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O governo Geisel, o POLOAMAZÔNIA e a migração gaúcha para a Amazônia

5 O CAMINHO DOS GAÚCHOS EM DIREÇÃO À AMAZÔNIA BRASILEIRA

5.1 REGIME MILITAR E EXPANSÃO DA MIGRAÇÃO GAÚCHA PARA A AMAZÔNIA

5.1.2 O governo Geisel, o POLOAMAZÔNIA e a migração gaúcha para a Amazônia

Com o governo Ernesto Geisel (1974-1979) há uma expansão significativa da colonização particular na Amazônia, em detrimento dos projetos oficiais. Há um recuo importante da colonização dirigida pelo Estado e uma ampliação considerável dos projetos privados pelas empresas colonizadoras. Este momento foi crucial para a migração de gaúchos em direção à Amazônia brasileira. Foi a partir desta mudança que se abriram de forma escancarada as portas da Amazônia para os colonos sulistas.

Com a aprovação do Programa de Polos Agropecuários e Agrominerais da Amazônia (POLOAMAZÔNIA), define-se a orientação para o aproveitamento das terras da região da seguinte forma: “a estratégia a ser adotada conjuga programas de colonos e pequenos produtores, com programas a serem realizados através de empresas agrícolas – pequenas, médias e grandes – assim como empresas de colonização” (TAVARES DOS SANTOS, 1993, p.55).

Entre os anos de 1976 e 1978 foi instituído um amplo sistema para a colonização particular. Num primeiro momento, o INCRA fixou critérios de concessão de terras públicas na Amazônia Legal para as “empresas particulares de colonização que se disponham a complementar a ação do governo nos programas de colonização oficial” (TAVARES DOS SANTOS, 1993, p. 56).

Em segundo lugar, ocorreu a regularização da participação de cooperativas agropecuárias em programas de colonização da Amazônia. Tratava-se de incorporar no modelo de colonização da Amazônia as experiências iniciadas ainda no início da década, como a da COOPERCOL (Cooperativa de Colonização 31 de março, fundada em Tenente Portela, no Rio Grande do Sul em 1971) que recrutou colonos para o projeto oficial de Altamira (PA) e que organizou também o projeto Canarana, no município de Barra do Garças, no Mato Grosso. Tanto cooperativas de colonização quanto as empresas privadas do sul do país que assumiram os projetos, responsabilizavam-se por todo o empreendimento, desde a implantação de obras de infra-estrutura, com medição e demarcação de terras, abertura de estradas vicinais, implantação de núcleos urbanos, instalações de serviços de saúde e educação, etc. Deviam também manter a área sob sua guarda e responsabilidade, preservando- a de eventuais invasores (ROCHA, 2006).

Com esta regularização haverá uma modificação no perfil dos futuros colonos a serem instalados nos projetos de colonização da Amazônia. A preferência passa ser pelos pequenos proprietários rurais residentes no sul do país, situados em localidades onde houvesse ações de cooperativas de produção agrícola. Como se sabe, o sistema cooperativista já de muito tempo ocorria no Rio Grande do Sul, pelo menos desde o final do século XIX. Até a metade do século XX, uma quantidade significativa de cooperativas agrícolas já tinha sido instalada naquele estado22. Portanto, havia uma lógica em cooptar os trabalhadores sulistas já com experiência cooperativa para a ocupação da Amazônia. Como visto anteriormente, o Estado buscava um modelo de colonização calcado na produção para o mercado, no que as cooperativas (e seus cooperativados) tinham larga experiência. Os trabalhadores rurais sulistas, portanto, possuíam experiência no sistema cooperativo de produção agrícola voltado à produção de excedentes para o mercado. Daí a escolha ter recaído sobre os “gaúchos”. Traçava-se naquele momento uma estratégia para as regiões de origem dos colonos e as

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Na década de 1940 existia o Departamento de apoio ao Cooperativismo (DAC) dentro da Secretaria de Agricultura do Rio Grande do Sul. Até o final dos anos 1950, somente de cooperativas tritícolas eram mais de 20 no estado. No início da década de 1930 havia cooperativas de produção e comercialização de laticínios, uvas, vinho, banha, fumo, madeira, cebola, dentre outras. Nos anos 1950 nada menos do que 600 cooperativas destinavam-se a produção e comercialização de produtos agrícolas no RS.

cooperativas atuavam no mesmo sentido. A atuação das cooperativas devia seguir a seguinte lógica:

Possibilitar a transferência de proprietários de minifúndios e o reagrupamento de propriedades rurais nas áreas de origem. A cooperativa atuará junto aos associados a serem transferidos visando promover o reagrupamento do minifúndio para a alienação de suas terras aos proprietários que permanecerem na área (TAVARES DOS SANTOS, 1993, p. 57).

