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O desenvolvimento da sociedade do capital e da ideologia marxista

A CONCEPÇÃO DE MÉSZÁROS ACERCA DO PODER DA IDEOLOGIA NA VIDA SOCIAL E NA FORMAÇÃO DOS HOMENS

3.3 O desenvolvimento da sociedade do capital e da ideologia marxista

Nesta terceira seção, examino a importantíssima questão do desenvolvimento da ideologia marxista desde Marx, que acompanha o desenrolar da história da sociedade capitalista. Nesta seção, tomo este desenvolvimento ideológico sem me prender a períodos específicos, deixando para a seção quarta a relevante questão das mudanças na ideologia socialista decorrentes do desenvolvimento do imperialismo, desde as últimas décadas do século XIX até o neocolonialismo contemporâneo.

Mészáros argumenta “as ideologias dominantes da ordem social estabelecida

desfrutam de uma importante posição privilegiada em relação a todas as variedades de

‘contraconsciência’” (MÉSZÁROS, 2004, p. 233). Em primeiro lugar, as ideologias

dominantes, assumindo uma postura positiva em relação ao status quo, “podem contar, em suas confrontações ideológicas, com o apoio das principais instituições econômicas, culturais

e políticas do sistema todo” (MÉSZÁROS, 2004, p. 233). Em segundo lugar “podem estipular a ‘praticabilidade’ como pré-requisito absoluto para a avaliação da seriedade ou da

inadmissibilidade categórica da crítica, bem como da legitimidade da mudança social”

(MÉSZÁROS, 2004, p. 233).

Ao mesmo tempo, as ideologias críticas das classes dominadas, - ou seja, as formas de contraconsciência -, enfrentam desvantagens no seu confronto com a ideologia da classe dominante. Elas tendem a assumir uma postura negativa diante da realidade e, ao mesmo

tempo, atacam as instituições existentes, “expondo-se, assim, à acusação de defender ‘os

impulsos do individualismo anarquista’” (MÉSZÁROS, 2004, p. 233).

Para se desvencilhar destas desvantagens, as ideologias críticas têm que ter também uma dimensão positiva. No caso da ideologia da perspectiva do trabalho, - isto é, do marxismo revolucionário -, esta dimensão positiva consiste na identificação de um agente

146 especial, capaz de protagonizar uma transformação radical da ordem existente. No caso do marxismo revolucionário este agente é a classe trabalhadora, a classe antagônica ao capital, que pode propor ideologicamente uma nova alternativa hegemônica viável. Ou seja,

as negações radicais da ordem social prevalecente não podem se libertar nem de sua dependência em relação ao objeto negado nem do poder da ideologia preponderante com que tentam competir, a menos que indiquem uma força hegemônica potencial historicamente identificável como seu ponto de apoio. (MÉSZÁROS, 2004, p. 234).

A validade histórica do marxismo revolucionário reside na sua escolha da classe trabalhadora como agente da emancipação da humanidade. Isto porque este agente é válido para todo o período de vigência do sistema de sociometabolismo do capital, pois não surgem novos agentes revolucionários e teorias revolucionárias desta sociedade a cada nova mudança conjuntural do capitalismo. Daí, Mészáros afirma a validade histórica do marxismo – para o futuro previsível – como sendo a insuperável conceituação revolucionária das transformações estruturais em escala mundial.

Marx instaurou a ideologia marxista, determinando a categoria trabalho como agente da emancipação da humanidade. Esta afirmação é válida para todo o período de vigência do sistema de sociometabolismo do capital, pois o trabalho é a classe antagônica ao capital.

Porém, isto não significa que na obra do próprio Marx possam ser encontradas todas as informações necessárias à emancipação da humanidade. O marxismo deve se desenvolver, acompanhando o desenvolvimento histórico do sistema de sociometabolismo do capital. De acordo com Mészáros:

A consideração do tipo de transformação social prevista pela visão marxiana tem de avaliar não apenas as dificuldades inerentes à própria magnitude das tarefas a serem realizadas, mas também deve ser capaz de enfrentar as complicações que inevitavelmente surgem das contingências sócio-históricas mutáveis, à luz das quais as proposições da teoria original devem ser reexaminadas e, caso necessário, adaptadas às novas circunstâncias. (MÉSZÁROS, 2004, 329).

Mészáros coloca, portanto, a necessidade de revivificar o marxismo. Afirma:

Insistir na validade temporal da teoria marxiana equivale a reconhecer que sua validade é apenas temporal. Em outras palavras, significa reconhecer que, apesar de o quadro conceitual geral desta teoria abarcar a época capitalista em sua totalidade, ela deve ser constantemente revivificada através de reelaborações específicas em resposta ao desafio da relação de forças necessariamente em mudança no quadro global do desenvolvimento desigual. (MÉSZÁROS, 2004, p. 236).

E, na realidade, não há um marxismo ideal abstrato, mas uma multiplicidade de marxismos em competição e luta uns contra os outros. Alguns são fundados no próprio Marx,

pois conservam “tanto as idéias centrais como os correspondentes princípios metodológicos

da concepção original” (MÉSZÁROS, 2004, p. 316). São fundados no próprio Marx também

por visarem como meta final a emergência da sociedade comunista, com a qual, segundo o filósofo alemão, se iniciará a verdadeira história da humanidade.

147 O marxismo, na opinião de Mészáros, é o sistema vivo de pensamento mais

abrangente de nosso tempo, “por conta de sua contínua capacidade de oferecer – apesar dos

numerosos revesses e reversões sociais e das revisões teóricas correspondentes – um quadro para a crítica radical tendo em vista uma reestruturação fundamental da sociedade em sua

totalidade” (MÉSZÁROS, 2004, p. 307).

O marxismo só morrerá com a morte do sistema do capital. Quando o marxismo se realizar na história, pela transformação radical da forma da vida social, “a abordagem

marxiana perde sua importância e significado como uma irreprimível ‘filosofia viva’ e se

transforma no monumental documento histórico de uma época passada, como ocorreu com

outros grandes sistemas ‘totalizantes’ antes dela” (MÉSZÁROS, 2004, p. 307). O autor acrescenta: “Desse modo, paradoxalmente, a concepção marxiana só pode se tornar vitoriosa com a condição de ‘falir’ e deixar de ser a filosofia viva – isto é, o quadro orientador

abrangente – das forças mais progressistas da época” (MÉSZÁROS, 2004, p. 308).