado a revista de arte onde desempenhava funções de designer gráfico, partiu para Portugal, para a cidade do Porto, com a intenção de iniciar uma relação de namoro com o indivíduo português que apenas conhecia do ciberespaço:

“Conheci essa pessoa na Internet… Foi logo depois que eu terminei o meu relacionamento com o Rodrigo… Aí, eu entrei na Internet e conheci essa pessoa daqui de Portugal… Ele é muito mais velho do que eu… Agora, ele está com 43 (anos)… Ele é português… Ele é vinte anos mais velho do que eu… Daí, a gente se conheceu na Internet… Daí, eu vim para cá… Sim, com a intenção de a gente ficar junto e tal, casar, morar junto… Só que aí, não deu certo…”

Com efeito, ao fim de um mês, tendo descoberto que o seu companheiro era adúltero, Fábio pôs fim ao namoro (Fábio utilizou sempre preservativo com este parceiro nas relações sexuais).

No período de tempo situado entre o fim do primeiro namoro, em 2004, e a vinda para Portugal, em Novembro de 2006, este indivíduo teve sensivelmente trinta parceiros sexuais ocasionais (utilizou sempre o preservativo, com excepção da relação sexual desprotegida que julga ter sido a fatal e da relação sexual com o indivíduo bissexual).

Em Dezembro de 2006, deslocou-se com um amigo brasileiro (trata-se de um conhecido da irmã de um amigo seu do Brasil que reside no Porto) até ao Centro de Aconselhamento e Detecção Precoce do VIH/Sida (CAD) da cidade do Porto, situado na Rua da Constituição, para realizar um teste de despiste, cujo resultado foi positivo.

Contrariamente àquilo que vem sancionado na literatura académica especializada sobre o tema (Parsons, 1951; Caldeira, 1995), a fase inicial de experimentação da doença foi vivida por Fábio com uma serenidade invulgar, sem que se tivesse verificado qualquer choque emocional ou tentativa de negação da seropositividade:

“Não, é assim, eu sempre fui muito tranquilo quanto a isso… Nunca tive problema com isso, não… Até hoje, eu nunca tive depressão… Nunca tive (hesitante)… Nunca fiquei revoltado com a vida, revoltado com Deus… Porque eu acredito na lei da causa e consequência, não é?... Se eu provoquei a causa, eu tinha que ter uma consequência… Ou seja, se eu sofro hoje, ou se eu tenho uma enfermidade, é consequência de uma coisa que eu próprio fiz… Eu tenho consciência disso… Por isso que eu não estou revoltado com ninguém… Se eu mesmo não acho que foi injusto… Eu acho que foi muito justo… Se eu sou doente hoje, isso é uma coisa muito justa… (…) Como eu já tinha amigos seropositivos lá no Brasil… Daí, até o psicólogo, na altura, perguntou: “Ah, você tem amigos? E eles, como é que eles vivem?”… (reproduzindo a sua resposta ao psicólogo) “Ah, eles vivem a vida deles normal”… Por isso, eu falei: “Então, eu vou viver a minha vida normal”… Isso não influenciou em nada, não mudou em nada a minha vida, nem o meu ponto de vista…”

Ainda no decurso desse mês de Dezembro de 2006, fez a sua primeira visita à Abraço/Delegação Norte, em Vila Nova de Gaia, por sugestão de um técnico do CAD do Porto. O jovem brasileiro foi movido até esta instituição pela vontade de conhecer outras pessoas seropositivas para partilhar experiências de vida e, também, para prestar trabalho voluntário. Nesta ocasião, fez somente a sua inscrição. Depois disso, teve atendimentos trimestrais com uma psicóloga e foi integrado num grupo de auto-ajuda (este grupo era composto por mais cinco utentes da Abraço/Delegação Norte e juntava- se quinzenalmente) que, entretanto, se extinguiu.

Até à data, Fábio associou-se a algumas actividades desenvolvidas pela Abraço/Delegação Norte, a saber, a distribuição de preservativos por altura da Queima das Fitas de 2008 (esta no âmbito de informação e prevenção do VIH/Sida) e o embrulho de presentes para crianças no Natal de 2007.

Este indivíduo tem uma relação boa com os profissionais da referida ONG e declarou estar satisfeito com o apoio psico-social que tem recebido:

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“(referindo-se aos profissionais da Abraço/Delegação Norte) É uma relação boa… (…) Ah, eu gosto de vir aqui, não é?... Porque eles respeitam a gente aqui, não é?... Só essa questão de eu saber que tem um lugar que faz esse tipo de serviços, já me deixa mais aliviado…”

Não possuindo um conhecimento aprofundado acerca do âmbito de intervenção, objectivos e lacunas na acção da Abraço/Delegação Norte, Fábio abonou que a vertente da convivência entre os utentes da instituição devia ser promovida com maior afinco:

“Ah, eu não sei o que é que pode melhorar porque eu conheço pouco aqui a Abraço, entendeu?… Não sei exactamente e tal (hesitante)… Eu sei mais ou menos o que é que eles fazem e tal… Dão apoio e tal… Mas, eu não posso dizer (hesitante)… (…) Então, acho que tinha que ter esse grupo de apoio, assim, para as pessoas… Mais convívio com outras pessoas seropositivas para ter essa interacção…”

No momento presente, desloca-se até às instalações da instituição, nomeadamente à unidade de Apoio Psico-Social, uma vez por cada três meses.