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Mapa 9: Sugestão para a redivisão territorial da Amazônia Legal, segundo o trabalho

4.5 O Império e a consolidação do Estado nacional

Com a independência do Brasil sob a égide de um governo imperial, a constituição de 25 de março de 1824 estabelecia a nação livre como um todo, sem federações ou oposições à independência:

Consolida-se com a Carta de 1824 como um estado unitário, apesar da extensão territorial do Brasil, em que as províncias seriam governadas por presidentes designados pelo poder central, presidentes muitas vezes oriundos de outras províncias, sem um mandato e sem ligações políticas ou sociais locais. Eram meros delegados do governo imperial. (ANDRADE; ANDRADE, 2003, p. 44).

Quando da abdicação de D. Pedro I, instaura-se o período de “Regência”, que entre 1831-1841 permitiu certa autonomia das províncias que constituíam o Império (ANDRADE, 1999b; COSTA, 2001); entretanto, as velhas estruturas da constituição de 1824 permaneciam, pois os presidentes das províncias continuavam a ser nomeados sem um mandato específico, o que gerou conflitos, revoltas e o avivamento dos sentimentos regionalistas entre as elites locais e o poder imperial.

Essas duas décadas, terminadas com a ascensão de D. Pedro II ao trono imperial (1841), foram marcadas pela consolidação da independência e pela montagem do aparelho do Estado. Como relembra Costa (2001), com a independência houve uma descolonização formal, já que a estrutura econômica e social permanecia a mesma, principalmente pela manutenção do sistema escravista, do latifúndio e da grande concentração das riquezas.

4.5.1 As revoltas provinciais durante o Período Regencial

A partir de 1831 inicia-se um período de maior convulsão social e política do Brasil, pois o isolamento e a desigualdade regional resultaram no aparecimento das revoltas provinciais por quase todo o território nacional, com maior destaque para os casos da Cabanagem no Pará (1835-1840), Praieira em Pernambuco (1848), Sabinada na Bahia (1837-1838), Balaiada no Maranhão (1838-1841) e Farroupilha no Rio Grande do Sul (1835-1845).85

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Costa (2001), citando a historiadora Maria de Lourdes Mônaco Janotti (1987) registra exatamente vinte revoltas entre os movimentos provinciais durante esse período conturbado. Além destes,

Para se compreender os problemas graves ocorridos no período regencial, torna-se necessário conhecer os movimentos revolucionários (ou reacionários) que despontaram no Brasil no século XIX e o esforço do governo central para manter a unidade nacional. Andrade (1999b) classifica esses movimentos em dois grandes grupos: o primeiro de movimentos nitidamente populares sem orientação política, como a Balaiada e a Cabanagem; o segundo é exatamente dos partidos e grupos oligárquicos descontentes com o governo imperial, como a Sabinada e a Revolução Farroupilha. Antes destes, agitaram o solo brasileiro ainda no período colonial a Inconfidência Mineira (1789) e a Conjuração Baiana (1798).86

As províncias do Pará, Maranhão e Rio Negro constituíam uma capitania à parte na formação colonial da administração lusitana, pois desde a sua criação eram controladas diretamente pela metrópole. O controle dos órgãos principais e do comércio ficara na mão dos portugueses e havia um descontentamento geral dos brasileiros pobres (em geral, índios, negros e mestiços). Nas palavras de Andrade (1999b, p. 72) “a Amazônia era uma área típica do domínio de uma economia colonial extrativista, cuja população do interior, ligada à produção e ao trabalho, não sentiu, com a Independência, qualquer modificação no sistema de relações existentes”. Durante a “cabanagem”, os revoltosos tomaram a capital Belém em 7 de janeiro de 1835, dominando a cidade por oito meses, sob a liderança do popular cabano Clemente Malcher à frente. Após diversos embates, em abril de 1838, as tropas legalistas atacaram os revoltosos, pondo fim ao conflito com a nomeação de um novo governador da província.

Da mesma forma que o Pará, o Maranhão era administrado diretamente por governantes de origem portuguesa e as causas da revolta não diferiram muito da ocorrida na província paraense. A luta armada iniciou-se em 13 de dezembro de 1838, com um grupo chefiado por Raimundo Gomes Vieira (produtor de balaios no Vale do Itapecuru), além de fazendeiros descontentes e grupos quilombolas. Apesar da reação do presidente da província, as tropas legalistas tiveram insucesso no interior e a revolta alcançou tal dimensão que toda a parte ocidental do Maranhão se merecem destaque o movimento republicano ocorrido no Recife em 1817, ainda no Brasil colonial e a “Confederação do Equador” (1824) que atingiu o Nordeste do Brasil.

