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Diante dos arcabouços legais e dos instrumentos de políticas ambientais disponíveis para os municípios resta um papel a ser cumprido pelo poder local na implementação de ações de gestão do meio ambiente visando o desenvolvimento sustentável. Esse papel consiste essencialmente em se estabelecer no âmbito do município uma política de meio ambiente – a Política Municipal de Meio Ambiente (PMMA).

A instituição da PMMA seria o principal mecanismo do poder local para definir diretrizes e estabelecer normas, na forma de lei, que regulamentariam as questões ambientais locais. A PMMA criaria um Sistema Municipal de Meio Ambiente (SISMUMA), com sua respectiva estrutura de gestão e os instrumentos que seriam utilizados para o atendimento dos objetivos que orientariam sua elaboração. A inexistência da PMMA deixaria o município à mercê dos serviços dos órgãos ambientais das esferas federal e estadual que, a rigor não possuem estrutura

suficiente para atender as demandas locais e nem para perceber as especificidades de cada município (LITTLE, 2003).

No SISMUMA, o poder executivo teria o papel principal de definição e execução da política ambiental local. Nesse sistema se integraria a estrutura burocrática com procedimentos administrativos apropriados, o Fundo Municipal de Meio Ambiente, o Código de Meio Ambiente do Município e o Conselho Municipal de Meio Ambiente. O SISMUMA, portanto, institucionalizaria toda a política ambiental do município, abrangendo o Poder Local (poder executivo e poder legislativo) e as comunidades locais. Nesse sentido, o Conselho Municipal de Meio Ambiente teria funções deliberativas e contaria com a participação de órgãos públicos e de representantes dos diversos segmentos da sociedade civil. Caberia então, a esse colegiado, que seria um dos instrumentos da política ambiental local, propor políticas públicas, diretrizes e normas na medida em que o sistema amadurecesse, além de acompanhar sua execução pelos diversos órgãos do município e manifestar-se sobre o Plano Diretor, suas alterações e sobre as normas dele decorrentes, favorecendo assim o controle social sobre as questões sócio-ambientais do município (MILARÉ, 1999).

A estruturação do SISMUMA nada mais seria do que a estruturação da política ambiental municipal tendo como base os elementos essenciais que estruturam e organizam toda e qualquer política pública: a) a base legal; b) o aparato institucional; c) o planejamento e a gestão; e d) o controle social. No entanto, o poder local dentro do seu papel de estruturação e consolidação do SISMUMA deverá aplicar esforços em três direções de forma permanente, a saber: 1) na capacitação técnica; 2) na capacitação tecnológica; e 3) na capacitação operacional para aprimoramento constante do sistema (PHILIPPI JR. e ZALAUF, 1999).

A capacitação técnica diz respeito à capacidade do órgão ambiental em possuir recursos humanos devidamente habilitados para responder às necessidades da sociedade, com disposições analíticas e reflexivas suficientes para interpretar os problemas e encaminhar soluções de caráter técnico e administrativo, adequadas à situação estudada.

Nesse sentido, Philippi Jr. e Zalauf (1999) destacam a importância da troca de experiências e idéias entre os profissionais dos setores públicos e privados, como também o apoio técnico do órgão ambiental e de seus profissionais ao Ministério Público, na forma de cooperação institucional, com enriquecimento do papel das

entidades envolvidas no processo de gestão. Além do mais, a existência de profissionais preparados e dotados de uma visão sistêmica dos problemas e solução ambientais, voltados para o planejamento e administração estratégicos seria muito importante para o reconhecimento do SISMUMA como peça chave para o desenvolvimento do município. No entanto, o reconhecimento da capacidade técnica do órgão executor do SISMUMA seria resultado de investimentos efetuados na capacitação profissional de seus quadros de funcionários e também dos quadros funcionais das organizações parceiras.

A capacitação tecnológica atrelada ao SISMUMA diz respeito à identificação de laboratórios, próprios ou de terceiros, devidamente habilitados para realização de exames e análises mediante métodos analíticos comprovados e aceitos internacionalmente. Além do mais, atrela-se a esse aspecto a utilização de tecnologia da informação na gestão ambiental, como por exemplo, um sistema de informações geográficas (SIG) (PHILIPPI JR. e ZALAUF, 1999; SILVEIRA, 2004). Tudo isso implica em dizer que caberia ao órgão ambiental responsável pela operacionalização do SISMUMA tomar as garantias necessárias para a confiabilidade do sistema, mediante a adoção de métodos e tecnologias confiáveis e adequados às necessidades de gestão ambiental. Nesse ponto, a realização de parcerias com centros tecnológicos e universidades seria um fator importante para o desenvolvimento da capacidade tecnológica do SISMUMA.

