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O Materialismo Histórico e a Concepção de Avaliação

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CAPÍTULO 1 AVALIAÇÃO EXTERNA COMO POLÍTICA PÚBLICA PARA A

1.3 Revisitando o Conceito de Avaliação

1.3.1 O Materialismo Histórico e a Concepção de Avaliação

O início do século XXI foi marcado por transformações gigantescas e aceleradas em todo o mundo, que marcaram o contexto educacional dos países da América Latina. Castelo (2012, 623) relata que

Na década de 1990 os danos sociais da agenda neoliberal foram sentidos com maior intensidade. Brasil, México e Argentina viram cadeias dos parques produtivos ser desmontadas e alguns setores desnacionalizados. O desempenho macroeconômico foi pífio: baixas taxas de crescimento,

desequilíbrios nos balanços de pagamentos (com graves crises cambiais), déficits públicos crescentes e aumento das dívidas públicas internas. E os efeitos sobre expressões da “questão social” também foram desastrosos: aumento do desemprego estrutural e do pauperismo (absoluto e relativo) e perda de direitos sociais básicos, com a precarização das relações trabalhistas e a privatização de bens públicos, como saúde, previdência e educação.

De acordo com o contexto histórico, os fatos ocorreram com tendências de aprimorar o ensino, com a qualidade do ensino da sua oferta. As mudanças direcionaram o tema avaliação para além do campo escolar, de forma que essa assume funções que respaldam ao modelo econômico capitalista. Matrizes teóricas e práticas educacionais atravessaram o tempo, carregadas de valores e ideais que direcionam a busca pelo conhecimento no campo das Ciências Sociais.

Os fundamentos teóricos entendem que a busca do conhecimento deve seguir um rigor metodológico para ver e explorar o mundo, garantindo a cientificidade. O sujeito está na realidade, mas essa não é o conhecimento e existe independente do sujeito que a modifica por sua atuação na natureza. O real é complexo e envolve vários campos das ciências humanas, cabendo à teoria interpretá-lo.

As teorias descrevem o mundo e constroem-se, na dinâmica da história, diversas formas de intervenção. Nesse sentido, Löwy (2002, p. 35) destaca as seguintes proposições teórico-metodológicas “[...] relação entre ideologias, utopias, visões sociais de mundo, valores, posições de classe, posições políticas e ciência”. Tratam-se do Racionalismo, do Positivismo e do Marxismo no estudo em questão, que aponta o materialismo histórico como a concepção que norteia a pesquisa em educação e orienta a visão do processo avaliativo.

O desvelar da realidade em si requer métodos de interpretação e explicação que deem conta do objeto de estudo em sua totalidade, envolvendo as contradições existentes em seu interior, com vista a aproximar da realidade investigada, (TRIVINOS, 1987). Nesse pressuposto, o materialismo histórico dialético é empregado na tentativa de compreender a PB e sua composição na história sustentada pelo movimento dialético. Esse método possibilita ter uma visão ampla e contextualizada da realidade estudada, por meio de suas categorias de análises, sendo que permite dialogar com A PB, na tentativa de apreender o real.

O método materialismo histórico dialético de Karl Marx (1818-1883) encontra- se fundamentado a partir dos conhecimentos que esse teórico adquiriu na Inglaterra.

Entende ser necessário conduzir seus estudos do plano mais amplo para o mais estrito a fim de captar a realidade. O marxismo compreende a natureza humana em seu desenvolvimento histórico. Seu estudo é sobre a sociedade burguesa e como essa constitui o ser social. Seu método de investigação parte da interpretação econômica, social e política para transformação social. O mundo precede à consciência, no qual o homem é um ser concreto, histórico e social que transforma seu ambiente (MARX, 2015).

Nessa filosofia, o conhecimento é um produto histórico, cuja realidade se explica no contexto político, social e econômico na busca pela compreensão da essência humana e seu desenvolvimento histórico. Os aspectos teóricos e práticos se relacionam e essa interação gera a práxis, que possibilita a reflexão-ação- reflexão em constante movimento e transformação. Essa composição promove o aprimoramento no campo educacional, entendendo o sujeito em seu aspecto total.

Para Perrenoud (1999, p. 111), a ideia de aprendizagem e desenvolvimento passa pela interação com o real. Afirma que toda “[...] psicologia genética piagetiana é indissociavelmente construtivista e interacionista”. Esse pensamento destaca que as pedagogias “[...] novas, modernas e ativas, insistem na importância da ação do sujeito que quer atingir um objetivo e se choca com a realidade”. Mesmo conflituoso, o ato de interagir é essencial, pois não se aprende sozinho.

