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O povoamento no território da Guiné-Bissau antes da independência

No documento Trabalho de Projecto Cali 16 Abril 2012 VF (páginas 48-58)

3. O SISTEMA URBANO GUINEENSE NOS ÚLTIMOS 50 ANOS

3.1.1. O povoamento no território da Guiné-Bissau antes da independência

Os conhecimentos sobre a antiga história dos países da África ao sul do deserto do Sara, foram sempre limitados por falta de documentos e registos para a investigação. Sabe-se, no entanto, tratar-se de uma região por onde passaram consecutivamente três grandes impérios naquela costa africana: Gana, Mali e Songhay, tal como se pode ver na figura-9, contudo todas as histórias relacionadas com esses impérios ou a maior parte delas eram contadas oralmente ou através dos cantos griô.

Segundo os relatos, o Império de Gana foi provavelmente fundado durante os anos 300, onde até 770, os seus governantes pertenciam a dinastia dos Magas, uma família berbere, apesar de, o povo ser constituído por negros das tribos Soninkés. Em 770 os Magas foram derrubados pelos Soninkés, e o império expandiu-se grandemente sob o domínio de Kaya Maghan Sissé, que foi rei por volta de 790.

Depois de muitos anos de luta, a dinastia dos Almorávidas berberes subiu ao poder, que no entanto não conseguiu conservar por muito tempo. O império entrou em declínio e, em 1240 foi absorvido pelo Império de Mali sob o comando de Sundiata Keita. A chegada e invasão dos Almorávidas do norte mudou tudo, porque estes submeteram e converteram os nativos à religião muçulmana, dissolvendo desta forma, a anterior estrutura social tradicional e criaram uma sociedade de hierarquias rígidas, sobretudo dentro das etnias convertidas. O rei Sundiata era mandinga, um dos grupos étnicos de povos negros que ainda vivem no Mali dos nossos dias, na Guiné-Bissau e no vizinho Senegal. Muito tempo depois, entre o séc. XV e XVI, ergue-se o império de Songhay, um dos três maiores impérios africanos da história.

Antes do império Songhay, a região tinha sido dominada pelo império de Mali, que no início do séc. XV, começou a declinar. O império de Songhay cresceu e dominou uma vasta área na costa ocidental africana, incluindo a actual Guiné-Bissau.

Invadido pelos guerreiros marroquinos vindos do Norte no final do séc. XVI, o império de Songhay ficou arrasado, política e economicamente, dando lugar a fragmentados estados independentes, sendo o mais importante desses estados, o reino de Gabu. Esta região de Gabu ocupa hoje o terceiro lugar na hierarquia das regiões administrativas da Guiné-Bissau, em termos do número da população residente. Desde então, sucederam- se períodos de guerras tribais, invasões, perdas ou conquistas de terras, como sucedeu com o último estado fula de Futa-djalon que se estabeleceu em meados do séc. XVIII, nas fronteiras das acuais regiões de Tombali e Quinara no sul da Guiné-Bissau. Todas essas ocupações não só deixaram as marcas religiosas mas também ao nível da organização das estruturas sociais que ainda refletem na forma da fixação desses povos. O monopólio dos mercadores norte-africanos naquela sub-região só terminou nos finais do séc. XVI com o início do mercado marítimo entre a África ocidental e alguns países europeus.

Fig. 9- Antigos Grandes Impérios Africanos na Região de África Ocidental

Fonte: pt.wikipedia.org/wiki/Imp%C3%A9rio_Gana (15/5/2009)

b) O povoamento da Guiné-Bissau no tempo dos portugueses;

Sabendo que o propósito deste trabalho consistia em analisar a situação do Sistema Urbano guineense apenas nos últimos cinquenta anos, ou seja, começar a partir de 1960, há no entanto, uma necessidade de recuar um pouco no tempo, para que se possa avaliar bem a Guiné no quadro do império português. Importa lembrar que muito antes da Guiné do séc. XX, a presença e a afirmação da soberania portuguesa nestas paragens com consequente edificação dos fortes nas margens dos importantes rios, o povoamento guineense nunca mais ficou como antes.

A título de exemplo e segundo o Atlas da lusofonia, Cacheu foi o primeiro ponto de contacto dos portugueses com a terra firme desta costa africana; Farim foi uma povoação fundada por um Capitão-mor de Cacheu, Gonçalo de Gamboa em 1641, tal como Ziguinchor, um presídio levantado e artilhado pelo mesmo Capitão-mor; Bissau, praça de guerra edificada em 1776; Geba, um grande mercado aonde concorre muita

courama, marfim, bastante cera e algum ouro; Fá, uma aldeia de Mandingas onde um negociante português fundou em 1820 uma feitoria mercantil que o governo de Portugal conserva etc.

