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1. O DANO EXISTENCIAL NO DIREITO DO TRABALHO

2.4. O DIREITO À DESCONEXÃO DO TELETRABALHADOR

visem à melhoria de sua condição social: [...]

XIII - duração do trabalho normal não superior a oito horas diárias e quarenta e quatro semanais, facultada a compensação de horários e a redução da jornada, mediante acordo ou convenção coletiva de trabalho;

Para o juiz do Trabalho da 4ª Região, Átila da Rold Roesler, a inclusão do inciso III no art. 62 da CLT, provoca um retrocesso, pois o empregado, sem o controle de horas trabalhadas, pode ser cobrado apenas por metas estabelecidas, independentemente da carga horária semanal que tenha que realizar para atingi-las.

Dessa forma, a modalidade de teletrabalho é significativamente alterada, e as condições de trabalho realizado nessa situação são profundamente precárias.60

Logo, na prática, o teletrabalho acarreta mais prejuízos do que benefícios para o trabalhador que adere a essa modalidade, pois o intuito de grandes empresas é a redução de custos para elas e a obtenção de lucro. Tal modalidade tem grande semelhança com o modelo fordista, quando se trata da coerção, do controle imposto e a constante vigilância ostensiva e rigorosa. Porém, hoje em dia, essa vigilância é feita por sistemas de controle aprimorados, em decorrência da evolução da tecnologia.

Cabe registrar, por fim, conforme destacam Wilson Ramos Filho e Sylvia Malatesta das Neves:

O teletrabalho, desse modo, revela-se realidade complexa e ambígua, que ganha nova expressão no atual contexto do capitalismo flexível, como mais uma possibilidade de flexibilização que combina formas antigas e novas de gestão de força de trabalho. Não se pretende, obviamente, defender que todo o teletrabalho é sinônimo de precariedade, mas sim expor que o trabalho informacional não traz uma autonomia específica ao trabalhador, já que, ao contrário, tem gerado maior insegurança e precarização do trabalho, pois em grande parte continua a expressar empregos de baixa qualificação.61

2.4. O DIREITO À DESCONEXÃO DO TELETRABALHADOR

60ROESLER, Átila Da Rold. Reforma trabalhista prejudicou muito a vida de quem “trabalha em casa”.

Justificando, 29 ago. 2017. Disponível em: http://www.justificando.com/2017/08/29/reforma-trabalhista-prejudicou-muito-vida-de-quem-trabalha-de-casa/. Acesso em: 08 out. 2019.

61FILHO, Wilson Ramos; NEVES, Sylvia Malatesta das. Trabalho imaterial e teletrabalho:

contradições e limites da sociedade informacional. In: COLNAGO, Lorena de Mello Rezende el al (Coords.); STOLZ, Sheila; MARQUES, Carlos Alexandre Michaello Marques (Orgs.). Teletrabalho. São Paulo: LTr, 2017, p. 39.

Em meados do século XXI, o desenvolvimento tecnológico assume papel de destaque na sociedade, e por esse motivo, Fernanda Marders e Bárbara Michele Morais Kunde acham relevante que:

o direito seja uma força para garantir os direitos individuais, notadamente no âmbito do Direito do Trabalho, pois que o avanço tecnológico das ferramentas comunicativas tem provocado profundas modificações na prestação do trabalho.62

Como bem já salientado, com o avanço dessas inovações tecnológicas, o trabalho em domicílio ou home office, ganhou nova dimensão. O artigo 6º, caput da CLT deixa claro que:

Art. 6º Não se distingue entre o trabalho realizado no estabelecimento do empregador, o executado no domicílio do empregado e o realizado a distância, desde que estejam caracterizados os pressupostos da relação de emprego.63

Ou seja, a todos os tipos de trabalho, seja ele realizado na empresa ou à distância, serão assegurados seus direitos e observados os seus fundamentos, por não haver distinção.

A Constituição Federal define o trabalho como um direito social, ou seja, é um direito que estabelece condições para a realização da dignidade da pessoa humana.

Sendo assim, o descanso do trabalhador é um dos elementos principais de uma existência digna, relacionado com o direito à desconexão e ao lazer.

O direito do trabalho, sempre se viu preocupado com as questões relacionadas à jornada de trabalho. Limitar a jornada é fundamental para que se concretizem os direitos fundamentais concernentes à vida, à saúde e à dignidade do trabalhador. Com a introdução dos meios telemáticos, houve uma alteração, de forma significativa, nas jornadas, de modo que se torna mais difícil separar o tempo à disposição do empregador e o tempo de descanso.

62MARDERS, Fernanda; KUNDE, Bárbara Michele Morais. O direito de desconexão no teletrabalho como concretização do princípio da igualdade na sociedade contemporânea. In: COLNAGO, Lorena de Mello Rezende; CHAVES JUNIOR, José Eduardo de Resende; PINO ESTRADA, Manuel Martin (Coord.). Teletrabalho. São Paulo: LTr, 2017, p. 125.

