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O contexto de criação da Universidade do Distrito Federal (UDF) –

5) Escola de Belas Artes: A escola Real de Ciências, Artes e Ofícios foi criada em 12 de agosto de 1816 Em 12 de abril de 1820 foi instituída a Real Academia de

4.2 O contexto de criação da Universidade do Distrito Federal (UDF) –

Engenharia), que continuaram a ter suas autonomias administrativas e didático- pedagógicas, sem maiores interlocuções para o estabelecimento de políticas comuns e com caráter de “tradição”, somada às novas realidades trazidas ao país pelas forças políticas que marcaram o início dos anos de 1930, podem nos sinalizar para as variáveis constituintes de outra problemática que envolve a sua reconfiguração quando, a partir de 1937, é transformada em Universidade do Brasil. Tal conjuntura será tema de nossas reflexões no ítem 5.

4.2 O contexto de criação da Universidade do Distrito Federal (UDF) – 1935

É consenso entre os estudiosos da história da educação que a UDF foi, sem dúvida, um projeto que teve Anísio Teixeira como seu principal mentor intelectual, embora tenha mobilizado, particularmente, os membros da Seção de Ensino Técnico e Superior da ABE, que, segundo Mendonça (2000), se incorporaram à universidade, especialmente na sua Escola de Ciências. Segundo a autora, seria justamente essa incorporação, de característica ‘voluntarista’ que conformou a UDF, sua principal originalidade, mas também, sua extrema fragilidade institucional, condicionando a certa facilidade com que foi destruída.

Autoras como Mendonça (2000, 2002) e Fávero (2000[a],[b], 2009) sinalizam para a radical diferença na estrutura proposta pela UDF, quando comparada à URJ, quando esta, já em 1935, encontrava-se em processo de estudos para sua reestruturação e futura transformação em UB. Além da estrutura, a própria designação das escolas indicava a ruptura com o modelo paradigmático de conformação da instituição universitária pela aglomeração de escolas profissionalizantes. Nesse sentido, sua organização se distanciava do modelo de universidade estabelecido pelo Governo Central expresso por meio do Estatuto das Universidades Brasileiras, de Francisco Campos. Seriam 5 as escolas que a constituiriam: as Escolas de Ciências, Educação, Economia e Direito, Filosofia e o Instituto de Artes, sendo que todas elas se proporiam “a desenvolver de forma integrada o ensino, a pesquisa e a extensão universitária (entendida prioritariamente na perspectiva da divulgação científica nas suas respectivas áreas de conhecimento” (MENDONÇA, 2000, p. 139).

A casa de Minerva – entre a ilha e o palácio Página 162 O discurso de inauguração da UDF, proferido por Anísio Teixeira, serve como exemplo dos elementos que Bakhtin nos revela em relação as “cadeias enunciativas”, à dimensão “axiológica” presente em cada enunciado, bem como às características de construção dos enunciados a partir do critério de ‘responsividade’ que o enunciador pretende marcar quando enuncia. Serve também para observarmos como os discuros se alinham a determinadas formações discursivas que retomam outros discursos que lhes antecedem, ao mesmo tempo que apontam para outros que o seguirão. Façamos algumas dessas observações a partir de partes do referido pronunciamento:

UNIVERSIDADE: MANSÃO DA LIBERDADE39

Por mais limitado que seja o âmbito de vida de qualquer povo, lá iremos encontrar, em gérmen – por vezes, obscuras e indiscriminadas-, quatro grandes instituições fundamentais, que lhe constroem e condicionam a vida em comum: a Família, o Estado, a Igreja e a Escola. Desde que haja vida em comum, e vida em comum de homens, essas instituições, sob alguma forma, hão de aparecer, e aparecem para manter, nutrir, ordenar e iluminar a vida em comum. Existir em sociedade envolve, com efeito, imensas complexidades. Cada indivíduo nada mais sendo do que uma urdidura de laços sociais, toda sua vida transcorre em plano superior ao de sua própria vida física e seus meios de expressão não podem ser outros que os das instituições de sua sociedade. Dentre essas instituições avultam as que mais largamente lhe compõem o quadro da existência coletiva. A Família que vela pelo seu desenvolvimento inicial e o conduz a se tornar, por sua vez, um perpetuador de sua espécie; o Estado que lhe defende e regula a vida em grupo; a Igreja que lhe dá o sentido profundo do seu devotamento social. e a Escola que o humaniza e socializa. Todas essas funções se confundem e se misturam, em cada uma dessas instituições, de tal modo que a história de qualquer delas

39Fragmento de discurso de Anísio Teixeira, na cerimônia de inauguração da UDF – 1935 (TEIXEIRA,

1998). Publicado com o título “A função das universidades” no Boletim da Universidade do Distrito Federal (Ano 1, nº 1, julho-dezembro de 1935).