A capacidade operacional diz respeito à capacidade potencial e real que o órgão ambiental teria em estabelecer as bases para o funcionamento do SISMUMA mediante um eficiente trabalho de gestão dos recursos disponíveis. A falha dessa capacidade comprometeria todo o esforço alocado nas capacidades técnicas e tecnológicas. Nesse sentido, o órgão ambiental teria o dever de estabelecer uma capacidade operacional de gestão baseada em diversos parâmetros, tais como:

Mobilidade produzida por veículos apropriados e na quantidade adequada aos compromissos assumidos;

Equipamentos, materiais e produtos utilizados para trabalhos de campo, laboratoriais e outros, revisados sistematicamente e com manutenção definida; Serviços devidamente dimensionados de telefonia, comunicação e informática e

Espaço institucionalmente identificado para utilização pela sociedade, pelos conselhos, comitês e comissões; para audiências públicas e participação popular na discussão de projetos; para atividades específicas de educação ambiental; Fornecimento de mudas, de materiais educativos e estrutura logística para

realização de eventos;

Instalações e suporte administrativo adequados para o exercício da missão institucional; das funções delegadas pelo governo municipal; das funções acordadas com outros níveis de governo; das responsabilidades assumidas em parceria com outras instituições; das ações articuladas em parcerias (PHILIPPI JR. e ZALAUF, 1999).

Diante das capacidades a serem desenvolvidas na estruturação do SISMUMA, o poder local teria quatro papéis básicos na consolidação e maturação de sua política ambiental. O primeiro papel seria o desenvolvimento da base legal para a atuação no âmbito do município e nesse sentido a vontade política se tornaria um elemento fundamental, não só no aspecto da formulação de uma agenda governamental e seus respectivos marcos legais, mas, sobretudo, na articulação política tão necessária à efetivação dos projetos e ações propostos no âmbito das políticas propostas. Essa base legal seria constituída essencialmente por uma lei que instituísse o SISMUMA com todos os seus elementos estruturadores, além de leis básicas ou previsões constitucionais presentes na Lei Orgânica do município que tratam da questão ambiental. O quadro 13, relaciona o conjunto dos principais marcos legais a serem instituídos pelo poder local na sua atuação sobre as questões ambientais no âmbito de suas competências.

Marcos legais específicos Marcos legais correlatos Lei da Política Municipal de Meio Ambiente.

Lei de criação do órgão ambiental.

Lei de criação do Conselho Municipal de Meio Ambiente. Lei de criação do Fundo Municipal de Meio Ambiente. Lei do licenciamento ambiental relacionado a impactos locais. Leis relacionadas a aspectos ambientais específicos.

Decretos, portarias e resoluções em aspectos ambientais específicos.

Lei Orgânica Municipal. Lei do Plano Diretor.

Lei de Uso e Ocupação do Solo. Código de Posturas.

Código Sanitário.

Quadro 13: Principais marcos legais a serem instituídos pelo poder local na sua atuação sobre as questões ambientais no âmbito de suas competências. Elaborado pelo autor (2008).

O segundo papel dado ao poder local seria estruturar e consolidar o aparato institucional para a gestão ambiental, e isso incluiria o desenvolvimento permanente

das capacidades técnica, tecnológica e operacional do órgão responsável pela execução da política ambiental e a garantia de suporte econômico para suas atividades. A questão ambiental nesse sentido não seria tratada de forma compartimentada ou generalizada, mas de forma integrada como outros órgãos executivos municipais responsáveis por outras políticas setoriais. Além do mais, seria também necessário fortalecer o papel e a imagem do órgão ambiental dentro do poder local e perante a sociedade, elevando a questão ambiental não como um adendo do desenvolvimento municipal, mas como um eixo estratégico indutor das diversas dimensões da sustentabilidade no âmbito local.

