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Novas orientações para o Ensino Médio: Orientações Educacionais Complementares-PCN+

Capítulo 3 A interdisciplinaridade nos documentos oficiais

3.3 Novas orientações para o Ensino Médio: Orientações Educacionais Complementares-PCN+

O documento PCN+ Ensino Médio: Orientações Educacionais Complementares aos Parâmetros Curriculares Nacionais traz uma ênfase nas áreas do conhecimento, subdividindo-se em: Linguagens Códigos e suas Tecnologias, Ciências da Natureza, Matemática e suas Tecnologias e Ciências Humanas e suas Tecnologias (Brasil, 2002). Esse documento busca contribuir para a implementação das reformas educacionais definidas pela nova LDB 9.394/96, regulamentada pelas Diretrizes do Conselho Nacional de Educação (CNE), que tem como propostas centrais, facilitar a organização do trabalho escolar sugerindo a formação de áreas do conhecimento. Para isso, propõe uma articulação nas e entre as áreas, com o domínio de competências gerais (comunicar e representar, investigar e compreender e contextualizar historicamente) e habilidades específicas, que se deseja promover com os conhecimentos disciplinares. O documento propõe o diálogo entre áreas para a articulação das competências que deseja desenvolver através dos conteúdos, além de apoiar o professor na sua prática e subsidiar sua formação contínua, o que se espera conseguir com a articulação entre as áreas do conhecimento.

Assim, mesmo com a necessidade de transformações de caráter econômico, social ou cultural que levaram à modificação da escola no Brasil e no mundo, não se propõe a extinção das disciplinas, mas sugere-se a organização e a interligação nas três áreas – Ciências da Natureza e Matemática, Ciências Humanas e Linguagens e Códigos – que interligam as disciplinas, mas não as diluem nem as eliminam.

A articulação entre as áreas é uma clara sinalização para o projeto pedagógico da escola, o qual envolve uma sintonia de tratamentos metodológicos e pressupõe a composição do aprendizado de conhecimentos disciplinares com o desenvolvimento de competências gerais. Essa integração de metas formativas necessita para sua realização de projetos interdisciplinares, nos quais diferentes disciplinas tratem ao mesmo tempo de temas afins, sendo indispensável o estabelecimento de metas comuns, envolvendo cada uma das disciplinas de todas as áreas, a serviço do desenvolvimento humano dos alunos e também dos professores (Brasil, 2002).

36 Ao assumir que as disciplinas devem ser mobilizadas com a intenção de produzir um ensino relacionado com o universo vivencial do educando, o documento sugere uma articulação desses saberes através de temas estruturadores, como: Universo, Terra, Vida, Biosfera, Transformações etc., pela facilidade que eles encontram de transitar por múltiplas disciplinas. A respeito de como essa articulação entre as áreas do conhecimento pode ser alcançada, o documento menciona que: “[...] a idéia de que a perspectiva interdisciplinar de conteúdos educacionais apresentados com o contexto no âmbito de uma ou mais áreas, não

precisa necessariamente de uma reunião de disciplinas, pois pode ser realizada por uma

única” (Brasil, 2002, p.17, grifo nosso). Essa intencionalidade pode ser observada, também

no item que trata do propósito de cada disciplina.

O ensino de biologia, por exemplo, faz menção às estratégias de ação, incentivando o desenvolvimento de projetos, os quais mesmo tendo perspectivas amplas de desenvolvimento podem ser abordados a partir dos conhecimentos da disciplina de Biologia: “Tal projeto, com característica inter ou transdisciplinares, pode ser desenvolvido, por exemplo, apenas no âmbito da Biologia” (Brasil, 2002, p. 56, grifo nosso).

O ensino de Física sugere também, uma abordagem por temas, entendendo que eles são mais adequados ao desenvolvimento de competências, ao mesmo tempo em que se busca um ensino de Física voltado ao universo vivencial do educando. Nessa perspectiva os temas geradores podem ser estruturados em: Movimento, variações e conservações; Calor, ambiente e usos de energia; Som, imagem e informação; Equipamentos elétricos e telecomunicações; Matéria e radiação; Universo, Terra e vida, pois permitem uma reorganização dos conteúdos tradicionais, como Mecânica, Termologia, Eletromagnetismo e Física Moderna, possibilitando atribuir-lhes novos sentidos. Esses temas podem ser abordados por inúmeras inter-relações com as demais áreas: “O estudo do som pode ainda permitir uma interface importante com as artes, a música e em particular, ou, ainda o reconhecimento dos vários instrumentos associados a diferentes culturas”, tendo uma abordagem física com transição nas diversas áreas (Brasil, 2002, p. 70). Esse diálogo pode ser estruturado, através de projetos que promovam uma intervenção na realidade, com a presença ativa do educando, com a participação de profissionais, especialistas, cientistas e tecnólogos.