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é, de algum modo, a história da humanidade. À medida que marcha a civilização, melhor se caracterizam, entretanto, essas instituições, e um equilíbrio, sem hierarquia, se vai estabelecendo entre suas funções.

Se todas visam, com efeito, tornar possível e rica a vida entre os homens, nem por isso são menos distintos e independentes os meios de que dispõem para esse mesmo fim comum e único.

Nesse fragmento discursivo/enunciativo, nas condições de produção que o caracteriza (uma cerimônia de inauguração dos cursos da UDF), Anísio Teixeira se alinha a uma rede enunciativa que se aproxima da valorização das instituições que definem e sustentam o corpo social, respondendo, mesmo que indiretamente, àqueles que, como Alceu Amoroso Lima e o grupo católico, o acusavam de “desequilibrado” ou “subversivo”. Já nos referimos ao fato de que, pela estratégia discursiva, o sujeito escolhe o papel que quer para si; e que pela antecipação, desequilibra enunciados com os quais pretende se opor. Ao se referir às instituições brasileiras Família, Estado, Igreja e Escola, procura alinhá-las aos discursos de seus opositores, ao mesmo tempo em que demacarca sua posição de defensor da ordem estabelecida, aspecto imprescindível a um pronunciamento que se fez diante de intelectuais e autoridades civis, políticas e religiosas no ano de 1935, quando as forças conservadoras já se articulavam para o arrefecimento do regime que culminaria com o Golpe do Estado Novo, em 1937.

Defende a existência e importância de instituições como o Estado, a família e a religião, mas pontua que a escola, dentre as diversas instituições, é a que mais pode contribuir para a construção de uma cultura que garanta a vivência coletiva. Ao fazer tal consideração, dirige-se (numa atitude responsiva) àqueles que lhe eram opositores, acusando-o de incitar a ordem ou desrespeitar as instituições existentes. Entretanto, aponta para as funções e papéis que devem caber a cada uma das instituições sociais. Em não havendo tal distinção, sugere que a harmonia social encontra-se comprometida, o que já aponta para seu posicionamento axiológico em relação ao que defende para o campo educacional, que acompanhará o enunciado:

Nesse sentido vamos lentamente emergindo da confusão inicial em que todas as instituições sofriam a supremacia de uma única, fosse a

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família, a Igreja ou o Estado, para uma separação de poderes que é essencial à ação correta e adequada de cada uma delas. Predomínio estreito da Família, prepotência da Igreja, ditadura espiritual do Estado, esses foram, com efeito, os estágios que temos atravessado, e em que se corrompeu a pureza funcional de cada uma dessas instituições pelo uso de meios que pertenciam organicamente ao desempenho de funções, qualitativamente diversas, das demais instituições. A independência e separação entre elas não é, assim, contingência política, mas o próprio imperativo experimental para seu bom funcionamento. De todas elas, a Escola é a que mais recentemente se vem emancipando, não sendo quase possível exemplificar, na história, já não digo o período de sua predominância, mas de sua legítima e total independência. Confundida sua função com a Família, com a Igreja e com o Estado, é, ainda hoje, com esses três senhores, que ela discute sua autonomia... Ou melhor, são ainda esses três senhores que discutem, entre si, sobre a sua tutela.

