2.3. Conhecimento Tácito e Explícito
2.3.1. O Modelo SECI
Dentre várias proposições de como melhor aproveitar o capital intelectual disponível nas organizações, um dos mais renomados trabalhos e modelo desenvolvidos sob a ótica de gestão do conhecimento foi realizado por Nonaka e Takeuchi (1997).
Nonaka e Takeuchi, ao constatarem que estudos na área da gestão do conhecimento estavam muito mais voltados para o modelo ocidental, no qual o conhecimento explícito era o mais valorizado, e diante da escassez de estudos que tratassem a gestão do conhecimento sobre o enfoque da criação do conhecimento nas organizações, desenvolveram uma teoria no campo do conhecimento organizacional baseada em duas visões: (i) a epistemológica, fundada em distinguir o conhecimento em tácito e explícito, que, sob a ótica da dialética, seriam opostos, mas na verdade são complementares; e (ii) a ontológica, fundada na ideia de que o conhecimento criado pelos indivíduos é amplificado em conhecimento em nível de grupo e em nível organizacional.
O modelo de gestão de Nonaka e Takeuchi, aborda a criação de conhecimento, mostrando a relação entre as dimensões ontológico-epistemológicas da criação de conhecimento – dialogo ininterrupto entre conhecimento tácito e explícito (VASCONCELOS, 2007).
A teoria de Nonaka e Takeuchi, denominada de “Teoria da Criação do Conhecimento Organizacional”, tem como base o processo de conversão de conhecimento, nominada por eles como Modelo SECI, que consiste num processo de interação entre os conhecimentos tácito e explícito, composto de quatro etapas: Socialização, Externalização, Combinação e Internalização.
Segundo os autores, a habilidade das empresas japonesas de criar sistematicamente a interação entre os conhecimentos tácito e explícito, mantendo uma dinâmica que propicie o “diálogo” contínuo entre essas formas de conhecimento, propicia as essas empresas uma grande vantagem competitiva.
Assim, uma organização cria e utiliza conhecimento, convertendo o que seja tácito em explícito e vice-versa, sob as quatro as formas de interação dinâmica:
Socialização - Conversão de conhecimento tácito para conhecimento tácito: envolve a interação social “face-a-face” entre indivíduos, que acontece no dia-a-dia do ambiente de negócios das organizações. Na prática, envolve compartilhar conhecimento tácito aproveitando a proximidade física para a interação direta entre os indivíduos (NONAKA; KONNO, 1998). Isoladamente, a socialização é uma forma limitada ao propósito da criação de conhecimento, pois, se o conhecimento não se tornar explícito, ele não será proveitoso para toda a organização (NONAKA; TAKEUCHI, 2008);
Externalização – Conversão de conhecimento tácito para conhecimento explícito: envolve tornar visível o conhecimento tácito, que possibilite transformá-lo na forma explícita, permitindo que ele seja compartilhado para um grupo de indivíduos e se torne a base de um novo conhecimento. É suportada por dois fatores chaves: (1) a articulação do conhecimento tácito para convertê-lo em explícito, que envolve o uso técnicas que ajudem a expressar as ideias, tais como: palavras, conceitos, linguagem figurativa (metáforas, analogias ou narrativas), e o diálogo ou a reflexão coletiva; (2) a tradução do conhecimento tácito dos especialistas, de forma que o torne mais simples de compreender (NONAKA; KONNO, 98);
Combinação – Conversão de conhecimento explícito para conhecimento explícito: envolve converter o conhecimento explícito em conjuntos mais complexos de conhecimento explícito. Nesse estágio, os fatores-chaves são: a comunicação, a difusão de processos e a sistematização do conhecimento. Na prática, a combinação é resultado de três processos: (1) captura e integração de novo conhecimento já explicitado pela externalização no interior ou do exterior da organização e combinação com os já existentes; (2) distribuição do conhecimento novo entre os membros da empresa; (3) edição ou processamento do conhecimento explícito para que seja mais utilizável (NONAKA; KONNO, 1998);
Internalização – Conversão de conhecimento explícito para conhecimento tácito: envolve a incorporação do conhecimento explícito em conhecimento tácito. Tal processo está muito associado ao “aprender fazendo” e requer que o indivíduo selecione o conhecimento que seja relevante para desempenhar a sua atividade na empresa. Quanto à internalização do conhecimento explícito, tal processo é facilitado se o indivíduo estiver verbalizado em documentos ou manuais e também se puder utilizar simulações ou experimentos (NONAKA; KONNO, 1998; NONAKA; TAKEUCHI, 2008).