37 O ensino de Química, por sua vez, traz especial atenção para as atividades experimentais, estudos do meio, diversificação de materiais ou recursos didáticos. É interessante verificar que o desenvolvimento de Temas Geradores, ou Projetos contemplam, se não todas, mas várias das estratégias sugeridas, segundo esse documento:

O desenvolvimento de projetos disciplinares, ou interdisciplinares, articulando todas essas formas de ação ou recursos pedagógicos, é extremamente propício para o desenvolvimento das diferentes competências almejadas, particularmente aquelas associadas à contextualização sócio-cultural: selecionar um tema de relevância científica, tecnológica, social ou cultural associado ao conhecimento químico, programar suas diferentes etapas, dividir tarefas e responsabilidades no grupo, buscar e trocar informações prévias, desenvolver as ações previstas, avaliá-las e relatá-las, usando diferentes meios e instrumentos de comunicação, interagir com outras comunidades (Brasil, 2002, p.109).

Dessa forma, o trabalho interdisciplinar sugere necessariamente um enraizamento no contexto, que pode ser explicado pela mobilização das disciplinas.

O estudo da produção industrial de algum material pode se iniciar como um projeto disciplinar e permitir a integração de vários conhecimentos de outras áreas tratados neste tema. A área de Matemática pretende que o educando aprenda de forma contextualizada, integrada e relacionada com outros conhecimentos, buscando desenvolver as competências desejadas a essa modalidade de ensino. Assim, o ensino de matemática intenciona capacitar o educando a compreender e interpretar situações e apropriar-se de linguagens específicas, como argumentar, analisar, avaliar etc. Seu foco de estudo, a exemplo das demais áreas, são os temas estruturadores, privilegiando o tratamento de situações-problemas presentes na realidade do educando. Dessa maneira, o ensino de matemática mesmo tendo as suas especificidades, serve de instrumento para as demais disciplinas (Brasil, 2002).

O documento menciona ainda, a necessidade de autoformação dos professores em sintonia com as exigências profissionais do século XXI, acenando para a formação permanente e em serviço do professor:

Afinal o que se pretende, o que se deseja, afinal, são professores reflexivos e críticos, ou seja, professores com um conhecimento satisfatório das questões relacionadas ao ensino-aprendizagem e em contínuo processo de autoformação, além de autônomos e competentes para desenvolver o trabalho interdisciplinar. Um dos instrumentos úteis a essa reflexão baseia-se em procedimentos de auto- observação e análise, em que se destaca a importância de o professor saber o que faz em sala de aula e de saber por que faz dessa forma e não de outra. Na reflexão sobre a própria prática, acabam emergindo também traços da história de vida dos

38 profissionais, que podem conduzir reflexões sobre as crenças que permeiam seu conceito de ensino e aprendizagem. Pensar e repensar o discurso e a prática, individual ou coletivamente, nos relatos em grupos da biografia profissional de cada professor, num movimento cooperativo, de co-responsabilidade e negociação, poderá levar à convergência para o aperfeiçoamento profissional e, em última análise, para a construção da escola pretendida (Brasil, 2002, p.144).

Esse espaço de formação deve ser planejado e fazer parte do plano político pedagógico da escola, pois é nele que as necessidades reais estão postas, e não nos parece fora de propósito a idéia de um professor/reflexivo e crítico da sua prática. Aquele que, numa discussão, aponta os problemas para coletivamente encontrar soluções e, refletindo sobre o problema, propõe novas estratégias para abordar o conteúdo (Maldaner, 2003; Schön, 2000 e Nóvoa, 1999). Ao fazer menção sobre a necessidade de uma reflexão individual/coletiva, esse documento acena para uma inevitável criação de “espaços” para a sua efetivação.

O PCN+ aponta para a necessidade de articulação entre as áreas, em função do desenvolvimento de competências. Nota-se que o conteúdo, a interdisciplinaridade e a contextualização são mobilizados, com a finalidade de facilitar as interconexões entre as áreas. Outro ponto marcante neste documento é a menção explícita de que a interdisciplinaridade pode ser desenvolvida por um professor de uma única disciplina, ou seja, admite-se a possibilidade de algumas superações epistemológicas, onde o mesmo professor desenvolve conteúdos de outras disciplinas. Essa menção pode ser constatada na seção que trata dos “Conhecimentos, competências, disciplinas e seus temas estruturadores”, sendo observada também nas áreas de Biologia e Química e inferida nas demais.