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1. Língua/linguagem, cultura e comunicação

1.3. O papel da língua e da cultura na comunicação

Língua e cultura são duas características básicas do ser humano. Tanto a língua como a cultura mudam conforme a comunidade social está estruturada e conforme a

época em que se vive, pois todos os seres humanos precisam de comunicar numa língua e comportar-se segundo alguma cultura, adaptando-as para satisfazer as suas necessidades comunicativas e respeitar as características individuais. Apresentamos, a seguir, o papel da língua e da cultura na comunicação, que se considera favorecer o desenvolvimento da competência comunicativa e da competência intercultural e que torna realizável a comunicação adequada entre culturas distintas.

A palavra «comunicação» em chinês é «交际/ jīao jì» (existem ainda mais formas para expressar o sentido de «comunicação» em chinês mas, no nosso trabalho, usamos a forma «交际»). O caracter «交/ jīao» parece uma pessoa de pé, com as pernas cruzadas, pois é um caracter que se baseia em hieróglifos, significando cruzar/cruzamento e encontrar/encontro. O caracter «际 /jì» significava que «se intersetam duas paredes». No termo «交际», o caracter «际/jì» já perdeu o seu significado original, tendo um sentido de «relação entre pessoas ou quaisquer coisas/assuntos». Os dois caracteres ficam juntos para expressar o cruzamento de pessoas. Como língua e cultura estão profundamente interligadas com toda a vida do ser humano, acompanhando todas as atividades dos indivíduos, «o cruzamento/encontro de pessoas» é «cruzamentos/encontros» de língua e de culturas. Os processos de globalização contribuem para que se produzam mais «cruzamentos/encontros» de línguas e culturas de modo mais sistemático, facilitando consideravelmente a comunicação intercultural. O diálogo entre culturas diferentes é uma forma básica da comunicação intercultural; deste modo, como qualquer sistema de sinais convencionais, a linguagem permite-nos realizar essa comunicação. A possibilidade de as diversas culturas se expressarem como uma comunicação harmoniosa entre comunidades diferentes só parece possível numa sociedade em que os indivíduos criam competências de interação em ambientes diversos com os meios de comunicação, produzindo as suas próprias exposições orais ou escritas, para facilitar o processo de integração e adaptação dos indivíduos ao nível da comunicação intercultural. Utilizar as estratégias verbais para compensar as falhas na comunicação intercultural é uma questão de importância crescente, especialmente na área do ensino

de uma LE, pois o desenvolvimento das estratégias verbais na comunicação intercultural pode melhorar a competência de produzir, ou entender, a fala entre os públicos de diferentes culturas.

Neste sentido, a comunicação é permeada pela língua e pela cultura de cada interlocutor, e para realizar a ação comunicativa tem de se entender os valores sociais e culturais dos grupos e dominar a língua com que se interage.

Entende-se a comunicação como uma característica humana essencial e uma necessidade social fundamental. Menezes (1973, p.147) propõe que o processo de comunicação seja considerado como fundamento da vida social. No nosso trabalho, a comunicação é a linguagem em ação num contexto de atividade cultural; o ensino de LE é um processo para que se encontrem maneiras de pessoas de diferentes comunidades comunicarem adequadamente. A comunicação, de um modo geral, é um processo evolutivo. Quando comunicamos, tentamos inserir o nosso pensamento e o comportamento num contexto de comunicação, compartilhando informações ou até uma atitude.

O processo de comunicação pode ser entendido como o modo pelo qual se dá, entre pessoas, o intercâmbio de mensagens – ideias, conhecimentos, experiências e sentimentos, etc.; nesse processo, a mensagem é transmitida, passando pela elaboração de um código, ou seja, utilizando-se uma linguagem adequada, normalmente verbal. A língua nasce da comunicação verbal entre indivíduos, sendo essencialmente comunicação verbal. Se não houvesse comunicação verbal, não haveria qualquer língua5. A língua estabelece uma comunicação entre pessoas,

possibilitando a compreensão entre diferentes origens culturais. O código utilizado deverá ser representado de maneira percetível aos sentidos. É a língua que permite às pessoas interagir entre si para que todas as coisas aconteçam e isso faz com que a comunicação exista em todos os âmbitos e entre comunidades diferentes. O

5 Em Portugal, a linguagem gestual portuguesa é reconhecida pela Constituição – Lei Constitucional nº 1/97, artº

74º, alínea h: «Proteger e valorizar a língua gestual portuguesa, enquanto expressão cultural e instrumento de acesso à educação e da igualdade de oportunidades»

pensamento humano é determinado linguisticamente, as diversas línguas maternas resultam do pensamento distinto dos seus falantes, determinam os seus comportamentos também. Portanto, por comunicação entende-se a transmissão de uma mensagem, usando um emissor, um meio e um recetor. Neste processo de transmissão, sem língua, uma «boa comunicação» é apenas uma projeção utópica; mas sem cultura a comunicação fica fragmentada, sem envolvimento e suporte culturais, perdendo os seus atributos individuais e sociais.

