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nota-se que a abertura da interacção foi feita pelo professor E através de uma série de

3.3 Movimentos pedagógicos dos actuantes 3.3.1 Professor

E, nota-se que a abertura da interacção foi feita pelo professor E através de uma série de

perguntas. Um aluno responde e o professor E avalia a resposta antes de fechar. Um outro exemplo com o extracto a seguir:

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A6 – Concordo com o título do texto porque [ _ ]

P – Título o texto. Porquê a escravidão é uma praga que persiste? A6 – Porque escravidão é uma forma de servidão com muito [ _ ] P – Escravidão é uma [ _ ]

A6 – uma furma, uma furma de servidão

P – de servidão. Escravidão tem mesmo sentido de servidão /

(Extracto da transcrição da gravação Gr C)

Por outro lado, os enunciados seguintes extraídos da transcrição da gravação Gr A da aula de PLE/2 da turma 3e A descrevem a organização sequencial da interacção verbal em que a professora A coloca uma pergunta ao nomear um aluno A2. Este responde para ouvir depois a avaliação da professora que volta a fazer mais uma solicitação. É, pois um encadeamento em que não houve troca de estatuto. Confirma-se a hierarquia institucional demonstrada pelo respeito dos papéis:

/P – Cissokho! “Deva”

A2 – “Deva” verbo dever no presente do conjuntivo.

P – Sim! “Prediz” Cissokho!

A2 – Verbo predizer no presente do indicativo.

P – Sim! Verbo predizer no presente do indicativo. /

(Extracto da transcrição da gravação Gr A)

No entanto, no decorrer das perguntas do professor realizadas sob a forma interrogativa, abre-se algum espaço para a participação dos sujeitos na interacção em que se destacam algumas situações de troca de papéis na tentativa de representar conhecimentos. São momentos em que os sujeitos não se deram conta de mudança de estatuto. A oferta de espaço que lhes foi concedida constitui um momento de libertação e de afirmação. Parecem sujeitos soltos que tentam exprimir-se sem condicionamento.

As raras situações de troca de papéis identificadas referem-se às actividades de apresentação de trabalho de casa seguida de debate nas turmas de 3e D e TLe B. A estruturação dos discursos revela que o ritual não foi respeitado pelos vários sujeitos. A abertura e o fecho não foram reservados para o professor, pelo contrário os papéis foram distribuídos entre alunos e professor. Além de falarem mais, os alunos efectuaram mais movimentos de abertura e de resposta do que os professores:

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/A5 – O que significa “houvesse”?

A1 – U!

A5 – “houvesse”

P – “houvesse” é o verbo, é o verbo conjugado no imperfeito do conjuntivo. Sim! /

(Extracto da transcrição da gravação Gr D)

O aluno A5 pergunta, o professor D, perante a hesitação do aluno A1 e repetição da solicitação

pelo A5, decide substituir o interlocutor e responder:

/A1 – Cheikhna!

A12 – O que significa “lugar”? “lugar”?

A1 – “lugar”! Une place!

P – “lugar”! Une place, un lieu /

(Extracto da transcrição da gravação Gr D)

O aluno A1 abre ao dar a palavra a A12 que coloca sua pergunta. O A1 responde ao deixar espaço

ao professor para confirmar e fechar:

/A14 – “nosso”

P – “o nosso!” A1 – c’est où?

P – É o adjectivo possessivo, Siaka! /

(Extracto da transcrição da gravação Gr D)

O aluno A14 pergunta, o professor exclama ao repetir a solicitação, outro aluno A1 responde por

uma outra pergunta solicitando a localização do enunciado. Esta acção dá oportunidade ao professor para voltar à carga para responder e fechar. Nesta situação, o professor D desempenha o papel de interlocutor ao responder à solicitação do aluno A14. Estamos num momento de troca de papéis entre os sujeitos.

Esta situação de troca de papéis entre alunos fica mais nítida na transcrição a seguir:

/A2 – O professor de Português na Lisboa, mas eu quero que tua filha sou na minha…

As – Escola!

A2 - na minha escola.

A3 – Ah! És o professor de Marie! A2 – Sim! Sim!

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A3 – Como está? A2 – Está bem!

