• Nenhum resultado encontrado

Parte I – Enquadramento teórico

Capítulo 3 Atraso de desenvolvimento global psicomotor (ADPM)

3.1. O atraso de desenvolvimento global psicomotor

O termo desenvolvimento é utilizado para referenciar o processo evolutivo biológico, psicológico e social, que decorre entre o nascimento e a idade adulta. Para Castelo & Fernandes (2009 apud Oliveira, 2012, p. 8) “o desenvolvimento adequado pressupõe a interação entre fatores genéticos e ambientais. É, por isso, um processo complexo dinâmico, assente na maturação neurobiológica e em correlação continua com aspetos psicológicos e sociais”. Segundo Oliveira et al (2012) as alterações de desenvolvimento podem ser agrupadas em três tipos, designadamente:

 Atraso de desenvolvimento – diferença entre a idade cronológica da criança e a idade associada às aquisições evidenciadas;

 Dissociação – desfasamento significativo entre as diferentes áreas de desenvolvimento (e.g. criança com paralisia cerebral);

 Desvio – aquisição não sequencial de competências (e.g. criança com linguagem expressiva superior à compreensão), as vezes motivada por alterações neurológicas.

Oliveira e colegas (Oliveira, Roddrigues, Venâncio, Saraiva, & Fernandes, 2012) sublinham também os fatores biológicos e ambientais que podem culminar em alterações de desenvolvimento (ver tabela 2).

Tabela 2 - Fatores de risco de alterações do desenvolvimento

Fatores biológicos

 Peso ao nascimento inferior a 1,5Kg e gestação inferior a 34 semanas;  Asfixia perinatal;

 Peso inferior a idade gestacional;

 Índice de Apgar inferior a 3 aos 5 minutos e evidência de disfunção neurológica;

 Evidência clínica de anomalias do SNC;  Necessidade de ventilação mecânica;

 Hiperbilirrubinémia inferior a 20 mg em recém-nascidos com termo completo;

 Doença genética, metabólica ou dismorfismos, pessoais ou com antecedentes familiares;

 Infeções congénitas;  Meningite / sépsis;  TCE grave.

42

Fatores ambientais

 Situação de pobreza familiar;

 Pais com patologia psiquiátrica (esquizofrenia, depressão grave);  Pais alcoólicos ou toxicodependentes;

 Pais com défice sensorial significativo;  Pais com défice cognitivo;

 Pais com perturbações antissociais;

 Falta de estruturas de apoio social e familiar;

 Sinais de negligência e maus-tratos à criança/irmãos;  Famílias com outras crianças institucionalizadas;

 Crianças institucionalizadas, separação prolongada da criança. Fonte: Adaptado de Oliveira et al (2012, p. 9).

Para Silva e Albuquerque (2011) o significado do termo atraso de desenvolvimento, a sua operacionalização e o conhecimento dos domínios que leva ao diagnóstico de atraso de desenvolvimento da criança são aspetos importantes. O reconhecimento da condição de atraso de desenvolvimento constitui um critério de elegibilidade da criança na área de intervenção precoce em vários países, inclusive em Portugal (Despacho conjunto n.º891/99 de 19 de Outubro), (Silva & Albuquerque, 2011). De acordo com a legislação, a seleção dos casos para a intervenção precoce é realizada pela equipa de intervenção direta (médicos, educadores, psicológicos, assistentes sociais, enfermeiros, etc.) (Silva & Albuquerque, 2011, p. 58). Tal como sublinha McConnell (1998 apud Silva & Albuquerque, 2011) nos casos em que a criança não adquire as competências desenvolvimentais associadas à sua faixa etária, não sendo resultado de um diagnóstico específico (ou qualquer outra condição), habitualmente descreve-se a criança como tendo um atraso de desenvolvimento. Todavia, esta pode não apresentar efetivamente uma perturbação do desenvolvimento, já que se inclui no grupo de crianças com atraso de desenvolvimento, todas aquelas que não têm diagnóstico, independentemente do grau ou do tipo de dificuldades que apresentem (Silva & Albuquerque, 2011).

