• Nenhum resultado encontrado

O conceito e objeto da identificação arquivística

No campo da Identificação Bellotto (2008, p.30) afirma que, “Aliás, a análise tipológica pode tornar eficiente o fazer arquivístico em múltiplos aspectos, como a avaliação, classificação e descrição”.

Deste modo, identificar as atribuições do órgão e os documentos por ele produzidos é essencial para elaboração de instrumentos adequados, a saber, o plano de classificação e tabela de temporalidade de documentos arquivísticos. Para tanto, ambos os instrumentos contemplam a estrutura do órgão, abrangendo a competência, as funções e atividades desempenhadas para o cumprimento da finalidade do órgão.

Nesse sentido, Mendo Carmona (2004, p.43) faz as seguintes definições:

A competência é o conjunto de questões ou assuntos que incumbem a um órgão administrativo; quer dizer a função atribuída a um órgão, autoridade ou funcionário para conhecer em determinadas questões ou assuntos; se delimita de forma hierárquica, territorial ou material. (...). A função é a capacidade de atuação dos organismos e se concreta em cada uma das atividades e tarefas materiais, técnicas ou de prestação de serviços que preparam o exercício das potencias.

Observando as definições formuladas por diversos teóricos, pode-se dizer que a identificação objetiva a demarcação da competência, das funções e atividades da instituição, nisto consiste processo de identificação. É importante destacar a opinião de Janice Gonçalves (1998, p. 20-21), segundo a qual, a identificação deve ser realizada a partir dos instrumentos administrativos e ou legais do órgão, nomeados como “fontes de informação privilegiadas para a realização do estudo”.

A partir dessa afirmação, entende-se que as atribuições do órgão, são habitualmente registradas nesses instrumentos. Embora em alguns casos deve-se contar apenas com o conhecimento não registrado, a experiência de funcionários do órgão que conheçam bem o

funcionamento e os fluxos administrativos da organização, para identificar suas respectivas funções, atividades e os documentos decorrentes do desempenho destas, o que requer a adoção de uma série de procedimentos e investigação junto aos produtores diretos dos documentos por meio de entrevistas acerca da instituição.

Ao mencionar as fontes de informações específicas Carmona Mendo (2004, p.42

tradução nossa), considera como fonte, os próprios documentos produzidos pelo órgão e a

participação dos responsáveis pela criação dos registros documentais:

As fontes que devemos consultar são as externas e internas. Entre as primeiras podemos citar: boletins oficiais, legislação, estudos históricos realizados...; entre as internas: a própria documentação que é objeto de estudo, ou seja, as normas internas produzidas pelas instituições, e quando seja possível, realizar entrevistas com os responsáveis pela gênese dos documentos.

Ainda referente a essa questão, Janice Gonçalves (1998, p. 21), também elenca as possíveis fontes de informações estruturais da instituição, especificando o âmbito de utilização destas, de acordo com os tipos de instituições: pública ou privada.

No caso de instituições públicas, as informações sobre sua criação e sobre suas principais transformações estruturais deverão estar contidas na legislação, podendo ser complementadas através da consulta de relatórios de atividades (indicando em que medida as disposições legais se efetivaram) e atas de reuniões das instâncias internas de poder. No caso de instituições particulares, ao invés da legislação, outros documentos de constituição são frequentemente, mais decisivos (estatutos sociais, por exemplo), mas o estudo da estrutura e do funcionamento do organismo também costuma se apoiar em atas de reuniões e relatórios de atividades, ou outros documentos correlatos (planos de metas, projetos institucionais etc.).

