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O contexto sociocultural dos povos indígenas do estado do Tocantins

O estado do Tocantins foi criado em cinco de outubro de 1988 com a promulgação da Constituição Federal, tornando-se o mais novo estado da federação brasileira. Está localizado na região Norte do país, encontra-se na zona de transição geográfica entre o cerrado e a floresta amazônica; sua extensão territorial é de 278.420,7 km². Esse estado abriga uma população multiétnica que inclui, particularmente, remanescentes de quilombolas e vários povos indígenas. O espaço territorial ocupado pela população indígena corresponde a aproximadamente cerca de 8,50% da área territorial do estado.

A população indígena do Tocantins corresponde a aproximadamente 14 742 habitantes2, pertencentes e distribuídos entre os seguintes povos: Xerente (3 357),

Karajá de Xambioá e Guarani (600), Apinayé (2 450), Krahô (2 547), Krahô – Kanela (700), Kanela do Tocantins (50), Javaé (1 877) e Karajá (3 161), com perspectiva de crescimento populacional, haja vista que entre esses povos a estimativa da taxa de natalidade é de 100 crianças por ano.

Esses povos são detentores de uma cultura que se expressa por meio de diferentes manifestações, bem como de uma história de luta e de sobrevivência que os fazem manter com vitalidade no convívio diário os seus saberes tradicionais face a renovação e agregação de conhecimentos que estão sendo adquiridos em contato direto com os não indígenas.

Reportamo-nos à realidade sociocultural do Tocantins para entendermos a ocupação e distribuição dos indígenas ao longo da extensão territorial. Destacaremos a presença de outros povos indígenas que vivem entre os povos indígenas tocantinenses, que há mais de cinco séculos ocupam as terras da antiga região do Brasil Central, hoje Região Norte.

A Figura 1 refere-se à localização geográfica dos seguintes povos: Karajá (Ilha do Bananal, Lagoa da Confusão), Karajá de Xambioá (Santa Fé), Javaé (Ilha do Bananal, Formoso do Araguaia e Lagoa da Confusão), Krahô (Itacajá e Goiatins), Krahô–Kanela (Lagoa da Confusão), Kanela do Tocantins (Araguaçu), Xerente (Tocantínia) e Apinayé (Tocantinopólis, na região do Bico do Papagaio). Incluem-se ainda os povos: Guaraní, que vivem entre os Karajá de Xambioá; os Funiô com os Apinayé; os povos Tuxá e Ava-Canoeiro entre os Javaé. A presença desses povos indígenas entre os citados é resultado, em parte, de casamentos interétnicos.

Educação, Cultura e Etnodesenvolvimento saberes em diálogo

Figura 1. Localização das terras indígenas demarcadas por povo indígena do estado do Tocantins

Fonte: pdrs.seinf.to.gov.br/.../1.../1_Pier_an3_V09_Povos%20Indígenas.doc. Acesso: 15 fev. 2015

De acordo com a Coordenadoria Regional da FUNAI, além desses povos existem no Tocantins indígenas desaldeados, ou seja, aqueles que vivem nos centros urbanos. Esses povos são pertencentes às etnias Pankararu e Atikum, que migraram de Pernambuco; e os Apurinã, que migraram de Rondônia. Eles migraram de seus estados em pequenos núcleos familiares e estão no Tocantins há alguns anos.

Ainda de acordo com a coordenadoria, esses indígenas são considerados como “indígenas desaldeados”, que migraram de seus estados de origem devido às várias situações políticas que lhes foram e são impostas, por isso ancoraram no Tocantins e em outros estados brasileiros na perspectiva de um futuro melhor. Esses povos reivindicam junto ao governo

federal a demarcação de terras para construção de moradias, prática da agricultura e sobrevivência da cultura.

