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CAPÍTULO II A Escola Básica do 1 º Ciclo 42 

1.  O conceito de Ensino Básico 42 

De acordo com Formosinho (s/d, p.11), entende-se por “Ensino Básico (…) o conjunto de níveis de ensino que a sociedade no seu todo considera que contêm as aprendizagens fundamentais para a vida social”.

Ultrapassa uma mera articulação de estruturas concretas do sistema de ensino, operacionalizando-se, sobretudo, numa perspectiva de “perfil de literacias” comuns a todos os cidadãos – um perfil de “competências” cuja aquisição é entendida como necessária ao garante da qualidade da vida pessoal e social de todos.

Pelos fundamentos que lhe assistem, o conceito de Ensino Básico funde-se com o conceito de escolaridade obrigatória, constituindo esta expressão - Compulsory schooling - a designação adoptada em diversos países europeus para designar o princípio de escolaridade básica, não se verificando, assim, a imposição da estrutura “ensino básico” no sistema educativo enquanto entidade concreta assente num modelo organizacional específico, tal como sucede em Portugal. Em alguns países, como é o caso de Espanha, encontra-se ainda igual e fortemente articulado ao de Primary Education, atendendo às relações de sinonímia entre os conceitos de “basilar”, “primário”e inclusive “elementar”, como constatamos através da especificação da sua finalidade:

La finalidad de la Educación Primaria es proporcionar a todos los niños y niñas una educación común, dándoles la oportunidad de adquirir los elementos culturales básicos, los aprendizajes relativos a la expresión oral, a la lectura, a la escritura y al cálculo aritmético, así como de alcanzar una progresiva autonomía de acción en su médio […] establece también como finalidades (…) facilitar la adquisición de hábitos de convivencia, estudio y trabajo com el fin de preparar a los alumnos para cursar con aprovechamiento la Educación Secundaria (Eurydice, 2003, p.17).

1.1 O Ensino Básico em Portugal

Em Portugal, o Ensino Básico é instituído com a publicação da Lei de Bases do Sistema Educativo, a 14 de Outubro de 1986, assumindo como objectivo essencial assegurar uma formação geral e universal sendo destinada a todos os portugueses sem qualquer excepção, conforme o estipulado no artigo 7.º:

Assegurar uma formação geral comum a todos os portugueses que lhes garanta a descoberta e o desenvolvimento dos seus interesses e aptidões, capacidade de raciocínio, memória e espírito crítico, criatividade, sentido moral e sensibilidade estética, promovendo a realização individual em harmonia com os valores de solidariedade social.

Apresenta-se de carácter obrigatório e gratuito e destinado a todas as crianças que completem seis anos de idade até 15 de Setembro ou, porventura, até 31 de Dezembro caso seja requerido pelos respectivos encarregados de educação. Pela Lei n.º 49/2005, de 30 de Agosto, a obrigatoriedade de frequência do ensino básico termina aos 15 anos de idade.

Desenvolve-se ao longo de nove anos e é organizado em três ciclos sequenciais (apresentando respectivamente uma duração de quatro, dois e três anos), sem designações nominais próprias, sendo apenas numerados enquanto 1.º, 2.º e 3.º ciclo, correspondendo respectivamente aos anteriores ensino primário, ensino preparatório e ensino secundário unificado. Como salienta Pires (1999, p.32), a diluição “da identidade distinta de cada um dos anteriores ciclos com designações nominais específicas e características próprias numa entidade mais ampla e unitária: o ensino básico” realça a preocupação pelo princípio de “unidade global”.

A designação ordinal dos ciclos enfatiza uma organização do sistema educativo assente sob o princípio de sequencialidade de aprendizagem, desenvolvido em relação ao ciclo inicial, constituindo os seguintes ciclos períodos de aprofundamento e expansão das competências adquiridas, e de articulação entre ciclos – sugerida quer pelas organizações curriculares, quer pela lógica de agrupamento de escolas.

A actividade educativa no ensino básico encontra-se orientada pelos planos curriculares do ensino básico, “estabelecidos à escala nacional, sem prejuízo da existência de conteúdos flexíveis integrando componentes regionais” (Lei n.º 46/86, art. 47.º). A leccionação é desenvolvida de acordo com as orientações provenientes das competências essenciais e específicas aí definidas, pela Administração Central do Ministério da Educação, para cada ciclo e área disciplinar, as quais consequentemente se subordinam ao perfil geral de competências estabelecido para a educação básica.

