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Parte I: A proposta de convergência

2. Os regimes da Segurança Social e da CGA

2.3. O financiamento dos sistemas previdenciais

O financiamento dos sistemas previdenciais tem sido a principal razão subjacente à elaboração de reformas, tendo em vista a arrecadação de receita, sendo que esta tem sido primordialmente obtida através dos rendimentos dos pensionistas.

Como já referimos anteriormente, as contribuições e quotizações bem como as transferências provenientes do Orçamento de Estado são as fontes de receita dos sistemas previdenciais55.

No caso do RGSS temos vindo a assistir a um desequilíbrio entre o número de contribuintes e pensionistas, motivo pelo qual hà a necessidade de atenuar os desequilíbrios existentes constitui-se um fundo de reserva que serve para atenuar esses mesmos desequilibrios.

No caso da CGA a questão do financiamento é mais grave, com o encerramento do sistema a novos subscritores e o aumento exponencial dos pensionistas, assistiu-se a um desequilibrio financeiro pela diminuição do rácio entre subscritores e pensionistas.

O ponto em questão revela-se pertinente para se entender a necessidade de adquirir receita através de novas fontes de financiamento, neste caso através da redução de pensões.

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2.3.1. O financiamento do Sistema Previdencial da Segurança Social

O sistema da segurança social assegura diversas funções sociais, as quais estão inscritas na LBSS, à custa do financiamento56 dos contribuintes. Ora esse mesmo financiamento obedece

a dois principios fundamentais: o da diversificação das fontes de financiamento (várias fontes de financiamento) e o da adequadação seletiva das contribuições às funções sociais.

O regime de financiamento adotado em Portugal, previsto nos regimes da LBSS e do DL nº 367/2007 de 2 de Novembro, referem que o regime financeiro deve conjugar as técnicas de repartição (pay-as-you-go).

O regime de financiamento aplicável ao sistema previdencial assenta no seguinte: as receitas com as contribuições financiam as despesas atuais com pensionistas, funcionando aqui o princípio da solidariedade intergeracional.

Em conjunto com o sistema de repartição existem as técnicas de capitalização, em que as receitas cobradas tem como destino o pagamento de benefícios futuros dos trabalhadores que as suportam.

Desta forma, o estado paga as prestações imediatas a que haja lugar e rentabiliza o remanescente de forma a assegurar no futuro as correspondentes pensões, ajustando-se assim as duas técnicas às condições económicas, sociais e financeiras57.

Na reforma de 2007, a receita contributiva passou a estar canalizada para o financiamento de despesas de natureza contributiva, não patrocinando desta forma despesas de natureza não contributiva.

A partir de 2008 o financiamento das várias prestações pagas pelo sistema previdencial passaram a ser asseguradas por receitas do Orçamento de Estado e por receitas fiscais consignadas.

Ora, no sistema previdencial a receita das contribuições e quotizações (contribuições sociais) constitui a sua principal fonte de financiamento, atingindo em 2011 cerca de 86%.

Esta receita é obtida por aplicação de uma taxa contributiva aos rendimentos profissionais considerados relevantes (base de incidência contributiva) que, segundo APELLES CONCEIÇÃO58,

resumem-se “ao conjunto de valores passíveis de contribuições para a segurança social”.

56 Cfr. artigos 87º e seguintes da LBSS.

57 Cfr. artigo 92º LBSS.

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A taxa que assegura a cobertura de todas as eventualidades59 corresponde à taxa

contributiva global, embora existam outras taxas contributivas no sistema previdencial com um âmbito material mais reduzido.

Ora a receita de contribuições sociais é em parte partilhada entre o sistema previdencial- repartição e o sistema previdencial- capitalização. A regra é privilegiar o financiamento das despesas com prestações sociais de natureza contributiva e das políticas ativas de emprego e formação profissional.

Para este financiamento, está consignado legalmente uma parcela entre dois a quatro pontos percentuais da receita de quotizações dos trabalhadores à capitalização pública de estabilização, que é transferida anualmente, bem como os saldos do sistema previdência- repartição.

Por forma a fazer face aos desiquilibrios estruturais foi criado o Fundo de Estabilização Financeira da Segurança Social que tem como missão principal o reequilibrio, oferecendo uma maior solidez face a desequilibrios estruturais60.

