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O percurso tortuoso do primeiro governo Berluscon

2.1 1994: A ENTRADA “TELEVISIVA” NA POLÍTICA

2.3. SILVIO BERLUSCONI NO PODER

2.3.1. O percurso tortuoso do primeiro governo Berluscon

Uma vez formado o seu primeiro governo, contudo, Silvio Berlusconi encontrava-se numa situação difícil: não se tinha que debater só com a procura de recursos para ser capaz de combater eficazmente a oposta coalizão eleitoral dos progressistas, mas, logo depois do seu triunfo eleitoral, apercebia-se de que o peso eleitoral de determinados partidos da sua coligação, em especial a Lega Nord, era grande em relação ao seu real apoio eleitoral. Parecia, dessa forma, tudo menos que simples governar com uma aliança formada por forças políticas, tais como a Liga do Norte e a Alleanza Nazionale (AN), ainda distantes numa série de questões políticas programáticas, em que a Liga era crucial para manter o governo, devido ao peso do seu grupo parlamentar. Bossi, o seu líder, de facto, com os seus 106 deputados leguistas em 366 da coligação e 56 dos 156 senadores, não aceitava automaticamente o direito de Forza Italia de se tornar partido-líder da coligação. O centro-direita começava, portanto, a ter de lidar com muitas contradições, que, mais tarde, viriam a se tornar cada vez mais incontroláveis. Em suma, com as

divergências dentro da maioria e, acima de tudo, entre a Liga e AN, o caminho para o mandato do novo governo de Berlusconi parecia bastante tortuoso.

De resto, o partido de Bossi temia que uma tão clara afirmação de Forza Italia pudesse tirar consenso eleitoral à Lega Nord. Daqui, portanto, o surgimento de uma atitude constante na relação entre a Liga do Norte e o movimento político de Berlusconi: aliados, mas sempre numa fórmula competitiva: a Liga funcionaria como partido da mesma coligação, porém autónomo e combativo, e, se necessário, pronto para “atacar”.

A batalha chegou a ser, muitas vezes, feroz, mas Bossi, depois de ter formulado uma série de pedidos, fazendo pesar a sua representação parlamentar, cedeu, e, no dia 10 de Abril, um mês antes da tomada de posse do governo, durante um comício, na frente de 25 mil apoiantes do partido, disse que o partido não tinha medo de governar, que apoiaria o primeiro executivo de Silvio Berlusconi, embora confirmando que seria uma Lega Nord sim de governo, mas também de "luta". A Liga do Norte, portanto, decidia apoiar o governo, mas Bossi colocava ao primeiro-ministro Berlusconi duas condições improrrogáveis: um projecto de reforma institucional para transformar a Itália num estado federal e uma virada liberal. Além disso, o estabelecimento de um período de seis meses, para verificar o andamento das propostas.

O outro principal aliado de Berlusconi, a Alleanza Nazionale, vivia um momento de grande ascensão. Tendo adquirido uma parte da legitimidade democrática graças à aliança com Berlusconi, o seu líder Fini foi, sem dúvida, um parceiro leal no governo. No entanto, apesar das aberturas do secretário, o partido continuava a ser visto com desconfiança, especialmente no estrangeiro, onde se mostrava uma certa preocupação com a próxima entrada para o governo de uma força política ligada à ideologia fascista. O secretário Gianfranco Fini, buscando rápida e definitivamente romper com o passado, apontou para um caminho de mudança, tentando fazer da Alleanza Nazionale uma verdadeira força de governo e um exemplo de uma direita moderna e liberal.

A equipa de governo que finalmente foi apresentada ao Chefe de Estado, Oscar Luigi Scalfaro, era composta por oito ministros de Forza Italia, seis da Liga do Norte e cinco ministros da AN, enquanto dois ministérios foram reservados para partidos menores e mais dois foram "técnicos". Não faltaram as controvérsias: impressionava, de facto, que

seis ministérios fossem da Lega Nord, um partido que representava, de facto, apenas uma parte geográfica do país; também a nomeação, inicialmente como ministro da Justiça do advogado de Berlusconi, Cesare Previti, mais tarde passado para a Defesa pela intervenção do Presidente da República, foi alvo de intensas polémicas.

Para além disso, o novo governo provocava alguma desconfiança não só na Itália, mas também a nível internacional. O que preocupava, principalmente no exterior, era, de facto, a presença no governo de ministros de Alleanza Nazionale, o partido “filho” do partido fascista. Em tom alarmado o diário israelita Haaretz escrevia, por exemplo: "Cinquenta anos após a extirpação do fascismo italiano, o fiel aliado da Alemanha nazista, os fascistas entram no governo de Roma." Fazia-lhe eco o Spiegel alemão, em cujas páginas lia-se: "O clima político mudou toda a Itália, o fascismo é novamente admitido na sociedade." Durante um de seus primeiros compromissos internacionais como chefe do governo, a visita de Bill Clinton a Roma no início de junho de 1994, Berlusconi, durante uma conferência de imprensa conjunta com o presidente dos EUA, sentia a obrigação de intervir na questão. Explicava, assim, aos jornalistas estrangeiros que insistiam sobre o papel dos "ministros fascistas" como, em Itália, os nostálgicos do fascismo constituíam uma minoria insignificante. No governo - acrescenta - "non c’è e non ci potrebbe mai essere un ministro che non creda fino in fondo nella libertà e nella democrazia e che non creda che il totalitarismo vada combattuto sempre e comunque fino in fondo.”(Campi, Varasano: 2012)

Apesar dessas polémicas, quatro meses após a fundação de Forza Italia, o seu líder tinha conseguido obter, embora com alguma dificuldade no Senado, a confiança para implementar o seu programa de governo. Uma grande expectativa centrava-se agora na figura de Berlusconi e no seu primeiro governo.