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O neoliberalismo e os modelos de produção flexíveis

2 NEOLIBERALISMO, OS NOVOS MODELOS DE PRODUÇÃO FLEXÍVEIS E SEUS

2.1 O neoliberalismo e os modelos de produção flexíveis

A História da ascensão do neoliberalismo como política hegemônica se confunde com a própria ascensão dos novos modelos de produção, sobretudo, o toyotismo e a organização flexível. Ambos são gestados nos primórdios do Segundo Pós-Guerra, porém esperaram a crise do fordismo/keynesianismo para se apresentaram como forte alternativa à este.

Se, conforme vimos anteriormente, o toyotismo foi originado no ambiente de reconstrução do Japão, o neoliberalismo, por sua vez, foi originado na Europa Ocidental e nos Estados Unidos em uma situação completamente adversa para o pensamento econômico liberal. Os efeitos da crise de 1929 e da Grande Depressão dos anos 1930 levaram a ascensão do keynesianismo como única forma capaz de conduzir a economia capitalista à sólidas bases de acumulação, fazendo com que o paradigma liberal fosse deixado de lado, mas não totalmente esquecido, pois fazia parte do ideário norte-americano.

O projeto de uma economia aberta era parte da estratégia dos Estados Unidos de imposição de seu modelo de capitalismo para todo o globo e começou a se afirmar no imediato Pós-Segunda Guerra com a Doutrina Truman e o Plano Marshall.80 Porém, conforme Hobsbawn, “o plano americano original para uma economia pós-guerra de livre-mercado, dominada pelos EUA, mostrou-se inteiramente irrealista” devido a três grandes motivos: i) a presença da URSS que contrabalançava o poder norte-americano; ii) “os desesperadores problemas de pagamento da Europa e do Japão, sedentos de cada dólar”; iii) o predomínio das ideias keynesianas durante a “Era de Ouro” do capitalismo mundial, entre as décadas de 1950- 1970, predomínio tão grande que o próprio presidente norte-americano Richard Nixon chegou a afirmar que: “Somos todos keynesianos”.81

Neste cenário completamente adverso é que as ideias neoliberais foram surgindo. Em 1944, o economista austríaco Friedrich Hayek lança O Caminho da Servidão uma forte crítica “às tendências socialistas” de regular as atividades econômicas e a livre-iniciativa individual.82 O mesmo Hayek convocaria, em 1947, os críticos do Estado intervencionista e de bem-estar social para uma reunião na estação de Mont Pèlerin, na Suíça. Estiveram presentes Milton Friedman, Karl Popper, Lionel Robbins, Ludwig von Mises, Walter Lipman, Michael Polanyi, Salvador de Madariaga, entre outros defensores do livre-mercado. Esses intelectuais acabariam fundando a Sociedade de Mont Pèlerin cujo propósito, segundo Perry Anderson, era “combater o keynesianismo e o solidarismo reinantes e preparar as bases de um outro tipo de capitalismo, duro e livre de regras para o futuro”.83

80 Sobre a estratégia de imposição do capitalismo norte-americano para todo o globo ver: BOTEGA, Leonardo

da Rocha; PEDROSO, Márcia N. C. De Truman a George W. Bush: o pensamento único na lógica da política externa norte-americana. In: Revista Espaço Acadêmico, n. 104. Maringá-PR: UEM, janeiro de 2010.

81 HOBSBAWM, op.cit., p. 237.

82 HAYEK, Friedrich A. O caminho da servidão. São Paulo: Instituto Ludwig von Mises Brasil, 2010. 83 ANDERSON, Perry. Balanço do Neoliberalismo. In: GENTILI, Pablo; SADER, Emir (Orgs.). Pós-

Na declaração da fundação da Sociedade de Mont Pèlerin os intelectuais neoliberais já demonstraram a sua concepção ao afirmarem que:

