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Organizado na modernidade, o jornalismo se inscreve num funcionamento cultural atravessado por um eixo simbólico multi-referencial que corrobora processos de subjetivação emancipatórios, desprendidos dos dogmas religiosos. Nesse enquadre, a noção de verdade como fato verificável, passível de experimentação traz uma referência à realidade objetiva diferente daquela concebida nas sociedades tradicionais. Uma vez que o divino não configura mais o princípio fundador do universo simbólico e a Ciência, o Estado, a Nação etc. passam a desempenhar a função legitimadora do funcionamento cultural em que os discursos se circunscrevem, instaura-se uma tensão entre dois processos: a objetivação e a subjetivação.

Dessa tensão dialética se desenvolve o padrão interacional moderno, no qual a Ciência desempenha um papel prototípico. Isso quer dizer que a noção de verdade científica como aquela que se constrói na relação objetiva com a empiria a partir de experimentos passa a habitar não apenas o âmbito científico propriamente dito, mas atravessa até mesmo o senso comum, ou seja, passa a habitar a base referencial da cultura em que as relações sociais se circunscrevem. Na modernidade, a inversão nas relações dialogais tal como propõe Dufour (1990) ao tratar do contexto científico mostra que o sujeito falante – o “eu”, aquele que enuncia e se posiciona como sujeito – estabelece diálogo com o objeto – o “ele”, aquele que, a princípio, estaria ausente da enunciação – atua como modelo referencial de interação, organizada dialeticamente. Essa inversão das pessoas do discurso sugere a valorização da tensão subjetivação vs. objetivação nesse modo de construção do sujeito. Isso quer dizer que o “eu” não se afirma como pessoa na relação com outra pessoa, mas no modo como lida com a não- pessoa, com o objeto do discurso.

45 Especificamente no âmbito do jornalismo, essa tensão ocupa lugar de destaque. A noção de objetividade, que implica gestos de objetivação, tem ligação direta com a questão ética, embora não haja consenso quanto ao modo como essa relação deva se dar. De acordo com Kunczik (2002), o conceito jornalístico de “objetividade” é mais um ponto de partida do que de chegada. A tentativa de defini-lo provoca discussões ao invés de aquietá-las e de nortear as práticas profissionais. O autor chama a atenção para o fato de que uma das características do conceito de objetividade é que frequentemente

ele é discutido sem ser definido. Supõe-se simplesmente que todos conheçam o seu significado (idem, p. 228). Ainda o mesmo autor ressalta quatro pontos de vista quanto à conveniência e à possibilidade da objetividade:

1. Afirma-se sem reservas a conveniência e a possibilidade da objetividade editorial. Essa atitude, que não vê contradição alguma entre a norma e a realidade, só se sustenta de um ponto de vista não científico;

2. Afirma-se criticamente a conveniência e a possibilidade da objetividade editorial; ela nem sempre é absoluta e não se considera possível sua consecução no sentido de demandas absolutas. Essa afirmação crítica da objetividade define-a como uma norma ocupacional basicamente praticável e como requisito prévio da comunicação numa democracia parlamentar;

3. Reconhece-se em princípio a conveniência da objetividade editorial, mas discute-se a sua possibilidade, já que sempre entram em jogo elementos subjetivos. Exige-se a equidade ou a expressão de uma variedade de opiniões;

4. Nega-se terminantemente a conveniência e a possibilidade da objetividade editorial. A objetividade é mera ficção científica

(Kunczik 2002:228, 229).

Essas divergentes maneiras de conceber a objetividade jornalística não encerram uma discussão teórica estéril. Pelo contrário, demonstram sua implicação num funcionamento cultural, o que vincula a discussão à ética profissional daqueles que se engajam na produção das notícias, reportagens etc. Ainda de acordo com Kunczik (2002):

O problema da objetividade na reportagem produz uma vez ou outra vez debates acalorados sobre a política da comunicação. Dada a

imprecisão da definição do termo, qualquer órgão editorial poderia

ser acusado de falta de objetividade ou de ser incapaz de reconhecer a verdade e transmiti-la apropriadamente (idem, p. 229 – grifos nossos).