O final do séc. XIX foi muito importante na história da viragem da actual Guiné- Bissau, porque “a 18 de Março de 1879, o território é proclamado (província da Guiné) passando a sua administração a ser independente da de Cabo Verde e sendo Capital da nova província estabelecida em Bolama” (Atlas de Lusofonia, 2001, 18). Nesta altura os limites fronteiriços ainda não tinham sido demarcados. A partir de1936, ano em que se deu por terminada a campanha de pacificação em Canhabaque (Arquipélago dos Bijagós), considerado último bastião da resistência dos indígenas da Guiné, a soberania portuguesa sobre todo território jamais foi ignorada.

O imposto de palhota criado desde 1903, passou a ser cobrado em todo território. Para que essa operação se possa efetivar, houve a necessidade da realização de um recenseamento geral, pelo que “Os censos coloniais realizados em 1928, 1929, 1936, 1940, 1949 e 1950 tiveram como unidade estatística a “palhota” que vigorou em quase toda a Guiné” (Franco, 2009,13). A palhota ficou por muito tempo como a principal unidade estatística para o pagamento dos impostos, uma vez que as estruturas sociais que os portugueses encontraram eram muito complicadas, fruto de um habitat disperso. A nível da escolaridade, poucos eram os negros guineenses com o segundo ciclo feito, facto que na generalidade pesava na falta de noção sobre os benefícios de uma cidade para os seus habitantes, a começar pela satisfação das necessidades básicas até a formação de intelectuais para liderar os destinos de uma nação.

Por tratar-se de uma época de viragem com importantes registos históricos quer para Portugal quer para colónias, achamos por bem definir dois grandes períodos na história de desenvolvimento do urbanismo guineense. O primeiro período que começa com o final da campanha de pacificação em 1936 até 1950, sendo o segundo período entre 1950 e 1973, com a saída do General António Spínola, uma vez que o seu sucessor mal teve tempo para dar seguimento da política traçada. Momentos altos que marcaram o arranque ao desenvolvimento urbano na Guiné portuguesa foram talvez quando se criou em Lisboa, o Gabinete de Urbanização Colonial (GUC) através do Decreto nº 34173, por Marcelo Caetano, no seu primeiro ano em exercício das funções de Ministro das Colónias, cargo onde permaneceu até 1947. “O diploma destinava-se a centralizar num só organismo público, com sede em Lisboa, toda a prática projectural de arquitectura e urbanismo de promoção oficial, destinada às "colónias de África"

(Diário do Governo, 1944, 1167), incluindo-se aqui naturalmente a então Guiné Portuguesa” (Milheiro e Dias, 2009, 82).

Segundo Milheiro e Dias, a criação do referido gabinete tinha como propósito uma necessidade urgente de “estudar e acompanhar a formação e o desenvolvimento dos aglomerados populacionais nas colónias de modo a aproveitar os ensinamentos da urbanística, evitando os erros por vezes irremediáveis, de um crescimento ao acaso” (Diário do Governo, 1944, 1167) citado por Milheiro e Dias, (2009, 82). Apesar de tratar-se de um diploma que constitui uma oportunidade para satisfazer as encomendas públicas ou privadas nas colónias portuguesas em matéria de arquitectura e urbanismo no início dos anos quarenta, a Guiné portuguesa continuava com os problemas de sempre. Falta das iniciativas locais, e de pouco interesse por parte dos anteriores governadores. Nessa primeira fase de arranque até finais dos anos 50, a governação de Manuel Maria Sarmento Rodrigues entre (1945 a 1948) deu um grande impulso nas actividades de urbanismo e na infra-estruturação em todo território nacional e em particular na cidade de Bissau. Graças aos serviços do (GUC), o governador Sarmento Rodrigues executa importantes obras, tal como iniciou e idealizou muitas outras que foram concluídas pelo seu sucessor Raimundo Serrão entre (1948 a 1954).

Alguns anos depois, procedeu-se a alteração do nome do Ministério das Colónias para Ministério do Ultramar (MU) e do Gabinete da Urbanização Colonial por Gabinete de Urbanização do Ultramar (GUU). Estas alterações aconteceram porque “com a revisão constitucional de Maio de 1951, desaparecem dos discursos oficiais os termos “Império” e “Colónias”, substituídos por “Ultramar” e “Províncias”, sugerindo uma integração mais pacífica destes territórios e contornando a crítica internacional então frontalmente contrária à existência de regiões colonizadas. Deste modo sai reforçado o princípio da unidade nacional de um Estado português pluricontinental” (SILVA, 2006, 147) ” citado em Milheiro e Dias, (2009, 85). Segundo a mesma fonte, foi nesse período entre (1950 e 1955) que o antigo governador da província da Guiné, Sarmento Rodrigues ocupa o cargo de Ministro do Ultramar, continuando deste modo a seguir de perto o desenvolvimento dos projectos por ele deixados para a acção urbanística na província. As actividades de urbanização, construção e infra-estruturação já tinham iniciado antes, com as brigadas e missões para ultramar, ou mesmo com os serviços das Obras Públicas locais, contudo considera-se 1945, o ano de arranque das obras estruturantes, com a adaptação do Palácio de Governo e a transformação da Sé