A3 – Como, como se passa escola de Portugal? /

(Extracto da transcrição da gravação Gr D’)

O aluno A2 abre. Um grupo de alunos (As) ajuda o A2 terminando a frase. A3 responde num tom

exclamo-interrogativo. A2 confirma ao deixar espaço para A3 colocar uma pergunta. A2 responde

e A3 abre de novo. Esta situação de troca de papéis aconteceu porque não se revelou um poder

de conservação da palavra pelo aluno A2 que ao longo da interacção mudou de estatuto. Ele

abriu a sequência e depois ficou a responder. O emissor/locutor torna-se receptor/interlocutor e vice-versa. Temos, então, uma situação em que os papéis não são fixos nem definidos antes. Esta troca de papéis involuntária levantada nesta situação de diálogo entre alunos demonstra que nenhum dos sujeitos ficou agarrado no seu suposto estatuto.

Baseando-nos na delimitação dos “sub-espaços” (Castro, 1987:68) e do tempo para os sujeitos envolvidos no trabalho interactivo, resumem-se os papéis seguintes a saber:

- o professor de Português, Língua Estrangeira/Segunda é transmissor de conhecimentos, modelo de uso da LE e representante das normas a ensinar. Neste sentido, desempenha uma função prioritária de mandar respeitar a norma da língua a ensinar. Produtor de discursos para exposição ou descrição do objecto a ensinar, é também obrigado a mandar produzir discursos. Seu duplo estatuto (detentor de saber e transmissor) justifica então sua omnipresença no espaço aula e sua viva ocupação do tempo de aula marcada pelas solicitações. Nestas, que decorrem em contexto de interacção, revela-se o carácter sistematicamente avaliativo da correcção linguística das frases dos alunos, muitas vezes colocando o conteúdo da comunicação em segundo plano;

- os alunos, na sua maioria, são receptores/interlocutores passivos, aquisidores de conhecimentos, consumidores de normas linguísticas.

Em suma, em contexto exolingue de ensino-aprendizagem do PLE/2, os papéis respectivos dos parceiros do acto educativo parecem estar ligados às concepções da língua a ensinar/aprender e às relações pedagógicas que resultam nele. Assim, os estatutos ou papéis institucionais dos intervenientes ficam definidos sendo o professor que coloca perguntas e o aluno que as deve responder. Cabe ao professor introduzir novos temas de discurso e controlar qualquer iniciativa de introdução de outros objectos feita pelos interlocutores. A abertura de uma aula é reservada ao docente e o fecho da interacção acontece quando ele usa o seu direito de tomar a palavra

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para introduzir formas rituais de fecho das trocas. O funcionamento do questionamento conduz a que a permuta da palavra seja determinada pelo ensinante para que haja uma sincronização interaccional contribuindo para uma “harmonia” conversacional (Kerbat-Orecchioni, 1995 T.1). Esta colaboração entre sujeitos resume-se no “princípio de cooperação” (Grice 1975:45) e na partilha do discurso entre esses para confirmar a complementaridade discursiva (Kerbat- Orecchioni 1995 T.1). Nota-se que os sujeitos com papéis definidos estão envolvidos na produção e recepção de enunciados, respeitando a alternativa dialógica. Neste sentido de trabalho interactivo destaca-se a “competência interactiva” (Mehan 1979) dos alunos e o poder de dominação afirmada e disfarçada do professor.

No entanto, na ocupação e cedência do “espaço sala de aula constroem-se subespaços, definidos pelo controlo que sobre eles podem exercer ou exercem os sujeitos – em termos gerais esse controlo é maior por parte dos transmissores e menor por parte dos aquisidores; a relação entre os subespaços e, em consequência, entre aqueles que os controlam pode aparecer regulada por uma maior ou menor insularidade.” (Castro1987:68). Apesar da redução do espaço e da delimitação do tempo, os alunos tentam representar conhecimentos que são meras repetições das normas a ensinar. Neste sentido pergunta-se se se constrói sentidos em contexto pedagógico na medida em que os alunos, parecendo particularmente atentos à gestão dos constrangimentos discursivo-pragmáticos, persistem em fazer erros de codagem ao nível da frase. Por conseguinte, anota-se que o desenvolvimento das competências de comunicação dos alunos em Português, Língua Estrangeira/Segunda, nomeadamente ao nível da oralidade é afectado pela delimitação do espaço aula e do tempo de fala, por um lado, e, por outro, pela definição e reconhecimento dos papéis dos actuantes.

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Capítulo 4

O multilinguismo na construção do discurso