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O Conselho Europeu de Tampere (1999) e o Programa de Tampere (2000-2005)

Capítulo I: O desenvolvimento de uma política de migração e um Sistema de Asilo Comum

1.2. Dos Acordos de Tampere às Orientações estratégicas no espaço de liberdade, segurança e

1.2.1. O Conselho Europeu de Tampere (1999) e o Programa de Tampere (2000-2005)

das áreas de migração e asilo, na cidade finlandesa de Tampere a 14 e 16 de Outubro de 1999, o Conselho Europeu reúne-se, em sessão extraordinária para delinear uma estratégia de implementação dos objetivos acordados no Tratado de Amesterdão, de forma a criar a um espaço de liberdade, segurança e justiça. “O Conselho Europeu está empenhado no desenvolvimento da União enquanto espaço de liberdade, de segurança e de justiça, utilizando plenamente as possibilidades oferecidas pelo Tratado de Amesterdão” (Conselho Europeu de Tampere, 1999). Tendo como principal objetivo uma UE aberta e segura, ao mesmo tempo em que afirma o seu total compromisso com a Convenção de Genebra de 1951 relativa aos refugiados, o Conselho Europeu procura encontrar padrões mínimos comuns entre as políticas migratórias e de asilo dos Estados Membros de maneira a desenvolver uma política comum. O diálogo adivinhava-se bastante complexo, sendo necessário proceder à harmonização de então quinze políticas de migração e asilo destintas, resultantes de uma variedade de perspetivas diferentes e experiências particulares, com o resultado final a ter que ser aprovado por unanimidade. O Acordo de Tampere detém a difícil tarefa de delinear objetivos claros e abrangestes, tendo sempre que acautelar a preocupação de não afetar áreas da soberania Estadual, particularmente sensíveis (Collett, 2014).

Os principais temas a serem abordados pela Convenção de Tampere, comumente apelidados de marcos de Tampere, e que desde então estruturam a ação europeia, nos sucessivos programas, são: a criação de uma política comum da UE em matéria de asilo e migração; a criação de um verdadeiro espaço europeu de justiça; luta contra a criminalidade a nível da união; e uma ação externa mais determinada. No que concerne à criação de uma política comum da UE em matéria de asilo e migração, é definido que esta seria desenvolvida ao redor de: uma parceria com os países de origem; desenvolvimento de um sistema de asilo comum; tratamento equitativo de nacionais de países terceiros; e gestão de fluxos migratórios. É defendida a definição de uma abordagem global ao fenómeno migratório, de maneira a identificar as razões que levam um indivíduo a deixar o seu país de origem, de maneira a prestar auxílio aos mesmos no combate a essas causas de uma forma eficaz, sendo estas: a pobreza e condições de vida deteriorantes; a escassez de ofertas de emprego, conflitos armados (por vezes de cariz étnico-religioso, que leva à perseguição de um determinado grupo de indivíduos) que levam, consequentemente, à não consolidação de Estados democráticos, como é verificável no caso da guerra civil da Síria desde 2011; e o desrespeito pelos direitos humanos.

Em seguimento dos objetivos propostos é anunciada a criação de um SECA, sendo o mesmo delineado como necessário devido à inexistência de fronteiras internas (entre os Estados Membros) e de maneira a estabelecer um modelo de receção de indivíduos terceiros comum, de forma a prevenir o fenômeno de asylum shopping. Tendo como base a Convenção de Genebra, o SECA é estabelecido de maneira a harmonizar os vários sistemas nacionais de asilo de maneira a assegurar uma distribuição equitativa dos esforços a serem levados a cabo pelos Estados Membros, tendo em consideração o facto de os migrantes e refugiados tenderem a orbitar para os Estados com um maior reconhecimento internacional e que detém uma maior multiplicidade de benefícios sociais (como é o caso da Alemanha e da Suécia) o que coloca um grande fardo nestes países. Num curto prazo o sistema de asilo deveria definir qual seria o Estado responsável pela análise do pedido de asilo, normas comuns para o desenrolar de um processo de asilo equitativo e eficaz, condições base de acolhimento dos requerentes de asilo e uma harmonização das normas ligadas à matéria de reconhecimento e de conteúdo do estatuto de refugiado, devendo ainda ser estabelecidas normas de proteção subsidiárias, de maneira a oferecer um estatuto adequado a qualquer individuo que necessite de proteção. No longo prazo, é estabelecido que as regras comunitárias deverão levar à instauração de um processo comum de asilo e a um estatuto uniforme para os indivíduos a quem seria concedido asilo sendo o seu estatuto

reconhecido em toda a União. É também delineado o objetivo de criar uma reserva financeira39, a ser

utilizada em caso da existência de um fluxo migratório em massa, de refugiados que necessitem de proteção temporária, assim como, é determinada a criação de um sistema de identificação de requerentes de asilo (Eurodac).