Portanto, o migrante escolhido para a implantação dos projetos de colonização na Amazônia era “o colono do sul que por já ter passado pela experiência da colonização, traria seu pecúlio para aplicar na propriedade e acima de tudo com outra mentalidade em relação ao trabalho, faria da produção uma atividade realmente lucrativa” (LENHARO, 1986, p. 50). Produziria, pois, como capitalista. Em seu estudo sobre o projeto de colonização de Canarana, município localizado no norte mato-grossense, Tavares dos Santos (1993) destaca que a maioria dos colonos de Canarana havia nascido em regiões de colonização europeia no Rio Grande do Sul. Os colonos de Canarana descendiam de imigrantes europeus que viam na migração para o Centro-Oeste a possibilidade de reprodução social de sua família e, por isso, migravam em busca de áreas maiores do que as que possuíam na sua localidade de origem. O autor ainda destaca que a migração do Rio Grande do Sul para Santa Catarina e Paraná já era uma tradição entre os descendentes, a “novidade era partir pro Mato Grosso” (TAVARES DOS SANTOS, 1993, p. 73).

Na época de sua implantação o projeto Canarana teve como clientela colonos de um mesmo município, Tenente Portela, na região do Alto Uruguai, norte do estado do Rio Grande do Sul. Historicamente povoada por índios Kaingang e Guarani, o município recebeu no início do século passado uma leva significativa de descendentes de imigrantes alemães e italianos vindos das “antigas colônias”, que não possuíam mais terras suficientes para o cultivo de suas lavouras.

No ano de 1955 o município conquistou sua autonomia política e administrativa. Nesta mesma época a agricultura familiar entra em crise, sobretudo por causa da fragmentação das propriedades que já vinha se desenrolando há um bom tempo. Contanto, os colonos imigrantes de europeus começam a invadir a reserva indígena, ocupando boa parte dos quase 24.000 hectares da área. Permaneceram aí por cerca de 20 anos, quando acabaram sendo expulsos pelos próprios indígenas.

Em março de 1962, cerca de dois mil agricultores formaram a “Associação dos Sem Terra”, objetivando reivindicar terras públicas disponíveis na região. Menos de um ano depois, em 17 de janeiro de 1963 foi fundado o sindicato dos trabalhadores rurais de Tenente

Portela. Muitos destes trabalhadores rurais é que se tornarão os futuros clientes do projeto Canarana.

Em 11 de outubro de 1970 foi inaugurada a Rádio Municipal de Tenente Portela, financiada pela Igreja Luterana do Brasil e da Suécia. Esta rádio, comandada pelo pastor luterano Norberto Schwantes teve papel fundamental na epopéia da migração dos portelenses para o projeto Canarana. A rádio fora criada com o intuito de expandir para os produtores rurais os conhecimentos sobre técnicas de produção e gerenciamento de propriedades que Schwantes havia adquirido em uma viajem que havia feito a Alemanha em 1969. Segundo relato do próprio Schwantes, apresentado por Simon (2009), num dado programa um convidado fez a seguinte pergunta: “por que não migrar?” A partir daí o próprio pastor abraçou a causa e foi atrás de áreas para o assentamento dos pequenos agricultores portelenses que contavam, em média, com menos de sete (07) hectares de terra para a reprodução de suas famílias.

No início de 1971 Schwantes e dois companheiros começaram a procurar terras para o assentamento dos agricultores pauperizados de Tenente Portela. O primeiro local visitado foi a região de Dourados, no atual Mato Grosso do Sul, onde o solo tinha boa qualidade para a cultura do trigo e soja, culturas desenvolvidas pelos agricultores portelenses. Além da qualidade dos solos, o preço da terra era acessível.

Na volta ao Rio Grande do Sul, após uma reunião com a Superintendência do INCRA em Porto Alegre, ocasião em que foi sugerida a criação de uma cooperativa de colonização, foi criada a Cooperativa de Colonização 31 de Março (COOPERCOL), no dia 31 de março de 1971. Inicialmente com 190 fundadores, rapidamente passa para aproximadamente 400 associados (TAVARES DOS SANTOS, 1993).