Com uma base legal adequada à realidade local e com um aparato institucional respeitável capaz de cumprir todas as prerrogativas da política ambiental formulada, um terceiro papel seria fundamental para o poder local: a materialização da política mediante instrumentos de planejamento e gestão que seriam aplicados através de planos, programas e projetos específicos alinhados às diretrizes e estratégias das políticas de meio ambiente e de desenvolvimento do município. Esse papel teria também uma dependência restrita às capacidades técnica, tecnológica e operacional do órgão executivo responsável pela política ambiental. Nesse sentido, na medida em que ocorresse a ampliação das capacidades técnicas e operacionais do poder local, mais eficiente e adequado seria a aplicação dos instrumentos operacionais de planejamento e gestão do meio ambiente. Tal aplicação se concretizaria através de projetos específicos com objetivos e metas explícitos, recursos definidos e resultados efetivamente palpáveis. Também para esse papel seria imprescindível a alocação de recursos humanos, financeiros e logísticos suficientes para atender satisfatoriamente as demandas existentes.

Assim, na estruturação do planejamento e da gestão ambiental seis temas deveriam ser considerados como bases para ação do órgão ambiental do município, a saber: 1) a gestão ambiental compartilhada; 2) a educação ambiental; 3) a qualidade ambiental; 4) a conservação da biodiversidade e dos recursos hídricos; 5) a sustentabilidade econômica para a gestão ambiental; e 6) o saneamento ambiental integrado. Esses temas, se trabalhados de forma integrada poderão se tornar elementos estruturais para um planejamento permanente no funcionamento do Sistema Municipal de Meio Ambiente. O quadro 14 em seguida apresenta as principais ações a serem desenvolvidas considerando o planejamento e a gestão ambiental dentro desses seis temas.

Temas básicos para o planejamento e para a gestão

ambiental municipal Ações básicas

Gestão ambiental compartilhada

Fortalecimento do Conselho Municipal de Meio Ambiente. Integração e articulação com fóruns locais.

Integração e articulação institucional com órgãos públicos afins e instituições privadas (locais, estaduais e federais) para descentralização e

compartilhamento de atividades de gestão ambiental.

Educação ambiental Promoção de programas de educação formal e informal. Promoção de programas continuados de capacitação do corpo técnico do órgão ambiental.

Qualidade ambiental

Fortalecimento da fiscalização ambiental.

Acompanhamento sistemático de empreendimentos ambientalmente impactantes (monitoramento).

Estruturação de Sistema de Informações Ambientais.

Conservação da biodiversidade e dos recursos hídricos

Projetos de recuperação e conservação das matas ciliares e demais áreas legalmente protegidas.

Gestão de unidades de conservação.

Fortalecimento da atuação do município em comitês de bacias hidrográficas.

Sustentabilidade econômica para gestão ambiental

Implementação e fortalecimento do fundo municipal de meio ambiente. Otimização dos recursos arrecadados da compensação ambiental, e de multas e taxas ambientais.

Acompanhamento do desempenho de repasses federais e estaduais atrelados à gestão do meio ambiente.

Saneamento ambiental integrado Assessoria nas atividades de saneamento ambiental integrado (gestão de resíduos sólidos, drenagem urbana, abastecimento de água, tratamento de esgoto e controle de vetores).

Quadro 14: Principais temas para o planejamento e gestão ambiental no âmbito municipal. Elaborado pelo autor.

Por fim, restaria ao poder local, de forma a fechar esse ciclo de papéis, o estabelecimento de mecanismos institucionais de controle social com efetiva participação da sociedade. Nesse aspecto, o fortalecimento do Conselho Municipal de Meio Ambiente, especialmente com a utilização de instrumentos de educação ambiental seria algo imprescindível e o mínimo a ser feito dentro do processo de maturação do papel do controle social. Tal controle social permitiria o estabelecimento de uma gestão participativa do meio ambiente, contribuindo para a solução de diversos conflitos sócio-ambientais e permitindo uma retro-alimentação permanente da formulação e execução de planos, programas e projetos da política ambiental.

Figura 7: Os quatro principais papéis do poder local na efetivação da política ambiental. Esquema elaborado pelo autor (2008).

Assim, considerando esses quatro papéis estruturados num ciclo de melhoria contínua do SISMUMA (Figura 7), é possível traçar uma graduação de níveis de maturação da política ambiental. A figura 8 apresenta uma forma de visualização dos níveis de maturidade de uma política pública com base nos quatro papéis apresentados anteriormente. É uma forma interessante de se analisar e avaliar a situação em que uma dada política se encontra, permitindo visualizar o grau de amadurecimento da política pública em estudo. Tal esquema é perfeitamente aplicável à analise aqui estabelecida relacionando-se aos papéis do poder local na implementação de uma política ambiental.