A Lei de Bases do Sistema Educativo aponta ainda a “unidade do modelo de administração dos respectivos estabelecimentos” (idem, art.46.º), nomeadamente ao nível da cadeia hierárquica instituída ao nível da Administração Central, assente sobretudo pela subordinação de todos os ciclos às mesmas instâncias periféricas do Ministério da Educação.

O aproveitamento escolar no decorrer do Ensino Básico é certificado pela atribuição de diploma.

1.2 O conceito de 1. º Ciclo do Ensino Básico

Tal como foi previamente referido, é em 1986, com a homologação da Lei de Bases do Sistema Educativo, que se redefine a nomenclatura do então Ensino Primário, passando este a responder sob a designação de 1.º Ciclo do Ensino Básico.

Relativamente à transfiguração substantiva ocorrida e à proposição de perda de características próprias perante a unidade mais ampla do Ensino Básico, salientamos a opinião discordante de João Formosinho, com a qual nos inclinamos a concordar.

De acordo com Formosinho (s/d, p.11) “a realidade Ensino Primário é uma realidade pedagógica, curricular e organizacional específica em todo o mundo e que, portanto, tem [características e] problemas também eles específicos”.

O abandono em Portugal do uso legal do termo “Ensino Primário” não reflecte alterações ocorridas no panorama internacional ao nível da organização dos sistemas educativos. Pelo contrário. Constata-se que o “Ensino Primário ou Ensino Elementar é uma designação da Educação Comparada que define um nível de ensino destinado a uma faixa etária dos 5, 6 aos 10,12 anos, de iniciação às aprendizagens académicas, geralmente leccionado em regime de monodocência, ou monodocência apoiada, com uma perspectiva globalizadora do currículo” (ibidem). Até ao presente, verifica-se, assim, que a aplicação terminológica do conceito de “1.º Ciclo” do Ensino Básico é exclusiva da realidade nacional.

Em Portugal, de acordo com a Lei n.º 46/86, de 14 de Outubro, o 1.º Ciclo corresponde a um “ensino globalizante, da responsabilidade de um professor único, que pode ser coadjuvado em áreas especializadas”.

Apresenta a duração de quatro anos, destinando-se a crianças com seis anos de idade. Caracteriza-se pelo “desenvolvimento da linguagem oral e a iniciação e progressivo domínio da leitura e escrita, das noções essenciais da aritmética e do cálculo, do meio físico e social, das expressões plástica, dramática, musical e motora” (idem, art. 8.º).

Constitui uma organização pedagógica específica assente na gestão integradora do espaço e do tempo escolar, embora progressivamente se configure uma compartimentação do tempo lectivo em unidades horárias da qual é exemplo o Despacho n.º 19 575/2006, de 25 de Setembro, o qual estabelece a distribuição semanal dos tempos lectivos por áreas curriculares.

Como refere Formosinho (idem, p. 14), a prática pedagógica, considerando a faixa etária dos alunos, encontra-se “muito mais dependente da relação pessoal”, prevalecendo “uma maior proximidade afectiva entre o professor e os alunos”. “A monodocência conduz a uma responsabilização integral do professor por todos os processos educativos dos alunos, sejam eles de carácter curricular, pedagógico, social, moral” (idem, p.13). Pela conjugação de ambas condições, torna-se o nível de ensino propício à participação activa dos encarregados de educação.

O professor do 1.º Ciclo é, necessariamente, portador de qualificação profissional de nível superior, adquirida em escolas superiores de educação ou universidades que disponham de unidades de formação próprias para o efeito. O âmbito da respectiva docência abrange todo o currículo do 1.º Ciclo do ensino básico, sendo que se mantêm responsáveis por um grupo constante de alunos ao longo dos quatro anos de escolaridade.

No seguimento desta sucinta abordagem ao conceito de 1.º Ciclo proceder-se-á ao estudo da sedimentação histórica da organização escolar que o formaliza – a Escola Básica do 1.º Ciclo.