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A importância da viabilidade do crédito rural, segundo LEITE, confere “destaque” em função de propiciar um impulsionamento no sistema produtivo no interior dos assentamentos, conforme a autora argumenta,

Os recursos mobilizados para o crédito, além de repercutirem na capacidade produtiva dos assentamentos, impulsionam um conjunto de atividades locais, aumentam a circulação monetária no município e estabelecem um diálogo direto e particular com o Estado, por meio de suas políticas públicas, e com os agentes financeiros e intermediários do crédito, notadamente o Banco do Brasil e o Banco do Nordeste (LEITE et al., 2004).

LEITE ressalta que somente diante da “condição de assentados” é que esta categoria de trabalhadores rurais passa a ter oportunidade de acesso ao crédito rural (Leite et al., op.cit., p.216). Segundo Guanziroli, a “disponibilidade de recursos financeiros é condição necessária, embora não suficiente”, para possibilitar que os agricultores “iniciem um processo produtivo rentável e sustentável”. Porém, é importante destacar que “os produtores familiares, em particular os mais pobres, encontram grandes dificuldades para obter créditos comerciais ou mesmo créditos oficiais distribuídos pelos canais bancários convencionais”. O autor ressalta que, na maioria das vezes, os agricultores não se estimulam em “financiar” o crédito, uma vez que as exigências “financeiras não são adequadas às suas necessidades e especificidades”. Por outro lado, a agência bancária impossibilita que este processo de financiamento tenha êxito, colocando empecilhos aos trabalhadores, “seja solicitando garantias reais que os produtores não podem prover”, ou solicitando “a compra de serviços adicionais: seguro, manutenção de saldo médio em cadernetas de poupança que, além de não interessar diretamente ao produtor, termina encarecendo o crédito” (GUANZIROLI et al., 2001 p.230).

É importante destacar também o contexto no qual estão inseridos os programas de créditos rurais. O primeiro programa de crédito implementado para os agricultores assentados foi denominado de Programa de Crédito Especial para a Reforma Agrária (PROCERA). Este programa emergiu na década de 80 e se constituía pelo investimento em “atividades produtivas (custeio e investimento) em assentamentos rurais”. Este programa foi permeado por interrupções, chegando a se concretizar após esse período inicial, entre 1993 até 1999, quando foi finalizado. Em termos gerais, esta linha de crédito atendeu às perspectivas de “acesso dos assentados aos insumos e equipamentos utilizados na produção agropecuária em áreas reformadas”. Embora, esta linha de crédito trabalhasse com “taxas diferenciadas”, apesar disso, ainda eram “taxas onerosas para o público beneficiário ao qual se dirigia” (LEITE et al., op cit, p.219).

Guanziroli destaca, no entanto, que a pesquisa desenvolvida por Buainain e Souza concluiu que este programa “contribuiu de maneira efetiva para a formação do patrimônio produtivo e doméstico dos beneficiários”. Além desse aspecto levantado pelos autores, cabe destacar também que “o crédito contribuiu” de forma efetiva para “aumentar o nível de produção corrente dos beneficiários”, de modo que “os recursos” do programa subsidiaram “quase 50% da produção total” (BUAINAIN e SOUZA apud GUANZIROLI, 2001 p.236).

Após o colapso pelo qual passou o Programa do PROCERA, foi instituído o Programa de Fortalecimento da Agricultura Familiar (PRONAF), em 1995, com o propósito de “oferecer condições diferenciadas de acesso ao crédito aos agricultores familiares” (ASSUNÇÃO e CHEIN, 2003). Este programa foi resultado de investimentos de recursos públicos e provém do Fundo de Amparo ao Trabalhador (FAT)11, do orçamento geral da União e dos Fundos Constitucionais de financiamento” (ASSUNÇÃO e CHEIN, op. cit.). Cabe enfatizar ainda que este programa é fruto das reivindicações dos

movimentos sociais rurais (SCHNEIDER, 1999 apud

STROPASSOLAS, 2006a).