Aqui Anísio deixa clara sua posição, que esteve bastante demarcada em sua atuação como educador, bem como no Manifesto dos Pioneiros, do qual foi um dos principais signatários: a defesa da educação laica, o que certamente muito desagradava aos que defendiam o intenso controle da educação por parte do Estado, bem como ao grupo católico, que historicamente tinha a hegemonia sobre o processo educacional no Brasil até então. Ao referir-se ao predomínio das instituições que, “confusamente” não se circunscreviam às suas funções específicas, aponta para o seu posicionamento ideológico de defesa da educação como “liberdade” a ser exercitada para e por uma sociedade que, somente assim, superaria etapas e períodos históricos anteriores e ultrapassados, marcados pelo “predomínio estreito da família, prepotência da Igreja, ditadura do Estado”. Sua construção narrativa é histórica, linear e teleológica.

Percebemos ainda que a linguagem é palco privilegiado da luta de classes e das ideologias. Ao mesmo tempo que se vale de forças centrípetas, na concepção de Bakhtin, pela qual afirma e estabiliza o discurso, aproximando-o de formações discursivas tradicionais, aponta para as forças centrífugas do enunciado, marcadas pela

A casa de Minerva – entre a ilha e o palácio Página 165 desestabilização, quando propõe uma reconfiguração dos papéis a serem desenvolvidos por tais instituições, bem como para as demarcações / separações necessárias entre as respectivas funções e áreas de atuação dessas instituições: “ a independência e separação entre elas não é, assim, contingência política, mas o próprio imperativo experimental para seu bom funcionamento”.

É explícito em sua posição ao afirmar que haveria a necessidade de separação entre as funções das instituições, sobretudo no que se referia ao plano educacional. Podemos perceber que seu enunciado tem uma perspectiva claramente dialógica com os representantes dos diversos modelos pretendidos para o campo educacional. Como sabemos, a palavra não é monológica, mas sim plurivalente e o dialogismo é uma condição constitutiva do sentido do enunciado. A forma como Anísio vai construindo sua linha argumentativa aponta para o que podemos chamar de “formação ideológica” de sua discursividade que se evidencia quando empregará a metáfora “a Mansão da liberdade40” ao final de seu pronunciamento para designar a grandiosidade do empreendimento, ao mesmo temo em que evidencia sua posição ideológica alinhada ao liberalismo e, consequentemente, contrária às medidas autoritárias que se anunciavam no campo político.

A função da universidade é uma função única e exclusiva. Não se trata somente de difundir conhecimentos. O livro também os difunde. Não se trata, somente, de conservar a experiência humana. O livro também a conserva. Não se trata, somente, de preparar práticos ou profissionais, de ofícios ou artes. A aprendizagem direta os prepara, ou, em último caso, escolas muito mais singelas do que universidades. Trata-se de manter uma atmosfera de saber para se preparar o homem que o serve e o desenvolve. Trata-se de conservar o saber vivo e não morto, nos livros ou no empirismo das práticas não intelectualizadas. Trata-se de formular intelectualmente a experiência humana, sempre renovada, para que a mesma se torne consciente e progressiva. (...) A universidade é, em essência, a reunião entre os

40 “Por isso é que a Universidade é e deve ser, a mansão da liberdade. Os homens que a servem e os que,

aprendendo, se candidatam a servi-la, devem constituir esse fino escól [sic] da espécie para quem a vida só vale pelas ideias que a alimentam.” (TEIXEIRA, 1998, p. 43)

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que sabem e os que desejam aprender. Há toda uma iniciação a se fazer. E essa iniciação, como todas as iniciações, se faz em uma atmosfera que cultive, sobretudo a imaginação... Cultivar a imaginação é cultivar a capacidade de dar sentido e significado às coisas. A vida humana não é o transcorrer monótono de sua rotina quotidiana, a vida humana é, sobretudo, a sublime inquietação de conhecer e de fazer. É essa inquietação de compreender e de aplicar que encontrou afinal a sua casa. A casa onde se acolhe toda a nossa sede de saber e toda a nossa sede de melhorar é a universidade.(...) São as universidades que fazem, hoje, com efeito, a vida marchar. Nada as substitui. Nada as dispensa. Nenhuma outra instituição é tão assombrosamente útil. (...)

