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Novos media em Angola: percursos e acessos actuais

CONTEXTUALIZANDO JOVENS, ENSINO UNIVERSITÁRIO E MEDIA EM ANGOLA

OS MEDIA EM ANGOLA DAS ORIGENS À ACTUALIDADE

4. Novos media em Angola: percursos e acessos actuais

O computador, a Internet e o telemóvel afiguram-se entre os principais meios tecnológicos do século XXI. A disseminação destas novas tecnologias e do fluxo de informação em Angola tende a alastrar-se por vários pontos do país. Desde os maiores centros urbanos a localidades próximas dos mesmos, foi crescendo a apropriação e usos de meios como a rádio, televisão, computador, telemóveis, Internet e outras tecnologias.

 Tecnologias da comunicação: computador, telemóvel e Internet

A difusão das tecnologias da informação e comunicação em Angola é crescente e tem afectado várias franjas da população e instituições. Tomemos como base 2002/3, ano imediato ao fim do conflito armado no país. Dados da agência americana CIA World Factbook21 referentes a 2011, estimavam que, em 2003, Angola contava com 96.300 linhas telefónicas terrestres/fixas em uso. Neste período, o número de subscritores da rede de telemóvel calculava-se em 130.000.

Estes indicadores cresceram exponencialmente nos anos seguintes, o que melhorou o acesso das populações aos diferentes aparelhos de comunicação. O estudo sobre o Bem-Estar da População, IBEP 2008-2009, realizado pelo Instituto Nacional de Estatística, em relação à posse de equipamentos de informação e comunicação indicou que dos 11.686 agregados familiares (5.800 no meio rural e 5.886 no meio urbano) 47,8% tinha rádio ou rádio cassete; 38,5% tinha televisor; 27,4% leitor de DVD, 9% antena parabólica; 1,5% telefone de rede fixa; 40,4% telefone da rede móvel; 4,1% computador e 0,7% linha de Internet em casa (INE, 2011:311-316).

Calculava-se que, em 2009, havia 303.200 linhas de telefonia fixa no país, enquanto a Internet passou a contar com 20.269 servidores, beneficiando cerca de 700.000 usuários, contra os 17 servidores que possuía até finais de 2003. Dois anos depois, em 2011, a telefonia móvel (celular) tinha atingido a fasquia de 9.491.000 usuários, numa altura em que, segundo a agência CIA Word Factbook, mais de metade da população angolana já possuía telemóvel, cuja taxa de penetração rondava os 71,15% por 100 habitantes. Ainda segundo a mesma agência, o país passou a contar com 20.703 servidores de Internet, em 2012, sendo que, no ano seguinte cerca de um milhão de angolanos tinha acesso à Internet (Sol, 2013).

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A disseminação das TIC pelo país abrangeu outros meios de mediação como a rádio, televisão, cinema, livros, jornais, revistas, boletins, computadores, CD, DVD, jogos electrónicos e outras tecnologias. Este crescimento representou um sinal positivo no âmbito do enriquecimento da paisagem mediática e do incremento do fluxo de informação no país. A disponibilidade e acesso a diferentes tecnologias da comunicação traduziram-se em capacidade de modernização infra-estrutural e instrumental, uma forma de emancipação das condições sociais, técnicas e intelectuais dos cidadãos.

O mercado tecnológico nacional continuou a marcar passos significativos, embora os indicadores estejam ainda abaixo das médias internacionais, como a Comunidade de Desenvolvimento da África Austral (SADC), Comunidade de Países de Língua Portuguesa (CPLP), África e do Mundo. O Censo realizado em 2014, por exemplo, destaca que nessa altura cerca 38% da população possuía telemóvel e 10%, o computador e a Internet, respectivamente.

Outras fontes apontaram para o mesmo ano (2014) uma rede fixa de telefonia com 216.000 assinantes, enquanto a telefonia móvel alcançava os 13.225 milhões de utentes (Rocha da Silva, 2014). Em algumas províncias o sinal de cobertura das telecomunicações alcançou mesmo algumas zonas rurais, o que permitiu que franja crescente da população angolana participasse da «aldeia global» da comunicação proporcionada pelos usos do telemóvel e da Internet.

