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O pensamento do possível

No documento Direito Fundamental ao Máximo Existencial (páginas 79-89)

EXCEÇÃO 1 O Município foi efetivamente criado e assumiu existência de fato, há mais de seis anos, como

2.3 A REFLEXÃO HERMENÊUTICA

2.3.2 O pensamento do possível

O pensamento do possível remete a uma discussão filosófica sobre o sentido e as compreensões em derredor do possível que vão às fontes distantes da filosofia, como o próprio Aristóteles (2002, p. 91) que, ao analisar a pertinência da deliberação sobre os meios a serem empregados para determinado fim, salienta que a condição necessária para a ação é, justamente, a possibilidade. O possível é aquilo “[...] capaz de ser executado por nossa ação”.

Como sustenta Abbagnano (2003, p. 778-782), os conceitos e compreensões do possível foram trabalhados por uma longa série de filósofos e pensadores, passando por

Aristóteles, São Tomás de Aquino, Lukacs, Hartmann, além dos existencialistas93. Ademais, haveria três noções do possível, sendo uma lógica e negativa e as outras duas positivas, que seriam a possibilidade real e a possibilidade objetiva94.

Dentre os pensadores e filósofos destaca-se a particular reflexão estabelecida em torno do possível por Ernst Bloch ao sustentar e embasar o princípio da esperança, fazendo várias incursões sobre o que seja possível diante da realidade e da necessidade – antecipando- se ao desenvolvimento da tríade do real, do possível e do necessário que seria empreendida posteriormente, no pensamento jurídico, por Häberle95.

Bloch (2005, p. 194-195) afirma que o mundo e a vida humana estão sempre inconclusos e, como tais abertos a contínuos processos96. Para Bloch, a realidade é processo, que nada mais é do que mediação entre presente, passado pendente e “[...] sobretudo o futuro possível”. Assim, todo real abriga uma dimensão do possível e o possível é parcial- condicional, o determinado que ainda não se concluiu. Diante disso, sustenta que “Possível é tudo que encontra as condições dadas em proporção suficiente. Todavia, justamente por isso, tudo que não encontra as condições necessárias ainda é faticamente impossível” (BLOCH, 2005, p. 203).

Exatamente em razão disso é que Bloch admite ser necessário que se vá sendo-

conforme-a-possibilidade, devendo-se proceder passo-a-passo no caminho para o novo, pois o

possível pode não ser executável imediatamente e a qualquer hora na medida em que condições ausentes podem retardar ou mesmo impedir a sua ocorrência.

O princípio da esperança, habilitante da utopia, recorre, então, a uma precaução crítica que fixa a velocidade do processo e a expectativa de que o possível se realize. Haveria, então, no âmbito do possível, dois lados de uma mesma moeda. O reverso, representativo das medidas do possível em cada caso; e o anverso, em que o totum do que é derradeiramente possível permanece em aberto. E a relação entre o reverso e o anverso revela a tensão

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Para quem (ABBAGNANO, 2003, p. 778-782) se remete caso se entenda necessário perscrutar as origens e o percurso histórico-filosófico do possível.

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Bloch (2005, p. 195) define o objetivamente possível como aquilo cuja ocorrência é cientificamente esperada ou que não pode ser excluída. O realmente possível é aquilo cujas condições de ocorrência ainda não estão integralmente satisfeitas no próprio objeto, seja porque estão se constituindo, seja pela sobrevinda de novas condições que modificam e projetam o real.

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Que, aliás, reconhece a precedência do clássico pensamento do possível em Robert Musil e Ernst Bloch (HÄBERLE, 2004, p. 49).

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Adiante, Bloch (2005, p. 221) registra que “Onde não se pode mais nada e onde nada mais é possível, a vida parou.” Como a proposta do direito fundamental ao máximo existencial se fundamenta na perspectiva utópica da ampliação progressiva do possível, situando-se no já aludido constitucionalismo virtuoso, há de se concluir que confere vida aos direitos fundamentais, assegurando-lhes sempre um espaço aberto de possibilidades.

existente no âmbito dos direitos fundamentais quanto à expectativa de sua realização e efetividade.

Com efeito, esclarece Bloch que

Precisamente o primeiro lado, o das condições de existência determinante ensina o comportamento a ser adotado na caminhada para o alvo, enquanto o segundo, o do totum utópico, permite fundamentalmente impedir que êxitos parciais nessa caminhada sejam tomados pelo alvo como um todo e o encubram.