Legenda: Ctrl: controle social; Plan: planejamento e gestão; Inst: aparato institucional; Leg: base legal. Figura 8: Os nove níveis de maturidade da política pública. Esquema idealizado e elaborado pelo autor (2008).

Como pode ser visto na figura 8 é possível identificar oito níveis de maturidade da política pública. Fazendo a aplicação desses níveis na análise dos papéis do poder local na efetivação da política ambiental, têm-se as seguintes significações:

Nível 0: Refere-se à situação em que não há nenhuma iniciativa do poder público em matéria de meio ambiente. O poder local é praticamente omisso no seu dever institucional de cuidar do meio ambiente. Nesse caso, o município fica a mercê dos órgãos estadual e federal no trato das questões ambientais;

Nível 01: Refere-se à situação em que a base legal para efetivação de uma política ambiental está se constituindo ou o conjunto de leis que se tem, mesmo que tratando de questões ambientais, não possui força suficiente para estruturar um sistema municipal de meio ambiente;

Nível 02: Refere-se à situação em que a base legal para estruturação do SISMUMA está posta, no entanto, ainda não se iniciou o estabelecimento do aparato institucional para implementação da política ambiental;

Nível 03: Refere-se à situação em que o aparato institucional está se constituindo para atender as exigências da base legal e fazer funcionar o sistema municipal de meio ambiente;

Nível 04: Refere-se à situação em que o aparato institucional está constituído e funcionado num contexto de rotinas administrativas previstas legalmente, porém sem proposição de planos, programas e projetos para fazer cumprir pro- ativamente a política ambiental e resolver problemas específicos demandados pela sociedade em dado momento;

Nível 05: Refere-se à situação em que o aparato institucional está estabelecendo suas bases para ação mediante instrumentos de planejamento tendo como fundamento um diagnóstico sócio-ambiental condizente com as principais demandas da sociedade. Nessa ocasião o poder local começa a ser pro-ativo diante dos principais problemas sócio-ambientais do município, definindo prioridades e estabelecendo uma agenda de planos, programas e projetos;

Nível 06: Refere-se à situação em que a agenda de planos, programas e projetos está em implementação, porém sem controle social definido. Nesta ocasião a atuação do órgão ambiental é influenciada fortemente pelo modelo e agenda de gestão adotados. Essa agenda de gestão em geral sofre alterações substanciais com a descontinuidade política, e sua configuração depende muito do tipo de governo que se estabelece no poder;

Nível 07: Refere-se à situação em que sobre a agenda de gestão (sobre o governo) está se estabelecendo mecanismos de controle social. Esses mecanismos podem ser transitórios no âmbito apenas da gestão, ou podem ser estabelecidos permanentemente mediante mecanismos legais de estado. No entanto, a instituição de processos de controle social será sempre influenciada pela atuação do governo vigente e de sua ideologia político-partidária de governança.

Nível 08: Refere-se à situação máxima de maturidade da política pública em que o controle social se estabelece sobre dada política de forma clara, sistemática e funcional; Nessa ocasião, mesmo que os instrumentos de planejamento e de gestão sejam transitórios devido à descontinuidade do governo, a agenda da política ambiental sofre influência substancial da sociedade atuante no controle social, o que pode promover incrementos na base legal gerando mecanismos

políticos-institucionais mais permanentes no contexto da atuação do estado e implementação da política pública.

Como visto, caberia ao poder local como instância de estado mais próxima da sociedade cumprir os papéis de estabelecer a base legal necessária para o estabelecimento de uma política ambiental como um eixo estratégico para o desenvolvimento local sustentável em complementação e suplementação às diretrizes de políticas públicas ambientais estabelecidas nos âmbitos federal e estadual; também caberiam os papéis de estabelecer e fazer funcionar um aparato institucional adequado à realidade, com competências técnicas e operacionais que se utilizam eficientemente de instrumentos de planejamento e gestão, que consideram a participação social como um elemento importante para o alcance e sustentabilidade dos resultados produzidos na implementação da política de meio ambiente municipal.

7 ANÁLISE E AVALIAÇÃO DA POLÍTICA AMBIENTAL DO MUNICÍPIO DO