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Diante disso, percebemos uma relevância conceitual que escapa do domínio estritamente teórico e tange diretamente a prática profissional. Assim, parece importante buscar os elementos postos em cena na tentativa de definir um termo tão relevante para o jornalismo. No senso comum, “objetividade” é concebida como a qualidade do que é prático, direto, não subjetivo. Desse ponto de partida, a objetividade do discurso deve ser entendida como uma linguagem acessível, sem circunlóquio, o que se concretiza por meio de mecanismos sócio-discursivos específicos. Isso significa dizer que, se entendemos que a objetividade está atrelada à praticidade, entendemos que o conceito, ainda que inserido no arcabouço teórico de uma disciplina, nomeia algo reiterável a partir de uma práxis.

Tomando a discussão de Ribeiro Junior (2001), entendemos que assumir uma postura ética profissional não implica abrir mão de posicionamento diante do fato social. Sendo inevitável dar pesos diferentes a determinados elementos quando da redação de uma matéria, não há como produzir um texto isento de subjetividade. Isso, porém, não significa negligenciar a necessidade de organizar de um modo responsável os fatos que serão apresentados no texto jornalístico. O desafio é conseguir articular no discurso um distanciamento responsável diante do objeto tomado.

O fato é que a noção de objetividade, que instaura celeumas nos dias de hoje, vem se transformando e orientando a questão ética dessa produção discursiva a partir da articulação de três perspectivas: ontológica, epistemológica e de procedimento (WARD, 2004). Esses pontos de vista de algum modo organizam aquilo que se referenda como ético em dado momento histórico na construção da esfera jornalística. Antes de apontar o percurso histórico da ética no jornalismo, atentemos para essas três perspectivas da objetividade discutidas pelo autor (idem).

Algo é ontologicamente objetivo se dispensa experimento, existe na realidade objetivada, como fato, e não de modo ilusório na mente (o que seria ontologicamente subjetivo). Traduzindo as palavras do próprio autor, citamos que a objetividade

ontológica explica a distinção subjetivo-objetivo como uma diferença entre realidade e aparência (WARD, 2004:17; tradução nossa). Isso significa dizer que aquilo que é referendado pelo crivo da objetividade ontológica dispensa a mediação dos sentidos, que conferem subjetividade ao real, aportando algo de subjetivo – aparente – ao objetivo – o real.

47 De outro ângulo, a objetividade pode ser concebida epistemologicamente, construindo crenças e métodos de investigação. As crenças são epistemologicamente objetivas se satisfazem aos padrões metodológicos de dada prática. Por exemplo, enquanto a crença de que uma árvore tenha a folhagem verde requer tão somente que as pessoas assim a vejam e a referendem, a crença na herança genética de traços de personalidade, por outro lado, requer experimentação científica detalhada com métodos que atendam às demandas da Ciência. A objetividade epistemológica explica a distinção subjetivo-objetivo como a diferença entre crenças adequadamente fundamentadas e

crenças não adequadamente fundamentadas (WARD, 2004:17; tradução nossa).

Do ponto de vista do procedimento, a objetividade diz respeito às ações práticas, decisões justas e razoáveis. Como o próprio termo sugere, a objetividade de procedimento não pertence ao domínio de disputa teórico-simbólica com as outras, mas ao domínio da ação empírica. Citamos mais uma vez as palavras de Ward (2004:17,18):

um procedimento decisório é objetivo se satisfaz um número de critérios relevantes que reduzem a influência de considerações irrelevantes ou tendências (tradução nossa). Apesar de não indiferente às outras duas perspectivas, a objetividade do ponto de vista do procedimento não parte de um comprometimento explícito com as demais. O autor prossegue: [aqueles que tomam decisões objetivamente] têm de agir imparcialmente em

relação às partes afetadas pela decisão. Têm de pesar direitos, princípios conflituosos e as prováveis consequências dos cursos de sua ação (WARD, 2004:18). O alvo dessa perspectiva da objetividade não é a demonstração científica, nem a busca pela verdade metafísica, mas a justiça e os melhores meios de atingir fins. É certo que a tomada de decisão reflete valores políticos, mas seu foco é de ordem estritamente pragmática.