Ora, o direito fundamental ao máximo existencial – e a dimensão utópica que encerra e que revela quanto aos direitos fundamentais em geral – insere-se justamente na perspectiva de ampliação do possível quanto aos níveis de prestação e aos graus de implementação dos direitos fundamentais, não se legitimando o conformismo com graus ineficientes ou mínimos de realização e, muito menos, com o mínimo vital. A categoria do mínimo vital, enquanto referencial para a justiciabilidade dos direitos sociais, peca por aterrar a construção da efetividade dos direitos fundamentais em geral ao mínimo, que se situa muito distante da função e do desiderato que almejam.

Assim, a dimensão normativa do direito fundamental ao máximo existencial desnuda que os direitos fundamentais exprimem um dever-ser no ser que possa-ser. Logo, dever-ser (instância normativa), ser (realidade) e poder-ser (aberta das possibilidades) se entrelaçam na compostura de um pensamento que se volta ao utópico projeto de que sejam os direitos fundamentais efetivados ao máximo possível, entendido essa máximo no âmbito das condições que limitam o possível e, então, como satisfatório suficiente.

Aliás, como Bloch (2005, p. 232) pontua, é próprio de o homem descortinar e revelar-se como um horizonte de possibilidades e, assim, nada mais natural do que os direitos fundamentais expressam essa condição humana, posto serem a criação cultural mais humanística.

Após rechaçar as objeções contra a categoria do possível, Bloch (2005, p. 243) considera ser uma característica inerente ao ser humano estar à frente de si mesmo, pois ao se deparar com limites e tomar consciência deles, os ultrapassa. Desse modo, os limites para a efetivação dos direitos fundamentais não são obstáculos à sua implementação conforme o máximo existencial, posto que tais limites podem ser superados com a ampliação do que seja possível, dirigindo-se sempre ao critério virtuoso da satisfação suficiente. O conteúdo utópico que os direitos fundamentais encerram nada mais exprime do que o sonho originário da instituição do bem estar por um bom governo. E, mais uma vez com Bloch (2006, p. 9), todo sonhador sempre quer mais.

Nem se objete que haveria uma retórica vazia e sentimentalista, pois o constitucionalismo anima e inspira a retórica para além dela própria, com a sua projeção sobre a realidade, comportando e expressando sentimentos porque deles vieram os direitos fundamentais: sentimentos de sofrimento, humilhação, desprezo, ignorância, fé, paixão e crença.

Essas reflexões de Bloch, a quem se retornará ao se analisar o locus da utopia, foram aprofundadas e adaptadas à ciência jurídica por Häberle (2002) a quem se deve o seu desenvolvimento e sua aplicação, notadamente, ao direito constitucional, estabelecendo-se a partir da sua interação com o real e necessário, compondo uma tríade97.

Como salienta Manoel Jorge e Silva Neto (2008, p. 104), “O pensamento possibilista visa, segundo Peter Häberle, a descoberta dos meios para conservar e recriar continuamente condições de liberdade para todos indivíduos com vistas à consecução de um justo e razoável equilíbrio de interesses.”

O constitucionalista alemão ressalta que “O pensamento e a ação constitucionais devem constantemente analisaram e si próprios para explorar suas possibilidades e seus limites, as oportunidades e os perigos para a sua causa, ou seja, para uma ordem constitucional livre, democrática e digna dos homens” (HÄBERLE, 2004, p. 48)98.

Desse modo, esse é o objetivo do pensamento do possível, que estaria firmado entre o real e o necessário e se apoiando em uma série de referenciais e materiais oriundos da legislação, da administração, do judiciário, da política e da vida pública, conferindo realidade e vida à constituição. Não obstante isso, admite que no âmbito da teoria constitucional, o possível mal conhecido.

Assim, explica as origens da tríade do possível, do real e do necessário ao salientar que se deve a H. Lenz o conceito de homem real, enquanto o conceito do necessário, que ocupa posição intermediária, compõe o imperativo de proporcionalidade.

Para a afirmação e a compreensão do direito fundamental ao máximo existencial torna-se fundamental a adoção da perspectiva do pensamento do possível, inserido e inspirado pela matriz da reflexão hermenêutica, porque, como acentua Häberle (2004, p. 48), é atualmente uma demanda intensa saber quais são as tarefas necessárias incumbidas ao Estado,

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Malgrado as potencialidades que suscita o pensamento do possível, Häberle (2002, p. 63) observa que apenas uma minoria parece tomar consciência disso.