Os valores centrais da civilização se acham em perigo. Em grandes extensões da superfície da terra, as condições essenciais da dignidade e da liberdade humana já desapareceram. Noutras, acham-se sob a constante ameaça do desenvolvimento das atuais tendências políticas. A posição do indivíduo e do grupo autônomo se acham progressivamente solapados por avanços do poder arbitrário. Mesmo o mais precioso bem do Homem Ocidental, a liberdade de pensamento e de reflexão, encontra-se ameaçado pela disseminação de credos que, reivindicando o privilégio da tolerância quando em posição minoritária, buscam apenas galgar uma posição de poder a partir da qual possam suprimir e obliterar todas as concepções que não a sua. O grupo sustenta que esses desenvolvimentos vêm sendo promovidos pela ascensão de uma concepção de história que nega todos os padrões morais absolutos e de teorias que questionam o caráter desejável do regime de direito. Ele sustenta ainda que esses desenvolvimentos vêm sendo promovidos por um declínio da crença na propriedade privada e no mercado competitivo; porque, sem o poder e a iniciativa difusos associados a essas instituições, torna-se difícil imaginar uma sociedade em que se possa efetivamente preservar a liberdade.84

Desta forma, a liberdade, em seu sentido de liberdade individual, se tornou uma das palavras de ordem do neoliberalismo. A outra palavra seria a dignidade humana. Uma escolha sábia, pois, conforme Harvey, “esses certamente são ideais convincentes e sedutores”.85 Por sua vez, a condição indispensável para a promoção destes ideais era a liberdade de mercado. Para Hayek, foi “a submissão às forças impessoais do mercado que possibilitou o progresso de uma civilização que, sem isso, não se teria desenvolvido”.86

O economista Milton Friedman, um dos expoentes da chamada Escola de Chicago, defende que a liberdade econômica tem um duplo papel na promoção de uma sociedade livre. Primeiramente, por ser “parte da liberdade entendida em um sentido mais amplo e, portanto, um fim em si mesmo”. Em segundo lugar, por ser “um instrumento indispensável para a obtenção da liberdade política”, pois, “separa o poder econômico do poder político e, desse modo, permite que um controle o outro”.87

Ainda conforme Friedman,

84

Declaração da fundação da Sociedade de Mont Pèlerin apud HARVEY, David. O neoliberalismo: história e implicações. 2ª edição. São Paulo: Loyola, 2011, p. 20.

85 Idem, ibidem, p. 15. 86 HAYEK, 2010, p. 193. 87

Enquanto a liberdade efetiva de troca for mantida, a característica central da organização de mercado da atividade é a de impedir que uma pessoa interfira com a outra no que diz respeito à maior parte de suas atividades. O consumidor é o protegido da coerção do vendedor devido à presença de outros vendedores com quem pode negociar. O vendedor é protegido da coerção do consumidor devido à existência de outros consumidores a quem pode vender. O empregado é protegido da coerção do empregador devido aos outros empregadores para quem pode trabalhar, e assim por diante. E o mercado faz isto, impessoalmente, e sem nenhuma autoridade centralizada.88

Tal domínio do livre mercado não significa que um Estado não seja necessário. Na concepção neoliberal, o Estado deve existir para garantir “as regras do jogo”. Dessa forma, é inestimável a existência de um governo que:

mantenha a lei e a ordem; defina os direitos de propriedades; sirva de meio para a modificação dos direitos de propriedade e de outras regras do jogo econômico; julgue disputas sobre a interpretação das regras; reforce contratos; promova a competição; forneça uma estrutura monetária; envolva-se em atividades para evitar o monopólio técnico e evite os efeitos laterais considerados como suficientemente importantes para justificar a intervenção do governo; suplemente a caridade privada e a família na proteção do irresponsável, quer se trate de um insano ou de uma criança; um tal governo teria, evidentemente, importantes funções a desempenhar. [...].89

Assim, se define a visão de um Estado Mínimo cuja tarefa “consiste, única e exclusivamente, em garantir a proteção da vida, a saúde, a liberdade e a propriedade privada contra ataques violentos”. Conforme o ex-professor de Hayek, Ludwig von Mises, “Tudo que vá além disso é mau”.90

Além destas funções o Estado, para a Teoria Neoliberal, “deve buscar persistentemente reorganizações internas e novos arranjos institucionais que melhorem sua posição competitiva como entidade diante de outros Estados no mercado global”.91

Por conseguinte, pode-se verificar que Estado Neoliberal deve ser uma espécie de colaborador das relações de mercado, devendo usar o seu monopólio dos meios de violência para a preservação da liberdade econômica. Uma espécie de braço político das empresas privadas e das iniciativas dos empreendedores, entendidas como a “chave da inovação e da criação de riqueza”.92

Dessa forma, começa a ser revelado o caráter de classe do Estado

88 Idem, ibidem, p. 23. 89

Idem, ibidem, p. 39.

90 MISES, Ludwig von. Liberalismo: segundo a tradição clássica. . São Paulo: Instituto Ludwig von Mises

Brasil, 2010, p. 77.