63Vade Mecum Acadêmico de Direito Rideel/Anne Joyce Angher, organização.-24. ed.- São Paulo:

Rideel, 2017 (Série Vade Mecum). p. 23.

Faz-se necessário analisar o direito à desconexão nessa modalidade de trabalho, pois a falta de análise faz violar direitos fundamentais dos trabalhadores. É certo que a tecnologia possibilita, aos seres humanos, uma vida mais confortável e, em relação ao trabalho, pode até eliminar a sua penosidade, que, se utilizada de forma errada, poderá acarretar sérios desajustes na ordem social.

Sob tal perspectiva, Adalberto Martins e Felipe Marinho Amaral assinalam que, por direito à desconexão, entende-se:

[...] o limite ao excesso de conectividade ao trabalho, garantidor de sadia qualidade de vida ao trabalhador. É o direito do empregado, em seus momentos de folga, férias, feriados, ou ao fim de sua jornada, não estar à disposição do empregador, devendo se desconectar totalmente de seus afazeres, com a finalidade de descansar e se revigorar física e mentalmente.64

Sendo assim, o direito à desconexão engloba o direito ao lazer e o direito ao não trabalho. O direito ao lazer encontra-se positivado na Constituição da República, em seu art. 6º, já o direito ao não trabalho, segundo Jorge Luiz Souto Maior:

[...] não se está tratando de uma questão meramente filosófica ou ligada à empregadores estão deixando passar, baseando-se em um trabalho sem tempo regulamentado para o descanso. O empresariado está habituado a entender o ócio como o tempo de vagabundagem ou inutilidade, contudo, baseando-se neste conceito, perdem-se inúmeras idéias excelentes todos os dias, pelo cansaço imposto ao trabalhador que não tem tempo para o pensamento, mas somente, para rotina de trabalho.66

É preciso destacar que o direito ao não trabalho não significa não trabalhar, mas sim de poder realizar outras atividades sem estar submetido a um controle do

64MARTINS, Adalberto; AMARAL, Felipe Marinho. O direito à desconexão no teletrabalho. Revista de Direito do Trabalho, São Paulo,Vol. 45, 2019, p. 201-221.

65SOUTO MAIOR, Jorge Luiz. Direito à desconexão do trabalho. Revista do Tribunal Regional do Trabalho da 15ª Região, Campinas, n 23, 2003. Disponível em:

https://juslaboris.tst.jus.br/bitstream/handle/20.500.12178/108056/2003_maior_jorge_direito_descone xao.pdf?sequence=1&isAllowed=y. Acesso em: 09 out, 2019, p. 2.

66DE MASI, Domenico. O ócio criativo. Tradução Léa Manzi. Entrevista Maria Serena Palieri. Rio de Janeiro: Sextante, 2000.

empregador. Pois, é certo que o teletrabalhador pode ser monitorado pelo seu empregador durante o seu tempo de trabalho, seja por telefone, meios interativos, entre outros, o que faz com que o art. 62, inciso III da CLT deixe de ser aplicado.

Bem como, caso a sua jornada ultrapasse o limite constitucional, deve receber horas extras, já que a própria CLT não diferencia o trabalhador em seu art. 6º.

Assim sendo, o direito à desconexão se mostra importante no teletrabalho, tendo em vista que este não possui o controle de sua jornada, fazendo com que se trabalhe e fique conectado por muito mais tempo ao trabalho do que outros trabalhadores que trabalham no espaço empresarial, por exemplo.

A falta de tal desconexão faz com que não seja assegurado o cumprimento do princípio da igualdade. Raimar Rodrigues Machado diz que esse importante princípio visa proteger os hipossuficientes, os mais vulneráveis nas relações contratuais e negociais, criando uma igualdade material para mitigar as diferenças existentes, pois, não basta uma igualdade formal reconhecida pela lei, é preciso que ela também seja material, ou seja, tenha efetividade no plano pragmático para que as liberdades individuais não sejam mitigadas.67

Martins e Felipe Marinho Amaral, assim preceituam:

[...] o fato de o empregado se encontrar enquadrado na exceção do art. 62, III da Consolidação das Leis do Trabalho, não permite o labor ininterrupto a qualquer hora do dia e a qualquer dia da semana. É indispensável que o trabalhador exerça o seu direito fundamental à desconexão, o qual envolve tanto o lazer quanto o direito ao não trabalho. E, na hipótese de desrespeito a tais direitos fundamentais, impõe-se a reparação pecuniária [...].68

Portanto, cumpre dizer que o direito de se desconectar é de grande importância para essa modalidade de trabalho introduzida na CLT, tendo em vista a sua maior facilidade de extrapolação de jornada e de períodos trabalhados, fazendo com que o teletrabalhador deixe de realizar suas atividades e exercer seus direitos fundamentais previstos na Carta Magna.