A ciência que estuda as culturas humanas é a antropologia. O estudo da antropologia tem como objetivo descrever integralmente os fenómenos socioculturais. A antropologia cultural ocupa-se do desenvolvimento das sociedades humanas no mundo. A linguística é um campo muito importante da antropologia cultural, estudando a história e a estrutura da linguagem. Os antropólogos apoiam-se na linguística para observar os sistemas de comunicação das pessoas e reconhecer a visão do mundo do ser humano. Na obra de Sapir (1954), o autor observa que «línguas sem qualquer parentesco partilham de uma só cultura; línguas intimamente cognatas - quando não uma língua única - pertencem a círculos de cultura distintos» (p. 210); «(...) todas as tentativas para estabelecer conexão entre tipos de morfologia linguística e certas fases correlatas de desenvolvimento cultural são vãs» (p. 215). Língua e cultura são fatores dominantes que fazem da comunicação uma atividade de integração social. Constituem-se enquanto sistemas que possibilitam a comunicação humana. O contexto cultural tem incidências sobre a língua; a língua verbal, entendida como uma comunicação na vida real, está intimamente relacionada com aspetos culturais. No entanto, a comunicação entre pessoas que não falam a mesma língua é um processo cultural, as pessoas realizam uma comunicação, porque uma informação é transmitida de um lugar a outro lugar, ou de uma a outra pessoa. Contudo, uma comunicação eficaz e eficiente é fundamental para o sucesso de qualquer atividade.

A integração cultural sugere uma sociedade aberta à comunicação intercultural, que sabe as diferenças e as semelhanças sociais e culturais. A integração da

comunicação linguística não é mais do que o começo de uma ação muito mais complexa e universal, em que se adquirem os conhecimentos linguísticos para conviver com comunidades diferentes, colocando toda a sociedade de línguas diferentes numa tarefa conjunta ─ desenvolver a comunicação no convívio cultural entre países diferentes.

O grau de proficiência de língua, no entanto, restringe a comunicação verbal, do mesmo modo que a cultura também influi sobre a comunicação intercultural. Portanto, para desenvolver a comunicação no convívio cultural entre países diferentes, realizar uma comunicação intercultural mais eficaz, é imprescindível clarificar o papel da cultura e da língua na comunicação, sobretudo quando está em relação com o ensino-aprendizagem de línguas ─ por exemplo, a elaboração de planos curriculares, a intervenção pedagógica nas aulas, as funções dos professores de nacionalidade chinesa e de nacionalidade portuguesa.

Segundo a reflexão da pragmática cultural, adquirir uma nova língua implica necessariamente aceder a uma nova cultura. A língua constitui-se em atividades essencialmente sociais, as comunicações humanas são línguagens carregadas de sentidos, são reflexos da cultura. No processo de ensino-aprendizagem de uma LE, com o objetivo de desenvolver competências de comunicação nessa LE, os professores e os alunos constroem a relação entre língua, cultura e comunicação intercultural a partir do contexto sociocultural em que se situam, ou seja, baseando-se nos contextos culturais da LM e da LE que se estuda.

A identidade do ser humano é construída pela cultura, o uso de uma língua é um importante fator de identidade cultural. De fato, uma língua é o elemento motor de uma cultura, tratamos os elementos culturais como instrumento de acesso às intenções comunicativas. Dito de outra forma, a língua é essencialmente comunicação e a comunicação é um processo direto de interação social e cultural. Um indivíduo que possui competência de adequar a comunicação segundo o seu contexto, tem de conhecer as regras de língua-cultura para adquirir as competências básicas de

comunicação. A língua deve ser analisada no comportamento de comunicar, no contexto social e cultural, com um determinado objetivo e conforme certas normas e convenções. Aprender uma língua pressupõe a competência de interpretar a linguagem natural e estabelecer relação com uma nova realidade sociocultural. A intervenção pedagógica no processo do ensino deve assumir um papel de facilitadora na interação entre a língua e a cultura para formar a consciência da aceitação das diferenças culturais na comunicação e para desenvolver a competência de negociar os significados culturais e de se comunicar eficazmente conforme as múltiplas idiossincrasias dos participantes. No entanto, diferentes comunidades podem responder melhor à informação, dependendo de como a receberem. Para a mensagem chegar ao seu público-alvo de forma eficaz, a comunicação tem de quebrar os obstáculos e os mal-entendidos causados pela diferença entre as línguas e as culturas. Logo, introduz-se no nosso trabalho o conceito de «comunicação intercultural» que contribui para a troca de diferenças culturais e para a construção da identidade cultural no processo de ensino-aprendizagem de uma LE.

2. Interculturalidade e comunicação intercultural no