Nesse fragmento, Anísio reconhece a instituição universitária como elemento imprescindível ao processo civilizatório que marca um projeto de construção de toda nação, ao mesmo tempo em que responde negativamente às formações discursivas anteriores que caracterizavam a universidade como instituição retrógrada, resquício do Antigo Regime, que marcaram boa parte dos discursos dos seus opositores no início do século XX. Há uma clara posição do educador quanto à sua concepção de universidade: não somente de suas características constituitivas, como também de suas formas de organização, sua estruturação político-pedagógica e de sua relação com a produção do conhecimento. À universidade não caberia somente a transmissão de conhecimentos já sistematizados. Novamente aí percebemos uma relação dialógica de seu enunciado com os enunciados que se opunham ao modelo constitutivo da UDF. Critica a rigidez estrutural da universidade, fechada em suas cátedras e suas práticas elitistas. Critica também o academicismo que descola o aprendizado da vida concreta, conectada às questões reais, da política, que caracterizam o discurso e a ideologia liberais. Entretanto, cabe ressaltar que a universidade (a UDF que se inaugura) existe ainda mais em suas intenções e planos do que na realidade concreta. Somos instigados à pergunta se haveria condições para a existência concreta, naquelas condições histórico-político-sociais, de uma instituição metaforizada como “casa” onde se “acolhe toda a vontade de saber e a nossa sede de melhorar”? Não existiriam também, internos à UDF, no decorrer dos anos que se sucederiam, os conflitos internos, as contradições, as disputas intra-grupos que caracterizam toda e qualquer instituição?

A casa de Minerva – entre a ilha e o palácio Página 167 Acreditamos que parte do que temos na “memória social” (e até mesmo no imaginário simbólico) e na bibliografia que trata da história da educação considera mais as intenções ideais defendidas e expressas por Anísio do que propriamente as características constitutivas de toda e qualquer instituição universitária onde os saberes das (e entre) as diversas áreas e campos sempre estão em disputas. Nesse sentido, seria a UDF uma utopia vedada por estar fora de seu tempo ou por não ter tido tempo de mostrar as possíveis contradições e impasses internos que certamente vivenciaria?

Na sua construção enunciativa, Anísio já vai abrindo espaço para a defesa do modelo da UDF, sabedor que era do conturbado processo social e político que já configuravam o ano de 1935. Segundo Brandão (2004), “em todo processo discursivo o emissor pode antecipar as representações do receptor e, de acordo com essa antevisão do ‘imaginário’ do outro, fundar estratégias de discurso” (BRANDÃO, 2004, p.44).

Nessa perspectiva, Anísio indaga:

E qual a universidade que abre, hoje, aqui as suas portas? É, por acaso, mais uma universidade para o preparo puro e simples de profissionais, de médicos, bacharéis, dentistas e de engenheiros civis? Não. É uma universidade cujas escolas visam o preparo do quadro intelectual do País, que até hoje se tem formado ao sabor do mais abandonado e mais precário autodidatismo. Uma escola de educação, uma escola de ciência, uma escola de filosofia e letras, uma escola de economia e direito, e um instituto de artes, com objetivos desinteressados de cultura, não podem ser demais no País, como não podem ser demais na metrópole desse país. (...)

Continuando suas reflexões, sustenta que

A cultura brasileira se ressente, sobretudo, da falta de quadros regulares para sua formação. Em países de tradição universitária, a cultura une, solidariza e coordena o pensamento e a ação. No Brasil, a cultura isola, diferencia, separa. E isso, por quê? Porque os

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processos para adquiri-la são tão pessoais e tão diversos, e os esforços para desenvolvê-la, tão hostilizados e tão difíceis, que o homem culto, à medida que se cultiva, mais se desenraiza, mais se afasta do meio comum, e mais se afirma nos exclusivismos e particularismos de sua luta pessoal pelo saber.(...)

E acrescenta:

A singular agrestia do meio intelectual e público do Brasil, em que os julgamentos são armas de combate, a análise, forma insidiosa de oposição, e o desejo de destruir e diminuir a obra alheia, o próprio modo de ser da inteligência, não será esse nosso famigerado antropofagismo político e mental a consequência mais grave do nosso nomadismo intelectual, do nosso isolamento espiritual e dos nossos processos indígenas de estudo e formação mental? Estou certo que esse é o mais grave aspecto do aparentemente inocente autodidatismo nacional. Somos isolados e hostis, porque é isolada e hostil a forma de nos prepararmos intelectualmente para as lutas da vida e do espírito. Não cooperamos, não colaboramos, não nos solidarizamos com os companheiros, nem em ação, nem em pensamento, porque cada um de nós é o centro do universo, e só desse centro partirá a verdadeira ação e o verdadeiro pensamento.(...)

