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Diplomas Legais e Jurisprudência

3. O Fenómeno da Violência Associada ao Futebol

A partir do momento em que o futebol se difundiu e desenvolveu por todo o mundo, foi ganhando crédito, aumentando a competição e a rivalidade entre equipas e influenciando os comportamentos dos apoiantes mais acérrimos. Há mesmo quem considere que a violência entre grupos organizados passou a ser uma preocupação social "uma vez que assumiu característica de acontecimento banal, débil e vazio", tornando-se também "um incómodo aos interesses em torno do evento desportivo". (Pimenta, 2000, p. 125)

Muitas são as teorias que tentam explicar a violência em geral e, especialmente, a violência associada ao deporto. Porém, surge a questão do motivo que leva a que a generalidade das manifestações se restringir ao futebol, sendo as ocorridas noutras modalidades uma fracção ínfima do todo. Segundo o Dr. Rui Pereira (Ministro da Administração Interna), num discurso proferido numa conferência em Bruxelas, a

83 violência associada ao futebol é "uma forma específica de comportamento anti-social" e que "tem a particularidade de ocorrer no contexto de competições, que, pela forte carga emotiva que geram, acabam por servir, com frequência de pretexto ou oportunidade situacional para comportamentos desviantes"83. Essa ideia sai reforçada com o texto da Convenção Europeia sobre a Violência e os Distúrbios dos Espectadores por ocasião de Manifestações Desportivas e nomeadamente Jogos de Futebol ao considerar a violência como um "fenómeno social actual de grande envergadura cujas origens são essencialmente exteriores ao desporto, e que o desporto é frequentemente o palco de explosões de violência"84 .

De entre os fenómenos violentos destacamos a utilização de códigos e símbolos de filiação aos grupos, usados para incentivar a violência, quer física, quer verbal. Pimenta (2000) afirma mesmo que, à medida que os actos de agressividade aumentam, proporcionalmente, cresce a procura e a filiação ao movimento do grupo. É evidente que o futebol atrai jovens aos estádios, e, por vezes, fruto do resultado da partida ou pelo inconformismo com as decisões do árbitro, despoletam acções mais hostis e violentas.

De à uns tempos a esta parte, a violência associada ao futebol, mais propriamente a ocorrida entre adeptos dos grupos organizados, vem ganhando uma parte significativa na agenda social, em especial nos meios de comunicação. Este não é um fenómeno recente, havendo inúmeros exemplos ao longo da história do futebol mundial de acções violentas de extrema impetuosidade. (Pimenta, 2000; Coelho & Pinheiro, 2002)

De entre os inúmeros acontecimentos trágicos ocorridos ao longo dos anos, destacamos aqueles que, na nossa opinião, consideramos mais violentos ou que tiveram repercussões sociais mais visíveis os ocorridos no Peru (em 1964), na Argentina (em 1968), em El Salvador e Honduras (em 1969), na Colômbia (em 1982), na Bélgica (em 1985) e em Inglaterra (em 1989), e que seguidamente apresentamos uma breve descrição do sucedido:

 A 24 de Maio de 1964, em Lima, Peru, um golo anulado à selecção da casa, no último minuto e que teria apurado os peruanos para os Jogos Olímpicos de Tóquio, num jogo frente à Argentina, originou fortes confrontos entre os adeptos. A polícia lançou gás lacrimogéneo para a bancada norte e, obedecendo à administração do estádio, trancou os portões de saída com fortes cadeados. Do terrífico massacre resultaram 318 mortos e meio milhar de feridos, a maior parte esmagadas por adeptos atordoados pelo gás. Face a estas decisões, os adeptos continuaram a violência nas

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Discurso consultado a 28 de Novembro de 2010, em: http://www.eu2007.pt/NR/rdonlyres/ 0CF505CA-20B9-4379-A0C8-7AF672E5494/0/20071129DiscursodoMAIviolencianodesporto.pdf

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84 ruas da cidade, tendo sido decretada a lei marcial durante os 30 dias seguintes. (Coelho & Pinheiro, 2002)

 Em Buenos Aires, no dia 23 de Junho de 1968, um desastre no jogo que opunha o River Plate ao Boca Juniors originou 71 mortos e 150 feridos. São muitas as hipóteses lançadas para justificar o ocorrido, havendo quem atribua a culpa ao facto de uma das portas de saída estar trancada e, os adeptos que vinham mais atrás, não se apercebendo do sucedido, esmagaram os primeiros. Outra das hipóteses justifica o que aconteceu com o lançamento de tochas e bandeiras queimadas entre os adeptos rivais, levando ao pânico geral entre os espectadores. (Coelho & Pinheiro, 2002; Bleacher Report, Inc. )

 Talvez o acontecimento mais grave de toda a história do futebol tenha ocorrido em 1969, em El Salvador e Honduras. Num jogo a contar para o Campeonato do Mundo do México, que opunha as selecções desses dois países, El Salvador sai vencedor por 3-2 e, face ao resultado do encontro, agravado pelo clima de tensão já existente entre os dois países, os adeptos hondurenhos despoletaram um ataque sobre os adeptos salvadorenhos que viviam nas Honduras. Como represália, o Governo de El Salvador decretou guerra às Honduras, lançando um forte ataque armado que durou cerca de uma semana, altura em que a intervenção da Organização dos Estados Americanos sanou com o conflito. (Zuljan, 2001; Coelho & Pinheiro, 2002)

 Num jogo em Cali, cidade colombiana, a fuga em massa de centenas de pessoas resultou em 22 mortos e mais de 160 feridos. Tudo leva a crer que as pessoas estariam a tentar sair da bancada apressadamente por estar um grupo de jovens adeptos a urinar da bancada superior, o que levou ao pânico na bancada inferior. (Coelho & Pinheiro, 2002)

 No estádio de Heysel, em Bruxelas, no dia 29 de Maio de 1985, uma hora antes da final da Taça dos Campeões, entre o Liverpool e a Juventus, um muro desmorona- se fruto dos confrontos iniciados pelos adeptos ingleses, causando 39 mortes e ferimentos em mais de 400 pessoas. Como consequência, os clubes ingleses foram proibidos de participar nas competições europeias num período de cinco anos. (BBC News; Coelho & Pinheiro, 2002)

 A 15 de Abril de 1989, em Hillsborough (Sheffield), horas antes da final da Taça FA, que opunha o Liverpool ao Nottingham Forest, 95 pessoas morreram e mais de 200 ficaram feridas consequência da compressão de inúmeros adeptos contra as grades de segurança por parte de uma multidão desejosa de entrar no estádio. Desta tragédia resultou a supressão das grades de segurança e na imposição de que os estádios passassem a ter exclusivamente lugares sentados. (Coelho & Pinheiro, 2002)

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Anexo B - Subculturas Associadas a Adeptos de Futebol