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2 SISTEMAS UTILIZADOS NA VERIFICAÇÃO DA VALIDADE DAS LEIS E DE

2.2 SURGIMENTO E DESENVOLVIMENTO DO SISTEMA DE CONTROLE DE

2.2.6 O golpe civil-militar e as Constituições de 1967 e de 1969

A substituição da Constituição de 1946 teve início no ano de 1961, com a renúncia do Presidente Jânio Quadros. Por ter trabalhado como Ministro do Presidente Getúlio Vargas, o Vice-Presidente João Goulart não tinha a confiança e simpatia de outros setores da sociedade, e para conseguir ser empossado no cargo, fez um acordo que se converteu na Emenda Constitucional nº 4, de 1961, instituindo o sistema Parlamentarista, no entanto, sucumbiu ao voto popular por meio de um plebiscito, no ano de 1963, o qual escolheu o modelo

presidencialista.117

Inobstante a implantação do Estado de Direito por meio da Constituição de 1946, invocando a necessidade de “salvação nacional”, em 31 de março de 1963 os comandantes das Forças Armadas se rebelaram, o Presidente fugiu do país, o Congresso declarou o cargo vago e nomeou para seu lugar o substituto constitucional, o Presidente da Câmara dos

Deputados, Raniere Mazzilli118

.

Insatisfeito, o Comando Militar editou o Ato Institucional de 9 de abril de 1964 – AI-1 –, que alterou profundamente a Constituição então vigente, e convocou eleições indiretas para escolha do próximo Presidente da República, votando apenas os congressistas que eram a favor do regime que se implantava. Concomitante a este fato, veio a cassação dos direitos

116

MENDES, Gilmar Ferreira. Op. cit., p. 16.

117

ALVES JÚNIOR, Luís Carlos Martins. Op. cit., p. 323.

118

políticos dos cidadãos vistos como opositores do regime, inclusive congressistas,

governadores e até militares, e aos demais, ameaças de prisão, cassação e expulsão do país.119

Com a edição do Ato Institucional nº 2, de 27 de outubro de 1965120, mais alterações

sobrevieram ao Poder Judiciário, com o restabelecimento da Justiça Federal e aumento do número de ministros do Supremo Tribunal Federal, de onze para dezesseis. Estavam excluídas da apreciação judicial as ações praticadas pelo Comando Supremo da Revolução e pelo Governo, com base nos atos institucionais ou complementares, e as resoluções estaduais e municipais que cassassem mandatos ou declarassem o impedimento de Governador, Prefeito, Deputado e Vereador. Muitos civis foram presos e processados por crime contra a segurança nacional.121

No final do ano de 1966, o Congresso Nacional foi convocado para chancelar a Constituição a ser apresentada pelo Presidente da República, com a justificativa de que a carta

anterior não poderia viger ante a “revolução”122 que se operava no país. Em meio a esse

conflituoso contexto histórico é proclamada a Constituição da República Federativa do Brasil, no dia 24 de janeiro de 1967.

Miranda pondera que:

Após a revolução de 1964, a Constituição de 1946 ficou subordinada a quatro Actos Institucionais, publicados entre esse ano e 1966 e todos dirigidos à concentração do poder no Presidente da República. Mas, a breve trecho, sentiu-se a necessidade de elaborar nova Constituição a fim de integrar tais Actos Institucionais e os seus Actos Complementares: assim surgiu a Constituição de 1967. Esta não iria durar na sua forma primitiva senão dois anos, pois, entretanto, os chefes militares publicaram

119

Idem, ibidem, p. 326.

120

Brasil. Ato Institucional nº 2, de 27 de outubro de 1965. Mantém a Constituição Federal de 1946, as Constituições Estaduais e as respectivas Emendas, com as alterações introduzidas pelo Poder Constituinte originário da Revolução de 31.03.1964, e dá outras providencias. Disponível em:

<http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/AIT/ait-02-65.htm>. Acesso em: 29 jun. 2014.

121

ALVES JÚNIOR, Luís Carlos Martins. Op. cit., p. 327.

122

Atualmente os historiadores e sociólogos brasileiros aceitam e defendem a nomenclatura “golpe civil-militar” em referência a este fato histórico, como, por exemplo, Carlos Eduardo Martins, que diz: “O golpe foi civil-

militar e articulou os diversos segmentos da burguesia em torno da liderança do grande capital nacional e