91 HARVEY, 2011, p. 76. 92

Neoliberal. Esse caráter pode ser demonstrado na concepção dos teóricos neoliberais sobre o trabalho.

Neste sentido, no que diz respeito ao trabalho, um princípio básico defendido por Mises é o da função civilizatória da divisão do trabalho. Para este economista:

A sociedade humana é uma associação de pessoas que buscam a cooperação. Ao contrário da ação isolada dos indivíduos, a ação cooperada na base do princípio da divisão do trabalho, traz a vantagem da maior produtividade. Se um determinado número de homens trabalha em colaboração, segundo o princípio da divisão do trabalho, esses homens produzirão (tudo o mais permanecendo constante) não apenas a quantidade do que teriam produzido, se trabalhassem como indivíduos autossuficientes, mas muito mais do que isso. Toda a civilização humana é alicerçada neste fato. O homem se distingue dos animais em virtude do trabalho. Foi a divisão do trabalho que tornou o débil homem, muito inferior à maioria dos animais em força física, senhor da terra e criador das maravilhas da tecnologia. Na ausência da divisão de trabalho, não estaríamos, em qualquer campo, mais avançados hoje do que nossos ancestrais da há milhares e milhares de ano.93

Na sequência desta reflexão, o fundador da Escola Austríaca, diferencia dois sistemas de cooperação em regime de divisão de trabalho, aquele baseado na propriedade privada dos meios de produção e aquele baseado na propriedade comunal dos meios de produção. Nesta diferenciação, Mises afirma que na opinião dos liberais “o único sistema de cooperação humana que, de fato, funciona numa sociedade baseada na divisão do trabalho, é a propriedade privada dos meios de produção” e ainda conclui dizendo que “o programa do liberalismo, se pudermos condensá-lo em uma única palavra, se resumiria no termo ‘propriedade’, isto é, a propriedade privada dos meios de produção”.94

À função civilizatória da divisão do trabalho e à defesa incondicional da propriedade privada dos meios de produção deve-se acrescentar a crítica a qualquer regulamentação das relações de trabalho. Nem mesmo a fixação de taxas de salários mínimos é aceita pelos neoliberais, pois,

Quando as relações entre empregador e empregado não são perturbadas por decretos legislativos ou por violentas medidas por parte dos sindicatos trabalhistas, os salários pagos pelo empregador a todo tipo de trabalho fixam-se, exatamente, no mesmo nível do aumento do valor que eles acrescentam aos dos materiais na produção. Os salários não podem aumentar mais do que isso, porque, se aumentassem, o empregador não mais teria lucro e seria, daí, compelido a interromper a linha de produção que não compensasse. Mas também os salários não poderiam cair, porque, nesse caso, os trabalhadores se voltariam para outros setores

93 MISES, op.cit., p. 49. 94

da indústria, onde seriam mais bem remunerados, de modo que o empregador seria forçado a paralisar a produção, por falta de mão de obra.95

Para o pensamento neoliberal as relações de trabalho devem ser regradas conforme a determinação “natural” das leis de mercado. Um mercado de trabalho livre das intervenções e regulamentações governamentais definiria conforme a própria dinâmica da livre oferta e da livre procura de mão de obra um taxa de salário “estático” ou “natural”. A variação deste “salário estático” é determinada pelos constantes ajustes sofridos pelo mercado. Tais ajustes do mercado é que explicam também o desemprego “natural” do livre mercado,

Se o desemprego tivesse sua causa apenas no fato de que há constante progresso no desenvolvimento industrial, não poderia assumir grandes proporções, nem o caráter de fenômeno duradouro. Os trabalhadores que não mais possam empregar-se num determinado setor de produção, em breve encontram espaço em outros setores que estejam em expansão ou que estejam entrando em atividade. Quando os trabalhadores gozam de liberdade de movimento e quando o deslocamento de uma indústria para outra não é impedido por obstáculos legais ou de outra espécie semelhante, ocorre de modo razoavelmente rápido o ajustamento às novas condições, sem grandes dificuldades. Quanto ao mais, o estabelecimento da troca de mão de obra em muito contribuiria para a redução ainda maior do grau desse tipo de desemprego.96