Criada a cooperativa, os responsáveis rumaram novamente para Dourados a fim efetivarem a compra das terras para dar início ao projeto de colonização. Tal foi a surpresa ao depararem com a estrondosa elevação do preço da terra, apontada por Tavares dos Santos (1993) como seis vezes maior do que na primeira visita. Sofreram ainda um novo revés: o projeto que haviam enviado para a apreciação da Igreja Luterana solicitando o financiamento fora recusado, provavelmente pela experiência frustrada que a mesma igreja já havia experimentado com a “Colônia Gurupi” em Goiás (atual Tocantins).

Foi então que a participação do governo federal começa a definir os rumos futuros da COOPERCOL e dos pequenos agricultores portelenses. Em fins de abril de 1971, numa reunião em Porto Alegre, o INCRA solicitou à COOPERCOL que recrutasse trabalhadores rurais para projetos de colonização que estavam sendo implementados às margens da rodovia

Transamazônica, em particular os projetos Altamira e Marabá. No mês seguinte os dirigentes da cooperativa vão a Brasília conhecer os projetos e recebem do INCRA a garantia de crédito fundiário para se instalarem na Amazônia.

Assim, a COOPERCOL começa a angariar camponeses pobres da região de Tenente Portela a fim de transferi-los para a Amazônia, particularmente Altamira. Inicialmente foram 76 trabalhadores rurais – 38 de Tenente Portela e 38 de Ibirubá – sem suas respectivas famílias. Partiram no dia 14 de julho de 1971 e chegaram ao destino dia 22 do mesmo mês. Segundo relatos contidos no Livro do Tombo da Paróquia de Tenente Portela a metade deles voltou de imediato, “horrorizados com a precariedade das condições de vida nos projetos” (TAVARES DOS SANTOS,1993, p. 70).

Ainda assim, a transferência de camponeses para estes projetos na Transamazônica continuou. Tavares dos Santos (1993, p. 71) descreve a continuidade do movimento de camponeses gaúchos para a Transamazônica:

em setembro de 1971, 23 outras famílias partiram, 20 famílias em novembro e, no mês de setembro de 1972, mais de 100 famílias de colonos ainda foram transferidas para a Amazônia. O INCRA impunha então aos colonos um prazo mínimo de seis meses para poderem ainda eventualmente pedir para voltar. No total, parece que cerca de 200 famílias de colonos do Sul foram transferidas pela Cooperativa e pelo INCRA para a Transamazônica. Em seguida, os dirigentes da COOPERCOL foram à Amazônia Legal, à procura de terras, pois lá podiam receber os créditos agrícolas concedidos pelo Estado. Desembarcaram com 14 associados, no começo de 1972, na região de Barra do Garças, considerada uma região de “vazio demográfico” onde encontraram terras privadas para vender. As quatro herdades escolhidas tinham sido anteriormente terras devolutas, passadas aos proprietários por concessão legal do governo do Mato Grosso em 1970.

Não obstante os problemas enfrentados por muitos colonos, o movimento migratório de gaúchos em direção à Transamazônica e ao Mato Grosso continuou forte, apoiado por uma rede de difusão de mensagens favoráveis aos projetos de colonização lançada pela COOPERCOL. Através da Rádio Municipal, do Jornal da Terra23, da própria Igreja Luterana, o discurso positivo sobre a colonização se espalhava por diversos municípios da região. Mais uma vez Tavares dos Santos (1993, p. 72) recorre ao Livro de Tombo da Paróquia de Tenente Portela: “Espalhavam-se rumores, pela Rádio, apresentando essas regiões como o paraíso terrestre”.

Este trabalho de propaganda dos projetos logrou êxito, resultando numa forte adesão de colonos dispostos à partirem para a colonização da nova fronteira agrícola do país. Houve ainda apoio das autoridades locais (projeto Canarana, no caso), haja visto que o prefeito do

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Jornal semanal que circulou entre 1971 e 1972 (74 edições) na região, fazendo propaganda dos projetos de colonização da Amazônia. Ver Tavares dos Santos (1993).

município entre 1971 e 1975 – nomeado diretamente pelo Governo Federal, por ser área de segurança nacional – era irmão do presidente da COOPERCOL. Os dirigentes da cooperativa avaliaram à época que nada menos do que 420 agricultores estavam interessados em partir para o projeto. Este número representava cerca de 10% dos proprietários rurais do município na época, já que havia 3.692 propriedades agrícolas em Tenente Portela em 1972, das quais 3.799 classificadas pelo INCRA como minifúndios.