Comparando com os indicadores internacionais, há ainda um caminho longo a percorrer. Em 2015, por exemplo, os dados da UIT referidos pelo Observatório de Língua Portuguesa, apontavam Portugal como líder na CPLP, com 64,4% de acesso à Internet. O Brasil vinha logo a seguir com 57,6% e, na cauda situava-se Timor Leste, com 1,1% de penetração da rede. Nesta altura, o relatório Estado da Banda Larga, divulgado em Genebra pela agência da ONU, dava conta que, em termos de banda larga móvel, o Brasil liderava com 78,1% de ligações, seguido de Cabo Verde, com 51,3%, e Portugal, com 45,3%. As repúblicas de Angola, São Tomé e Príncipe e Moçambique surgiam com 16,4%, 9,8% e 3%, respectivamente.

A mesma fonte avançava que Cabo Verde era o país africano lusófono com a maior taxa de acesso por ligação de banda móvel e ocupava o 102º lugar do raking mundial. Nesta altura, 40,3% de cabo-verdianos estavam conectados à Internet,

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seguidos pelos santomenses, com 24,4%, angolanos, com 24,3%, moçambicanos, com 5,9% e bissau-guinenses, com 3,3%. Em termos de conectividade domiciliar nos países em desenvolvimento, o referido relatório indicava o Brasil no topo de países lusófonos, com 48%, seguido de Cabo Verde, com 24,8%, Angola, com 8,6%, Moçambique, com 6,2%, e Guiné-Bissau, com 1,9 por cento22.

As debilidades das infra-estruturas básicas (Rocha da Silva, 2014) constituíram ao longo desses anos um factor limitante do desenvolvimento das telecomunicações em Angola. O facto de a Internet chegar ao destinatário final essencialmente por "sistemas operados via satélite e através de operadores telefónicos" (MTTI, 2010:10), tem igualmente condicionado a cobertura e a qualidade do seu sinal. A isto tudo acresce-se a fraca penetração do computador no seio da sociedade angolana, ligada aos «elevados custos do aparelho», que, na óptica das autoridades, tem limitado o acesso à Internet, já que parte da população acede a este serviço por via telefónica, cuja exploração cinge-se a contactos nas redes sociais.

Tudo isto leva-nos a dizer que o crescimento tecnológico atrás descrito não foi e nem é tão linear. Existiram (e existem ainda) profundas desigualdades de acesso a esses meios, não apenas entre o litoral e o interior, ou o urbano e o rural, mas também no interior de cada uma dessas zonas, em muitos casos devido às diferenças socioeconómicas prevalecentes. De um modo geral, verificaram-se avanços no domínio das tecnologias de informação e comunicação que precisam ser incrementados para aproximar o país dos indicadores médios internacionais, particularmente no que diz respeito ao acesso e usos de telefonia fixa e móvel, computador e da Internet.

No quadro da democratização das TIC, têm sido também desencadeadas iniciativas públicas de inclusão digital através da colocação de salas de informática em distintos estabelecimentos de ensino, criação de mediatecas nas capitais provinciais do país, implantação de casas polivalentes para a juventude que incluam ciberespaços, e outras. Houve igualmente iniciativas no sector privado para a modernização dos serviços. Em alguns pontos de zonas urbanas e periurbanas, surgiram ainda cyber-cafés privados que têm permitido o acesso ao computador e à Internet de dezenas de milhares de cidadãos do país, sobretudo os desprovidos desses meios em casa.

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É importante referir que, de um modo geral, o continente africano tem um longo caminho a percorrer em termos de acesso e apropriação das novas tecnologias de informação e comunicação (NTIC). No contexto mundial, a África continuou a ser a menos cotada. Por exemplo, em 2016 a União Internacional das Telecomunicações (ITU) calculava que 75% dos africanos não tinham acesso à Internet23. Uma outra base estatística, a Global Overview, apontou que, até Janeiro de 2017, apenas 10% de usuários da Internet, 6% de usuários activos nas redes sociais e 13% dos subscritores da telefonia móvel. Se nos ativermos ao continente individualmente, nesta mesma altura a taxa de penetração da Internet rondava os 29% (362 milhões de pessoas), enquanto o número de utilizadores de redes sociais activos calculava-se em 14% (170 milhões de pessoas) e de subscritores de telemóveis, em 81% (995 milhões de indivíduos)24.