LEITE destaca que este programa constitui-se por uma “linha de financiamento” que está voltada prioritariamente aos agricultores familiares. Nesse sentido, o programa normatiza que os agricultores cumpram a regra de que “80% da renda advenha do trabalho na

11 O Fundo de Amparo ao Trabalhador emergiu na década de 90 e representa um fundo de

“natureza contábil-financeira, vinculado ao Ministério do Trabalho e Emprego (MTE), constituído pelo produto das arrecadações para o PIS e o PASEP, destinado a custear os programas de seguro-desemprego e abono salarial”. O processo de gestão do FAT é realizado pelo “Conselho deliberativo do Fundo de Amparo ao Trabalhador (CODEFAT), órgão colegiado, de caráter tripartite e paritário, composto por representantes dos trabalhadores, dos empregadores e do governo, no qual, têm assentos representantes do Ministério do trabalho, Ministério da Previdência Social, do BNDES e do Ministério da Agricultura, Pecuária e abastecimento. Dentre outras atribuições, cabe a este “órgão elaborar diretrizes para programas e para a alocação de recursos, acompanhar e avaliar seu impacto social e propor o aperfeiçoamento da legislação referente as políticas públicas de emprego e renda”, assim como “a fiscalização da administração” da mesma” (SANTOS, 2006).

propriedade rural, que sejam contratados no máximo dois empregados e que o tamanho da área seja limitado a quatro módulos fiscais” (LEITE et al., op.cit., p.220).

Além dos créditos de financiamento que foram abordados anteriormente é importante ressaltar a modalidade de “créditos de instalação ou implantação, administrados pelo INCRA”, dentre os quais, são constituídos por crédito de “fomento, alimentação e habitação”. Conforme LEITE argumenta,

Ainda que não sejam créditos produtivos propriamente ditos e, portanto, sem as mesmas regras vigentes nos casos anteriores, esses recursos são considerados pelos assentados, ora como uma doação do Estado (o que também acontece às vezes com o dinheiro do crédito produtivo, gerando problemas de inadimplência), ora como um crédito stricto sensu. Na realidade as atividades fins desses recursos deveriam ser encaradas, pelo Estado, a fundo perdido, visto tratar-se de dotar essas famílias marginalizadas, agora “incluídas socialmente” de um mínimo de condições humanitárias necessárias à sua inserção social, econômica e produtiva (LEITE et al., op.cit.).

Nesse contexto, é importante destacar que os agricultores assentados, ao chegarem ao assentamento, estão totalmente desprovidos de recursos necessários para sua sobrevivência e de suas famílias, o que resulta na necessidade dos trabalhadores contarem com o apoio do Estado por meio do crédito de fomento, alimentação e habitação para que suas famílias possam se estruturar no assentamento até o momento de terem condições de iniciar as atividades produtivas.

De fato, o que Medeiros propõe é extremamente relevante no sentido de que deveria ser dever do Estado disponibilizar estes recursos de forma gratuita aos agricultores e não como um crédito que deva ser ressarcido ao Governo Federal, pois estes benefícios atribuídos aos agricultores familiares representam um meio de incluí-los socialmente

para a garantia das condições necessárias à sua chegada e permanência efetiva na terra.

Portanto, a assistência técnica representa um elemento primordial para que os agricultores tenham acesso ao crédito como garantia para desenvolver sua produção em sua unidade produtiva.

No próximo capítulo, trataremos das trajetórias dos trabalhadores, ex-assalariados da Usina Santa Maria que, após o processo de desapropriação das terras, encontram-se atualmente na condição de assentados. Abordaremos sobre o tipo de agricultura familiar que os mesmos desenvolvem no assentamento, assim como analisaremos se estes agricultores dispõem de uma assistência técnica efetiva para que tenham acesso ao crédito rural para o desenvolvimento de sua produção no assentamento.

Capítulo 4

A categoria das trajetórias e o Processo das transições

Neste capítulo será realizada primeiramente uma reflexão sobre os conceitos de “trajetória” e “transição” na visão de autores como Elder, Dubar, Gomes e Martins. No segundo momento, será abordada a análise empírica da pesquisa de campo, evidenciando os depoimentos dos trabalhadores e de representantes das entidades que os assessoram, a respeito de temas como: as trajetórias de trabalho na Usina Santa Maria, o processo de falência que culminou na perda do emprego, assim como o contexto de luta pela desapropriação das terras onde estes trabalhadores moravam durante o funcionamento da usina e, finalmente, serão exploradas as percepções sobre a transição que estes trabalhadores elaboram no processo de adaptação à nova condição de assentados.

4.0 De assalariados a assentados: o desafio de uma transição na