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4. RTP: UM OLHAR SOBRE A PROGRAMAÇÃO REGIONAL

4.5. O “PORTUGAL EM DIRECTO”

4.5.2. O Impacto do Directo

O nome deste programa é claro quanto aos seus propósitos. Com efeito, o “Directo” é a essência deste novo formato. Ainda que seja realizado e coordenado por Lisboa, conta com uma intervenção diária em directo de um ponto do país, feita com três operadores de imagem e um jornalista, a partir de um carro satélite. Estas intervenções são feitas em três períodos diferentes do programa: a primeira dura mais

32 A maioria dos investigadores, como Francisco Rui Cádima, Manuel Pinto, Felisbela Lopes, quando se referem ao serviço público,

preferem, no entanto, utilizar a designação de “público(s)”, tendo em conta a associação da palavra “audiência” ao mercado televisivo, à “televisão que vende”.

ou menos 15 segundos, é uma chamada de atenção, a primeira promoção, logo no início do programa, e as duas seguintes cerca de dez minutos, ao longo da emissão.

Os directos abordam temas como a ourivesaria, problemas nas estradas, associações… e são eles que efectivamente dão destaque a uma região, podendo, por exemplo, ajudar os seus populares. É por essa razão que o responsável pelo Centro Regional Comum (CRC) de Bragança diz que “são o momento mais marcante do programa. Não obstante a importância da actualidade, ver as pessoas a discutir um tema é muito importante, porque foi de certeza escolhido tendo em conta o seu interesse, cativando assim a atenção de quem ouve” (Mateus, entrevista: 10/01/2006).

Com efeito, com o aparecimento da CNN, a informação em directo trouxe um novo impulso aos noticiários televisivos. Os desenvolvimentos tecnológicos permitiram aos repórteres poderem estar em directo a partir de qualquer lado, sendo a sua imprevisibilidade e a impossibilidade de se fazerem montagens o que confere a este género de reportagem jornalística um profundo carácter genuíno, que acaba por “seduzir” ainda mais os telespectadores.

A este propósito Gérard Imbert (1999: 62) chama a atenção para alguns dos mitos que surgiram com a neotelevisão:

Há, por detrás do mito da proximidade, da transparência total, do directo, uma “ilusão de presente” que leva ao que Jesus Martín Barbero chama “retórica do directo”, a impressão de estar compartilhando o acontecimento graças à sua visualização (…). O directo (…) faz coincidir o presente histórico (o dos factos) com o presente enunciativo (o da narração dos factos). “Aproxima” a realidade ao espectador.

O investigador (Imbert, 1999: 51) diz que o directo é uma forma de reintroduzir uma dimensão comunicativa no espaço social, que está cada vez mais despersonalizado. A ideia, no fundo, é criar uma televisão mais íntima, como se o “ver mais” permitisse entender melhor. Na sua perspectiva, há, no entanto, um perigo: o excesso de visibilidade pode provocar saturação e conduzir a uma certa insensibilidade, especialmente se se enveredar pelo caminho da dramatização, o que, segundo Alves Mateus (entrevista: 10/01/2006), não é intenção deste programa.

Com o directo o que se pretende é a informação na hora, à escala planetária, neste caso concreto, à escala nacional, algo que, por exemplo, o “Regiões” Bragança raramente oferecia aos seus telespectadores, dado que raramente se disponibilizavam carros de exteriores para a região. Actualmente, não se corre o risco de particularizar o

directo em Lisboa ou no Porto, uma vez que eles são distribuídos antecipadamente. Todos os meses, os responsáveis pelo “Portugal em Directo” reúnem na capital, onde, entre outras coisas, são definidos os temas e directos, de Norte a Sul do país (Ibidem). Há, assim, a garantia de que todas as regiões têm eco nos directos que este programa promove de segunda a sexta na RTP.

Mas será que essa representatividade de todas as regiões nos directos deste programa é sinónimo de uma maior informação sobre as mesmas? José Sánchez Noriega (1999: 43) acredita que “esse voyeurismo, essa íntima satisfação de contemplar em directo, não equivale a maior informação nem a um maior conhecimento do que sucede”. O que se pretende é criar a ideia de que estamos mais próximos do acontecimento.

Esta tese seria verdadeira no caso do “Portugal em Directo” não fosse o tempo que se atribui à reprodução dos acontecimentos seleccionados para serem passados em tempo real. Obviamente que se o destaque de hoje é para um facto de Bragança, de certeza que a informação transmitida sobre esta região neste dia será bem maior em relação às outras. Mas também é certo que o destaque vai apenas para um assunto, ficando outros para trás.

De qualquer modo, é importante ter em conta que a simples presença de uma câmara de televisão tem o poder de criar os “pseudo-acontecimentos”, ou seja, a transformação artificial de factos em notícias devido apenas à presença da câmara (Ibidem). Umberto Eco (1993: 145) fala de manipulação, dado que, mesmo o directo, pressupõe uma escolha. Esta teoria é constatada, especialmente, nos trabalhos de agenda, que exigem que o evento televisivo seja preparado. Ele dá o exemplo do futebol: “ (…) veja-se a passagem da velha bola de couro grosseiro à bola televisiva em xadrez; ou a atenção posta pelos organizadores em colocar anúncios publicitários importantes em posição estratégica, de modo a enganar as câmaras e o organismo estatal que não queria fazer publicidade”. O investigador dá como certo o facto de que a entrada em cena de uma câmara de televisão influencia o curso do acontecimento.

No que respeita à selecção de notícias de actualidade, a política do “Portugal em Directo” é semelhante à do “Regiões”, apesar das críticas feitas pelos defensores das janelas regionais. Eles entendiam que as regiões de interior iriam ter menor representatividade em programas regionais emitidos a nível nacional. Se combater essa ideia já era, contudo, um objectivo dos responsáveis pelo programa que se seguiu ao

“Regiões” local, o mesmo se passa com este novo formato. A informação é produzida por cada região em doses mais ou menos equilibradas. Alves Mateus (entrevista: 10/01/2006) diz que é natural que, por vezes, Lisboa e Porto estejam mais representados, porque afinal de contas é no litoral onde há mais acontecimentos. Mesmo assim, avança que não é nada de significativo e que se se avaliarem os mapas de produtividade do CRC de Bragança e se forem comparados com outros, de outras regiões, ver-se-á que os índices são bastante idênticos. Pode haver até mais informação feita em Bragança e menos em Castelo Branco ou em Faro, mas muitas vezes isso deve- se não à falta de assuntos, e sim à falta de meios, porque há reorganizações internas na empresa que fazem, por exemplo, com que Bragança tenha neste momento quatro jornalistas e três operadores de câmara e mais uma equipa em Vila Real e se calhar noutra região, por exemplo, Castelo Branco ou Évora, há menos profissionais, logo, produzem menos. São, no entanto, questões que com o tempo se corrigem.

O entendimento é que se for uma notícia do dia, tem de ser emitida. Se Bragança tiver só uma notícia e Coimbra tiver duas, não é por causa desse desfasamento que não se vai emitir. O que se costuma fazer é tentar gerir de uma forma eficiente a agenda: se houver tempo, e se Bragança efectivamente tiver apenas uma notícia do dia, o que se pode fazer é alinhar uma outra notícia, intemporal, mas que promova a região ou as pessoas que nela vivem (Ibidem).

4.6. O AGENDAMENTO DAS NOTÍCIAS