Na passagem acima podemos verificar que para a Teoria Neoliberal o desemprego “natural” das relações de mercado é gerado pela reacomodação da mão de obra de setores economicamente defasados para os setores mais dinâmicos, sendo que o próprio livre mercado, ao permitir a livre troca de postos de trabalho, torna-se o seu remédio. Porém, além deste desemprego “natural” gerado pelos ajustes do mercado e, portanto, transitório, há outro desemprego gerado pela intervenção do Estado na economia e pelos altos salários exigidos pelos sindicatos. Esse tipo de desemprego não seria um fenômeno transitório, pois, a intervenção do Estado através da legislação trabalhista e a pressão dos sindicatos “evitam que os salários sejam reduzidos [...] até o nível que teriam alcançado na ausência de interferência por parte do governo ou dos sindicatos, a saber, a taxa à qual todos aqueles que procuram por emprego finalmente o encontram”.97 Dessa forma, percebe-se que além da intervenção do Estado nas relações de trabalho, outro suposto problemaidentificado pela Teoria Neoliberal é a ação dos sindicatos.

95 Idem, ibidem, p. 101. 96 Idem, ibidem, p. 104-105. 97

Milton Friedman, em sua crítica ao monopólio do trabalho, reforça esta concepção contrária à ação governamental e a presença dos sindicatos nas relações de trabalho. Na concepção do economista, a primeira fonte deste monopólio seria a intervenção estatal, enquanto que a “legislação que garante imunidades especiais aos sindicatos, como a isenção com respeito a leis antitrustes, restrições da responsabilidade dos sindicatos, direito a tribunais especiais são uma segunda fonte”.98

Esta concepção exposta por Friedman, e anteriormente por Mises, vem ao encontro da ideia defendida por Harvey segundo o qual “o Estado neoliberal é necessariamente hostil a toda forma de solidariedade social que imponha restrições à acumulação de capital”. Para que esta se realize plenamente “Sindicatos independentes ou outros movimentos sociais [...] tem, portanto, de ser disciplinado, se não destruídos – em nome da supostamente sacrossanta liberdade do trabalhador isolado”. O autor complementa a sua ideia com a afirmação de que a palavra “‘Flexibilidade’ se torna o mantra dos mercados de trabalho”.99

Essa palavra torna-se também o ponto de ligação entre os novos modelos de produção e a Teoria Neoliberal. Além deste, outro ponto de ligação entre os novos modelos de produção e a Teoria Neoliberal foi a crise dos anos 1970. Esta proporcionou o cenário de ascensão para a Teoria Neoliberal e, conseqüentemente, abriu espaço para a consolidação destes novos modelos de produção.

A crise do início dos anos 1970 fez com que as críticas feitas pelos neoliberais às ideias keynesianas rompesse o isolamento a ela imposto pela prosperidade da “Era de Ouro” do capitalismo. Aos poucos aquela teoria começou a ocupar o centro dos debates econômicos, sobretudo, nos Estados Unidos e na Inglaterra, ganhando notoriedade e “respeitabilidade acadêmica quando Hayek, em 1974, e Friedman, em 1976, ganharam o prêmio Nobel de economia”.100

Ao mesmo tempo, o governo ditatorial de Augusto Pinochet, no Chile, instalado apôs o Golpe deferido contra o governo socialista de Salvador Allende, em 11 de setembro de 1973, proporcionou aos neoliberais a possibilidade de teste para sua teoria. Inspirado pelas ideias de Milton Friedman e de seus Chicago Boys, a ditadura de Pinochet “começou seu programa de maneira dura: desregulamentação, desemprego massivo, repressão sindical, redistribuição de renda em favor dos ricos, privatização de bens públicos”.101 Estas medidas demonstravam que o Chile se tornara o espaço para a afirmação do neoliberalismo, pouco importando a natureza ditatorial do regime, o que coloca os limites da concepção de

98 FRIEDMAN, op. cit., p. 120. 99 HARVEY, 2011, p. 85. 100 Idem, ibidem, p. 31. 101

liberdade daquela Teoria. Conforme Perry Anderson, a “liberdade e a democracia, explicava Hayek, podiam facilmente tornar-se incompatíveis, se a maioria democrática decidisse interferir com os direitos incondicionais de cada agente econômico de dispor de sua renda e de sua propriedade como quisesse”.102

Aqui fica demonstrada a não existência de qualquer contradição entre a teoria neoliberal e o governo ditatorial chileno, uma vez que para os seus intelectuais a liberdade essencial era a liberdade de mercado.

