• Nenhum resultado encontrado

O ingresso como professor – motivos e formas de ingresso no CEFETPE

CAPÍTULO VI – CONSTITUINDO A IDENTIDADE DOCENTE: a dinâmica no

4. O exercício da docência no CEFETPE: a identidade profissional revelada como

4.1 O ingresso como professor – motivos e formas de ingresso no CEFETPE

Na definição de Sainsaulieu (1985), a identidade para além de um processo biográfico de construção do eu “é um processo relacional de investimento do eu”. Compreende a “noção do eu” não como um papel passageiro a ser encenado pela pessoa, “mas sim um investimento essencial em relações duráveis que põem em causa o reconhecimento recíproco dos parceiros” (apud Dubar, 1997, p.115), o

que pode ser observado nas trajetórias dos professores narradores ao buscarem um concurso como garantia de reconhecimento na profissão identificada.

Em uma análise geral das narrativas percebe-se que a construção da identidade docente dos narradores é um processo complexo, com motivos e razões pessoais, por meio do qual cada um se apropria do significado que atribui a si mesmo e à educação, ao modo de ser, de sentir-se e tornar-se professor, numa aproximação com o exercício da docência. Apresentam como traço comum a opção pessoal e profissional para ser professor e, principalmente, o fato de se sentirem satisfeitos e realizados na docência. Embora alguns professores desenvolvam atividades profissionais também na área de engenharia, atribuem a si mesmos uma identidade profissional como docente. Como revela o relato da professora P7:

[...] Quando eu vim para escola, realmente, até hoje, é a área que eu me identifico! Eu exerço na minha área profissional, mas onde eu gosto de fazer, o que eu gosto de fazer é exatamente ensinar! Quer dizer, era uma coisa que já estava em mim, como “essa coisa de trabalhar com gente” mas que eu não sabia naquela época identificar como é que eu vou fazer isso dentro daquela área que eu atuava. (P7, 14 anos na docência)

De acordo com os achados na pesquisa encontramos semelhanças quanto ao percurso de ingresso dos professores no CEFET. Primeiro, o fato de sete professores terem ingressado por meio de concurso público, sendo que apenas um submeteu-se à seleção interna, na época, a convite de um professor. Destaca- se a importância e a persistência atribuída em submeter-se ao concurso e o orgulho de ter sido aprovado, bem como a faixa etária, em sua maioria, jovens concluindo os cursos de engenharia. O segundo é o fato de quatro professores

serem alunos egressos dos cursos técnicos da antiga escola técnica, como já citamos neste trabalho.

Podemos inferir que o ingresso na escola por meio de concurso público proporcionou aos professores um reconhecimento oficial de suas habilidades e competências para desenvolver uma carreira na profissão com a qual se identificavam na época como alunos, através das atividades de monitoria e de colaboração junto aos professores. Esse reconhecimento implica a construção do processo identitário, articulando o si (biográfico) e o outro (relacional), pois, como a identidade nunca está definida e acabada, é nesse movimento que os professores se reconhecem na relação com os outros na experiência escolar e (re) significam a sua identidade profissional docente. Isto porque, através do concurso, ocorre a estabilização e efetivação da carreira no magistério (HUBERMAN, 1989).

Situamos no entrecruzamento dessas histórias de vida as tendências gerais descritas no ciclo de vida profissional elaborado por Huberman (1989), contudo, sem considerar uma seqüência linear e temporal. Verifica-se uma semelhança nas trajetórias, porém respeitando-se as singularidades dos professores, de acordo com a seguinte seqüência: para alguns uma “entrada fácil”, não no sentido de que não aconteceram “dificuldades”, mas, sim, quanto à identificação com o magistério originada na “exploração” inicial vivida nas primeiras experiências “extra-oficiais” como aluno-“professor”-“monitor”. Para outros sujeitos, vivenciaram “o choque de realidade” e de “descoberta”.

Os dados nos mostram o interesse motivacional para ingressar no magistério a partir das experiências de vida, da valoração positiva atribuída ao “ser

professor”, ao “gostar de estudar” e “gostar de ensinar”. Para alguns professores, ingressar no magistério significa a possibilidade de realização de um “sonho” pessoal e profissional, como destaca P6:

Foi aqui onde me senti realizado e deixei de pensar em trabalhar em empresa... não vejo mais querer trabalhar como engenheiro, não quero! [...] E, não me sinto frustrado por ter feito engenharia, porque me realizei como professor. Eu me sinto plenamente realizado como professor, não queria ser outra coisa. (07 anos na

docência)

Para os professores egressos dos cursos técnicos, a motivação está caracterizada no campo afetivo de amizade e de satisfação pessoal por estar naquela instituição formadora, convivendo com antigos professores e realizando uma atividade prazerosa, isto é, a atividade de ensino. Destacamos as lembranças significativas dos narradores:

