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O Espaço e as Correntes Ortodoxas e Heterodoxas da Economia do Desenvolvimento

O TERRITÓRIO DO DESENVOLVIMENTO

1.1 ANTECEDENTES DA IDÉIA DE DESENVOLVIMENTO

1.3.4 O Espaço e as Correntes Ortodoxas e Heterodoxas da Economia do Desenvolvimento

duas correntes – a estruturalista e a neomarxista – seguindo as referências dadas por autores várias vezes citados (Escobar, 1996; Aguado et al. 2005) e somando a essas as referências de Bielschowsky (1998) – especificamente em relação aos trabalhos da CEPAL – pode-se precisar a existência de uma corrente estruturalista e uma neomarxista, e fazendo parte dessa última, a teoria da dependência. Porém, a teoria da dependência com um maior desenvolvimento na América Latina, alimentou-se das fontes estruturalistas.

O segundo aspecto está relacionado com a classificação das etapas do pensamento

Cepalino feito por Bielschowsky (1998). Nessa classificação, o contexto histórico, no qual

cada etapa do pensamento se desenvolve, é altamente relevante para a formulação das duas correntes heterodoxas da economia do desenvolvimento de América Latina e, posteriormente, para seu declínio, é importante a transição para outros desenvolvimentos teóricos até o fim do auge da subdisciplina economia do desenvolvimento.

1.3.4 O Espaço e as Correntes Ortodoxas e Heterodoxas da Economia do Desenvolvimento

¿Cómo suelen abordar los economistas el espacio? Por decirlo en pocas palabras, la mayoría no lo trata en absoluto. En efecto, hay algo extraño en la manera en que buena parte de nuestra profesión ignora cualquier cosa que guarde relación con el lugar en el que se producen las actividades económicas

Krugman,1997 apud Coq Huelva, 2001

Como já mencionado na seção sobre a teoria da modernização, na década de 1950, desenvolveram-se conceitos e propostas para o desenvolvimento regional, concretizando-se nos anos 1960 em políticas de planejamento regional. Os trabalhos de Perroux, Hirschman e Myrdal elaborados no contexto da economia do desenvolvimento ou o que Krugman (1992)

chama de teoria do grande desenvolvimento38, deram maior ênfase aos fatores dinâmicos da aglomeração e colocaram as complementaridades entre indústrias e a geração de economias externas como fatores-chave de sua localização.

Os estudos desses autores confrontavam-se na época com os modelos tradicionais da localização industrial. Nas décadas de 1950 e 1960, a Associação Americana de Ciência Regional e um de seus mais reconhecidos representantes, W. Isard, trabalharam com os

postulados das antigas teorias da localização, como a formulada por Von Thünen em 182639, e

das pesquisas de início do século XX de outros geógrafos alemães, como Weber (1929), Cristaller (1933) e Lösch (1940), estes últimos representantes da escola de Iena (AMARAL FILHO, 2001; COG HUELVA, 2001; MONCAYO, 2001, 2003, s.d.). Isard e outros, como E. Moses e E. Hoover, mantiveram os fatores de localização utilizados pelos seus antecessores, dando um maior desenvolvimento aos elementos matemáticos da teoria da localização. Em síntese, esses estudiosos, com sua teoria dos lugares centrais, postularam a homogeneidade do espaço no qual a hierarquia urbana seria estruturada pelo mercado.

Esses desenvolvimentos teóricos sobre a aglomeração e a concentração industrial, anteriores à Segunda Guerra Mundial são denominados por Benko e Lipietz (1994) como a primeira ortodoxia da economia espacial, regional ou urbana, na qual de igual forma, incluem-se as teorias da academia norte-americana que seguem fielmente tais propostas e que não conseguem explicar o que leva à aglomeração urbana e à hierarquia interurbana. Segundo Moncayo (2001, p. 14), o argumento desses enfoques é tautológico: “la aglomeración de

productores en una localización proporciona ventajas y éstas ventajas, precisamente, explican la aglomeración. Éstas teorías suponen lo que están tratando de entende: la existencia de un mercado central urbano”.

A insuficiência explicativa dessas teorias é outorgada à homogeneidade do espaço por elas assumida, ao seu pressuposto neoclássico de equilíbrio (em que se descreve uma situação estática como ótima) assim como à utilização do conceito de economias externas de forma não apropriada, ou seja, sim estar associadas à concorrência imperfeita (COG HUELVA,

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Esse tema será abordado posteriormente.

