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REVISÃO DE LITERATURA 2.1 Introdução

2.3. O (in)sucesso em matemática: causas e consequências

Há cerca de dez anos, a Sociedade Portuguesa de Matemática (SPM) elaborou um relatório (SPM, 2009) no qual argumentava que:

“A matemática é uma das matérias mais importantes para a formação dos nossos técnicos e dos cidadãos do futuro. Estamos no século XXI. É urgente formar técnicos competentes, capazes de competir num mercado internacionalizado e numa economia em que o conhecimento tem uma importância cada vez maior.” (p. 2).

Na mesma linha, Brandão (2015) afirmou que “a matemática serve […] para promover o desenvolvimento das crianças e jovens, estimulando-os para a vida social e para o exercício da cidadania.” (p. 75). Na verdade, a matemática é uma disciplina de elevada importância, pois o conhecimento matemático pode ser utilizado pelo homem para a resolução de problemas do quotidiano, para descrever e explicar o mundo físico, bem como para fazer comparação, classificação, ordenação, medição e quantificação (Sousa, 2016) no dia a dia pessoal ou profissional.

Apesar desta importância, desde a antiguidade, sempre foram relatados problemas no que respeita à aprendizagem da matemática pelos alunos (Brandão, 2015). Acresce que, de acordo com diversos autores (Almeida, 2011; Peixoto et al, 2010; Viveiros & Lopes, 2008), o insucesso escolar em matemática é um problema que persiste apesar dos muitos estudos realizados nesta área temática. Há 13 anos atrás, Fernandes e Silva (2005) afirmavam que:

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“O conceito de insucesso escolar em matemática é definido praticamente sempre, em termos do aluno, significando que este não atingiu as competências de um nível de ensino, tem fraco aproveitamento escolar, não está motivado para a disciplina, revela incapacidade/dificuldade em matemática e não domina certos processos matemáticos.” (p. 2807).

Contudo, as causas do insucesso em matemática são várias e, de acordo com Aguiar (2013) e Almeida (2011), podem ser intrínsecas ao próprio aluno ou extrínsecas a ele, tendo, neste caso, origem, por exemplo, nos professores, nas escolas, nos sistemas de ensino ou nas políticas educativas, nos pais e encarregados de educação e na sociedade em geral.

Contrariamente a Fernandes e Silva (2005), também Viveiros e Lopes (2008) afirmam que o insucesso escolar em matemática, apesar de depender da origem socioeconómica dos alunos, não depende só destes. Para estes autores, o insucesso escolar depende de fatores tais como a formação inicial e contínua de professores, as metodologias de ensino utilizadas por estes, os critérios de avaliação das aprendizagens dos alunos, os conteúdos programáticos a aprender pelos alunos, as condições de trabalho docente e os materiais didáticos utilizados.

Atendendo a todos estes fatores, o insucesso escolar em matemática é uma situação preocupante, não só para os alunos, mas também, para professores, educadores e membros das direções escolares, visto que muitas são as causas que precisam de combater a fim de encontrarem soluções satisfatórias para reduzirem o insucesso (Brandão, 2015). Para este autor, grande parte do problema reside no facto de os professores continuarem a privilegiar um ensino de matemática orientado para a mecanização e a memorização, sem contextualização no dia-a-dia dos alunos, dos conhecimentos a aprender. Para minimizar o insucesso escolar na disciplina em causa, Viveiros e Lopes (2008) defendem um ensino de matemática contextualizado e capaz de responder às exigências do mundo atual e que contribua para uma melhor inserção dos jovens na sociedade moderna.

A sociedade também tem responsabilidade no insucesso em matemática, pois, como afirmaram Fernandes e Silva (2005), a imagem negativa da matemática (como um bicho-de-sete-cabeças) que veicula aos jovens acaba por incutir nos alunos desmotivação, desinteresse e até medo pela disciplina.

Com base em estudos realizados por diversos autores (Aguiar, 2013; Almeida, 2011; Araújo & Cabrita, 2015; Brandão, 2015; Fernandes & Silva, 2005; Fernandes et al, 2013; Gonçalves, 2017; Oliveira, 2010; Peixoto et al, 2010; Pereira, 2010; Sousa, 2016; Viveiros & Lopes, 2008), e tal como para a física, foi efetuada uma síntese das diferentes causas de insucesso escolar na disciplina de matemática que se apresenta na tabela 2.