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Em tradução livre. No original, « La penseé et l’action constitutionnelles doivent constamment s’analyser elles-mêmes pour explorer leurs possibilités et leurs limites, les chances et les dangers pour leur ‘cause’, c’est-à- dire pour un ordre fondamental libre, démocratique et digne des hommes. »

sobre a reserva do possível. E, nesse sentido, “[…] tanto os limites, como as próprias possibilidades do vigor ou da força normativa da Constituição sempre poderão ser explicitados mediante a tríade filosófica, ou seja, o pensamento do possível, do necessário e do real”99 (HÄBERLE, 2002, p. 61); assim, o dever-ser unido ao ser tem como condição de possibilidade o poder ser.

O pensamento do possível não se reduz, não se limita e nem pode ser confundido com a categoria habilitadora da reserva do possível, sendo, em verdade, um estilo de raciocínio que em muito condiz com paradigmas da hermenêutica filosófica e com outra matriz epistemológica que é o criticismo popperiano.

Com a hermenêutica filosófica o pensamento do possível tem em comum a abertura a alternativas, que a hermenêutica reconhece diante da primazia da pergunta sobre a resposta quando se dá a fusão de horizontes100. E o pensamento do possível consiste exatamente num pensamento que se desenvolve de forma aberta e plural mediante alternativas – que bem poderiam ser os topoi sustentados pela tópica de Viehweg.

O pensamento do possível, como esclarece Häberle, se estabelece mediante alternativas, desde alternativas e com as alternativas, estando muito mais aberto às alternativas, independente de quantas sejam, do que a um compromisso.

Ademais, corresponde a uma exigência ética do Estado Constitucional republicano o pensamento por alternativas e investigar as possibilidades que se projetem a partir do exame do real e do necessário, impondo-se na construção de conceitos fundamentais do constitucionalismo – notadamente de um constitucionalismo virtuoso como o que se propõe a partir do máximo existencial como satisfação suficiente –, como o relativo aos direitos sociais e culturais.

Cada uma das três categorias, do possível, do real e do necessário, é indispensável para a operacionalização do Estado de Direito nos quadrantes de um Estado Constitucional, destacando que os ideários que povoam a comunidade, a doutrina constitucional relativa a textos sociais, suas funções e procedimentos devem ser sempre compreendidos sob a forma de possibilidades, necessidades e realidades, que podem levar a resultados divergentes; todavia,

99

Em tradução livre. No original, “[...] tanto los límites como las propias posibilidades del vigor o fuerza normativa de la Constitución siempre podrán ser puestas de manifiesto claramente con la ayuda del mencionado triadismo iusfilosófico, es decir, el pensamiento posibilista, necesarista y realista.”

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E não é sem razão que Häberle (2004, p. 48) afirma que “O raciocínio do possível é, com efeito, interrogador”. No original, « Le raisonnement du posible est em effet interrogateur. »

não são quaisquer possibilidades, necessidades e realidades, mas aquelas que se inserem nos marcos do Estado Constitucional (HÄBERLE, 2002, p. 60).

O pensamento do possível é o adequado para a compreensão e a interpenetração das diferenças e particularidades constitucionais dos países, ressaltando sua especial importância na solução de problemas que envolvam a compreensão dos princípios constitucionais, dos direitos fundamentais e em temas relativos à interpretação constitucional (HÄBERLE, 2004, p. 49-51), além da reconfiguração das funções dos poderes do Estado.

Diante disso, Häberle (2004, p. 53) sintetiza a interação do real, do possível e do necessário, consistindo numa cooperação de três elementos que, enquanto tríade, manifestam- se como unidade aberta, pois “[...] é preciso primeiramente estudar a realidade, por em seguida a questão das alternativas possíveis e, então, avaliá-las para compreender as necessidades”101.

A relação entre as três dimensões, com a preferência do real, do possível ou do necessário, é questão central da teoria constitucional e a “dosagem” de cada um dos estilos de pensamento dependerá da função estatal que esteja em causa. Não obstante isso, Häberle (2004, p. 54) aponta o caminho para a melhor combinação dos três estilos de raciocínio que compõem o pensamento possibilista, como se verifica do excerto abaixo, in verbis:

Entre as possibilidades como um todo, é preciso escolher as que favoreçam a transformação da realidade existente numa realidade melhor e evitem os riscos de retorno a uma realidade pior. A cooperação das três etapas do pensamento supõe, então, a escolha das premissas normativas.102

Justamente essa perspectiva é que inspira a reflexão em torno da eficácia jurídica do direito fundamental ao máximo existencial, que, em verdade, dirige-se à promoção e à exigência de efetivo atendimento dos níveis essenciais de prestação, bem como a ampliação dos mesmos de acordo com o contexto social e econômico existente.