39 Johann Heinrich Von Thünen (1783-1850) é considerado o fundador da teoria econômica da localização. Sua

principal obra, TheiIsolated State, foi escrita em três volumes publicados em 1826, 1842 e 1850. Em um espaço uniforme e homogêneo, localizam-se as atividades agrícolas, como de círculos concêntricos, contendo cada um deles um tipo específico de produção e organizados em torno de um mercado central (a cidade). Tal organização está determinada pelo valor do transporte e valor e qualidade da terra. As localizações ótimas das atividades agrícolas são as que ficam nos anéis próximos ao centro ou mercado, e isto devido aos preços de transporte, das técnicas da produção, dos valores relativos de produtos e fatores. Com esse modelo, pode-se explicar, tendo em conta o pressuposto de uniformidade e homogeneidade de espaço, as rendas dos agricultores e a divisão de trabalho urbano-rural, mas ele não pode explicar o motivo da existência de aglomerações urbanas especializadas em manufaturas ou serviços terciários, por exemplo (MONCAYO, 2001; BRUE, 2005; TORAL ARTO, 2001).

2001). Para Benko e Lipietz (1994), nem todos os comportamentos presentes nos processos de aglomeração obedecem a transações mercantis isoláveis. Existe uma atmosfera, à Marshall, em que se dão “efeitos de maravilhamento, de emulação, de trocas informais, de interação

não taxada próprio da aglomeração” (BENKO; LIPIETZ, 1994, p. 25; BENKO, 1999, p.53).

Posteriormente à Segunda Guerra Mundial, enfrentaram-se duas ortodoxias que tiveram sua maior ênfase durante os anos 1960 e1970 (BENKO; LIPIETZ, 1994 ; BENKO, 1999), cujas origens provêm das teorias de crescimento e desenvolvimento econômico e não das teorias espaciais, mas influenciaram as teorias e práticas do desenvolvimento regional (MONCAYO, 2001; s.d.). A primeira é uma combinação dos postulados de Colin Clark (1951), Rostow (1963) e Veron (1966). Na época, supunha-se que cada região ou país deveria passar pelas etapas do modelo de Clark (pré-industrial, industrial e pós-industrial), mas tal seqüência não se apresentava de forma uniforme em todas as regiões geográficas, o que se

explica pela teoria das etapas do crescimento de Rostow40. Soma-se, ainda o suposto de

Vernon segundo o qual os novos produtos inventados nas áreas desenvolvidas perdem importância (banalizam-se), deslocando-se a sua produção para áreas menos desenvolvidas (BENKO; LIPIETZ, 1994 ; BENKO, 1999). Como antes mencionado, segundo o modelo Rostow um país somente decolaria se fizesse reformas internas, e importasse as tecnologias dos países mais avançados.

A segunda ortodoxia que emergiu após 1945, rival da anterior – utilizando o termo usado por Benko e Lipietz (1994) – é a teoria da dependência, do centro-periferia ou do intercâmbio desigual. Como foi indicado na exposição sobre o estruturalismo e o neo- marxismo, dependendo dos autores que analisem essas correntes, os seus teóricos podem ser identificados como estruturalistas, neo-marxistas ou como transitando pelas duas correntes. No entanto, autores como Benko e Lipietz (1994), Cog Huelva (2001) e Moncayo (2001) não fazem essa distinção e indicam como propulsores da teoria da dependência autores como Amin (1973), Frank (1969), Enmanuel (1975) assim, como à CEPAL no período de 1960 a 1970. Porém, vale mencionar que a CEPAL só é citada por Moncayo (2001).

Para Cog Huelva (2001), que utiliza sobretudo os postulados de Amin (1974) e Enmanuel (1975), a teoria do centro e da periferia, foi uns dos primeiros intentos que visava abarcar a complexidade do real, utilizando postulados teóricos e metodológicos distintos dos presupostos das teorias tradicionais da localização apoiados na economia neoclássica..

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O atraso ou subdesenvolvimento relativo de uma região em relação a outra não seria estrutural, mas um efeito dos acasos da história que viu decolar uns primeiro dos outros por razões de estrutura interna (BENKO; LIPIETZ 1994); BENKO, 1999). É importante salientar que se faz referência ao estruturalismo na sua perspectiva estática e a-histórica, e não à diacrônica, histórica e comparativa do estruturalismo latino-americano.