Apesar destes indicadores, sobretudo da Internet, situarem-se muito abaixo da taxa média de penetração mundial (50%), o continente tem conhecido um crescimento considerável no domínio da difusão e usos das tecnologias de comunicação. Só para ter ideia, do ano 2000 até 2017, o continente cresceu 7,722.1% em relação à penetração da Internet. De acordo com a secção africana da Internet Word Stats, até Março de 2017, o Kenya era o país mais bem posicionado, 81.8% de penetração da Internet e a Eritreia, com 1.3%, o pior colocado.

Tabela 5 – População e usuários da Internet nos PALOP (2017)

PALOP População Internet Facebook Cinco Países (Est. 2017) Usuários

(30-12-2000) (31-03-2017) Usuários Penetração (% pop.) Crescimento (%) (2000-2017) (Jun-2016) Usuários

Angola 26.655.513 30.000 5.951.453 22.3% 19.738.2% 3.500.000

Cabo Verde 533.468 8.000 235.183 44.1% 2.839.8% 210.000

Guiné-Bissau 1.932.871 1.500 84.000 4.3% 5.500.0% 84.000

Moçambique 29.537.917 30.000 1.834.337 6.2% 6.014.5% 1.400.000

São Tomé e Príncipe 198.481 6.500 49.686 25.0% 664.4% 38.000

Total 58.858.250 76.000 8.154.659 13.9% 10,629,8% 5.232.000

Fonte: elaboração própria, com base no Internet World Stats.com (2017)25

Como ilustra a Tabela 5, Angola insere-se neste quadro do alargamento da cobertura tecnológica nos últimos 16 anos. No caso da Internet, por exemplo, é o país que mais cresceu no contexto dos Países Africanos de Língua Portuguesa (PALOP), com um indicador na ordem 19,738.2%. Até Março de 2017, o país já contava com

23 cf..: http://www.itu.int/en/ITU-D/Statistics/Documents/facts/ICTFactsFigures2016.pdf 24 cf..: https://www.slideshare.net/wearesocialsg/digital-in-2017-global-overview

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5,951,453 usuários de Internet, cuja taxa de penetração rondava 22,3% 26 . Comparativamente a Moçambique, igualmente situado na sub-região austral do continente e com maior número de habitantes, a penetração da Internet em Angola situa- se 16 percentuais acima daquele país. Mas, situa-se ainda ligeiramente abaixo de São Tomé e Príncipe, e duas vezes menos de Cabo-Verde, o segundo e primeiro países mais bem colocados ao nível dos PALOP.

À semelhança de outras partes do continente e do mundo, o Facebook é a rede social virtual com mais subscritores no país, tendo rondado aos 3.500.000 de usuários, até Junho de 2016. Em conjunto com os serviços de telefonia fixa e móvel, passou a cobrir significativas áreas dos principais centros urbanos do país.

 Agências de notícias e media online

Desde 1975 até a actualidade, a Agência Angola Press (ANGOP), tem sido a única agência pública de notícias. A sua transformação em órgão de comunicação social do Estado Angolano ocorreu em 1978, por força do "decreto presidencial 11/78, de 2 de Fevereiro", publicado no Diário da República. Segundo o seu historial online, a empresa cresceu e se desenvolveu tendo conhecido, na década de 80 do século XX, uma expansão e expressão nacional e internacional. "Nessa época, a ANGOP já contava com cerca de 300 trabalhadores, a maioria jornalista, com um labor ininterrupto, 24 horas ao dia, em todo o país (18 províncias) e no estrangeiro com cinco delegações (Portugal, Brasil, Reino Unido, Zimbabwe e Congo)" (http://www.angop.ao/). Como empresa dedicada à recolha, tratamento e distribuição de notícias, quer para os órgãos de comunicação angolanos quer estrangeiros, a ANGOP integrou também o grupo de mais de uma centena de agências dos chamados países não alinhados, tendo assumido a presidência da organização de 1989 a 1992.