De forma a garantir que os nacionais de países terceiros que residam no território de um Estado Membro recebam tratamento equitativo, é definido que a UE deverá incentivar a realização de políticas de integração ambiciosas, com o objetivo de assegurar que os direitos e obrigações dos migrantes e refugiados sejam os mais próximos possíveis dos direitos e deveres dos cidadãos europeus, assim como o seu estatuto jurídico. Tal como explicito nas Conclusões de Tampere (1999) um indivíduo de nacionalidade terceira que resida legalmente em qualquer Estado Membro durante um certo período de tempo e possua uma autorização de residência prolongada, deverá ter acesso, nesse Estado Membro, a um determinado número de direitos: o direito de residência, o acesso ao ensino e de trabalhar por conta própria ou de outrem; devendo ser também promovido o princípio da não discriminação relativamente aos cidadãos do Estado de residência, na vida económica, social e cultural e desenvolvidas medidas de combate a xenofobia e ao racismo.

Nas conclusões de Tampere é também salientada a necessidade de uma gestão mais eficaz dos fluxos migratórios, é defendido como prioritário um forte combate ao tráfico de seres humanos, e à promoção de campanhas de informação sobre as possibilidades reais de uma imigração ilegal para território europeu, sendo desenvolvida uma estreita colaboração com os países de origem e de trânsito, ao mesmo tempo, que deverá ser promovida a realização de sanções contra os indivíduos que procurem e auxiliem migrações irregulares. No que concerne à cooperação com Estados Terceiros, quer de origem quer de trânsito, é estabelecido que esta deverá ser também desenvolvida em matéria de promoção do regresso voluntário e ao prestamento de auxílio no reforço das capacidades de luta contra o tráfico de seres humanos e no assumir das suas obrigações de readmissão de indivíduos para com a UE e os Estados Membros. “O Conselho Europeu convida o Conselho a concluir acordos

39 No que concerne à criação de uma reserva financeira, esta é criada em 2000 em consequência do conflito no Kosovo, que levou a um grande fluxo de

refugiados para a UE. Esta seria alocada para os Estados, tendo em consideração o número de refugiados que alberguem, de maneira a providenciar uma melhor integração dos mesmos na sociedade através do financiamento de projetos de integração. Como também iria providenciar auxílio ao Estado albergador na implementação temporária de medidas de imergência, caso este esteja a presenciar um fluxo em massa no seu território. Mais tarde foram implantados fundos adicionais alargando-se o seu propósito para a facilitação no processo de receção e de retorno, mas também para o desenvolvimento dos controlos das fronteiras externas da UE.

de readmissão ou a incluir cláusulas-tipo noutros acordos entre a Comunidade Europeia e os países ou grupo de países terceiros em causa” (Conselho Europeu de Tampere, 1999). Em congruência, é incentivada a cooperação dos Estados Membros com a Europol, de forma a reforçar os seus esforços para detetar e desmantelar redes criminosas que estejam envolvidas no tráfico de seres humanos, sendo também reforçado o nível de cooperação e assistência técnica entre os serviços de controlo fronteiriço dos Estados Membros, como os programas de intercâmbio e de transferência de tecnologias, tendo especial atenção as fronteiras marítimas (Conselho Europeu de Tampere, 1999).

No decorrer dos cinco anos de implementação do Acordo de Tampere procede-se à revisão da Regulação de Dublin (Regulação de Dublin II), acordada em Conselho de Ministros a 18 de Fevereiro de 2003. O mecanismo de decisão de qual seria o Estado responsável pelo processo de análise do pedido de asilo é revisto, sendo agora definido que o Estado em questão deverá aceitar o requerente de asilo caso este se encontre a residir ilegalmente no território de um outro Estado Membro (dentro, no entanto de determinado período de tempo). É definida a criação do Eurodac (European Automad Fingertip Recognition) que irá deter em sua posse impressões digitais dos requerentes de asilo com idades superiores a catorze anos, como também de todos os indivíduos que alcancem território europeu de forma ilegal, tendo os Estados Membros a possibilidade de enviar essas informações para uma base central de dados do Eurodac (Conselho da União Europeia, 2003)