Nessa perspectiva, a interação do estudante com a realidade possibilita a construção do conhecimento e torna a aprendizagem contextualizada e significativa. Do mesmo modo, o processo avaliativo contínuo e totalitário está a serviço da aprendizagem. Fundamenta-se na avaliação formativa aliada ao diagnóstico, à autoavaliação. A inter-relação dos aspectos qualitativos e quantitativos evolui de acordo com as transformações do contexto, sendo a práxis a base que possibilita novo conhecimento (SOUSA, 2007).

Nessa matriz, são apresentadas soluções das práticas capazes de promover mudanças. A avaliação na concepção dialética vai muito além da técnica, o diálogo é horizontal e político. Essa teoria possibilita a prática da avaliação externa com caráter formativo. Reconhece as contradições presentes em todo o processo educacional a partir de uma construção histórica, tanto no seu contexto como no percurso. O conhecimento não acontece somente no fazer, mas também no pensar estruturado e (re)elaborado.

Por um lado, essa concepção reconhece o sujeito em sua integralidade, defende igualdade de direitos e confronta a ideologia dominante, que promove a distinção de classes para garantir privilégios. Por outro, a concepção de avaliação, no materialismo histórico dialético, entende que a educação básica deve formar sujeitos que se coloquem na condição de promover a democracia e a cidadania. Assim, a avaliação se diferencia das demais na dimensão da adaptação, sendo a escola vista como espaço de construção emancipatória.

As abordagens qualitativas e quantitativas dialogam com a avaliação, que se centra em si. Ela serve como mecanismo que direciona a aprendizagem. Entende e reflete o processo educacional com base no diálogo interacional, contínuo e totalitário do ensino e aprendizagem para desenvolvimento da criticidade. O estudante é visto como sujeito ativo, e não como indivíduo, e o professor como mediador da aprendizagem. Há a valorização do diagnóstico que desencadeia a mediação do ensino e a autoavaliação. Nesse ensino, reconhecem-se as contradições existentes no processo (SOUSA, 2007).

O materialismo afasta a ideia do conhecimento como verdade absoluta e coloca o sujeito na posição de humildade para investigar as causas do sucesso ou insucesso dos estudantes. A avaliação investiga o nível do conhecimento dos estudantes e as condições em que acontece a aprendizagem para desvelar o real, indo além das aparências, para a promoção da emancipação do cidadão. De acordo com Trivinos (1987), essa filosofia afasta a visão descontextualizada da realidade. Distancia do projeto educacional que apresenta a avaliação como meio de reprodução da cultura de uma classe:

Normalmente a avaliação na escola está relacionada ao desenvolvimento de hierarquias de excelência. Em nome da excelência os alunos são classificados, comparados por meio de avaliações padronizadas que exerce o papel de treino para o exame. Uma hierarquia de excelência jamais é o puro simples reflexo da “realidade” das variações, (PERRENOUD, 1999, p. 11).

Em uma concepção positivista, os dados estatísticos ganham visibilidade e os elementos quantitativos passam ser mais importantes. A avaliação torna-se seletiva, arbitrária e classificatória. Para Bourdieu (1998) o processo de exclusão é contínuo e brando. Antes de passar pelo exame avaliativo, o professor já exclui o

aluno pela sua linguagem e postura. A avaliação torna-se um meio de colocar sobre o aluno o pensamento de que ele é responsável por seu fracasso escolar.

Essa postura não condiz com a avaliação formativa que promove a emancipação do sujeito. Para Perrenoud (1999, p. 18), “[...] o fato de a avaliação estar ainda entre duas lógicas decepciona ou escandaliza aqueles que lutam contra o fracasso escolar e sonham com uma avaliação puramente formativa”. A avaliação ainda varia entre a lógica formativa e a seletiva. Observa-se que há grande avanço na utilização da avaliação formativa e menos na seletiva, mais voltada para a ação educativa. Tem-se a acentuada prática avaliativa impregnada da cultura dominante.

O materialismo histórico dialético dá a ampla abertura nas ciências sociais para as concepções teóricas que fundamentam a avaliação educacional abrindo novas possibilidades. Os elementos tratados transcendem a dimensão quantificável do fenômeno, assim foram eleitas três categorias presentes na dialética: contradição, mediação e totalidade, que servirão de mecanismos e interpretação da PB. Em se tratando de avaliação da educação, que se realiza por meio da avaliação externa materializada por meio das políticas públicas, compreende-se a importância de uma análise do contexto econômico, social e político, que configuram as mudanças sociais e a avaliação.

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