• Nenhum resultado encontrado

4.1 A hierarquia nas relações de trabalho

4.1.2 O Processo de falência da Usina Santa Maria

A Usina Santa Maria é considerada um dos maiores empreendimentos agrícolas da região do Brejo Paraibano, que após passar por momentos de crise entra em um processo de falência, deixando mais de 4.040 trabalhadores desempregados, colocando, desse modo, as famílias dos trabalhadores numa grave situação de desamparo, com condições de sustento praticamente nulas, cada família se arranjando como podia, reproduzindo sua vida de precariedade (SEDUP, 2004).

Segundo Moreira e Targino, a falência desta Usina ocorreu em 1991. Após esse período, surge a AGROENGE (Agropecuária e Engenharia S/A), uma empresa vinculada a um grupo empresarial do

Distrito Federal. Esta empresa com interesse em investir na usina, entra na justiça e ganha a suspensão da falência, realizando empréstimos junto ao Banco do Brasil, para sua reabertura. Para conseguir esse objetivo a AGROENGE recebeu o “apoio de políticos locais” (MOREIRA e TARGINO, 1997 p.52).

Em 1992, realiza-se a reabertura da Usina Santa Maria administrada por este grupo, sendo denominada de USIAGRO (Usina e Agropecuária Ltda). Passou dois anos em funcionamento, produzindo açúcar e álcool, mas não teve sucesso, fechando logo em seguida. O grupo empresarial se retirou sem ter conseguido soerguer a empresa. Da sua produção restaram mil sacos de açúcar e 712 mil litros de álcool da safra 1992/1993, além de dívidas contraídas com o banco. Para o Banco do Brasil, os produtos estocados representavam uma garantia do pagamento dos empréstimos feitos pela empresa. Para a justiça, estes produtos pertenciam à massa falida, havendo a possibilidade de serem vendidos. A venda foi realizada em maio de 1994. Estava previsto que o dinheiro arrecadado seria destinado ao “pagamento das dívidas e das ações trabalhistas” (MOREIRA e TARGINO, op.cit., p.122).

As usinas, durante o processo do seu auge na produção do açúcar, passaram pela derrocada de seu trabalho, decretando falência em inúmeros locais do país, e consequentemente gerando desemprego em massa. Conforme NEVES afirma,

Ao se reportarem à ruptura ou a falência da usina, os ex-trabalhadores, diferenciadamente, conforme as diversas posições anteriormente em jogo, enfatizam os princípios e as regras constitutivas do modo idealizado de funcionamento do sistema social que os integrava a partir da relação de trabalho. A falência da usina correspondeu então a um processo imediato e descendente de deterioração das condições de vida e de trabalho (NEVES, 1997 p.151).

A crise gerada pelo fechamento da Usina Santa Maria provocou grandes impactos, já que grande parte da população economicamente ativa desses municípios ficou desempregada e sem perspectivas de

conseguir outro trabalho. Foi um cenário extremamente difícil, conforme manifestam os trabalhadores.

No primeiro momento eu senti porque fiquemo sem serviço, mesmo sendo ela ruim, a gente tinha a feirinha certa toda semana. Aí eu tive que me destinar pra aquele mundo da Paraíba, aquela usina Jacuípe, Santana. Eu trabalhei um bocado de tempo lá. Antes de lotear as terras fiz um bico por aqui, os cabas me chamaram pra trabalhar dois dias, três dias, foi sofrimento! (Assentado).

Fica evidente a ideia de que embora o trabalho fosse duro, penoso, o que recompensava, por outro lado, era o salário garantido que os mesmos tinham a cada semana, o que assegurava a subsistência da

família. Outro entrevistado reitera essa ideia dita anteriormente. Eu trabalhava no campo, não foi bom não, porque

ninguém tinha aquele dinheiro certo prá sobreviver. Eu arrumei um bocado de gente e me desloquei daqui pro município de Santa Rita, para trabalhar, cortar cana fazer o mesmo serviço da gente. Quando isso aqui não tinha mais condições, quando ela faliu de uma vez passou pro INCRA, aí dividiu (Ex-assalariado).

Este trabalhador manifesta em seu depoimento que a sua trajetória de trabalho na usina era importante pelo fato de assegurar o salário, mas, ao mesmo tempo, reconhece que foram se adaptando à situação de desemprego. Embora a usina garantisse o sustento para a família, ele concorda que o trabalho era difícil pelo fato de o salário ser limitado.

Logo com poucos dias a gente sentimo porque a gente tinha aquele ganho certo, né, mas depois a gente foi se acostumando. Há mais tempo que ela tivesse falido porque quando ela funcionava tudo era mais difícil pra gente. Por uma parte era fácil porque a gente tinha o trabalho, mas a gente trabalhava e ganhava pouco (Ex- assalariado).

Este entrevistado destaca que a situação dos trabalhadores nesse contexto de desemprego foi complicada, conforme o seu depoimento manifesta.

Foi um cenário muito difícil, né porque quem era trabalhador do campo o homem que trabalhou pra usina ele trabalha de segunda a sábado, então a situação dessas pessoas ficou muito delicada. Aí muitas pessoas iam pra Pilões, Areia, Guarabira pedir mesmo nas feiras livres pra se alimentar. Uma situação muito delicada. Além do mais que começou a surgir as dívidas da usina e que a usina a qualquer momento ia ser leiloada pra pagar os credores que tava cobrando na justiça os débitos. Foi aí que a luta pela terra começou porque se comprasse a usina e, aí os morador? Foi aí que começou a organização da luta pela terra (Ex-assalariado da usina).

Conclui-se, reiterando o acima registrado, de que o processo de desemprego vivenciado pelos trabalhadores, no período de 1992 a 1995, foi de penúria. Para minimizar a situação de desemprego, alguns trabalhadores tiveram que viajar nesse período para os municípios próximos e pedir ajuda para se alimentar, representando um processo de sobrevivência limite. Em outros casos, certos trabalhadores foram para regiões próximas como Pernambuco e Paraíba em busca de inserção laboral em outras usinas, sendo que, em certos casos específicos, outros migraram para o Rio de Janeiro e São Paulo em busca de oportunidades de emprego. É importante ressaltar que apesar do baixíssimo salário da usina, este ao menos garantia o sustento da família, mas sem ele foi pior. Assim sendo, os trabalhadores começaram a ser conscientizados pelas entidades representativas de que os mesmos deveriam começar a mobilização, pois as terras da usina seriam leiloadas. Desse modo, fortaleceu-se a luta pela terra. Detalhes sobre esse contexto serão abordados na próxima seção.