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CAPÍTULO I REVISÃO DA LITERATURA

1. AS TÉCNICAS DE DANÇA

1.6 O ENSINO APRENDIZAGEM DA DANÇA

1.6.3 O ensino-aprendizagem na infância

O ensino artístico da dança surge nos currículos no 1.º ciclo do ensino básico, abrangendo crianças dos 6 aos 10 anos de idade. Considera-se então que integram o período final da infância, correspondente ao período escolar, iniciado aos 6 anos (Tavares, Pereira, Gomes, Monteiro & Gomes, 2007). Nesta fase, o corpo perde um pouco da estrutura infantil, verificando-se mudanças graduais no tamanho e proporções bem como nas formas corporais, apesar de forma discreta. Para além de existir um pico no crescimento, “A motricidade grossa evolui significativamente, possibilitando que por volta dos 5 anos, a criança desenvolva diversas atividades com mais flexibilidade e rigor.” (Tavares et al., 2007, p. 52), permitindo a aquisição de múltiplas capacidades, como por exemplo, as capacidades coordenativas e a flexibilidade. A este respeito, Michael & Simmel (2014) referem que quanto mais jovens são os bailarinos maior é a sua flexibilidade. Logo, o seu trabalho deve ser feito de forma gradual desde o início do ensino básico, pois, naturalmente, a flexibilidade começa a reduzir a partir desta fase, visto que existe um aumento normal da rigidez dos ligamentos capsulares que constitui uma limitação natural do movimento. O crescimento do corpo é lento e a variação no tamanho, forma e maturação corporais é espoletada pelos genes, pela nutrição, pela família e pela estrutura social e, por isso, assiste-se constantemente a mudanças no ensino-aprendizagem das várias gerações (Buckroyd, 2000; Tavares et al., 2007). No âmbito das ciências da motricidade, Barreiros, Cordovil & Neto (2014) afirmam que os indivíduos com idades a partir dos 7 anos entram numa fase denominada como fase dos movimentos especializados. A este respeito os autores referem que esta fase se distingue “(...) pela aplicabilidade dos comportamentos a contextos muito específicos de aplicação, como as atividades desportivas. Não consistem em evoluções ‘naturais’ dos movimentos fundamentais, mas sim variações únicas aprendidas e aperfeiçoadas num conjunto de condicionantes bem definidas, mediante processos complexos de técnica.” (p.60). Michael & Simmel (2014) e Krasnow & Wilmerding (2015) acrescentam ainda, no âmbito do treino em dança, que, depois de aprender a caminhar, a criança começa a correr, a saltar e a galopar, sendo que cada uma destas transições requer uma evolução progressiva e gradual de competências como a coordenação, força e até resistência, visto que os sistemas sensoriais se desenvolvem em conjunto com o sistema motor. Apesar disso, existe um maior foco no desenvolvimento da coordenação, pois esta auxilia o próprio

crescimento e desenvolvimento da criança. Assim, quanto mais ágil for o uso dos músculos, melhor estarão preparados para as mudanças físicas que ocorrem com a puberdade. Além disso, a coordenação também significa uma maior “flexibilidade” cerebral, ou seja, um desenvolvimento do raciocínio, para mais tarde se poderem desenvolver diferentes combinações de movimento executados individualmente no lado direito e no lado esquerdo. Já a força deve ser desenvolvida em “parceria” com a coordenação, na fase final da infância, de forma a aumentar a massa muscular, mas que deverá ser mais afirmativa no decorrer da adolescência. A resistência deve ser realizada a partir do desenvolvimento de jogos, pois é o sistema músculo-esquelético e não o sistema cardiovascular que define, nesta fase, os limites da resistência (Michael & Simmel, 2014). Desta forma, o desenvolvimento motor permite desempenhar qualquer tarefa motora que não exija um grande nível de esforço e abstração, apesar de nesta fase as crianças desenvolverem uma rápida capacidade de resposta a qualquer estímulo. Daí que Meyer (2010) refira que dos 6 aos 8 anos as aulas de dança geralmente funcionam em períodos entre 40 e 45 minutos, sendo que apenas a partir dos 9 anos são capazes de suportar aulas de 90 minutos, pois os períodos de aulas mais longos oferecem mais oportunidades para uma estruturação da aula mais detalhada e desenvolvimento de projetos individuais que requerem uma maior autonomia no pensamento por parte do aluno. Assim, os períodos mais curtos são úteis para aumentar o desenvolvimento de habilidades em diferentes técnicas de dança e a sua direta aplicabilidade em coreografias, tão características desta fase de desenvolvimento.

No que respeita ao desenvolvimento cognitivo, a criança é dotada de um pensamento mágico, imaginativo e metafórico, expressando-se assim em inúmeras brincadeiras de “fazer de conta”, principalmente a partir de personagens fantasiosas. Por isso, comummente se focam na técnica de dança clássica (e até na dança criativa) que, pelas suas características alegóricas a tudo o que é mítico e fantasioso, adota o mesmo carácter. A este propósito, Michael & Simmel (2014) referem que, nesta fase, as “histórias de movimento” no espaço contribuem para desenvolver tarefas independentes onde o movimento por si só apoia as competências motoras e a criatividade que estimulam a autoconsciência através de um vasto leque de movimentos. Para além disso, a criança integra o que Piaget denominou como período pré-operatório, que se caracteriza pelo desenvolvimento sequencial de uma ideia, de acordo com alguns princípios lógicos, não demasiado abstratos (Tavares et al., 2007). Assim, esta fase é caracterizada por um grande impulso para o movimento e para o jogo14, espoletada pela curiosidade, sobretudo

14

Entenda-se por jogo “(...) uma modalidade que apresenta a tendência de abandono da realidade, através da atividade

lúdica, quer seja individual ou em grupo (...)” (Mota, 2012, p.64).

daquilo que lhes é menos familiar, pois existe uma forte imaginação e uma enorme vontade de aprender (Tavares et al., 2007; Michael & Simmel; 2014; Krasnow & Wilmerding, 2015). É ainda de destacar que Muir & Munroe-Chandler (2017) garantem que nesta fase de desenvolvimento cognitivo é fundamental a implementação da imagética nas aulas, de forma a melhorar o desempenho motor e de consciência corporal dos alunos. Ao nível do desenvolvimento psicossocial, as crianças consideram os pais como heróis, os professores justos e os amigos leais, logo são propícias para o trabalho em grupo como refere Meyer (2010). É nesta fase que “(...) as crianças constroem um quadro complexo de características físicas, intelectuais e sociais de si próprias e dos outros, o que possibilita a continuidade e aperfeiçoamento na construção do autoconceito.” (Tavares et al., 2007). A criança constrói, assim, um conjunto de respostas perante a sociedade e reconhece a importância dos outros na sua vida, através do desenvolvimento do autoconceito e a compreensão social por todos os que a rodeiam.