Assim, na primeira metade dos anos 1970 o neoliberalismo ganhou reconhecimento acadêmico e conseguiu um local para a aplicação de seu programa. Porém, somente no final daquela década e início dos anos 1980 que ocorre a sua consolidação como “nova ortodoxia econômica de regulação da política pública no nível do Estado no mundo capitalista avançado”103

, com as vitórias eleitorais de Margaret Thatcher em 1979, na Inglaterra, e de Ronald Reagan em 1980, nos Estados Unidos.

Enquanto o governo Thatcher na Inglaterra optou por ser o mais puro dos modelos de neoliberalismo, com políticas de forte desmanche do Estado de Bem-Estar social, nos EUA, onde o Estado de Bem-Estar Social era menos forte do que na Europa, o governo Reagan adaptaria o modelo neoliberal a outra estratégia. Nos Estados Unidos “a prioridade neoliberal era mais a competição militar com a União Soviética, concebida como uma estratégia para quebrar a economia soviética e, por esta via, derrubar o governo comunista da Rússia”.104

Até que ponto esta estratégia do governo Reagan funcionou é algo ainda a ser pesquisado, o historiador Eric Hobsbawm, por exemplo, discorda que esta política tenha sido fundamental para a queda da URSS.105 Isto indica que este é um debate ainda em aberto, mas o fundamental é que com Reagan o neoliberalismo atingiu o centro do poder do capitalismo mundial e que com o final da Guerra Fria o neoliberalismo ganhou uma dimensão de pensamento único.

Em 1989, tendo em vista à queda do socialismo real e o auge do thatcherismo, conforme explica Mattoso, uma entidade privada, o Institute for International Economics (IIE), organizou um encontro em Washington, nos Estados Unidos, tendo como objetivo avaliar as políticas neoliberais iniciadas na América Latina. Esse encontro ficou denominado como Consenso de Washington. As propostas estabelecidas por este impunham um conjunto de

102 Idem, ibidem, p. 20. 103 HARVEY, 2011, p. 31. 104ANDERSON, op. cit., p.12. 105

políticas de desregulação dos mercados, abertura comercial e financeira e de redução do tamanho e do papel do Estado. De acordo com Mattoso, foram um conjunto de dez ressalvas as políticas impostas pelo Consenso de Washington:

Limitação dos gastos do Estado à arrecadação, eliminando o déficit público; redução dos gastos públicos e sua focalização; reforma tributária que ampliasse o peso dos impostos indiretos e diminuísse a progressividade nos impostos diretos; liberalização/desregulação financeira e retirada do Estado do setor; taxa competitiva de câmbio; liberalização do comércio exterior para impulsionar a globalização da economia; eliminação de restrições ao capital externo; privatização, com a venda de empresas estatais; desregulação do processo econômico e das relações trabalhistas; defesa da propriedade intelectual.106

A partir do Consenso de Washington, o neoliberalismo ganhou impulso, para tornar-se a política econômica hegemônica também nos países da periferia do capitalismo. A América Latina, que não havia desenvolvido um Estado de bem-estar social em seu modelo clássico e que vinha procurando caminhos para reencontrar-se com a democracia e uma saída para a crise ao qual estava mergulhada desde a segunda metade dos anos 1970 devido ao seu forte endividamento externo, acabou adotando várias abordagens frente ao Consenso de Washington. Após a experiência chilena, iniciada nos anos 1970, México, Argentina, Venezuela e Peru passaram a adotar o programa neoliberal na virada dos anos 1980 para os anos 1990. O Brasil passou a adotar este modelo a partir do governo de Fernando Collor de Mello em 1990.

Paralelamente à transformação do neoliberalismo em política hegemônica, outro fator fundamental para a consolidação dos novos modelos produtivos, foi a ascensão do processo de mundialização do capital que é, conforme afirma Chesnais, “bem mais do que apenas outra etapa no processo de internacionalização, tal como o conhecemos a partir de 1950”, sendo na verdade uma “nova configuração do capitalismo mundial e nos mecanismos que comandam o seu desempenho e regulação”.107

Essa nova configuração do capitalismo mundial resultou da reestruturação das empresas e dos mercados financeiros, tornando-se possível através das políticas governamentais de cunho neoliberal. Nesse sentido, Castells considera que a “economia global, não foi criada pelos mercados, mas pela interação entre mercados e

106 MATTOSO, Jorge. O Brasil herdado. In: SADER, Emir; GARCIA, Marco Aurélio. Brasil entre o passado e