Tendo em vista a diversidade sociocultural desses povos indígenas que estão em contato com os não indígenas por aproximadamente 500 anos, salientamos que cada um deles tem sua cultura com características próprias no que se refere a comportamentos, costumes, valores, crenças, visão de mundo, tradições, saberes e fazeres do cotidiano tidos ou não como atividades laborais, forças de poder, de políticas e de organização social, entre outros. Todos esses traços possibilitam conhecer melhor essas diversidades que se constituem em saberes transmitidos via oralidade e por meio da observação entre os indígenas em suas comunidades de práticas socioculturais.

É a partir desta questão, que destacamos parte dos sistemas próprios de organização dos seguintes povos: os Karajá, os Karajá de Xambioá e os Javaé, que formam o povo Iny, pertencentes linguisticamente ao tronco Macro-Jê, família Karajá. São considerados povos das águas. Residem às margens dos rios Araguaia e Javaé, têm a subsistência proveniente da coleta de frutos, dos peixes das águas mornas desses rios e de outros alimentos próprios de sua cadeia alimentar.

As expressões das tradições dos povos Iny se dão de várias formas: nas pinturas corporais, na confecção de artesanatos, em especial os de barro, como a das figuras de cerâmicas – chamadas na língua nativa de ritxòkò (na fala feminina) e ritxòò (na fala masculina) – trabalhos que envolvem técnicas tradicionais transmitidas de geração a geração e que foram tombadas como patrimônio cultural pelo Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional (IPHAN), nas artes plumária dos raheto (cocares), nos rituais de danças e de ritos de passagens, como o Hetohoky.

Os Krahô e Krahô-Kanela denominam a si próprios de Mehi e a língua falada por eles pertence à família linguística Jê, tronco Macro-Jê. Suas aldeias são circulares, com pátio central. A organização social e política dos Mehi divide-se em dois grandes partidos ou metades: wacmejê (partido do verão) e katãmjê (partido do inverno). Das tradições desse povo destacamos a festa do jàtjõpĩn (Festa da Batata), tepmẽtere (Peixe Lontra) e os ritos de iniciação Pempcahàce Ketwajê3.

O povo Apinayé ou Pahi pertence à família linguística Jê, tronco Macro-Jê, são bilíngues e mantém com vitalidade seus saberes tradicionais. Os Apinayé são organizados socialmente pelo dualismo, ou seja, por duas metades cerimoniais, Kooti e Koore, que se completam em si, tendo o Sol e a Lua como elementos de criação desse povo. Esses povos têm toda uma história de vida que vai desde a ocupação territorial, marcada por longos séculos de avanço do não indígena, que logo se apossou de suas terras e delas tomou parte para si, como também de seus rios, de suas riquezas naturais, além da força de trabalho.

Os Xerente são organizados socialmente por meio dos partidos ou metades exogâmicas patrilineares clânicas Doí e Wahirê4. São também considerados povos da floresta, grandes

guerreiros e corredores. Tem sua subsistência advinda da coleta de frutos, caça, pesca e das roças de vazantes e tocos. Das tradições culturais desse povo se destaca a tradicional festa

3 Rito de passagem dos meninos da vida de crianças para a adulta. Informações obtidas com Letícia Jokahkwyj Krahô, em abril de 2016.

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do Daĩsipê5. No decorrer dessa festa muitas atividades culturais são realizadas com o intuito

de fortalecer e preservar a cultura, como as corridas com toras de buriti grande (masculina e feminina), nominação masculina e feminina, cantos e danças, corrida de taquara, reunião das quatro associações de Clãs Daksu: Krara, Annãrowa, Krêrêkmõ e Kâhâ tô Wasãmkpônõze.

Em meio a essa riqueza cultural, temos questionado sobre as questões metodológicas e teóricas que possam abarcar o conduzir, o trilhar e a recolha de informações dessas paisagens socioculturais na perspectiva de propiciar aos professores e estudantes indígenas atividades investigativas que reflitam ações de ensino e de aprendizagem da matemática escolar no âmbito das escolas indígenas. Com o intuito de descrever as práticas socioculturais desses povos indígenas Xerente, apresentamos a seguir alguns dos diversos repertórios de saberes e fazeres dos modos desses indígenas compartilhados em diferentes estágios.

Práticas socioculturais dos indígenas do