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O tempo profissional como espaço construtor da Identidade Docente

CAPÍTULO I – A SOCIALIZAÇÃO E A IDENTIDADE DOS PROFISSIONAIS

1.2 O tempo profissional como espaço construtor da Identidade Docente

sobre sua prática docente, do significado que atribui a si mesmo e à educação, da forma como se reconhece no magistério. A identidade não é um dado imutável, mas, sim, um continuum no desenvolvimento pessoal e profissional do indivíduo.

1.2 O tempo profissional como espaço construtor da identidade docente

O “tempo profissional” referencia-se na concepção de “saberes temporais”, conforme TARDIF (2002), porque são adquiridos nos processos de socialização e de aprendizagem inscritos na história de vida do professor e construídos ao longo de uma carreira profissional. Esse tempo é entendido “tal como é vivido e não como tempo cronológico expresso em termos de datas” (p.67) e que possibilita a compreensão da genealogia dos saberes docentes. Nesse sentido, esse autor defende que:

Se uma pessoa ensina durante trinta anos, ela não faz simplesmente alguma coisa, ela faz também alguma coisa de si mesma: sua identidade carrega as marcas de sua própria atividade, e uma boa parte de sua existência é caracterizada por sua atuação profissional. [...] com o passar do tempo, ela vai-se tornando – aos seus próprios olhos e aos olhos dos outros – um

professor, com sua cultura, seu ethos, suas idéias, suas funções, seus interesses, etc (ibdem).

Na concepção de “tempo como vivido”, considera-se a sua subjetividade na medida em que se constitui, “modela-se”, a identidade profissional. É mediante um certo tempo – tempo da vida profissional, tempo da carreira – que o Eu pessoal vai se transformando no contexto do trabalho e se torna um Eu profissional. Nesse sentido, a noção de experiência presente “no cerne do Eu profissional do professor e de sua representação do saber ensinar remete ao tempo, concebido como um processo de aquisição de um certo domínio do trabalho e de um certo conhecimento de si mesmo” (TARDIF, 2002, p.108).

A relação tempo e identidade profissional do professor está inserida na sua trajetória pessoal e profissional, na sua história de vida e socialização. Com base em Dubar (1997), a identidade não é apenas um “dado”, mas também um “constructo” que remete “aos atos” de agentes ativos capazes de justificar suas práticas e de dar coerência às suas escolhas. É no estatuto de uma profissão que se compreende a identidade. No caso do professor, é no seu processo de socialização e na carreira no ensino que se constitui a identidade pessoal e profissional, através de um repertório de saberes e competências e do bem-estar pessoal na profissão. Portanto, segundo Tardif,

[...] se é verdade que a experiência do trabalho docente exige um domínio cognitivo e instrumental da função, ela também exige uma socialização na profissão e uma vivência profissional através das quais a identidade profissional vai sendo pouco a pouco construída e experimentada e onde entram em jogo elementos emocionais, relacionais e simbólicos que permitem que um indivíduo se considere e viva como um professor e assuma, assim, subjetivamente e objetivamente, o fato de fazer carreira no magistério (2002, p.108).

É nessa dimensão temporal do processo constitutivo da identidade profissional do professor que se estrutura “a memorização de experiências educativas marcantes para a construção do Eu profissional, e constitui o meio privilegiado de chegar a isso” (TARDIF, ibdem p.67). É a partir de referenciais espaço-temporais que o professor validará as suas certezas experienciadas, enquanto busca a definição de formas identitárias aceitáveis para si e para os outros.

No que se refere ao tempo vivido na trajetória profissional, conceituada por Tardif como pré-profissional (grifo nosso), a literatura internacional25 e os estudos

empíricos revelam que o saber dos professores sobre o ensino, sobre como ensinar e sobre o papel do professor é proveniente de sua história de vida. Destaca sua socialização escolar (enquanto aluno), na qual adquire-se um repertório de conhecimentos, de crenças, de representações e de certezas sobre a prática docente. Nesta pesquisa, conceituamos como primeiras experiências

extra-oficiais na docência. Segundo Raymond et allii (1993):

[...] os saberes adquiridos durante a trajetória pré-profissional, isto é, quando da socialização primária e sobretudo quando da socialização escolar, têm um peso importante na compreensão da natureza dos saberes, do saber-fazer e do saber-ser que serão mobilizados e utilizados em seguida quando da socialização profissional e no próprio exercício do magistério. [...] uma parte importante da competência profissional dos professores tem raízes em sua história de vida, pois, em cada ator, a competência se confunde enormemente com a sedimentação temporal e progressiva, ao longo da história de vida, de crenças, de representações, mas também de hábitos práticos e de rotinas de ação (apud: TARDIF, 2002, p.69).

25 LESSARD &TARDIF, 1996; TARDIF & LESSARD, 2000 e Raymond, 1998 et alli nos estudos de

80 documentos autobiográficos de futuros professores e 10 histórias de vida de professores experientes. In: TARDIF, 2002.

No campo educacional os estudos sobre a socialização pré-profissional iniciados nos anos 90, defendem a idéia de que na prática profissional evidenciam-se saberes que provêm da socialização anterior à preparação profissional para o ensino, assim como provêm de “preconcepções do ensino e da aprendizagem herdadas da história escolar” (TARDIF, ibid.p.72). Entendemos que essa idéia também pode ser aplicada à prática dos professores que não passaram por uma formação inicial para o ensino, como é o caso dos professores deste estudo.

É, portanto, na socialização profissional que se situa a temporalidade do saber docente, a qual expressa na trajetória de vida a construção de sua identidade profissional no exercício de seu trabalho docente, permeado pelo significado das experiências e dos saberes que lhe dão consistência. Essa dimensão temporal é marcada por dois fenômenos: a trajetória pré-profissional ou

fontes pessoais e a carreira no magistério. A carreira é um processo de vida

profissional, com fases e mudanças, no qual estão presentes as dimensões identitárias e as de socialização profissional. O início desse processo decorre da socialização escolar, que pode ser determinante quanto à escolha da carreira e ao estilo de ensino, assim como à relação afetiva e personalizada para o magistério.

CAPÍTULO II - A CONSTITUIÇÃO DA IDENTIDADE DO