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12. TEORIAS DA EXCLUSÃO SOCIAL

12.3. O PARADIGMA MARXISTA

Para o marxismo as sociedades capitalistas contemporâneas

“[...] são compostas de classes: a classe capitalista, formada pelos proprietários ou administradores dos meios de produção, organizados funcionalmente como empresas; a classe operária formada por aqueles desprovidos de qualquer propriedade dos meios de vida e assim obrigados a vender sua força de trabalho; e os produtores simples de mercadorias, formados por aqueles que possuem alguns meios de produção, mas os utilizam eles próprios ganhando sua vida pela venda de bens e serviços que são produzidos por eles sozinhos ou, no máximo, com outros membros da família ou um pequeno número de trabalhadores contratados.” (SINGER, 1998, p. 70)

Ainda segundo Singer:

Essa divisão fundamental de classes é de longe incompleta demais para explicar a complexidade das atuais sociedades capitalistas altamente desenvolvidas. Primeiramente, as maiorias dos dirigentes das empresas capitalistas são empregados, com pouco ou nenhum direito de propriedade. É importante distinguir entre capitalistas financeiros, que possuem capital e supervisionam os executivos, e estes últimos que realmente dirigem a atividade produtiva, admitem e demitem trabalhadores, estabelecem os níveis salariais e desse modo distribuem pelo menos parte da receita gerada pelas firmas. Capitalistas proprietários e capitalistas gerenciais formam atualmente grupos diferentes de uma mesma classe. Em segundo

lugar, algum limite de classe separa os executivos dos trabalhadores

ordinários, mas não é fácil determiná-lo na teoria. Existem diversos níveis de supervisores ou dirigentes administrativos subordinados que não podem ser facilmente classificados como capitalistas gerenciais ou trabalhadores assalariados. Em situações de conflito de classe eles podem caracteristicamente aderir a um lado ou a outro. Em terceiro lugar, existem participantes da vida econômica que não parecem pertencer a qualquer das três classes fundamentais. São por exemplo, as donas de casa, que ajudam a produzir e reproduzir a mais importante de todas as mercadorias: a força de trabalho. Servidores públicos e trabalhadores de organizações sem fins lucrativos também não dispõem de um lugar apropriado no esquema de classes marxista. (SINGER, 1998, p. 70)

Para os marxistas, a sociedade de classes é intrinsecamente injusta, gerando inevitavelmente a exclusão social. Nas sociedades capitalistas a exclusão social tem sido identificada com desemprego, mas ultimamente novas formas de exclusão

social estão surgindo. Estas novas formas estão relacionadas à Terceira Revolução Industrial. (SINGER 1998)

Dentre as drásticas transformações na maioria das empresas, provocadas pela Terceira Revolução Industrial, está a redução da hierarquia gerencial levando ao desemprego de grande maioria dos supervisores de nível intermediários, que são compelidos a se preparar para uma nova carreira ou a uma aposentadoria precoce. Outro problema para os assalariados é a sua substituição por fornecedores de serviços contratados (terceirização). Com isso os trabalhadores que frequentemente podem ser os mesmos, têm seu status de classe alterado: São aqueles que pertenciam anteriormente à classe operária e agora se tornam produtores simples de mercadorias. Como empregados, o número de horas de trabalho era determinado por lei ou contrato. Como autônomos, para eles há sempre motivo para aumentar o número de horas trabalhadas e assim ganhar mais. Então os trabalhadores autônomos substituem os empregados, poucos executam o trabalho e alguns são excluídos não mais por ter sido demitidos, mas por ser incapaz competir. (SINGER 1998).

Singer mostra em sua análise do paradigma marxista que:

Os marxistas distinguem entre exploração e exclusão. Marx escreveu certa vez que pior do que ser explorado pelo capital é não ser explorado por ele, quer dizer, estar excluído do mercado de trabalho. A teoria da exploração mostra que no capitalismo o excedente social toma a forma de mais-valia ou renda de propriedade, que é apropriada pela classe capitalista. Atualmente isto não é totalmente verdadeiro. Os fundos de pensão, que pertenciam aos trabalhadores, estão entre os maiores investidores. Por conseguinte, uma parte do excedente toma forma de salário e é apropriada pelos empregados e economizada na forma de fundos de pensão. Contudo, empresas médias e grandes são todas controladas por capitalistas e as camadas mais pobres da classe operária certamente são exploradas.

