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O casamento com a princesa Jezabel, a fenícia (v.31)

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Capítulo 2 A Ascensão da Dinastia Omrida: Estudo Exegético de 1Rs

2. Crítica Textual

7.3. O Reinado de Acab, Filho de Omri (16.29-33)

7.3.3. O casamento com a princesa Jezabel, a fenícia (v.31)

O editor deuteronomista já disse desde o início da avaliação, que este foi o pior de todos os reinados, e que Acab fez pior do que todos os que foram antes

dele (v.30), e isto também foi dito sobre Omri, seu pai (v.25). Agora a avaliação negativa se intensifica, já que o editor começa a apresentar alguns fatos que, para ele, pareciam suficientes para justificar sua negativa e repulsa.

Surge na história de Israel a princesa fenícia chamada Jezabel

lb,z<yai

(na LXX,

Iezabel

). A figura de Jezabel vai se perpetuar como sinônimo de maldade e ambição, que vai alcançar até a época cristã e seus escritos. Além da Jezabel, teremos a divindade chamada Baal, que será um dos pilares para a condenação de Acab pela ideologia deuteronomista.

Neste tópico, composto pelo v.31, o texto pode ser subdividido em quatro frases, “e aconteceu que, acaso era insignificante seu andar nos erros de Jeroboão, filho de Nebate”, “e tomou [por] mulher a Jezabel, filha de Etbaal, rei dos sidônios”, “e andou e serviu a Baal”, e “e se prostrou para ele”. Vejamos o texto:

twaJoßx;B. ATêk.l, lqEån"h] ‘yhiy>w:

31

jb'_n>-!B, ~['äb.r"y"

~ynIëdoyci %l,m,ä ‘l[;B;’t.a,-tB; lb,z<©yai-ta,

l[;B;êh;-ta, dboå[]Y:w:) ‘%l,YE’w hV'øai xQ;’YIw::

`Al* WxT;Þv.YIw:

31 E aconteceu que, acaso era insignificante seu andar nos erros de Jeroboão, filho de Nebate;

e tomou [por] mulher a Jezabel, filha de Etbaal, rei dos sidônios,

e andou e serviu a Baal, e se prostrou para ele.

A frase começa com o verbo

yhiy>w:

“e aconteceu”, que indica uma frase narrativa. A maioria das traduções da Bíblia para o português, traduz esse verbo como “ser”, neste caso “e houve”, “e sucedeu” ou “e como se fora”. Mas no hebraico bíblico, assim como em todas as línguas semíticas, não tem verbo ser. Por isso, a melhor tradução para este verbo é “e aconteceu” (ver no ATI, FRANCISCO, 2014, p. 480).

Logo na sequência de

yhiy>w:

“e aconteceu”, temos o verbo

lqEn"h]

(da raiz

llq

) na conjugação hifil, “ser insignificante” ou “tratar algo frivolamente ou com desprezo”. A ideia é “e como se não fosse suficiente...”, ou seja, poderíamos traduzir o texto da seguinte forma:

jb'_n>-!B, ~['äb.r"y" twaJoßx;B. ATêk.l, lqEån"h] ‘yhiy>w:

“e aconteceu que, como se não fosse suficiente ele andar nos erros de Jeroboão, filho de Nebate”. O editor coloca um tom de desprezo na atitude de Acab, rei de

Israel, com relação aos “erros” praticados por ele, pois como se não bastasse ele ter andado nos erros de Jeroboão, ele fez ainda coisas piores. Como a que é narrada na próxima frase.

A segunda frase do v.31, narra o que para o editor deuteronomista, era pior do que andar nos erros de Jeroboão, o fato de ter se casado com uma estrangeira adoradora de Baal. O texto bíblico diz que Acab “tomou por mulher Jezabel, filha de Etbaal, rei dos sidônios”. É uma frase iniciada por um verbo

wayyiqtol, a ênfase está na ação do sujeito, na ação de tomar, pegar, agarrar.

Tal verbo, neste caso, junto com a palavra hebraica

hV'ai

, forma uma expressão que dá a ideia de casamento (

hV'ai xQ;YIw:

“e tomou por mulher”).

Jezabel, segundo o texto bíblico, foi atuante em algumas situações complicadas, as quais o editor aproveitou para enfatizá-las e mostrar como ela era “má”. Jezabel reagiu com extrema fúria quando soube que Elias tinha matados seus profetas de Baal, e decidiu matá-lo (1Rs 19.1-18). Por conta disso Elias fugiu para o sul. Ela também tramou a morte de Nabote, porque este não quis vender sua propriedade para o rei Acab. Então Nabote foi condenado à morte por apedrejamento, e Acab se apoderou de sua vinha (1Rs 21.1-16).