No projeto Caranana os colonos começaram a desembarcar no mês de julho de 1972, tendo outra leva chegado somente no início do ano seguinte. Ao final deste ano aproximadamente 80 famílias residiam nos lotes no projeto. A primeira etapa (1972-1974) foi marcada pelo assentamento de colonos que praticavam fundamentalmente agricultura de subsistência. Em 1975 o projeto se emancipou (até então era responsabilidade da COOPERCOL), a administração tornou-se pública e em 01 de maio de 1975 foi fundada a Vila de Canarana. Neste mesmo ano, a 05 de julho, foi criada a Cooperativa Agropecuária Canarana (COOPERCANA) – por 200 associados, que chegarão a 1.500 em 1980 (TAVARES DOS SANTOS, 1993).

A grande maioria dos colonos de Caranana, que nesta data já possuía 10.200 habitantes, era oriunda das regiões de colonização europeia do século XIX, no Rio Grande do Sul. Suas famílias haviam chegado a Tenente Portela principalmente entre 1945 e 1954, no esquema de ocupação organizada pelo governo federal, nas chamadas “últimas colônias novas” do Rio Grande do Sul. Nessas colônias chegaram em busca de áreas mais extensas do que aquelas que possuíam nas suas regiões de origem.

Eram pequenos proprietários rurais que tinham como sistema de produção a policultura e a criação, associando culturas de subsistência às culturas de mercado. Todos eram associados à Cooperativa e ao Sindicato dos Trabalhadores Rurais. Sua forma de produção era bastante rudimentar, calcado na utilização de arados puxados por bois, geralmente em terrenos acidentados e perigosos. Por isso, a busca por terras novas no Mato Grosso, por exemplo, também tinha como objetivo a possibilidade de abandono do trabalho manual com a pá, a enxada, a picareta. Era a vontade do agricultor ter uma lavoura mecanizada. O sonho destes agricultores era poder trabalhar com a máquina, sentir-se também moderno, ser dono do seu próprio maquinário. Isso traria liberdade para eles, não seriam mais trabalhadores assalariados de ninguém, “nem pais nem filhos precisarão trabalhar como peões” (TAVARES DOS SANTOS, 1993, p. 80). Assim descreve Tavares dos Santos (1993, p. 80) sobre as motivações que levaram camponeses do Sul para o projeto Caranana:

Todos foram motivados pela falta de terras: uma terra que pudesse dar a eles e a seus filhos a possibilidade de também serem camponeses que não precisam trabalhar com tanto esforço, porque mecanizaram o trabalho. Uma terra que lhes dê a possibilidade de ter a liberdade de um trabalho autônomo. Foi este projeto que, face a uma situação de expulsão, fê-los escolher este destino de colonos, de preferência a qualquer outro que também fosse possível. Esses colonos do Sul queriam partir para novas regiões para realizar seu sonho de terra.

Outro projeto de colonização no Mato Grosso foi uma porta de entrada de migrantes gaúchos na Amazônia brasileira. Trata-se do Programa de Colonização Terranova, implantado em terras públicas situadas às margens da rodovia Cuiabá-Santarém, a BR 163. O programa foi organizado em 1978 pela COOPERCANA a pedido do Governo Federal, visando o assentamento de camponeses que haviam sido expulsos pelos índios kaingang das reservas que ocupavam a pelo menos duas décadas. Também previa o assentamento de camponeses sem terra do Sul, principalmente do Rio Grande do Sul, totalizando 1.000 colonos (TAVARES DOS SANTOS, 1993).

A origem da presença dos colonos brancos nesta área do Rio Grande do Sul data pelo menos dos anos 1920 quando já expulsos das “antigas colônias” pela falta de terras, vão se deslocar em direção à Santa Catarina e Paraná. Entretanto, alguns pararam pelo meio do caminho e começaram a ocupar as áreas indígenas, a ponto de, em 1962 serem contabilizadas cerca de 400 famílias de colonos residindo no interior da reserva de Nonoai, que estava sob “posse” dos índios desde 190824

. Entre invasões e expulsões, havia, em 1975, aproximadamente 980 famílias de colonos brancos residindo no interior da reserva de Nonoai. Estas famílias ocupavam cerca de 65% da área total da reserva, ou seja, 9.634 hectares. Por causa desta invasão, restaram apenas 232 famílias indígenas em Nonoai (TAVARES DOS SANTOS, 1993; SIMON, 2009). As áreas mistas no Rio Grande do Sul equivalem às colônias mais recentes, depois que os pioneiros italianos e alemães empreendem a jornada em direção ao noroeste do estado. Ali, as duas etnias – alemã luterana e italiana católica vão se encontrar e formar as colônias mistas (Figura 1). A figura 1 mostra os diferentes tipos de colonização europeia não ibérica nos estados da região Sul do país. Cabe destacar que as principais nacionalidades dos colonos no Rio Grande do Sul são os alemães e italianos. Os eslavos tem uma participação muito menor. Estes se encontram em maior número no estado do Paraná.