Nonaka e Takeuchi (2008) afirmam que essas quatro formas de conversão de conhecimento devem ser gerenciadas articuladamente e ciclicamente, como uma espiral. Assim, seguindo o modelo proposto por eles, um novo conceito é reproduzido em um grupo,
extrapolando o nível individual, desenvolvido e esclarecido evolutivamente. Dessa forma, ocorreria a partir, daí uma espiral de conhecimento, com o comprometimento pessoal, em que, de forma gradual, conceitos úteis e valiosos obtêm uma ampla aceitação e são progressivamente cristalizados em vários processos de conversão entre o conhecimento tácito e o explicito, envolvendo desde o indivíduo até o grupo e a organização (Figura 2).
Figura 2: Modelo SECI
Socialização Externalização Combinação Internalização I I I I II II I I II G II O G G G G O G I Tácito Tác it o Tácito Exp lí ci to Exp lí ci to Explícito Explícito Tác it o G I
I Indivíduo Grupo O Organização Indivíduos
compartilham e criam conhecimentos tácitos pela experiência direta
Aprender pela prática, em treinamentos, experimentos, simulações Articulação do conhecimento tácito pelo diálogo e da reflexão Sistematização e aplicação do conhecimento explícito e informações
Fonte: Adaptado de Nonaka e Takeuchi, 2008.
A criação de conhecimento organizacional dever ser entendida como um processo que “organizacionalmente” amplifica o conhecimento criado pelos indivíduos e o cristaliza no nível do grupo por meio do diálogo, da discussão e do compartilhamento de experiência (NONAKA; TAKEUCHI, 1997).
O modelo de criação de conhecimento desenvolvido por Nonaka e Takeuchi tornou-se a principal referência para muitos estudos na área de gestão do conhecimento, inclusive em pesquisas empíricas. Um exemplo disso é o estudo sobre a criação de conhecimento em práticas de controle gerencial, realizado por Oyadomari (2010), no qual o modelo SECI foi adaptado para a área de controladoria, porém, ainda sem validação empírica (Quadro 6).
Quadro 6: Modelo conceitual SECI Aplicado à Controladoria
Processo Descrição
Socialização
Acumulação de Conhecimento Tácito
Gerentes Obtém informação de áreas cliente, como as áreas comercial e produção e áreas fornecedoras, como tecnologia da
informação e financeira
Coleta de informação externa
Obtenção de informação por meio de consultores e auditores externos, palestrantes, professores e associações de classe ou
associação de empresas
Coleta de informações
internas Busca de informações em outros departamentos da empresa Transferência de
conhecimento tácito
Gerentes criam ambiente de trabalho que ajudam os pares a entender o processo de elaboração do conhecimento técnico por meio de
exemplos praticados pelos mestres
Externalização Gerentes desenvolvem modelos para elaboração conceitual do conhecimento
Combinação
Aquisição e Integração Junção de informações produzidas externamente com as internas,
com o uso de literatura e softwares
Síntese e Processamento Criação de manuais, documentos e banco de dados
Disseminação Gerente se engajam na apresentação dos modelos para transmitir os
novos conhecimentos Internalização
Experiência Pessoal: aquisição do conhecimento
no mundo real
Utilização de equipes interdepartamentais e interfuncionais para disseminação dos novos conhecimentos
Simulação e Experimentação: aquisição
do conhecimento no mundo virtual
Gerentes formam equipes para fazer projetos-piloto e compartilhar os resultados com os membros do departamento com o objetivo de
facilitar a prototipação e encontrar padrões
Fonte: Oyadomari, 2010.