A ação de se casar não era um problema para o editor deuteronomista, o problema para ele, era o se casar com uma estrangeira. Acab tomou por esposa

a

lb,z<yai

Jezabel, uma princesa estrangeira. O texto não informa com precisão

quando Acab teria se casado com Jezabel, mas possivelmente, seu pai, Omri, deve ter arranjado esse casamento, com a finalidade de fechar um forte acordo comercial e político com a Fenícia, cuja tecnologia naval era bem avançada, e estes dominavam o comércio marítimo do mediterrâneo. Esta era uma grande oportunidade para quem agora estava dominando a costa litorânea de Israel Norte, e dominando a cidade portuária de Dor.

Jezabel era filha de

l[;B;t.a,

Etbaal, o rei dos sidônios. Era o reino que ficava na fronteira no extremo noroeste de Israel. O reino de Sidon ocupava a parte final do Vale de Jezreel quando este chega ao mar, e todo o monte Carmelo. Megiddo poderia ter sido uma fortaleza militar para proteger o vale de Jezreel, e ficava perto da fronteira com a Fenícia. O nome

l[;B;t.a,

Etbaal (na LXX,

Ieqebaal

), ocorre somente uma única vez tanto na Bíblia Hebraica quanto

na LXX. Uma anotação massorética marginal da Bíblia Hebraica (massora parva), indica que

l[;B;t.a,

Etbaal é uma hapax legomenon (

ׄ ל

).

A terceira frase do v.31, é a segunda de uma sequência de três ações “negativas” de Acab, segundo a avaliação deuteronomista. A frase “e andou e serviu a Baal” leva o personagem da narrativa na direção dos mais “horríveis pecados” que um rei poderia cometer, o servir a Baal. Segundo Finkelstein (2003, p. 238), “diz-se que Jezabel apoiava o clero pagão em Samaria, abrigando “quatrocentos e cinquenta profetas de Baal e quatrocentos profetas de postes sagrados” em seu espaçoso palácio real”.

Baal era uma divindade canaanita, era o deus da tempestade e da fertilidade. Aparece em textos extra bíblicos como os de Ugarit. Em Ugarit, Ras Shamra, Baal é visto de várias formas, uma das que mais aparecem é a de “cavaleiro das nuvens” e como aquele que construiu seu palácio acima das nuvens, na montanha sagrada de Sapanu (OLMO LETE, 1981, p. 98-153). Baal também aparece como divindade da Fenícia com vários epítetos, como, Baal- Shamem (KAI 4.3), Baal do Líbano (KAI 31.1, 2) e Baal de Sidon (KAI 14.18). Também aparece como Baal-Mot, o Baal da vida e da morte, da ressurreição (DAY, 1992, p. 850-853).

A última frase do v.31 aponta para mais uma ação “negativa” de Acab, rei de Israel:

Al WxT;v.YIw:

“e se prostrou para ele” ou “e se prostrou diante dele”. O verbo

WxT;v.YIw:

que ocorre nesta pequena frase vem da raiz

hwx

, este é um verbo que tem atraído a atenção dos lexicógrafos40, o verbo ocorre aqui como um histafel, Holladay indica pelo menos duas opções de tradução, “prostrou-se” e

“fez reverência”. Em grande parte dos casos, ocorre no âmbito do culto (HOLLADAY, 2010, p. 138). Acab, então, além de ter andado e servido a Baal, teria também se prostrado diante dele, numa ação causativa do verbo. O temor

40 Sobre o verbo

WxT;v.YIw:

: “O verbo

hw"x]T;v.hi

(curvar-se, adorar) tem recebido atenção considerável dos lexicógrafos. Tem sido tradicionalmente considerado formação hitpolel de

hx'v'

, na qual a sibilante (

v

) e o

T

passam por metátase (esse verbo ocorre uma vez no qal e outra no

hif‘il). Alguns gramáticos sugerem que a forma é um hištafel de

hwx

, com

Tv.hi

como o prefixo desse tema raro. O tema šafel no semítico oriental corresponde ao hif‘il (causativo) do semítico

do noroeste, de modo que essa pode ser uma forma reflexiva (

t.hi

) do tema causativo com

v

” (ROSS, 2005, p. 304-305).

do sujeito faz com que ele se curve diante da divindade. Isto mostra um certo grau de devoção por parte de Acab, rei de Israel Norte, para com o deus Baal.

Estas três últimas ações “negativas” de Acab no v.31, seria decorrente da ação de ter tomado Jezabel por esposa. A princesa Jezabel, ao se casar com Acab, teria vindo para Samaria e trazido consigo uma comitiva, com presentes, servos e servas, oficiais, divindades sacerdotes e sacerdotisa. O deuteronomista reprovou todas essas ações.

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