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nos teatros secundários de Lisboa

No documento Um movimento musical FINALt (páginas 103-115)

Uma cáfila de mizaraveis Italianos, talvez acoçados da fome, e da mizeria deixão sua patria, seus parentes: e esquecendo-se de que são homens, com os olhos fitos no interece, vem a nossa casa derrancar os costumes, exercer o triste papel de Comico: [...] sua musica languida, suas danças lascivas acabão de Perverter tudo, dão nova força a suas tenções dannadas. As comicas, estas vis arpias, fazem galla de mostrar ao publico aquilo, que a decencia, que a honra obriga a esconder; […] por isso bom era que o governo posesse no andar da rua esta canalha, e em seu lugar, estabelece-se um theatro, que fosse a escola da moral, e da saã filosophia.

(Martelo político, 23 de Janeiro de 1822) Se são poucas as informações que podemos encontrar hoje em dia sobre a Sociedade Filarmónica, existem ainda menos notícias sobre o funciona- mento dos teatros secundários de Lisboa, os quais albergavam, também eles de maneira esporádica e no âmbito de uma programação dirigida principal- mente para o teatro declamado, algumas exibições concertísticas. Isto apesar de, para a finalidade deste estudo, se poderem assinalar alguns dados que, se bem que parciais, contribuem para nos fornecer um quadro mais completo da actividade musical da capital entre o primeiro e o segundo liberalismo.

Em primeiro lugar está o facto de a música ser, também nestes teatros, um elemento secundário mas indispensável da programação, como demons- tra a presença neles, no período examinado, de orquestras estáveis e a reali- zação de alguns espectáculos em benefício de músicos provavelmente pertencentes ao elenco dos próprios teatros. Além disso, especialmente a partir de 1830, são estes teatros que irão tentar ocupar os espaços deixados livres pela prolongada inactividade do Teatro de S. Carlos, inserindo na sua programação um número cada vez maior de intervenções de música e de dança para as quais recorriam aos próprios profissionais provenientes do teatro italiano que ainda se encontravam em Lisboa.

O Teatro da Rua dos Condes, no segundo lugar nestes anos na hierar- quia dos teatros citadinos e gerido por uma sociedade da qual faziam parte os próprios actores, era também chamado “Theatro nacional” ou “Theatro Portuguez” por se dedicar a um repertório em língua portuguesa centrado geralmente sobre um drama em vários actos e uma farsa, ou de qualquer modo uma peça final mais breve e ligeira.

Fig. 16: Reprodução de um desenho de Manuel de Macedo e Christino do Teatro da Rua dos Condes, vista exterior, sala de espectáculos e corredor

dos camarotes (Museu Nacional de Teatro)

A orquestra, se bem que com uma função limitada como era a de exe- cutar peças instrumentais, geralmente aberturas de ópera, “tanto na abertura da Scena, como nas divisões dos actos”, assim como de intervir na breve “farça ornada de excellentes peças de musica” que concluía normalmente os espectáculos, aparece no entanto como um elemento estável da estrutura deste teatro. De facto, a maioria dos anúncios jornalísticos relativos ao Teatro da Rua dos Condes sublinham a execução de sinfonias dos mais reputados autores, citando-lhes por vezes os nomes, o que demonstra que eram um importante elemento de atracção para o público. É necessário pensar no entanto que a sua orquestra seria de dimensões reduzidas, uma vez que os anúncios tendem a sublinhar muitas vezes que, na particular ocasião

dos eventos publicitados, ela “será [...] consideravelmente augmentada com alguns dos melhores professores desta Capital”.1

A música era também uma atracção indispensável nos espectáculos rea- lizados durante o período da Quaresma, como naquele dado entre 18 e 20 de Março de 1827, em que se representou um drama sacro com “excellentes peças de musica, e uma brilhante vista final da glória”.2 Aqui teve também

lugar o já citado espectáculo “em favor da tropa da segunda linha” do exér- cito organizado pelo barão de Quintela, que contou com a participação gratuita de todos os artistas e mais pessoal do teatro:

Rua dos Condes quinta feira 9 do corrente, em beneficio da 2ª linha des- tacada nesta côrte, haverá o seguinte espectaculo. Depois de uma nova symphonia de Rossini apparecerão as Effigies de S.M. o sr. D. Pedro IV., e de S.A.S. a sr.ª Infanta Regente. Drama = O triunpho constitucional = ou = O Castigo das violencias. = A actriz Loduvina Soares, e o actor João Evangelista da Costa recitarão um dialogo em verso. = Baile Hespanhol.= Farça = A Assembléa malograda. O author do drama, Luiz José Baiardo offereceu gratuitamente a sua peça para esta noute. Os empregados na orchestra, todos os effectivos da casa, e os de fóra servem gratuitamente nesta noute. A sociedade com o fim de mais amplo producto em prol dos milicianos pobres diligenciou dar este espectaculo no Real Theatro de S. Carlos; todavia por um concurso de circumstancias não lhe foi possivel realisallo.3

Ignoramos até que ponto a concepção rígida da prática do benefício que descrevemos em relação ao S. Carlos era também aplicada nos teatros secundários, cuja posição inferior na hierarquia das salas de espectáculo

1 A fórmula, que aparece por exemplo no Diario do Governo de 31 de Maio de 1823, é

comum a muitíssimos anúncios. Para uma visão general dos espectáculos dos teatros secundários remete-se para o Anexo III.

2 Diario do Governo de 17 de Março de 1827. Indicativos de um particular gosto lisboeta

são também os espectáculos realizados por ocasião do aniversário do rei em 1823 e 1825, em que se representaram respectivamente um drama “embelecido com huma banda de Musica Militar” (Diario do Governo de 15 de Maio de 1823) e uma dança que “necesita d’alguns effeitos do Arsenal Real do Exercito, como espingardas, espadas, barretinas” (cf. P-Lan, MR, Intendência Geral de Polícia l. 22, fól. 164v).

3 O portuguez de 8 de Novembro de 1826, enquanto que O pobre generoso de 21 de

Outubro de 1826 nos informa que “O Preclarissimo Barão de Quintella, Portuguez sem mescla, e ornado dos mais puros sentimentos a favor da sua Patria, e da humanidade, por cujo effeito tanto concorreo, para este projecto se realizar, vai ser o depositario geral dos productos, que resultarem daquelle, e mais Espectaculos, que se celebrarem para o dito fim”.

citadinas os tornava provavelmente mais acessíveis. No Teatro da Rua dos Condes registamos de qualquer modo, além dos benefícios a favor dos actores do teatro declamado e do camaroteiro, o do primeiro violino da orquestra José Pinto Palma na noite de 18 de Outubro de 1825, cujo anúncio nos informa da execução de uma “Pessa de Musica, escripta pelo insigne Mestre Luigi Bethoven”.4 Às suas antigas ligações com o Teatro da Rua dos

Condes e à sua posição de prestígio no âmbito dos músicos locais, ou ainda à sua reintegração no elenco daquele mesmo teatro, deve-se talvez o benefício que o mesmo violinista aí realizou mais uma vez em 1832.5 Em 1829 regista-

mos por sua vez um espectáculo em benefício do flautista Manuel Joaquim dos Santos, presente também em diversos outros espectáculos daquele ano juntamente com sua mulher, a cantora italiana Chiara Asti dos Santos.6 O

anúncio relativo ao primeiro destes eventos, se por um lado apresenta o músico genericamente como “professor de flauta nesta corte”, por outro indica-o como o beneficiado daquela noite, o que permite colocar a hipótese de pertencer naquela data ao elenco do teatro.

A partir de Abril de 1830 registamos a presença, além de Carolina Talassi (identificada como actriz e sócia do teatro) e de Josefa Monati (“no caracter de primeira Dama”), também de “Josefa Castelli Turchetti, Baila- rina que foi no Real Theatro de S. Carlos”;7 as primeiras duas, além de

recitarem e cantarem nas habituais farsas, executaram árias de ópera nos

4 Cf. TDM, 772, Teatro da Rua dos Condes, anúncio do benefício de José Pinto Palma a

18 de Outubro de 1825 (ver Fig. 17). Na mesma documentação encontramos o anúncio de outro benefício deste músico a 12 de Setembro de 1826.