[...] nunca perdi essa expectativa, dessa história quando eu era monitor de escola técnica! Do amor pela escola técnica! Eu sou do tempo em que você era aluno aqui da escola, você se sentia orgulhoso de estar aqui dentro, dos amigos todos... tinha enraizado esse sentimento, e também pela parte da monitoria eu gostar de ensinar, de passar conhecimento para pessoas. (P1, 10

anos na docência)

A minha influência maior em escolher ser professor foi o relacionamento que eu tive no início quando eu era aluno daqui, com outros professores que me chamavam para trabalhar. Então, a gente às vezes viajava, passava uma semana fazendo algum trabalho, conversava bastante. Isso acredito que tenha ajudado para que eu escolhesse. (P5, 10 anos na docência)

Além dessa relação afetiva com a instituição encontramos também o sentido de continuidade de experiências anteriormente vivenciadas na docência, em um desejo implícito de manutenção de vínculos pessoais e profissionais. Isso

implica a importância das referências quanto à orientação pessoal e social, no capital cultural herdado da família e da escola, como verificamos no depoimento:

[...] fui fazendo o curso de engenharia .... no segundo ano, quando eu estava lá, no terceiro período de engenharia surgiu uma vaga para professora aqui na escola. E o professor foi me convidar na universidade. Ele queria que eu fizesse o concurso para professora temporária; naquela época bastava fazer uma prova. Aí eu vim fazer. Lembro, na hora da prova, me deu um branco. Assim...nervosismo, mas depois fiquei direitinho na escola. (P3, 19

anos na docência)

No depoimento da professora P7 observa-se outro ponto de interesse para a docência, inserido no contexto mais amplo de uma socialização positiva, quando enfatiza a satisfação e o orgulho de ter passado no concurso, ainda muito jovem e concluindo o curso de engenharia, e ter concorrido com professores universitários. Confirma-se uma valoração atribuída não só ao conhecimento específico, mas, principalmente, à questão didática inerente ao exercício do magistério, pois, mesmo não tendo a formação na área pedagógica, ela tinha adquirido essa consciência e a prática através do seu “empirismo” nas experiências anteriores.

Quando eu prestei o concurso, tinha muito orgulho de tirar a nota boa na prática! ... que era no ensinar ... era aquilo que valia. Eu me lembro disso, que eu comentava, porque na época eu fiz junto com dois professores da universidade, e eu tirei em primeiro lugar na prova prática... a aula. Eu tinha um orgulho de dizer, “porque era professor há não sei quantos anos de universidade!” Mas, me saí bem na prova prática! Eu sempre gostei muito dessa coisa organizada, de trabalhar uma aula. (P7, 14 anos na docência)

No caso de outros dois professores, após terem investido profissionalmente na engenharia através de estágios e em trabalhos em indústrias, a procura pela docência decorre das “incertezas”, dos “questionamentos” sobre a possibilidade de realização pessoal e profissional nessas atividades. Esses professores

vislumbravam uma atividade que fosse prazerosa, na qual pudessem conciliar a formação inicial com o investimento em estudos posteriores. Como lembra P4: [...]Não tinha tempo para atualização, para estudar nada, era só trabalho... e viajava muito [...] E aí eu pensei em fazer outra coisa.

Por sua vez, P6 não estava satisfeito com as experiências nos estágios como engenheiro, não conseguia imaginar uma realização profissional nessa área, pois sempre associava o “gostar de estudar, de ensinar com a sensação de que seria professor”, não importando, assim, o curso superior que tivesse cursado. Busca na pós-graduação o mestrado em engenharia, a condição para concretizar profissionalmente o seu desejo de ser professor. É aprovado no concurso para professor no CEFET e realça o seu bom desempenho na prova prática – aula: “[...] dei minha aula, preparei o plano de aula, inclusive preparei exercícios...Boa aula! Passei! Era o que eu queria!.. Aí, eu vi que realmente eu sou professor!”. Podemos inferir que há uma relação de continuidade entre o processo identitário biográfico e o relacional, assegurado pelo desejo de pertencimento no grupo profissional de identificação, ou seja, “ser professor”.

Nos percursos motivacionais para ingresso na docência no CEFET, verificamos que a construção da identidade se dá entre as transações objetivas e subjetivas nas relações com o outro, articulada entre os sistemas de ação que propõem identidades virtuais e as “trajetórias vividas” explicitadas na forma como cada professor reconstruiu subjetivamente as experiências que julgam significantes na sua trajetória pessoal e social na família e na escola.

4.2 A “lacuna” da formação didático-pedagógica – o choque de