O importante é que a exclusão de uma parte intensifica a exploração da outra. Na maioria dos países, e certamente no Brasil, existe uma sobreoferta de trabalho desqualificado ou escassamente qualificado. “A pressão do grande número de excluídos conserva o padrão salarial desses trabalhadores num nível baixo, limitado apenas pela legislação do salário mínimo”. Como foi visto acima a crescente informalização das relações de trabalho está agora golpeando também trabalhadores qualificados e antigos empregados com nível universitário. As longas jornadas de trabalho praticadas por trabalhadores informais resulta em mais demissões e crescimento número de desempregados, avolumando as fileiras dos trabalhadores informais. Não há dúvida que a exclusão alimenta a exploração e a exploração (particularmente do trabalhador informal) alimenta a exclusão.

O marxismo propõe o socialismo como modelo de sociedade na qual em princípio, ninguém é excluído. “A proposta original supunha que a plena integração social seria assegurada pela produção social de todos os meios de produção e pelo planejamento centralizado da atividade econômica”. (SINGER, 1998, p. 73)

De acordo com Singer (1998), devido ao colapso do “socialismo realmente existente”, a maioria dos marxistas se convenceu de que o progresso econômico e os direitos individuais não podem ter garantias sem liberdade econômica e algum grau de competição de mercado. Isto significa a necessidade de redesenho do projeto socialista, e tendo como desafio encontrar um caminho de conciliação das potencialidades de liberação de um mercado competitivo com os controles institucionais que reduzam sistematicamente a desigualdade e as exclusões sociais.

A Terceira Revolução Industrial e suas implicações sociais acenam para a solução do problema ou “enigma”. A divisão alienante do trabalho padronizado por Taylor e Ford está sendo radicalmente revista, na medida em que os trabalhadores estão ganhando mais responsabilidades e autonomia.

[...] A equipe de trabalho substitui o trabalhador individual e uma colaboração mais estreita entre as equipes, gerentes e técnicos está mudando as relações sociais no local de trabalho. Como resultado, empresas gigantescas podem ser substituídas por extensas redes de empregados, fornecedores associados, subcontratantes etc. Até aqui, a exigência de elevado capital inicial representava uma barreira inseparável para o ingresso em muitos mercados, particularmente em mercados que geram e utilizam tecnologia avançada. A única maneira de neles entrar tem sido empregar-se num dos poucos oligopólios que dividem este mercado. A mudança na organização empresarial e as novas tecnologias tendem a abri- la aos pequenos operadores, cuja dimensão é prontamente superada por meio de “redes” com outros operadores.. (SINGER, 1998, p. 74)

Para Singer(1998), as barreiras para o ingresso de capital em muitos mercados estão sendo suprimidas pelo encurtamento das distâncias e do tempo consumido nas comunicações. Anteriormente, a coordenação do trabalho de dezenas de milhares era levada a cabo por meio da concentração de capital, e do que Marx chamou de “centralização de capital”, a fusão de muitos pequenos capitais em um punhado de enormes capitais oligopolísticos. A informática e a telemática já estão tornando possível esta coordenação sem a concentração de grande capital, abrindo perspectivas de um novo mundo de produção onde o trabalho será partilhado entre produtores livres e autônomos, sem a dependência dos monopolizadores da propriedade do capital. Mas os marxistas não acreditam que essa perspectiva seja realizada pela gradual disseminação de novas tecnologias. Segundo Singer: “[...] os capitalistas, que exercem sua dominação através do monopólio dos ativos de capital, irão de preferência, limitar ou retardar a chegada da Terceira Revolução Industrial do que abrir mão de seus privilégios”.(SINGER, 1998, p, 74).

Por outro lado, recentes evoluções, particularmente a globalização, expandiram a exclusão social no mundo desenvolvido. A abertura dos mercados nacionais à competição externa e ao capital estrangeiro impôs a reestruturação de todas as economias através de maciça transferência da indústria para os países onde a mão-de-obra é barata e desprovida de direitos sociais e políticos. Enquanto isso nas nações desenvolvidas, tradicionais reduto do movimento operário foram destruídos pela exportação dos postos de trabalho em larga escala e pela substituição dos trabalhadores assalariados organizados por autônomos. Os trabalhadores organizados foram vítimas de um novo tipo de exclusão social. Nos mercados oligopolistas, os trabalhadores altamente organizados podiam exigir – e conseguir – uma parte dos lucros extras recebidos pelas empresas. Os altos salários os benefícios adicionais assim conquistados fazem desses trabalhadores o alvo principal da desindustrialização e do deslocamento da produção para o exterior. (SINGER, 1998, p. 75)

O deslocamento da produção para o exterior constitui fator de insegurança para os trabalhadores locais, gerando possibilidades concretas de exclusão do processo de produção e consumo e consequente instablidade social e medo.

No pensamento marxista, em uma economia de mercado a competição deve ser limitada por acordos extra-mercado, assim, há garantia de que todos tenham uma chance de participar da economia através do emprego, de contrato, de associação ou como operadores autônomos. (SINGER 1998).