5 Cf. Diario do Governo de 28 de Janeiro de 1832.

6 Cf. os anúncios presentes no Diario do Governo de 19 de Setembro e de 17 de

Dezembro de 1829. Sobre Chiara Asti dos Santos, que não parece constar dos elencos das companhias italianas do Teatro de S. Carlos, mencionemos apenas que uma artista do mesmo nome figura entre os cantores referidos nos libretos de ópera representadas no Teatro alla Scala de Milão em 1803 e entre 1812 e 1815, aparecendo neste último ano junto dos nomes de Gaspare Martinelli e Teresa Zappucci, ambos presentes nas companhias italianas de Lisboa dos anos 20 (é o caso por exemplo do libreto de

L’impostore, dramma comico per musica in due atti da rappresentarsi nel Regio Teatro

alla Scala nella primavera dell’anno 1815, Milão, Tipografia Pirola [1815], assim como do de La schiava di due padroni, melodramma giocoso in due atti del cittadino

Luigi Romanelli. Da rappresentarsi nel Teatro alla Scala la quaresima del 1803 anno secondo / musica nuova del maestro Valentino Fioravanti, Milão, Tipografia Pirola, [1803], conservados em I-Mc, libr. L. 20 e libr. U. 9). Em relação ao portuense Manuel Joaquim dos Santos, flautista e depois primeira violeta do S. Carlos, veja-se a breve biografia em VIEIRA, op. cit., vol. II, pp. 281-282.

7V. os anúncios publicados no Diario do Governo de 2, 23 e 28 de Abril, 27 de Agosto,

Fig. 17: Programa do espectáculo do 18 de Outubro de 1825 no Teatro da Rua dos Condes em benefício do violinista José Pinto Palma

intervalos entre as várias partes do programa, enquanto que o italiano Raf- faele Lucci, “professor de cantoria e de forte pianno” (chegado a Lisboa por volta de Agosto de 1831, altura em que anunciava as suas lições de música), se exibiu no teatro a 16 de Outubro daquele ano.8

Também Luís Cossoul aparece como violinista e violoncelista no palco do Teatro da Rua dos Condes nos espectáculos em benefício de um actor e do “primeiro professor de rebeca”, respectivamente em 1827 e 1829, não sendo de excluir nem sequer neste caso que o antigo “malabar” se tivesse tornado nessa altura elemento interno do teatro. A sua admissão na Irman- dade de Santa Cecília a 24 de Outubro de 1826 tinha de facto marcado uma mudança na sua actividade, maioritariamente orientada a partir deste momento para a música, seja como executante seja como professor, de acordo com a obrigação imposta pela confraria de deixar de apresentar “em Praças Publicas ou Theatros os exercicios de Jogos de Mãos nem de Ingolir espadas ou fazer equilibrios, assim como lucrativamente em outro qualquer lugar”.9

Mas, como prova da dificuldade da confraria dos músicos lisboetas exercer eficazmente a própria acção de controle durante o período da dita- dura de D. Miguel, assinalamos o caso singular dos três espectáculos dados por Cossoul no Teatro de S. Carlos a 18, 21, e 25 de Abril de 1830 nos quais o prato forte continuava a ser justamente a execução de exercícios de mala- barismo. O programa dos espectáculos era dividido em duas partes, a primei- ra definida como “academia instrumental” para a exibição em harpa da sua filha Sofia de quatro anos e meio, e a segunda constituída por “Jogos Orien- taes” executados pelo próprio Cossoul e pelos seus “jovens descipulos Julio e Paulo, de idade de onze, e oito annos”.10 Transcrevo aqui a curiosa descri-

ção de algumas habilidades executadas no último espectáculo:

os jogos Orientaes serão nesta ultima noute em grande numero, e dividi- dos em tres partes; os principaes que são inteiramente novos são os seguintes: o ovo sobre huma palha, o equilibrio luminoso subindo huma escada, e tocando ao mesmo tempo violoncello; este muito difficultoso equilibrio será executado por Julio; o dobrado equilibrio da ponta de ferro, o grande equilibrio de força da Escada destruida etc.

8 Diario do Governo de 4 de Agosto e 14 de Outubro de 1831.

9 VIEIRA, op. cit., vol. I, p. 312, onde se afirma: “D’ahi por diante ficou Luiz Cossoul

vivendo esclusivamente da arte musical, tocando nas orchestras e principalmente dando lições”. Em 1827 Cossoul anunciava também num periódico “Variações para rebeca com accompanhamento de pianno compostas por J. L. O. Cossoul professor de rebeca e violoncello”, disponíveis “no armazem de musica da viuva Waltmann e filho, rua direita de S. Paulo nº 18, e nos mais armazens de musica” (O portuguez, 6 de Julho de 1827).