A necessidade de assegurar o reequilibrio obriga a que se recorra a outras formas de financiamento previstas na LBSS de forma a assegurar o pagamento das prestações em causa. Exemplo desta necessidade foi a consignação, entre 2005 e 2009, da receita equivalente a 1% do IVA que se destinou ao financiamento de despesas de natureza contributiva e não contributiva61.

2.3.2. O Financiamento do Sistema Providencial da Caixa Geral de Aposentações

O financiamento deste sistema previdencial segue os mesmos moldes do regime geral da segurança social. Todavia o modo como tem sido financiado é a grande questão e o motivo que justifica a adopção desta medida que prentendemos análisar.

Ao longo dos últimos anos verificou-se um grande desequilíbrio das contas da CGA, motivo pelo qual o Estado teve que intervir no sistema, financiando-o através de dotações orçamentais provenientes do Orçamento de Estado.

No atual contexto sócio-económico, a viabilidade deste subsistema é colocada em causa,

59 Quando falamos em eventualidades referimo-nos a situações que determinam a atribuição da prestação tais como o desemprego, a

invalidez, a velhice ou morte de um cônjuge.

60 Para mais desenvolvimentos ver Noémia GOULART, O financiamento da Segurança Social, in Por Onde Vai o Estado Social em Portugal ? ,

organização de Fernando Ribeiro Mendes e Nazaré da Costa Cabral, Vida Económica, 2014, págs 310 e seguintes.

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por um lado com a diminuição das receitas e por outro o aumento da despesa pelo facto de haver um grande aumento de beneficiários e dos respetivos períodos de benefício da pensão.

Neste contexto, a doutrina62 dá-nos um contributo importante ao fazer um enquadramento

da situação financeira da CGA: o peso da despesa com pensões da CGA representa quase 40% do total (5,6% em 14,8%), o número de pensionistas da CGA não chega a 17% do total de beneficiários dos dois sistemas públicos de pensões.

Para termos uma ideia do valor das despesas, passamos a analisar o período de 2010 a 2013.

Neste espaço de tempo, o peso das despesas com pensões da CGA sobre PIB subiu cerca de 8% ao ano (em contraste com um crescimento negativo de -1,5% do PIB), num aumento total de mais de 25% em três anos (em contraponto com uma evolução global negativa de -4,4% do PIB). Em termos comparativos entre o RGSS e o regime da CGA, face aos quase 15% do PIB que representam as despesas com pensões, as despesas com salários da função pública representam cerca de 10% do PIB, as despesas em investimento e em encargos com o funcionamento em 2013 representam 2% e 5%, respetivamente63.

Mas mais preocupante ainda é o défice estrutural existente entre o financiamento das despesas com pensões da CGA através das receitas ordinárias (quotas dos trabalhadores subcritores e as contribuições das entidades empregadoras públicas) e as receitas extraordinárias. Em 2012 (e estima-se valor ainda superior para 2013), o estado teve que contribuir de forma extraordinária, através de transferências do Orçamento de Estado, com mais de 4 mil milhões de euros apenas para assegurar o financiamento das pensões CGA.

Ainda assim, não foram consideradas despesas que resultam de outras pensões que constituem encargo do Estado, encargo de terceiros 64 ou encargo de Fundos de Pensões

transferidos para a CGA.

Num cenário em que nada fosse feito, estima-se que o valor do défice do sistema atingisse os 12 mil milhões de Euros em 2037 (para se ter uma noção, este é um valor correspondente a mais de 7% do PIB de 2012).

Apenas em 2060 o valor do défice (que corresponde exatamente ao montante que tem que ser suportado pelo orçamento de Estado) regressaria aos níveis atuais.

62 Cfr. Hélder ROSALINO, Fundamentos à proposta de lei que estabelece mecanismos de convergência do regime de proteção social da

função pública com o regime da segurança social,op.cit, pág.17 e seguintes.

63Cfr. Hélder ROSALINO, Fundamentos à proposta de lei que estabelece mecanismos de convergência do regime de proteção social da

função pública com o regime da segurança social,op.cit, pág.17 e seguintes.

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A crescente contribuição do Estado para o sistema torna-o, ao contrário da sua formulação inicial, num instrumento iminentemente de política redistributiva em que todos os contribuintes contribuem para as pensões de, atualmente, cerca de 600 mil pessoas.

Deparamo-nos assim com uma situação caótica da CGA 65 no que respeita ao

financiamento. Contudo, a atual medida não vem resolver a situação da CGA mas sim atenuá-la pela via da obtenção de receita que permita reduzir as transferências por via do Orçamento de Estado.