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3. Metodologia de Pesquisa

3.1. Natureza da Pesquisa

Ao tratar de processos complexos que constituem a subjetividade e de elementos que não se mostram evidentes, como os sentidos subjetivos, o estudo naturalmente se orienta para o modelo qualitativo de pesquisa. A pesquisa qualitativa permite a busca do entendimento de um fenômeno específico em profundidade, trabalhando com descrições, comparações e interpretações, em lugar da utilização de estatísticas, regras e outras generalizações.

Nesse estudo, a pesquisa qualitativa se baseia na Epistemologia Qualitativa (REY, 2005), entendida, nas ciências antropossociais, como uma busca de compreensão da pesquisa como um processo de comunicação e de diálogo, uma vez que o homem se comunica permanentemente nos diversos espaços sociais em que vive. A Epistemologia Qualitativa procura a legitimação do conhecimento por meio da construção contínua de modelos de inteligibilidade sobre um problema, que se permitam estar em constante desenvolvimento e construção (REY, 2003).

O método de pesquisa adotado é o estudo de caso (REY, 1999). O autor ressalta o estudo de caso como um momento importante na produção teórica, pois por meio dele é possível expressar “... a tensão permanente entre o individual e o social, momento essencial para a produção de conhecimentos sobre ambos os níveis de construção da subjetividade" (REY, 1999, p. 158).

A pesquisa enfatiza a categoria de sentidos subjetivos de Rey (2003) para explicar os processos relacionados aos sentidos subjetivos do servidor fazendário frente à participação no trabalho. Os sentidos subjetivos são construídos pelos sujeitos pesquisados de forma única e se originam dos significados nas dimensões culturais e sociais. Tanto o momento atual da vida da pessoa e de sua situação em relação à experiência vivida, quanto os outros sentidos construídos anteriormente, são elementos constitutivos de uma nova produção subjetiva, numa sucessão contínua que dura toda a vida.

Nessa pesquisa, a construção do conhecimento fundamenta-se especialmente nos três princípios básicos da proposta metodológica da Epistemologia Qualitativa (REY, 1997). O primeiro princípio é de que “a Epistemologia Qualitativa defende o caráter construtivo- interpretativo do conhecimento”. Esse fundamento implica entender o conhecimento como produção permanente, “e não como apropriação linear de uma realidade que se nos apresenta”

(REY, 2005, p. 5). O caráter construtivo-interpretativo do conhecimento visa romper com a dicotomia entre o empírico e o teórico. O caráter teórico da proposta de Rey, como afirma, nem exclui e nem relega o empírico a um segundo plano. Na proposta, o empírico é compreendido como um momento inseparável do processo de produção da teoria.

O segundo atributo importante da Epistemologia Qualitativa é a legitimação do singular como fonte de produção do conhecimento, o que implica considerar a pesquisa como uma produção teórica. O teórico, nesse caso, não é o restringido a fontes de saber pré-existentes ligados ao processo de pesquisa, mas sim ao que se expressa na atividade “pensante e construtiva do pesquisador” (REY, 2005, p. 11). No tocante à generalização dos resultados, o autor defende que

“o caso singular pode ter tanto valor de generalização com relação ao problema estudado como outras formas de opção populacional”. (...) “A investigação sob essa perspectiva epistemológica se difere daquela que enfatiza o valor da indução e da descrição como dominantes na investigação qualitativa” (REY, 2003, p. 270).

Na Epistemologia Qualitativa, a individualidade tem um papel essencial no processo de construção do conhecimento, que por sua vez tem muito a ver com seu próprio objetivo: a subjetividade (REY, 1997). Para a compreensão da relação complexa entre o social e o individual, e da importância do individual para a construção do conhecimento, Rey (2005) recorre a um texto elucidativo de Ferrarotti (2003):

“O indivíduo não é um epifenômeno do social (...) longe de refletir o social, o indivíduo se apropria, o equilibra, filtra e o traduz por sua projeção em outra dimensão, a qual se converte então em sua subjetividade (...) Desde a restauração da subjetividade à ciência: uma ação única ou uma história individual se apresenta como uma via de acesso – por vezes a única possível – ao conhecimento científico de uma realidade social. Isso não representa uma via direta, sendo frequentemente crítica, requerendo a invenção de chaves e novos métodos que permitam alcançá-la (FERRAROTI, 2003, p. 26-27, apud REY, 2005, p. 25).

O número de sujeitos pesquisados nesse estudo tem consonância com o segundo atributo da Epistemologia Qualitativa: a legitimação do singular como fonte de produção do conhecimento. Rey (2005) alerta que apesar da pesquisa qualitativa não usar o conceito de amostra tradicional, ligado ao significado estatístico de um grupo em relação a sua população, esse tipo de pesquisa permite enfrentar problemas que por sua natureza envolvem o estudo de grupos grandes. O autor explica que o conhecimento produzido no estudo de grupos grandes na pesquisa qualitativa baseia-se nos mesmos princípios epistemológicos do estudo de casos. Ou seja, não é o tamanho do grupo o fator fundamental para se definir os procedimentos de construção do conhecimento, mas sim as exigências de informação quanto ao modelo em construção na pesquisa.

O terceiro atributo geral da Epistemologia Qualitativa, destacado por Rey (2005), consiste em entender a pesquisa nas ciências antropossociais como um processo de comunicação e de diálogo. A ênfase dada à comunicação no processo de construção do conhecimento baseia-se no fato de que grande parte dos problemas sociais e humanos tem raízes, direta ou indiretamente, na comunicação entre as pessoas. Nesse sentido, a comunicação é um espaço privilegiado para o estudo da subjetividade e serve de via para conversão dos que fazem parte da pesquisa em sujeitos da pesquisa.

A compreensão da pesquisa nas ciências antropossociais como um processo de comunicação e de diálogo rompe com a condição de neutralidade dada ao investigador. Essa concepção, como sustenta Rey (2005), obriga e instiga o pesquisador a manter uma relação ativa com as pessoas que fazem parte da pesquisa. Esse momento de interação entre o investigador e as pessoas investigadas passa a ser não apenas um momento de registro ou coleta, mas também um importante momento de produção teórica, explica.