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Em 1908 o governo federal definiu esta área indígena com superfície de 34.908 ha no município de Nonoai. Em 1941 esta área foi reduzida para 14.910 ha devido a criação de uma reserva florestal. Ver Tavares dos Santos (1993).

Figura 1 – Tipos de colonização na região Sul

Fonte: Alves, Carvalho e Lasmar (1990) apud Martins e Vanalli (2001)

Em maio de 1978 os índios kaingang conseguem expulsar os colonos brancos de suas reservas, num total de mais de 1.100 famílias. A maior parte destas famílias vai acampar as margens das rodovias na própria região do Alto Uruguai. Ainda no dia 18 de maio o governo vai retirar aproximadamente 800 famílias destes acampamentos e enviá-los ao Parque de Exposições Agropecuárias de Esteio, na região metropolitana de Porto Alegre. Outras 200 famílias ficaram ainda acampadas nas rodovias do Alto Uruguai.

Com esta situação o governo federal apelou à COOPERCANA para elaborar um programa de colonização para estes sem terra na Amazônia. Para tanto a União ofereceu a concessão de terras públicas às margens da Rodovia Cuiabá-Santarém. Logo em seguida uma comissão formada por seis agricultores escolhidos pelo governo foi ao local para conhecer as

terras. Os agricultores gostaram do que viram e foram arregimentar outros trabalhadores para a empreitada.

Já no começo de julho cerca de 550 famílias rumaram em direção ao Programa de Colonização Terranova. Numa primeira etapa, até junho de 1979, 637 famílias foram assentadas. Posteriormente, a partir de outubro de 1979, mais 423 terrenos foram distribuídos a colonos oriundos da região de Nonoai e outros municípios do norte do Rio Grande do Sul e também de Santa Catarina.

Daquelas famílias expulsas das áreas kaingang, parte delas vai ocupar em setembro de 1979 a fazenda Macali, de 1.600 hectares e a granja Brilhante, esta com 1.500 hectares, ambas no município de Ronda Alta, no Rio Grande do Sul. Estas áreas haviam sido ocupadas ilegalmente e, desde o início dos anos 1960 esperava-se por uma decisão judicial sobre seu aproveitamento para fins de reforma agrária. Em outubro de 1980, os colonos que não receberam terra na região invadiram a fazenda Annoni (municípios de Sarandi e Pontão), com cerca de 9.200 hectares. Em 1981 algumas famílias acampam em Encruzilhada Natalino, município de Ronda Alta. Este acampamento é considerado o marco de fundação do Movimento dos Trabalhadores Sem Terra (MST).

Diante da situação que ocorria em Ronda Alta o governo Federal organiza um projeto de colonização da então Gleba Lucas do Rio Verde, no Mato Grosso e direciona os assentados de Encruzilhada Natalino a esta região. Muitos não quiseram ir, mas 71 famílias enfrentaram uma viagem de mais de 70 horas e desembarcaram em Lucas do Rio Verde na madrugada de 07 de novembro de 1981. Traziam consigo “poucos bens materiais, como roupas, algumas ferramentas para a lida no campo, e, totalmente desprovidos de recursos financeiros” (ROCHA, 2006, p. 36). Apenas algumas famílias que haviam vendido o pouco de terra que lhes restava no Rio Grande do Sul aportaram com algum recurso financeiro. Além disso, “traziam na bagagem a esperança de conquistar a terra e integrar-se efetivamente no sistema produtivo e fazerem-se cidadãos” (ROCHA, 2006, p. 36). Em maio de 1982 chegou mais um grupo para o Projeto de Assentamento Conjunto (PAC) Lucas do Rio Verde, totalizando aproximadamente 230 famílias assentadas.

Muitos foram os projetos de colonização no Mato Grosso que tiveram como alvo os pequenos agricultores gaúchos. Cidades como Sorriso, Nova Mutum, Porto Alegre do Norte, dentre outras, surgem através destes projetos. Sorriso, por exemplo, vai surgir no final dos