Notemos que essas três perspectivas não constituem posições estanques, antes sinalizam os múltiplos eixos a partir dos quais a produção jornalística opera. Isso significa dizer que não há uma única objetividade ontológica e/ou epistemológica. Pelo contrário, há tantas quantas os funcionamentos culturais referendarem. Outra peculiaridade dessas abordagens é o fato de cada uma delas apontar para um modo de tensão objetividade vs. subjetividade. Independente de qual perspectiva se trate, sempre há uma contrapartida subjetiva.

Entendida essa inserção sócio-histórica da oposição objetividade-subjetividade, podemos dizer que a tensão objetivação-subjetivação diz respeito aos processos que

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constroem o senso de objetivo-subjetivo. São esses processos que nos interessam nesta investigação. Mais do que um produto final referendado (ontológica, epistemologicamente ou pelo procedimento) como objetivo, os mecanismos simbólicos subjacentes e constituintes de cada uma das perspectivas da objetividade mostram como a questão ética se constrói e se transforma concomitantemente com a noção de sujeito que atualiza e é atualizada no funcionamento cultural.

Compreendemos que essa seja a origem do fundamento ético jornalístico em direção à objetividade. Notemos que o privilégio dado à objetivação não implica anulação do processo de subjetivação. Pelo contrário, a dialética tece o sujeito jornalístico moderno. Se a objetivação, que orienta a prática jornalística, é constitutiva do processo de subjetivação, essa tensão é atravessada por questões éticas, o que traz para a discussão a questão da responsabilidade. Se o sujeito se constrói na relação com a não-pessoa, há de se considerar tanto a responsabilidade quanto à apropriação da não- pessoa quanto ao que se faz dessa apropriação.

Essa tripla consideração da responsabilidade supõe um compromisso com o outro e com o Outro. No âmbito do jornalismo, a responsabilidade tem implicações ainda mais complexas, porque, como discutimos no item anterior, assim como nas ciências humanas, o objeto no discurso jornalístico é também um sujeito. Portanto, apesar de se tratar de uma relação “eu-ele”, configura uma relação entre sujeitos, estando um na condição de sujeito falante e outro na condição de objeto do discurso. A construção do objeto como falante ou apenas falado (AMORIM, 2004) determina a postura ética que orienta o processo de construção dos sujeitos jornalísticos.

Conceber a articulação ética no ponto de interseção entre o eixo das relações simbólicas e o das relações dialogais imediatas demanda uma abordagem da produção jornalística engajada no funcionamento cultural, e não simplesmente como resultado da cultura. Se concebemos o exercício jornalístico como arena de tensão entre a objetivação vs. subjetivação, que caracteriza o paradigma moderno, entendemos que a sua produção não apenas reflete valores fundadores, mas também os refrata ao consolidar determinada postura ética na construção de seu objeto. Especialmente no caso desta investigação em que tratamos do contexto de premiação de reportagens de uma editoria que trabalha na construção de uma imagem de seriedade, consideramos que os valores entretecidos na produção do material jornalístico impresso sejam

49 efetivamente o objeto referendado nos concursos, o que nos diz muito a respeito do modo como a cultura organizacional do jornal tem definido sua ética.

Essa abordagem torna pertinente à discussão a perspectiva filosófica de ato proposta por Bakhtin (1921/1993) por inscrever a responsabilidade na existência humana e, assim, lançar os primeiros fundamentos que justificam a proposta dialógico- enunciativa da trama discursiva – viés por meio do qual entendemos a construção dos sentidos e que toca tanto o nível dialogal quanto o simbólico-político das relações sociais (cf. cap. 2). A noção de ato do ponto de vista dialógico bakhtiniano permite compreender como a linguagem e as atividades profissionais podem se interpenetrar e se interdefinir, tendo o sujeito como interseção. Mesmo em esferas como a jornalística, que privilegia a objetivação e, por isso, busca apagar os processos de subjetivação a ela inerente, a responsabilidade existencial, manifesta na tensão objetividade vs. subjetividade, se impõe de modo a desvelar valores que fundamentam e ordenam as relações do humano com a realidade objetiva e suas relações intersubjetivas.