estrangeiro contra a ofensiva do movimento de massas, dirigida principalmente pelo trabalhismo, formados pelos trabalhadores urbanos, rurais, estudantes e soldados e militares de baixa patente, que buscavam construir um capitalismo de Estado com forte dimensão popular, democrática e nacional. Este programa centrava-se nas reformas de base, em particular a agraria e a urbana, no controle da remessa de lucro, na nacionalização de setores estratégicos e promoção da indústria nacional e numa política externa independente, anti-imperialista, baseada no direito à autodeterminação dos povos. Postulava ainda a extensão de voto aos analfabetos, que constituíam quase a metade da população brasileira, aos soldados e sub-oficiais, bem como elegibilidade a todos os eleitores. A dimensão civil do golpe militar foi muito bem demonstrada em obras como 1964: a conquista do Estado, de René Dreyfuss, que evidencia as intensas articulações entre o empresariado nacional e estrangeiro, o governo dos Estados Unidos e os militares de alta patente para construir uma oligarquia que partilhasse cargos e espaços nos conselhos empresariais, em instituições estatais e em organismos ideológicos formadores de quadros (ESG) ou de opinião pública (IBAD e IPES)”. Cfr. MARTINS, Carlos Eduardo. O golpe militar de 1964 e o Brasil: passado e presente. Disponível em: <http//.www.blogdaboitempo.com.br>. Acesso em: 21 jun. 2014. (grifos nossos)

novos e numerosos Actos Institucionais e Complementares e, para lhes dar forma coerente, surgiu em Outubro de 1969 a Emenda Constitucional nº 1 (entenda-se como Constituição nova ou como Constituição de 1967 alterada).123

Observa-se que os atos institucionais editados pelo Presidente da República consistiam

em norma suprema e estavam acima da Constituição Federal124

, a exemplo do art. 181 da Emenda Constitucional nº 1, de 17 de outubro de 1969, que excluiu da apreciação do Poder Judiciário os atos praticados pelo Comando Supremo da Revolução de 31 de março de 1964, os atos de governo praticados com base nos Atos Institucionais e nos Atos Complementares, e as resoluções que houvessem cassado mandatos eletivos ou declarado o impedimento de governadores, deputados, prefeitos e vereadores, no exercício dos referidos cargos, desde que fundados nos Atos Institucionais.

Em relação ao controle de constitucionalidade foi mantido o recurso extraordinário (art. 114, III) e a representação por inconstitucionalidade (art. 114, I, ‘l’). Somente com a

chamada Emenda nº 1, de 1969125, há alteração de relevo quanto ao tema, ao prever a

possibilidade de os Estados realizarem o controle das leis municipais em face das Constituições Estaduais (art. 15, § 3º, “d”).

Porém, a principal alteração se deu nas discussões doutrinárias e no entendimento do Supremo Tribunal Federal acerca da possibilidade de conceder liminar para suspender a execução da norma e do exercício exclusivo da representação por parte do Procurador-Geral da República, especialmente se consistia em poder-dever ou mera faculdade.

Após o Supremo Tribunal Federal comunicar a declaração de inconstitucionalidade ao Senado Federal, a este cabia editar uma resolução com o fim de suspender os efeitos da norma impugnada. Na prática, o Senado baixava a resolução se a decisão proferida pelo Poder Judiciário estivesse de acordo com os interesses políticos da época. Por esse motivo, muitas ações repetitivas chegavam ao Supremo Tribunal Federal para ver declarada a inconstitucionalidade da mesma norma, em face da omissão do Senado Federal, a quem cabia conceder o efeito erga omnes das decisões judiciais, caminhando para a sobrecarga do Tribunal.126

123

MIRANDA, Jorge. Op. cit., p. 210.

124

ALVES JÚNIOR, Luís Carlos Martins. Op. cit., p. 329.

125

Apesar de receber a denominação de Emenda Constitucional, tratou-se na verdade de uma nova Constituição, imposta pelos Ministros de Guerra da Marinha, do Exército e da Aeronáutica Militar. A justificativa para a promulgação consistia no fato do recesso do Congresso Nacional ter sido decretado pelo Ato Complementar n. 38, de 13 de dezembro de 1968, ficando o Poder Executivo autorizado a legislar sobre todas as matérias, inclusive as Emendas Constitucionais. Cf. SILVA, José Afonso da. Curso de Direito Constitucional positivo. 25. ed. São Paulo: Malheiros, 2005. p. 87.

126

Por outro lado, a discussão acerca do cabimento da medida liminar na representação por inconstitucionalidade tomou corpo com a discussão do Regimento Interno do recém criado Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro, após a fusão dos Estados da Guanabara e do Rio de Janeiro. Na discussão, o Supremo Tribunal Federal passou a entender que há um poder geral de acautelamento inerente ao exercício da função jurisdicional, antecipando a tutela

própria da resolução a ser expedida pelo Senado Federal.127

A Emenda Constitucional nº 7/77128, editada posteriormente, respaldou o novo

entendimento que se delineava, introduzindo no ordenamento a ação avocatória (art. 119, I, “o”) e a representação para interpretação (art. 119, I, “l”).

Com essas alterações, o controle de constitucionalidade até então vigente passou a caminhar mais próximo do modelo dito europeu, contribuindo para o surgimento do sistema a ser adotado pela Constituição de 1988.

2.2.7 A redemocratização do Brasil, a Constituição de 1988 e as profundas alterações no