86 Conforme o visto no capítulo referente aos símbolos no Brasil, outro fato importante a ser relatado é

que nas revoltas ocorridas durante o período regencial, principalmente aquelas com maior consciência política, houve a manifestação e criação de símbolos próprios, que mais tarde seriam revividos com a criação dos brasões e bandeiras de alguns Estados, com destaque para o Rio Grande do Sul e Pernambuco.

encontrava sob domínio dos balaios em 1839. O governo central nomeou então para presidente da província Luís Alves de Lima (futuro Duque de Caxias), com plenos poderes para reprimir o movimento. Com uma tropa de oito mil homens a repressão começou ao passo que em 1840 o movimento foi aos poucos liquidado. 87

Como a mais “politizada” de todas as revoltas do período (COSTA, 2001), o movimento ocorrido em Pernambuco entre 1842-1843 desenvolveu-se enquanto luta política explícita entre classes sociais distintas. A província tinha a força dos senhores de engenho (em função de séculos de produção açucareira) e uma pujante e portuguesa burguesia comercial nas cidades, cujo extremo oposto era ocupado por uma massa de escravos e trabalhadores livres. Da luta política se fez a ameaça armada ao passo que os praieiros88 tinham dominado amplamente a província, ameaçando expropriar as elites e os engenhos de açúcar. Em 1848 o governo central nomeia um novo presidente da província com a incumbência de normalizar a situação, tal ação generalizou-se na luta armada propriamente dita, com o levante dos “praieiros” em marcha à capital. Os revoltosos são derrotados pelas forças de reação em 3 de fevereiro de 1849 e as guerrilhas do interior sucumbiram pouco depois.

A situação social e política da Bahia não diferia muito da do restante do país, ao passo que no período de julho de 1823 (data da Independência da Bahia) à 1838 (fim da Sabinada) ocorreram pelo menos dez insurreições (COSTA, 2001). Após a chamada revolta dos escravos Malês (1837), eclode em 7 de novembro desse mesmo ano o movimento separatista da “Sabinada”, liderado por Francisco Sabino e João Carneiro, além de estratos médios e intelectuais de Salvador. A reação começa na região do Recôncavo, onde grandes senhores de engenho, sob defesa da guarda nacional e sob os auspícios do governo imperial bloquearem as rotas de abastecimento da capital baiana. A cidade é tomada de assalto em 14 de março de 1838 e os líderes do movimento fogem, tendo os “legalistas” reassumido o poder na província em abril do mesmo ano.

Diferentemente das capitanias ao norte, o Sul não foi um empreendimento colonial típico da administração portuguesa, “tendo sido o seu povoamento

87 A grande diferença da “balaiada” não estava no ideal libertário-separatista, mas nas ações dos

revoltosos espalhados pelo interior, pois não estavam centrados apenas na capital.

88 Por sua organização política, o movimento surge em um partido (o “Praieiro”, já que seu jornal, o

Diário Novo, funcionava na rua da Praia), cuja oposição política faziam ao partido da “Ordem” e seu respectivo jornal (o Diário de Pernambuco).

‘espontâneo’ (por parte dos criadores de gado paulistas, vicentinos e lagunenses) o elemento fundamental da garantia do domínio de Portugal sob a região desde o início” (COSTA, 2001, p. 39). Além da chamada ocupação “espontânea”, a imigração estimulada a partir do século XVIII, especialmente o de açorianos, resultou na ocupação do litoral catarinense. No interior, entre os campos naturais instalou-se o latifúndio pecuarista, com suas “estâncias” e a fabricação do “charque”, voltada para o mercado interno. Costa (2001, p. 39-40) assinala que:

O quadro social sulista também diferia do restante do país. Ali, a presença do escravo era mínima, predominando o trabalho familiar livre, e os remunerados na pecuária. Um outro aspecto a destacar-se é a forte presença militar na região, desde o início do período colonial, dada a sua posição estratégica (a disputa pela Bacia do Prata). Os militares, no caso, não se limitavam ao seu papel de defesa, mas imiscuíam-se de modo generalizado na vida econômica, social e política da Província. Muitas das estâncias pertenciam a militares, que em suas incursões ao interior, desalojaram muitos antigos ocupantes daquelas terras. Finalmente, completa-se o quadro com a presença de grande número de bandos de preadores de gado (os gaúchos), além de contrabandistas e saqueadores, dirigidos por chefes, muitos deles transformados em “caudilhos” locais.