Retomando a discussão de Ward (2004), destacamos, assim como o autor, que a ética jornalística foi tecida ao longo da história de acordo com a trama em que a produção se inseria. Apesar de reconhecer a dificuldade em precisar o início do jornalismo moderno, o autor opta por refazer o percurso da articulação ética dessa esfera a partir do século XVII, quando emerge um conjunto de habilidades usadas na produção de notícias impressas para um público. É também nesse século que surgem os primeiros periódicos impressos. Tanto o meio quanto a periodicidade são cruciais para a configuração de um estatuto enunciativo que inaugura um novo modo de relação social. Esse estatuto será discutido no próximo capítulo.

Com seus primórdios no violento período britânico rumo a uma monarquia cerceada pelo parlamento, o jornalismo se orienta a partir do “discurso de fatos” desenhado pela Ciência. Sua adesão a esse discurso lança o primeiro fundamento da ética jornalística: o fato. Em meio às turbulências político-religiosas que marcaram esse período da história britânica, os primeiros periódicos viam-se compelidos a adotar uma pretensa imparcialidade, assim como aquela pretendida pela Ciência, como condição de manutenção.

O desenvolvimento de centros urbanos, que concentravam toda sorte de pessoas, e a sede por informação face aos tumultos políticos da época favoreciam a relação

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entretecida pela imprensa. Além disso, a circulação de correspondências conferia à imprensa a capacidade de repensar as relações espaço-temporais. Desde o período pré- periódico (até os anos 1620, aproximadamente), o jornalismo reconfigurava as noções de espaço e tempo por apresentar “fatos” que escapavam ao alcance imediato dos leitores. Do período pré-periódico, o jornal herdou o formato dos panfletos e

broadsides, cuja ética manteve-se sub-reptícia, já que não havia regularidade na produção, nem um sujeito (empírico ou institucional) que se responsabilizasse pela produção jornalística, e nem a adesão ao “discurso de fatos”. É a partir da imprensa periódica que começa a se construir a interação entre editores, jornalistas e o público mediada pela escrita. A adesão ao discurso de fatos é crucial para o desenvolvimento do jornalismo porque, simultaneamente se embasando nela e referendando a perspectiva moderna de verdade, essa produção discursiva inaugura uma possibilidade relacional. A partir daí, a interação jornalística diferencia-se da produção literária, por exemplo, pelo apelo ao discurso de fatos que a afasta da ficção, porém seu caráter pontual não a equipara à interação científica. O jornalismo se estabelece como esfera discursiva.

Ainda de acordo com Ward (2004), a periodicidade da imprensa (a partir dos anos 1620) tece os princípios éticos jornalísticos. A regularidade da publicação confere comprometimento à relação entre jornalistas, editores e público. Para garantir a publicação, os editores adotam o discurso ético fundamentado na imparcialidade e verdade como mecanismo de objetivação do discurso e consequente comprometimento com os leitores. O autor ressalta que o apelo à ética bem como sua articulação linguístico-textual-discursiva fundam a retórica ética, que norteará daí por diante as relações compreendidas pela esfera jornalística.

A retórica ética advogada nessa época se fundamentava em três alegações caras até os dias atuais: publicar a verdade, e não ficção, aderir aos métodos que dessem acesso aos fatos confiáveis e equilibrados e adesão à imparcialidade. Essas três alegações deixaram um legado para a ética pública que se constituiria no século seguinte. A imprensa no século XVIII criou práticas jornalísticas e editoriais que se tornariam padrão ético, estabeleceu um léxico da ética para a esfera discursiva e lançou os primórdios do que se constituiria como esfera pública de circulação e construção de sentidos.

51 No século XVIII, então, o jornalismo é marcado pela construção de uma ética pública com o desenvolvimento da noção de domínio público, principalmente a partir da articulação de ensaístas na Inglaterra que consolidaram o lugar sócio-histórico do público e o movimento de jornalistas radicais que segmentaram a Inglaterra, França bem como as colônias americanas. O estatuto do jornalismo nessa época é comparado a de um quarto estado, de acordo com o comentário de Edmund Burke, um dos teóricos da constituição britânica (WARD, 2004). Essa comparação sinaliza a importância que a imprensa havia conquistado no funcionamento cultural da Inglaterra e, em seguida, se espalharia pelo Ocidente.