Até 1991 a ANGOP manteve-se como única agência de notícias do país. Ao abrigo da nova Lei de Imprensa (Lei n.º 22/91 de 15 de Junho), reconfigurou a sua autonomia e independência editorial com vista a fazer face aos desafios concorrenciais do período democrático que vislumbrava no país. No ano 2000 começou a distribuir os seus produtos via Internet e, em 2008, criou um portal de notícias. Porém, não houve registo de surgimento de agências privadas de notícias no país, apesar da liberalização

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económica. A situação prevalece até a actualidade. Nesse domínio, a ANGOP conta com a concorrência de algumas agências internacionais de notícias presentes no país, tais como a Lusa, AFP e Reuters.

Além das agências de notícias, importa fazer referência a outros media online no país ou sobre o país. Desde a implantação da democracia e da livre iniciativa comercial no país, há 26 anos, têm surgido dezenas de meios de comunicação sociais angolanos (ou que tratam matérias sobre Angola) na Internet. O ano de 2000 pode ser tomado como referencial a partir do qual passou a surgir com alguma intensidade um conjunto de jornais, portais e blogues digitais que difundem (ou reproduzem), via Internet, os mais diversificados conteúdos noticiosos, publicitários, entretenimento, informações úteis e outros assuntos. Entre vários media online, destacam-se os portais Angonotícias, Angola24Horas, Club K, Digital News, Folha de Angola, Zwela Angola, Sapo Angola Online, Rede Angola Online, Luanda Digital, Portal de Angola, Portal do Governo da República de Angola, Portal do Cidadão, Platina Line, Portal do Emprego de Angola, Angola Global, entre outros sites institucionais públicos e privados ou de pessoas singulares.

Ainda no capítulo dos media online, há a destacar o surgimento recente de dois importantes veículos de comunicação que, nos últimos meses, têm capitalizado a atenção de internautas sedentos de informações actualizadas e diversificadas sobre o país e o mundo. Trata-se do portal de notícias Pérola das Acácias, criado em 2016, e do Correio Angolense, inaugurado no dia 4 de Abril de 2017. Este último assume-se como “um jornal diário online, um veículo de conteúdos on-line, independente, livre e em sintonia com os processos de mudanças tecnológicas no mundo global”. Nos seus pressupostos editoriais refere que “coloca a liberdade no centro das suas preocupações e defende uma sociedade aberta, com instituições respeitadoras da lei e dos direitos individuais”27.

Uma parte considerável dos jornais e portais é editada na diáspora, mesmo que difundam informações sobre Angola. De modo geral, tanto estes como muitos que são editados a partir do interior do país funcionam de forma autónoma, sem o registo ou controlo do órgão que superintende a política da informação no país, o Ministério da Comunicação Social. De acordo com a nota já citada deste órgão, tal autonomia

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justificava-se, até então, pela inexistência de legislação específica sobre a actividade de comunicação social online.

O desenvolvimento das novas tecnologias tem permitido também que os media tradicionais expandam e distribuam os seus serviços online. É o que acontece com parte considerável de jornais e revistas, rádios e televisões, já mencionadas atrás, ao disporem actualmente de sítios na Internet onde difundem os seus produtos. De facto, a «comunicação em rede» proporcionada pelas novas tecnologias da comunicação está a mudar os paradigmas de serviços da comunicação em Angola. Assiste-se a uma reconfiguração dos meios e a introdução de inovações ajustadas aos novos tempos. À luz do que disse Cardoso (2009), na prática a rádio está ter uma nova vida, a televisão a deixar de ser uma tecnologia e passar a ser identificável pelo tipo diferenciado de conteúdos e os jornais a converterem-se cada vez mais em agências noticiosas. Por exemplo, já é possível ouvirmos e vermos na Internet os programas radiofónicos e televisivos de muitas estações de rádio e de TV no país que, nas suas páginas online, têm igualmente espaços de abordagem escrita (em forma de jornais electrónicos) dos principais assuntos noticiados ou informados. O mesmo acontece com os jornais e agências de notícias que, além de se apresentarem em formatos electrónicos, tendem igualmente a criar espaços online de noticiabilidade em formatos audiovisuais.

A seguir, passemos um breve olhar sobre alguns estudos sobre os meios de comunicação em Angola.