O descontentamento das lideranças provinciais no período colonial e após a independência com a administração central era grande, e “essa insatisfação com o que consideravam uma espoliação do poder central sobre a província, expressava- se, politicamente, em anseios de autonomia, a partir dos princípios liberais e republicanos e, antes de tudo, federativos” (COSTA, 2001, p. 40).

Foi assim que ao passo de 1835 os revoltosos expulsaram o presidente da província e, sob a liderança de Bento Gonçalves, tomaram a cidade de Porto Alegre e proclamaram a “República Rio-Grandense”.89 Após a antecipação da maioridade de D. Pedro II, o governo central tenta um acordo efetivo com os revoltosos, mas os embates continuam. Em 1842 o governo envia para a província Duque de Caxias, que ao cortar as comunicações do Rio Grande do Sul, sobretudo com o Uruguai, vai sucumbindo o movimento, ao passo que em 1845, este acaba por se render às forças imperiais, com a anistia dos revoltosos.

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Se esta constituiu de fato uma “república independente” durante todo o período é uma questão de controvérsia, pois ela mantinha relações com outras províncias e mesmo os países da bacia do Prata (ANDRADE, 1999b; COSTA, 2001). Chegou a ocupar o litoral catarinense em Laguna, inclusive fundando a efêmera “República Juliana”, mas após sucessivas conquistas e derrotas, o poder central retomou o território em 1839. Muitos dos gaúchos envolvidos na luta tinham estâncias e mantinham relações com Uruguai e a Argentina, embora fossem poucas as chances de uma união dos revoltosos com os caudilhos destas outras regiões.

Assim, após o ano de 1845, cessaram os movimentos armados em favor do separatismo e do sentimento regional, mas durante todo o período imperial, os partidários buscaram ampliar a autonomia das províncias, continuando a se bater pelo federalismo e, a partir de 1870, pelo ideal da República (ANDRADE, 1999b). 4.5.2 Da Guerra do Paraguai ao alvorecer do republicanismo

No cenário geopolítico da América do Sul, a “Guerra do Paraguai” (1864- 1870) deflagrou o envolvimento do Brasil no conflito internacional, após a invasão do desguarnecido Mato Grosso pelas tropas de Solano López em 1864 e a ameaça de ocupação das províncias do Sul, já que no ano seguinte López invadiria a província de Corrientes, declarando guerra à Argentina, no qual ansiava por uma saída marítima para seu território. Em maio do mesmo ano formou-se a “Tríplice Aliança” (Argentina, Brasil e Uruguai) para rechaçar a obstinação paraguaia, fato que ocorreu ao longo dos anos até a tomada de Assunção em 1869 e a derrota do exército paraguaio em março de 1870, onde, nesse contexto “o Paraguai saiu arrasado do conflito, perdendo partes de seu território para o Brasil e a Argentina e seu próprio futuro” (FAUSTO, 2004, p. 216).

Com relação às fronteiras, o período imperial foi marcado pela manutenção e demarcação dos limites coloniais, pois “o Brasil independente herdou o conflito e a jurisdição que o século XVIII não havia resolvido” (CARVALHO, 1959, p. 200). Durante o Império, permaneceu o direito territorial brasileiro baseado nos tratados coloniais de limite, isto é, nas fronteiras naturais com a tese do uti possidetis. Em 1867, o Brasil assinava com a Bolívia, o “Tratado de Ayacucho”, fixando a fronteira entre os dois países na confluência dos rios Beni-Mamoré – uma linha de demarcação pouco definida que geraria, por conseqüência, os futuros conflitos pelo território do atual Acre.90

No que se refere aos assuntos políticos, a crise no segundo reinado agravou- se após a guerra e o sistema monárquico começava a sofrer as pressões dos ideais republicanos, das tensões geradas com o exército e a Igreja, além do problema da escravidão, formalmente abolida em 1888, que criaram certo “desgaste” no governo

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Ainda, conforme Magnoli (1997), a horogênese das fronteiras brasileiras durante o império seria constituída pela demarcação das fronteiras com o Peru e Venezuela.

imperial. Esses fatos culminaram com e a proclamação da República em 15 de novembro de 1889, nascida sob a égide dos militares.