O possível pode ser ampliado se pensadas as necessidades e o contexto real através das alternativas que sejam suscitadas, em superação de dogmas e mitos que, também, condicionam a capacidade de estender os próprios limites. Isso é reforçado pelo próprio Häberle (2002, p. 63) ao reconhecer que a reflexão do possível almeja qualquer resquício que

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Em tradução livre. No original, “[...] il faut d’abord etudier la réalité, poser ensuite la question des alternatives possibles, puis évaluer celles-ci afin de clarifier las necessites”.

102

Em tradução livre. No original, « Parmi l’ensemble des possibilités, il faut choisir celles qui favorisent la transformation de la réalité existante vers une réalité meilleure et évitent les risques d’un retournement vers une réalité moins bonne. La coopération des trois étapes de pensée suppose donc des choix et des prémisses normatifs ».

permita ampliar as possibilidades existentes, estendendo o horizonte visual103 para conceber novas realidades. Assim, seria possível corrigir as trajetórias das realidades pretéritas, adaptando-as e adequando-as para que as novas realidades sejam melhores.

No mesmo sentido se manifesta Neil MacCormick (2011, p. 18) ao considerar que “O que é possível não é independente do que acreditamos ser possível. A possibilidade da sua ocorrência no mundo real dependente de ser apreendido pela imaginação das pessoas que fazem o mundo real funcionar”.104 Daí o caráter expansivo ensejado pelo pensamento do possível, justificando sobremodo a sua pertinência quanto à compreensão do direito fundamental ao máximo existencial.

O acúmulo de possibilidades deve se nortear por aquelas que sejam capazes de melhorar o desenvolvimento da própria realidade existente, evitando sua deterioração e seus perigos potenciais (HÄBERLE, 2002, p. 80).

De qualquer sorte, constitucionalista alemão preocupa-se em registrar que o elemento normativo nunca se dilui num âmbito da tríade, revelando especial atenção com a aplicação e as potencialidades do pensamento do possível aos direitos fundamentais e, em especial, aos direitos sociais105.

Também ressalta a importância do pensamento do possível Gustavo Zagrebelsky (2002, p. 17), destacando que o seu objetivo é, dentre as possibilidades suscitadas, obter a melhor (ZAGREBELSKY, 2011, p. 34), correspondendo a uma exigência ética em se tratando de temas constitucionais e, notadamente, na seara dos direitos fundamentais. Ao associar o pensamento do possível com a democracia, cunha a noção de democracia crítica, entendida não apenas como um meio, mas com um fim e que, como tal, deve não apenas ser servida, mas servir.

É nesse contexto que se adequam à proposta do direito fundamental ao máximo existencial os referenciais que Zygmunt Bauman (2008, p. 31) aponta para uma vida boa. Considerando que cada vida se trata de uma obra de arte, sustenta que

[...] devemos escolher alvos que estão (ao menos no momento da escolha) muito além do nosso alcance, e padrões de excelência que, de modo perturbador, parecem permanecer teimosamente muito acima de nossa

103

Ou o horizonte hermenêutico se inserido no âmbito da proposta da reflexão hermenêutica, como se pretende.

104

Em tradução livre. No original, “What is possible is not independent of what we believe to be possible. The possibility of such developments in the practical world depends upon their being grasped imaginatively by the people who make the practical world work.”

105

Tanto que destaca haver uma progressiva densidade normativa dos direitos sociais, cabendo ao Estado Social proporcionar a criação de possibilidades de efetivação de tais direitos diante da difícil efetivação imediata das realidades que colimam (HÄBERLE, 2002, p. 69).

capacidade (pelo menos a já atingida) de harmonizar com o que quer que estejamos ou possamos estar fazendo. Precisamos tentar o impossível. E sem o apoio de um prognóstico fidedigno (que dirá da certeza), só podemos esperar que, com longo e penoso esforço, sejamos capazes de algum dia alcançar esses padrões e atingir esses alvos, e assim mostrar que estamos à altura do desafio106.

