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O Segundo Elemento Heterodoxo da Economia do Desenvolvimento: o Neomarxismo

O TERRITÓRIO DO DESENVOLVIMENTO

1.1 ANTECEDENTES DA IDÉIA DE DESENVOLVIMENTO

1.3.3 O Segundo Elemento Heterodoxo da Economia do Desenvolvimento: o Neomarxismo

Na segunda metade da década de 1960, além da discussão feita pelos estruturalistas sobre a estratégia do desenvolvimento para América Latina, começou a ter uma maior visibilidade a crítica que teóricos marxistas ou neomarxistas vinham fazendo desde os anos 1950 à abordagem modernizadora da economia do desenvolvimento. Fernando Henrique Cardoso (2004) no prefácio da ultima edição do livro Dependência e desenvolvimento na

América Latina, menciona que, na época em que foi escrito tal texto – inicialmente um

relatório apresentado no ano do 1965 a Raúl Prebisch diretor da CEPAL – existiam dentre as muitas correntes para o desenvolvimento econômico, duas que tinham um maior peso na América Latina.

A primeira delas era desenvolvida pela CEPAL com autores como Furtado, Prebisch e Aníbal Pinto que trabalhavam ressaltando o progresso técnico e a industrialização, e o Estado seria a peça fundamental para acelerar a acumulação de capital. Na segunda corrente, liderada mais por centros universitários e movimentos políticos, o crescimento econômico e desenvolvimento dos países subdesenvolvidos seria alcançado no socialismo ou “na

intensificação do nacionalismo ‘terceiro-mundista’, para romper os laços de dependência colonial ou submissão ao imperialismo” (CARDOSO; FALETTO, 2004, p.8). Na primeira

visão, sobretudo a referente à corrente estruturalista, o pensamento marxista, segundo Furtado (2000b), foi retomada, uma vez que se dava prioridade à análise das estruturas sociais como meio para compreender as variáveis econômicas.

Já para o caso da segunda visão, a que se referiu Cardoso, autores como Del Búfalo (1985), Escobar (1996), Hidalgo (1998), Aguado (2005), Herrera (2006), coincidem em apontar Paul Baran (1963 [1952]) e seu artigo Sobre a economia política do atraso como o impulsionador da teoria da dependência. Esse autor estabelece uma conexão entre a moderna

teoria do imperialismo37 e a teoria neomarxista da dependência. Baran (1963) faz uma forte

crítica ao sistema capitalista, atribuindo-lhe as tensões sociais e econômicas próprias dos países subdesenvolvidos. Sem melhorar as condições de vida dos povos dos países mais atrasados, o capitalismo ocidental conseguiu “quebrar tudo o que ficava de coerência

‘feudal’” em tais sociedades atrasadas. À exploração exercida pelos nobres fazendeiros

somava-se a racionalidade do mercado capitalista, aprofundando a injustiça. Além disso, os parâmetros de nível de vida que foram mostrados pelos países desenvolvidos fizeram surgir

“aspirações, invejas e esperanças”. Por outro lado, o suporte cultural dos países

subdesenvolvidos, herdado da tradição feudal, as condições de pobreza de sua classe média, e a pouca confiança de tal classe para assumir a direção da sociedade, entravam em oposição à classe feudal, ocorrendo uma acomodação à ordem predominante. Segundo Baran (1963), se o capitalismo se mostrava incapaz de lutar contra o conservadorismo de posições herdadas e de privilégios tradicionais, então teria que se gerar um novo ethos social, o ethos do esforço coletivo com predomínio dos interesses da sociedade sobre os interesses de uns poucos escolhidos.

Essa concepção propôs, em última instância, uma revolução socialista nos países subdesenvolvidos para sair da estagnação manifestada na baixa do ciclo econômico. Surgiram numerosos seguidores da proposta feita por Baran, assim como diversas as correntes que se geraram, além das classificações dessas correntes.

Aguado et al. (2005) distinguem como linhas de pensamento da corrente neomarxista a teoria da dependência e a teoria do sistema mundial de Wallerstein, as quais cimentam as bases dessa corrente e incentivam os seus desenvolvimentos posteriores. Em ambos os casos,

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Segundo Higalgo (1998) os neomarxistas da América do Norte, herdeiros da antiga teoria do imperialismo formulada por Hobson, Lenin, Luxemburgo e Hilferding, desenvolveram, após o término da Segunda Guerra Mundial, o que se chama a moderna teoria do imperialismo.

o “subdesenvolvimento era a conseqüência inevitável do processo histórico do

desenvolvimento capitalista” (p. 17). Guiando-se por Bustelo (1992) Aguado et al. (2005)

enumeram três linhas ou correntes de pensamento como as mais representativas da teoria da dependência: a) a teoria da dependência como teoria geral do subdesenvolvimento (Amin, Frank, Do Santos) b) a proposta da CEPAL para a qual é possível o crescimento econômico, mas desde que sejam enfrentados os obstáculos esternos e internos ao desenvolvimentos (Furtado, Sunkel, Prebisch); c) a crítica às duas anteriores, na qual Cardoso e Faletto propõem o conceito de desenvolvimento dependente associado em que o enfoque da dependência é o meio para analisar as diversas situações de subdesenvolvimento.

Hidalgo (1998), ao fazer a diferenciação entre a teoria estruturalista da dependência e a neomarxista da dependência, argumenta que essa última se diferencia da primeira porque os neomarxistas não acreditavam na possibilidade do desenvolvimento econômico. Na realidade, como dizem Aguado et al. (2005) para os autores mais representativos da corrente neomarxista, sobretudo os enunciados no item a), as economias dos países subdesenvolvidos continuariam estagnadas até que saíssem do sistema capitalista dominante.

Cardoso (2004) e Faletto (1998) são chamados na América Latina os pais da teoria da dependência. Esses autores, em textos produzidos separadamente, quase quarenta anos depois de terem escrito Dependência e Desenvolvimento na América Latina, preocupam-se por ressaltar o contexto histórico no qual foram desenvolvidas as diversas tendências da teoria da dependência, em razão da força ideológica que tal fenômeno, a dependência, tinha em uma época em que estavam ocorrendo eventos políticos complexos, como a Revolução Cubana, a morte do Ché Guevara, a mudança de um setor da igreja católica que adotaram uma visão mais progressista e próxima da esquerda tradicional e, dentre outros, os indícios no Chile de uma “transição pacífica ao socialismo” (FALETTO 1998, p. 111). Nesse contexto, o termo dependência, nas palavras de Cardoso (2004), era mágica. Ele e Faletto (1998) foram, como já se disse, críticos das concepções em que a dependência era interpretada pela ótica de que o desenvolvimento era um problema de poder em uma relação imperialista. As diferenças entre as diversas correntes dependentistas estavam marcadas pelo traço de poder existente e de poder possível nas relações entre os países desenvolvidos e os subdesenvolvidos (FALETTO, 1998).

O fenômeno de dependência, mediante o qual se procurava entender o comportamento social e econômico dos países subdesenvolvidos não foi rompido, embora, como enfatizado pelos autores mencionados no parágrafo anterior, as dependências da década de 1960 foram, como é obvio, interpretadas nesse contexto histórico com base em uma larga tradição do

pensamento econômico. Como o diz Singer (1998), na atualidade, passou-se da dependência tolerada à dependência desejada, em virtude do aprofundamento da integração entre os países desenvolvidos, em desenvolvimento e os emergentes.

Por último, em relação às duas correntes heterodoxas da economia do