A periodicidade já representava, desde o século anterior, um avanço nas relações entre editores, jornalistas e público. Data de 1702 o primeiro jornal diário na Inglaterra. Outros aparecerão a partir dos anos 20 desse século e, na França, a partir 1777. A maior parte da Europa só terá imprensa significativa no século XIX. De qualquer modo, é a partir da imprensa diária que a esfera pública é consolidada no processo interacional jornalístico. Daí por diante, termos como “público”, “opinião pública” entram no léxico da ética do jornal, que passa operar como agente e/ou representante do público. Certamente, a ética dessa perspectiva considera a função do jornal na formação de opinião pública. O ponto é: além do apelo aos fatos já aclamado desde o século anterior, no século XVIII, o leitor passa a atuar de modo mais patente na interação jornalística. Nesse momento, o jornal se endereça ao público, e não simplesmente a um público.

Esse público que emerge é determinado pela classe social e econômica. Mesmo assim, fica evidente que o jornal atua na vulgarização da arte, ciência e notícias em geral. Apesar de não acessível a qualquer um, já que a imprensa demandava, no mínimo, alfabetização, o jornal estende as fronteiras de circulação do conhecimento, traduzindo para um público menos restrito a linguagem de outras esferas como a artística, científica, entre outras. Ward (2004:131 – tradução nossa) ressalta que

cientistas, acadêmicos, negociantes de arte, vendedores de livros usavam a imprensa para construir uma rede de comunicação por meio da esfera pública, e essa rede corroborava e se construía como espaço de circulação de mercadorias. O pensamento liberal ganha, com o desenvolvimento jornalístico, propulsão suficiente para atravessar diferentes níveis sociais de diversos lugares num espaço de tempo mais curto do que nunca. O estabelecimento de uma interação entre editores, jornalistas e público é

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endossada como arena liberal a partir dos anos 30 do século XVIII, quando os anúncios publicitários são introduzidos no jornal.

Ao longo das disputas políticas travadas ao longo de todo o século XVIII na Europa, os jornalistas vão assumindo uma das três posturas que vão se consolidar definitivamente na escrita jornalística: uma postura partidária, a princípio, ligada à adesão ou crítica à monarquia; uma postura de espectador, que posicionava o jornalista num ponto privilegiado para contemplar e reportar os fatos que compunham o cotidiano da sociedade; e os revolucionários, que, a partir da década de 60, assumem uma expressão explícita especialmente contra a monarquia (seguidores radicais do partido Whig). Essas três posturas que se desenharam especialmente na Inglaterra e, posteriormente na França, principalmente após a Revolução Francesa, marcam o que até os dias de hoje identificamos como notícias imparciais e objetivadas, editoriais, que assumem uma linha político-ideológica, e ensaios, que promovem a reflexão e visam a formação da opinião pública (WARD, 2004). É nesse período que diferentes naturezas de textos jornalísticos começam a ser forjados.

O principal legado das transformações no jornalismo no século XVIII diz respeito ao estabelecimento de diferentes tipos de textos jornalísticos que vão se desenhando a partir daí e à estruturação das relações implicadas na produção, circulação e recepção dos textos jornalísticos de modo a consolidar o envolvimento entre editores, jornalistas, público e, por que não dizer, comerciantes que utilizam o meio para divulgação de anúncios.

Organizado esse cenário, o século seguinte, o XIX, é o período em que a orientação liberal é confirmada, construindo, basicamente, duas vertentes jornalísticas: uma elitista, como a imprensa britânica, que se articulava como educadora e formadora de opinião; e outra de massa (popular), como a imprensa americana, que desenvolveu o mecanismo de capturar no texto jornalístico aquilo que a massa demandava. Enquanto a postura britânica se desenvolvia numa perspectiva de cima para baixo, a americana supostamente se articulava a partir do popular. Por que supostamente? Porque tanto uma vertente quanto a outra se orientavam efetivamente pelos valores liberais que se impunham e atravessavam o funcionamento cultural. Independente da tendência editorial, a interação jornalística moldava-se pela noção cada vez mais imperativa da circulação de mercadorias.

53 É nesse século que a imprensa se estabelece no Brasil. Apesar de haver controvérsias quanto à existência de prelos no Brasil antes da chegada da família real