Nada impede transplantar esses critérios de vida boa individual para o âmbito de uma convivência comunitária com qualidade de vida e que permite a auto-realização e a autonomia individuais.

Ademais, como salienta Muhammad Yunus (2008, p. 227), prêmio Nobel de Economia, é possível colocar a pobreza – e com ela, grande parte dos problemas sociais, alcançando a realização das condições existenciais – no museu, pois há tecnologia e recursos disponíveis para tanto, carecendo apenas vontade política e instituições que desenvolvam e executem as políticas adequadas e necessárias.

Já Karel Vasak (1984a, p. 242-243) adverte quanto ao erro de pensar que as aspirações máximas não podem ser realizas. Após destacar ser uma estratégia técnica comum a firme defesa de uma menor proteção dos direitos, sobretudo quando parecem ilusórios, inoperantes, ressalta que “Apesar disso, devemos rechaçar quaisquer técnicas o estratégias que ajudem a perpetuar o mito de que os direitos de mais alto nível são meras aspirações, e não assuntos de legítima utilização por parte de juristas e advogados”107.

Logo, o direito fundamental ao máximo existencial deve ser afirmado e compreendido, e suas potencialidades desnudadas, a partir da reflexão hermenêutica orientada conforme o pensamento do possível a fim de que, expandindo-se o possível, cada vez mais se venha a tornar o impossível possível no que se refere à ampliação da efetividade dos direitos sociais.

Do quanto analisado, evidencia-se, primeiramente, a plena compatibilidade do pensamento do possível com a reflexão hermenêutica e com o paradigma da complexidade. Ademais, o desvelar de possibilidades – a partir da interpelação que os horizontes do texto constitucional e da realidade, matizada pela necessidade, fazem à comunidade aberta de intérpretes – é condição sine qua non para que se alcance a expansão do possível em direção à satisfatoriedade suficiente, referencial do direito fundamental ao máximo existencial.

106

Destaques constantes do original.

107

Em tradução livre. No original, “Pese a ello, debemos rechazar cualesquiera tácticas o estrategias que ayuden a perpetuar el mito de que los derechos de más alto rango son meras aspiraciones, y no asuntos de legítima utilización por parte de juristas y abogados.

Além disso, o pensamento do possível pode auxiliar a descortinar novas condições quanto à justiciabilidade dos direitos fundamentais, habilitando a crítica e a reflexão sobre os limites da jurisdição constitucional e suas técnicas de decisão.

Gilmar Mendes e André do Vale (2011) têm destacando a aplicação do pensamento do possível em sede de jurisdição constitucional brasileira, dando azo a incrementação das técnicas de decisão do Supremo Tribunal Federal.

Nesse sentido, o pensamento do possível foi invocado pelo Supremo Tribunal Federal no julgamento da Ação Direta de Inconstitucionalidade n° 1.289, cuja ementa, abaixo transcrita, faz-lhe expressa referência, in verbis:

Ação Direta de Inconstitucionalidade. 2. Embargos Infringentes. Cabimento, na hipótese de recurso interposto antes da vigência da Lei nº 9.868, de 10 de novembro de 1999. 3. Cargos vagos de juízes do TRT. Composição de lista. 4. Requisitos dos arts. 94 e 115 da Constituição: quinto constitucional e lista sêxtupla. 5. Ato normativo que menos se distancia do sistema constitucional, ao assegurar aos órgãos participantes do processo a margem de escolha necessária. 6. Salvaguarda simultânea de princípios constitucionais em lugar da prevalência de um sobre outro. 7. Interpretação constitucional aberta que tem como pressuposto e limite o chamado "pensamento jurídico do possível". 8. Lacuna constitucional. 9. Embargos acolhidos para que seja reformado o acórdão e julgada improcedente a ADI 1.289, declarando-se a constitucionalidade da norma impugnada

(ADI 1289 EI, Relator(a): Min. GILMAR MENDES, Tribunal Pleno, julgado em 03/04/2003, DJ 27-02-2004 PP-00021 EMENT VOL-02141-02 PP-00315)

O caso envolvia o julgamento da constitucionalidade de ato normativo do Conselho Superior do Ministério Público do Trabalho que admitia a complementação da lista sêxtupla, necessária ao procedimento para observância da regra do quinto constitucional, previsto pelo art. 94 da Constituição Federal, quando não houver, dentre os membros do Ministério Público do Trabalho, candidato com mais de dez anos de carreira por quem não

No documento Direito Fundamental ao Máximo Existencial (páginas 79-89)