Benko e Lipietz (1994)41, em sua análise, partem do fator divisão internacional do trabalho, mediante o qual, segundo a teoria estruturalista, se geraram as relações de dependência entre a periferia e o centro. Em uma primeira instância, esse raciocínio foi utilizado pelos teóricos do desenvolvimento, transladando-o de sua escala global (internacional) para a inter-regional, tentando explicar o desenvolvimento desigual de regiões na Franca, na Inglaterra e nos Estados Unidos de América. Contudo, essa abordagem enfrentou o desafio de explicar a existência da industrialização de subregiões periféricas naqueles países. De fato, ocorria o processo de industrialização, e uma da suas explicações se relacionava com o que Benko e Lipietz (1994) denominam dualidade Rostow-Vernon, no entanto, tal fenômeno não se apresentava de forma homogênea.

A afirmação anterior leva a definir uma nova divisão inter-regional do trabalho, que é

típica da organização fordista42 em que existem três funções sincrônicas no mesmo setor,

quais sejam: a concepção, a fabricação qualificada e a execução. Esta divisão foi considerada

“como a forma definitiva da organização cientifica do trabalho e o seu desdobramento foi batizado de circuito setorial” (BENKO; LIPIETZ, 1994, p. 28). Dessa forma, as regiões

desenvolvidas convertem-se no centro da organização do trabalho, e as atividades manuais (nível três de execução), deslocam-se para as regiões mais pobres.

Ao colocarem esse raciocínio de novo em escala internacional, as empresas multinacionais estruturavam as relações de trabalho e o centro do mercado sob a dependência dos países periféricos. Essa generalização, que incluía a divisão do trabalho no interior da indústria, é questionada por Benko e Lipietz (1994) Para estes autores, era apressado concluir

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Segundo Benko e Lipietz (1999), para os partidários da teoria da dependência, a causa do desenvolvimento de um país é o subdesenvolvimento de outros. Seria possível que os países subdesenvolvidos ascendessem pelos seus próprios meios ao capitalismo industrial, mas as relações de dominação política e a concorrência no mercado mundial cortaram o passo dos que chegaram depois: “Así se consolidaría de manera duradera una división internacional del trabajo entre un centro dominante, manufacturero y terciario, y una periferia dominada, exportadora de bienes primarios, agrícolas y mineros. El intercambio desigual impediría a la periferia acumular los medios para su despegue, mientras que los progresos de competitividad del centro les impondría barreras de entrada cada vez más altas” assinalam os autores (1994, p. 27).

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Sobre a organização fordista do trabalho, os autores citados esclarecem que esse tipo de organização é a combinação do taylorismo e a mecanização: El modelo de desarrollo fordista, que incluye además un modelo de crecimiento macroeconómico (o “régimen de acumulación”) basado en el consumo de masas, y un “modo de regulación”, un conjunto de costumbres y procedimientos que fuerzan a los agentes individuales a adptarse a ese régimen. (BENKO E LIPIETZ, 1994, p. 28). Complementando esse conceito, Lipietz (apud BENKO, 1999) desenvolve o conceito de fordismo periférico; trata-se de um autêntico fordismo, mas que permanece periférico. Quer dizer, em palavras de Benko (1999) o seguinte: “Nos circuitos mundiais dos ramos produtivos, os postos de trabalho e as produções correspondentes aos níveis da fabricação qualificada e sobretudo da engenharia permanecem largamente exteriores ao país. Por outro lado, os mercados correspondem a uma combinação específica do consumo das classes médias modernas locais e das exportações para o centro desses mesmos produtos manufaturados a baixo preço. Assim, o aumento da demanda social, notadamente para os bens duráveis das famílias, é decreto antecipado, mas não é institucionalmente regulado numa base nacional em virtude dos ganhos de produtividade dos ramos fordistas” (p. 237).

que existisse tal dependência sem ter presente uma “irreductivel especificidad de la sociedad

local, el papel del Estado local, a naturaleza de las relaciones y compromisos sociales locales, su próprio modelo de regulación garantizado por el Estado local, etc.” (BENKO;

LIPIETZ, 1994, p. 29). Segundo esse entendimento, as multinacionais ao intervirem em países da periferia encontraram um agente mais autônomo – o Estado local – com os seus agentes, conflitos e as suas ambições.

As particularidades locais e as capacidades existentes no local para gerar desenvolvimento produzem uma outra ortodoxia do desenvolvimento espacial, desenvolvimento regional endógeno. Retorna-se ao singular, à “personalidade regional,

colocar no centro da reflexão a personalidade do território local” (BENKO; LIPIETZ, 1994,

p.30), no capítulo II retoma-se essa questão, especificamente em relação às outras bases teóricas que dão origem ao tema de desenvolvimento endógeno.

1.3.5 Um Período de Transição: a Emergência de Novos Estilos de Desenvolvimento,