Finaliza seu discurso observando que

Dedicada à cultura e à liberdade, a Universidade do Distrito Federal nasce sob um signo sagrado, que a fará trabalhar e lutar por um Brasil de amanhã, fiel às grandes tradições liberais e humanas do Brasil de ontem. (TEIXEIRA, 1998, p. 34-43)

Após a cadeia progressiva de construção de suas argumentações, articulada pela sucessão entre perguntas formuladas e respostas pretendidas, finalmente o fundador da UDF evidencia os elementos que a legitimam e a identificam. Ao construir o enunciado por meio de sucessivas interrogações já se vale de uma estratégia discursiva: a

A casa de Minerva – entre a ilha e o palácio Página 169 indagação é imediatamente seguida de respostas que levam aos sentidos que pretende transmitir aos seus interlocutores (diretos ou presumidos, considerando que tal enunciado é um pronunciamento feito numa cerimônia institucional). Apontando para as qualidades que identifica no modelo da UDF, utiliza-se da construção enunciativa a partir da negação às críticas que lhe eram feitas por grupos ligados ao Governo Federal , como as advindas de Capanema, ou pelo grupo católico, com os ataques diretos promovidos por Alceu Amoroso Lima que o acusava, inclusive, de comunista. Ao indagar “É, por acaso, mais uma universidade para o preparo puro e simples de profissionais, de médicos, bacharéis, dentistas e de engenheiros civis?” reporta-se, não somente à URJ, como também ao modelo de constituição de outras universidades que vinha sendo defendido pelas políticas do Governo Federal e seus aliados.

A UDF àquele momento estava em processo de constituição: nem todos os seus institutos estavam prontos para o pleno funcionamento. Diversas aulas seriam ministradas por professores que eram pesquisadores de outras instituições; diversos laboratórios a serem utilizados não pertenciam à universidade. Ou seja, boa parte de uma pretensa identidade da UDF era, na verdade, uma aposta de Anísio e dos grupos que com ele se alinhavam, em uma nova perspectiva de organização institucional e de uma nova concepção de construção do saber. Se ela seria bem sucedida ou viável, nunca o saberemos, já que sua curta duração acabou por abortar o projeto.

Remetemo-nos a Becker (2007) quando nos diz que a realidade é complexa e não pode ser pensada numa perspectiva de linearidade (2007, p. 31). Sendo assim, sempre atribuímos, implícita ou explicitamente, um ponto de vista, uma perspectiva e motivos às pessoas cujas ações analisamos. Daí o cuidado que devemos ter com as imagens que já possuímos para evitar que as imagens estereotipadas entrem em ação. Daí a proposta de pensarmos as pessoas pelas atividades que desempenham em determinado momento e contexto social. Segundo Becker “as pessoas fazem o que fazem ou o que devam fazer em função do que nos pareça bom no momento” (2007, p.32). Dessa forma, há “sempre que se evitar cair nas ‘mentiras’ que as organizações contam de si mesmas” (idem), por intermédio das diversas formações discursivas que controlam seus discursos e conferem o status de credibilidade e verdade aos enunciados de suas autoridades reconhecidas.

A casa de Minerva – entre a ilha e o palácio Página 170 Dessa forma, a fim de ultrapassarmos a materialidade enunciativa de Anísio Teixeira (materialidade enunciativa que se remete a discursos e formações discursivas), quando identifica as características constitutivas da sua UDF, em pleno processo de ‘fazer-se’, podemos nos remeter a Bauman41, (2005, p. 35) ao nos mostrar que “o anseio

por identidade vem do desejo de segurança, ele próprio um sentimento ambíguo”. No caso particular da UDF que se encontrava diante da necessidade de um apoio político para sua estruturação e validação, Bauman (2005, p.35) complementa nosso raciocínio ao salientar que, diante da construção identitária em contextos conflituosos ou contraditórios, embora até possa parecer estimulante no curto prazo, esse fazer-se cheio