Em particular, o ADPM resulta de um funcionamento cognitivo subnormal (Oliveira

et al, 2012). Evidencia-se por um atraso significativo em vários domínios do

desenvolvimento, designadamente ao nível da linguagem, cognição, atividades de vida diária, motricidade, competências sociais, etc. (Semedo, 2012). Holtzapfel (2006) explica que existem dois significativos fatores que estão correlacionados com os distúrbios de leitura e escrita, ou seja, um atraso na metamorfose das forças do crescimento, que seriam as forças formativas, e um atraso na intervenção do Eu, ambos ocorrendo durante o

43

desenvolvimento infantil. O que o autor quer explicar, é que não se trata de um distúrbio isolado da faculdade de ler e escrever, mas sim de um problema do desenvolvimento que atinge a criança na sua totalidade.

Para Molofsky e Gold (1988 apud Silva & Albuquerque, 2011) o atraso global de desenvolvimento consiste num atraso, deficiência ou regressão na aquisição de aprendizagens adequadas a uma faixa etária. Já Shevell et al. (2003 apud Silva & Albuquerque, 2011) definem o ADPM como um atraso significativo em duas ou mais áreas do desenvolvimento, sendo que é um termo restrito aos sujeitos com idade inferior aos 5 anos.

Em termos clínicos, ADPM caracteriza-se por um atraso significativo em dois ou mais domínios do desenvolvimento infantil (Oliveira et al., 2012).

O Manual do Ministério da Educação – “A Criança Diferente” – (Ministério da Educação, 1987, p. 57) refere que estas “características vão refletir-se na comunicação, na socialização, na autonomia, na consciência de si própria, na compreensão e resolução de problemas”.

As crianças com ADPM geralmente enfrentam dificuldades em situações que exigem uma compreensão mais complexa (e.g. várias informações em simultâneo) e/ou pensamento abstrato. O seu pensamento é menos flexível, sendo que tendem a utilizar menos palavras e conceitos para memorizar, pensar e comunicar as suas experiências. Estes défices potenciam problemas de adaptação ao longo da vida e refletem-se em comportamentos inadequados à sua idade cronológica. O atraso no desenvolvimento intelectual diverge, sendo que a criança pode apresentar capacidades mentais ligeiramente diminuídas e outras gravemente diminuídas.

Em pediatria, o ADPM é a

“ segunda causa mais comum de perturbação neurológica, logo a seguir à epilepsia. O termo ADPM é comummente reservado à criança com idade inferior ou igual a cinco anos. A criança com ADPM é aquela que apresenta atraso em alcançar os marcos do desenvolvimento, face ao esperado para a idade cronológica, em duas ou mais áreas do desenvolvimento” (Oliveira, Roddrigues, Venâncio, Saraiva, & Fernandes, 2012, p. 5).

O ADPM é estabelecido através de incapacidades, de início, precoces, e resulta de um funcionamento intelectual subnormal, com origem durante o período de

44

desenvolvimento como consequência de múltiplas causas, nomeadamente a agressão perinatal ou erros genéticos. Este distúrbio do neuro desenvolvimento apresenta

“uma prevalência de aproximadamente 3% no mundo ocidental, variando consoante a gravidade (avaliado em termos de quociente de inteligência (QI), 2,5% para um QI <70 e 0,5% para um QI <50). Esta patologia constitui um problema de saúde não resolvido com um grande impacto socioeconómico, bem como na vida da pessoa afetada e respetiva família” (Oliveira et al., 2012, p. 5).

No entanto, Oliveira e colegas salientam ainda, que além do custo financeiro inerente à problemática, existe também o impacto emocional e social na vida familiar (pais e irmãos sujeitos a um stress crónico) quer devido à estigmatização social, quer à dependência constante a longo prazo e necessidade de adaptação a uma realidade diferente da imaginada (Oliveira et al., 2012, p. 5).