23 Tabela 2

Síntese das causas de insucesso escolar em matemática (elaborada com base na literatura)

Origens das causas Causas Causas relativas aos

professores - Práticas pedagógicas não ajustadas aos alunos; - Recurso a métodos de ensino tradicionais; - Pouca diversificação das estratégias utilizadas nas aulas; - Falta de conhecimentos matemáticos e didáticos; - Falta de competências de comunicação;

- Uso de linguagem complexa; - Falta de vocação para ser professor;

- Inexistência de trabalho colaborativo entre docentes; - Falta de autoridade na sala de aula;

- Não reconhecimento do esforço do aluno;

- Adoção de ideias estereotipadas sobre o ensino e a aprendizagem. Causas relativas aos

alunos

- Dificuldades de aprendizagem; - Fraca autoestima;

- Falta de domínio da linguagem matemática; - Fracas de competências de cálculo; - Falta de concentração nas aulas;

- Falta de motivação, interesse, empenho e autonomia; - Falta de métodos e hábitos de estudo;

- Inexistência de trabalho colaborativo entre alunos; - Interiorização de medo face à matemática. Causas relativas às

escolas e sistemas educativos

- Inadequação (extensão e atualidade) dos programas escolares; - Admissão massiva de alunos;

- Elevada dimensão e heterogeneidade das turmas; - Inadequação da formação de professores; - Inadequação do recrutamento de docentes; - Falta de materiais didáticos;

- Falta de aulas de apoio. Causas familiares,

culturais e económicas

- Desestruturação das famílias; - Baixo nível sociocultural das famílias; - Baixo nível económico das famílias;

- Veiculação de uma imagem negativa da matemática; - Falta de apoio e envolvimento dos pais;

- Falta de diálogo com os educadores e a escola.

O estudo PISA, da OCDE (2004), realizado há mais de 15 anos (em 2003), centrou-se na literacia matemática e visou, nessa altura, avaliar as competências que têm a ver com a capacidade dos alunos para usar os conhecimentos e habilidades matemáticas, para analisar, raciocinar e comunicar eficazmente, e para resolver e interpretar problemas relacionados com diferentes situações e desafios da vida real. Assim sendo, em 2003, o PISA definiu a literacia matemática como:

“a capacidade de identificar e entender o papel que empenham as matemáticas no mundo atual, fazer julgamentos bem fundamentados, usar as matemáticas e comprometer-se com elas de maneira que elas possam satisfazer as necessidades da vida do indivíduo como cidadão construtivo, comprometido e pensativo” (OCDE, 2004, p. 26).

O último estudo PISA que teve mais foco na matemática realizou-se em 2012. No que concerne à definição da literacia matemática usada em 2003, o PISA 2012 modernizou-a e definiu-a como “a

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capacidade dos indivíduos racionarem matematicamente e usarem conceitos matemáticos, procedimentos, factos e ferramentas para descrever, explicar e prever fenómenos” (OCDE, 2014, p. 25). O estudo PISA 2012, envolveu 34 países da OCDE e 31 países associados, perfazendo um total de 65 países (OCDE, 2014). A média da OCDE nesse ano foi de 494 pontos e foi Shangai - China que obteve a pontuação mais alta, 613 pontos. Nesse ano, Portugal foi um dos países que aumentou a percentagem de alunos de maior rendimento e, em simultâneo, reduziu a percentagem de alunos abaixo do nível dois, tendo alcançado uma média de 489 pontos. A Tunísia, único país africano que participou nesse estudo internacional, obteve 388 pontos, tendo ficado abaixo da média da OCDE.

Para OCDE (2014), o domínio da matemática é um forte preditor de resultados futuros e positivos para os jovens e adultos. No entanto, a OCDE (2014) afirma que “a literacia matemática não é um atributo que um indivíduo tenha ou não tenha; em vez disso, é uma habilidade que pode ser desenvolvida ao longo da vida.” (p. 25). Assim, os países da OCDE investem, anualmente, cerca de 230 bilhões de dólares na educação matemática. Esses países entendem que as competências básicas em matemática têm um grande impacto no futuro profissional dos indivíduos.

De acordo com Coelho (2008), o insucesso escolar continua a afetar muitos jovens. Para este autor, os maus resultados na disciplina de matemática, para além de originarem insucesso escolar, dão origem a situações como abandono escolar, envolvimento em profissões não desejadas e/ou a empregos mal remunerados. Esta ideia é concordante com o PISA 2012 quando considera que as habilidades deficientes em matemática limitam, de alguma forma, o acesso das pessoas a empregos mais bem pagos e mais recompensadores.

Para além disso, o estudo PISA 2012 salientou, também, que as pessoas com fortes bases matemáticas são mais propensas a se voluntariar e a se ver como atores, e não como objetos, de processos políticos e são ainda mais propensos a confiar nos outros. Sendo assim, “a matemática permanece como um aspeto distinto e importante das competências dos alunos que compromete a carreira dos jovens, filtrando a entrada num vasto leque de profissões científicas e técnicas que apresentam níveis elevados de empregabilidade e de remuneração.” (Coelho, 2008, p. 672). Nesta linha, como defendem Araújo e Cabrita (2015), motivar os alunos para a aprendizagem da matemática é torná- los cidadãos mais autónomos e críticos.

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