Em sua aplicação, os processos de identificação mantêm relação direta com os princípios básicos da arquivística, principalmente, o princípio da proveniência que é muito considerado nos estudo arquivísticos. Este princípio reflete o procedimento administrativo que determina a origem documental. Logo, torna-se praticamente impossível não ponderar tais princípios. Considerando as definições:

1) o da proveniência é a marca de identidade do documento relativamente ao produtor/acumulador, o seu referencial básico, o ‘princípio, segundo o qual os arquivos originários de uma instituição ou de uma pessoa devem manter sua individualidade, não sendo misturados aos de origem diversa’;

2) o da unicidade, ligado à qualidade ‘pela qual os documentos de arquivo, a despeito da forma, espécie ou tipo, conservam caráter único em função de seu contexto de origem’ [...];

3) o da organicidade, sua condição existencial. As relações administrativas orgânicas refletem-se no interior dos conjuntos documentais [...];

4) o da indivisibilidade, sua especificidade de atuação. Fora do seu meio genético, o documento de arquivo perde o significado, principalmente [...]. (BELLOTO: 2002, p. 23-24)

A afirmação de Gómez López (1998, p. 39) sobre a observação dos princípios básicos da arquivística reforça a ideia da importância destes para o desenvolvimento das metodologias arquivísticas, inclusive para a identificação, deste modo,

é importante dizer que o uso do ‘princípio de origem’ deve ser uma diretriz núcleo do nosso trabalho em conjunto, quando necessário, com o princípio da ‘estrutura’ e ‘ordem original’, que são complementares, e não simplesmente se considerar uma extensão do princípio anterior.

Comparada às outras metodologias, a identificação também é caracterizada como uma função arquivística interdisciplinar, já que exige a cooperação de um conjunto de pessoas envolvidas no processo de gestão de documentos. Para a realização da identificação é necessária a colaboração de profissionais de diversas áreas, relacionadas ao desempenho das atribuições do órgão produtor e que conheçam o contexto de produção dos documentos.

O desempenho das atividades relativas à identificação atribui ao arquivista o papel de pesquisador. A identificação “[...] confere ao trabalho arquivístico a dimensão da qualidade científica”. (Rodrigues, 2011, p.126).

Tal afirmação se confirma observando a opinião de Gómez López (1998, p. 39,

tradução nossa):

[...] agora, que o arquivista é um pesquisador por ofício, mas não uma pesquisa sobre qualquer assunto. Ele é um pesquisador das instituições cujos documentos têm custódia e deve organizar e descrever mediante uma metodologia arquivística, que com bases científicas, lhe permite pisar um terreno firme e seguro.

Desta forma, espera-se que o arquivista aproprie-se dessa imprescindível atribuição para desenvolvimento das funções que lhe são peculiares. Segundo a opinião de Gómez López (1998, p.39, tradução nossa):

Este método tem de ser combinado com a ‘análise documental’, por um processo analítico dos documentos, podemos, a partir do conhecimento das características internas e externas, chegar à identificação das séries de documentais a que pertencem, mediante um processo de síntese, por meio do estudo das suas associações documentárias, reconstruir tanto a organicidade como a funcionalidade dos arquivos e, portanto, as instituições que lhes deram origem.

Os estudos de identificação arquivística, a partir da diplomática como metodologia, permitem a apresentação de resultados teóricos e práticos, contribuem para a concepção de

profissionais capazes de enfrentar os desafios arquivísticos e as necessidades da sociedade contemporânea. (Rodrigues, 2011, p. 126). Nesse sentido podemos afirmar que “nesta dimensão, o trabalho arquivístico reveste-se de cientificidade, contribuindo para a construção de um conhecimento teórico que tenha utilidade prática de aplicação”. (RODRIGUES, 2011, p. 121).

O caráter preliminar e intelectual da identificação é discutido por Rodrigues (2011, p. 118), ao definir que o arquivista tem na identificação uma ferramenta necessária ao seu trabalho. Nessa perspectiva, o conhecimento gerado a partir da identificação tipológica, oferece as bases para todo trabalho técnico arquivístico, sendo esta fase a premissa para o tratamento de massas acumuladas ou para o planejamento da produção dos documentos.