Cossoul, que com sua mulher tinha já pisado o palco do principal tea- tro lisboeta ao participar no benefício do cantor Martinelli em 1824, regres- sava agora como protagonista mas mais uma vez na qualidade de “indio”, mais do que de músico que tinha sido aluno do célebre Kreutzer no Con- servatório de Paris, provando assim o grande sucesso de que este tipo de espectáculo continuava a gozar na capital.11

O Teatro do Bairro Alto, também chamado de S. Roque, que o tinha visto estrear-se com espectáculos de malabarismo entre Novembro de 1823 e Abril de 1824 (juntamente com o sogro Eugenio Robertson, protagonista por sua vez de “experiencias hydraulicas”) é o primeiro onde parece dar-se a passagem de Cossoul e de sua mulher Virginia para a actividade pública de músicos, quando ambos intervêm nos espectáculos de teatro declamado de 1827 com exibições de “rebeca e de harpa”.12 É justamente este teatro,

provavelmente pela sua posição inferior na hierarquia dos teatros citadinos, que parece ser ainda mais acessível que os outros a espectáculos de natureza extremamente heterogénea. Por exemplo em 1826 “Casteli Dorino, dono do celebre cão Mencito” apresentava-o “pela primeira vez ao illustrado pubblico desta capital”, no ano seguinte “mr. Gamet” exibia “o seu theatro pictoresco fazendo ver as melhores, e novas figuras, e grande maquinismo, e o nasci- mento do sol, sua elevação, e carreira”, terminando o espectáculo com “um

11 Um anúncio citado na biografia do músico redigida por Vieira informa-nos que ele

tinha estudado com Kreutzer no conservatório de Paris (VIEIRA, op. cit., vol. I, p. 311); o mesmo autor afirma que “Luiz Cossoul era tido em estimação pelo rei D. Miguel, a quem serviu como official de milicia” (id., vol. II, p. 428): a crença absolutista do artista foi presumivelmente determinante para obter a autorização para se exibir no Teatro de S. Carlos numa altura em que este se encontrava encerrado. O anúncio do benefício do cantor Martinelli a 26 de Fevereiro de 1824, no qual participaram Eugenio Robinson e o casal Cossoul, aparece no Diario do Governo desse mesmo dia.

12Cf. os anúncios no Diario do Governo de 29 de Novembro e de 11 de Dezembro de

1823, que confirmam quanto refere Vieira sobre o facto de que os espectáculos realizados pelo casal Cossoul entre Dezembro de 1823 e Abril de 1824 no Teatro do Bairro Alto, embora previssem execuções de violino e de harpa, eram sobretudo baseados nas assim chamadas exibições “fantasmagoricas” (VIEIRA, op. cit., vol. I,

p. 311). Em relação às exibições de 1827 veja-se O portuguez de 9 de Junho de 1827 assim como BENEVIDES, op. cit., p. 146, que refere o espectáculo de 3 de Abril de

1827 como “beneficio” de Virginia Cossoul, utilizando provavelmente este termo na acepção também comum em Lisboa no momento em que o autor escrevia, ou seja genericamente como sinónimo de concerto; se assim não fosse, deveríamos colocar a hipótese de que em 1827 a harpista fizesse parte do elenco do Teatro do Bairro Alto, o que parece muito pouco provável dado que nessa época não havia mulheres nas orquestras dos teatros.

grandioso concerto de violino”, do mesmo modo que em 1829, após a representação de uma comédia e de uma dança, “Madame Luiza Collote” exibiu juntamente com o marido “differentes sortes de Mecanica”.13 Entre as

exibições concertísticas neste teatro assinalamos ainda as de “Carolina Massei, 1ª dama de musica, que foi do Real theatro de S. Carlos” que cantou árias de ópera nos espectáculos de 1827.14

O teatro albergou também neste período pelo menos duas companhias teatrais estrangeiras, uma espanhola em 1827-28 e uma francesa em 1823. Esta última era formada por alguns dos membros da mesma companhia que tinha realizado uma temporada de teatro francês no Salitre entre Agosto e Dezembro de 1822 sob a direcção de Gaetano Pellizzari e que, uma vez terminado o contrato com aquele teatro, tinham passado a exibir-se no Teatro do Bairro Alto, tendo tido contudo de interromper os seus espectácu- los ao fim de pouco mais de três meses devido aos graves prejuízos econó- micos sofridos.15 Neste caso também, assim como a propósito de Bomtempo,

O oraculo de 1826 atribui à inveja da classe dos artistas e intelectuais locais o falhanço da empresa teatral de Pellizzari:

Diga-o Mr. Belizari [sic], excellente rebequista de Paris, o qual veio em 1823 estabelecer um theâtro em Lisboa, de onde em breve o bannio uma coalisão perseguidora, que assim privou os amantes das lettras, d’um bom theâtro francez.16

13 O portuguez de 29 de Novembro de 1826 e 9 de Maio de 1827, assim como o Diario

do Governo de 7 de Outubro de 1829.

14 O primeiro destes espectáculos foi anunciado como benefício de Massei (O portuguez

de 5 de Fevereiro de 1827), o que, também neste caso, pode fazer pensar que esta pertencesse ao elenco do teatro e portanto na possibilidade representada pelos teatros menores de oferecerem uma saída profissional a alguns artistas saídos do circuito do primeiro teatro lisboeta. Massei tinha estado de facto na companhia do Teatro de S. Carlos entre 1818 e 1821 (cf. MOREAU, O Teatro de S. Carlos... cit., p. 1393).

15 Diario do Governo de 8 de Março de 1823, onde se diz que os actores franceses, após

todas as perdas sofridas, deram as últimas quatro récitas.

16 O oraculo de 14 de Setembro de 1826. O nome de Pellizzari vem referido na imprensa

da época dos modos mais variados, entre os quais o mais frequente é o seu afrancesamento. Às notícias sobre este músico já referidas in ESPOSITO, “Lisbona

1822...” cit., pp. 66-67, acrescente-se a de um concerto de violino dado por aquele que parece ser seu filho em Dezembro de 1826 no Teatro S. Agostino de Génova, em que o anúncio o apresenta como “pensionista das cortes de Espanha e Portugal, aluno de seu pai, do Conservatório de Paris” (“pensionato delle Corti di Spagna e Portogallo, allievo di suo padre, del Conservatorio di Parigi”: cf. Gazzetta di Genova de 23 de Dezembro de 1826).

É justamente no âmbito da temporada de teatro francês no Salitre em 1822, quando entre outras coisas tinha havido em duas ocasiões execuções concertísticas tanto do director como do seu filho, que o teatro – com a cumplicidade da atmosfera iluminista e filo-francesa do liberalismo, o patro- cínio de alguns membros da aristocracia liberal e um repertório constituído pelo que havia de melhor no teatro clássico e contemporâneo francês – parece por um breve momento subir de nível na hierarquia dos teatros da cidade, passando a ser frequentado pela melhor sociedade.17 Posição essa que perderá

rapidamente, a ponto de, após um período de encerramento para restauros, em 1825 o intendente de polícia não hesitar em afirmar que naquele teatro “ordinariamente concorre a mais baixa plebe, e sem instrução alguma”.18

O Salitre, cujo repertório, se se exceptuam os períodos nos quais albergou companhias estrangeiras, parece quase idêntico ao do Condes, possuía uma orquestra estável, também aqui muitas vezes ampliada com músicos exteriores ao teatro, como quando, num “pomposo espectaculo” de 1828, foi “acrescen- tada com professores do Real Theatro de S. Carlos”.19 No Salitre também se

regista a presença de espectáculos de natureza variada, como, em 1828, “os jogos malabares, executados pelo habil joven Portuguez, que praticará a difficil operação de engolir huma espada de 25 pollegadas” (ou seja o mesmo exercício que tinha tornado famoso Luís Cossoul no início da sua actividade lisboeta), assim como as do ginasta Stefani, presente com os seus espectáculos em 1829 não só neste teatro como também no Teatro de S. Carlos.20

Entre as verdadeiras exibições concertísticas assinale-se a estreia de Luís António Miró como pianista, logo após a sua entrada para a Irmandade de Santa Cecília, no espectáculo em benefício de um actor do teatro a 19 de Novembro de 1826, e como compositor no espectáculo de 4 de Fevereiro de 1827, em que “a musica e os coros” da comédia que se representou eram de

No documento Um movimento musical FINALt (páginas 103-115)