Catedral de Bissau. O então governo local soube estreitar ligações com Lisboa nessa matéria de construção para a integração social, como o próprio Governador afirmava, segundo as citações de (Milheiro e Dias, 2009, 90), de que “no primeiro plano das realizações, como mais visível, o trabalho de obras públicas”, adiantando possuir “uma vasta lista de obras projectadas para um período… bastante curto” (RODRIGUES, 1949, 37). Desta lista fazem parte construções em andamento, como o “Palácio, Sé, capelas de Catió, Bafatá, Canchungo, Mansoa e Gabu, moradias projectadas para os funcionários em Bissau, o monumento ao Esforço da Raça, edifício da Praça do Império… e outras tentativas dispersas pela Colónia” (Idem).

Sabe-se que os técnicos do Gabinete de Urbanização do Ultramar com sede em Lisboa, deslocavam-se ao local, sempre que tal se justificasse para se inteirarem do andamento das obras e da situação em geral, muitas das vezes, no quadro do imediato. O caso guineense não se esgota apenas em urbanizar Bissau e os antigos assentamentos populacionais, houve no entanto projetos para o resto da província e para diversos setores, como foi o caso do Estudo de Urbanização da Praia de Varela em 1947 e 1959.

Muito empenhado com a causa guineense, o governador Sarmento Rodrigues orgulhava-se das suas realizações, chegando a afirmar em termos de um desabafo que “Fizeram-se os levantamentos topográficos de Bissau, Bafatá, Varela, Canchungo, Mansoa, Farim, Gabú, bem como esboços para os planos de urbanização de Varela, Canchungo, Farim, Mansoa e sobretudo o de Bissau, que me parece não ter merecido o carinho devido por parte da população. Vieram projectos para enfermarias, postos sanitários, escolas, moradias, igrejas, postos administrativos, mercados e tantos outros edifícios” (Milheiro e Dias, 2009, 92).

O governador tinha consciência da indiferença da população guineense em relação ao trabalho que desenvolvera, mas nem por isso deixou de prosseguir com a sua determinação em alargar os pequenos centros urbanos existentes, dotando-os de boas condições de habitabilidade, contando para isso com a participação de agentes privados interessados. Ganhou a aposta, o território também, porque quase 90% dos edifícios emblemáticos que hoje caracterizam a rede urbana guineense, fazem parte das grandes obras herdadas (ver anexo-4), das importantes obras realizadas na Província da Guiné entre (1945-1974). As imagens de figura-10 são exemplo de muitos edifícios sociais

projetados pelos técnicos da Agência de Habitação e Urbanismo do então Ministério do Ultramar.

Fig. 10- Escola Prof. António José de Sousa e a Residência das Irmãs em Bissau

Fonte: MILHEIRO e DIAS, 2009, 94.

Relativamente ao levantamento topográfico na Guiné atrás mencionado, urge enfatizar acima de tudo, sobre a divisão Administrativa do território durante a era colonial. Segundo o Diário do Governo de 22 de Abril de 1942, I Série nº 92, foi promulgado o Decreto nº 31:976 da Direcção Geral da Administração Política e Civil do Ministério das Colónias para a modificação da divisão administrativa nos seguintes termos: “ (…) Artigo 1.º A divisão administrativa da colónia da Guiné, constante do artigo 1.º do decreto n.º 29:257, de 13 de Dezembro de 1938, fica modificada conforme foi determinado, nos termos das alíneas a) e b) do artigo 6.º de Reforma Administrativa Ultramarina, pelo governador da colónia em diploma legislativo n.º 1:146, de 24 de Janeiro do corrente ano. No Art.º 2.º referia-se que o quadro do pessoal administrativo estabelecido pelo artigo 4.º do referido decreto é aumentado de dois administradores de circunscrição de 3.ª classe, dois secretários de circunscrição e dois aspirantes administrativos, lugares que serão providos nos termos das disposições legais aplicáveis. Ou seja, dos nove Concelhos e uma Circunscrição existentes, foram acrescidas mais duas novas circunscrições a pedido do governador.

No que se refere a um planeamento regional, é consensual entre os técnicos que os espaços sejam agrupados atendendo às distâncias e aos graus de semelhanças e homogeneidade. Ou seja, “as áreas geográficas contíguas tendem a realizar entre si, relações de troca mais intensas e melhor hierarquizadas” (Lopes, 2001, 30). Querendo com isso dizer que, têm maior proximidade de interesses que possam justificar a realização de acções conjuntas, de modo a rentabilizar os recursos e aumentar a sua

eficácia. Entende que estes espaços devem ser vistos não só na sua dimensão geográfica, mas também como espaços económicos e sociais.

De qualquer forma no caso guineense, isso não foi levado em consideração, uma vez que os interesses da soberania sobrepuseram-se ao respeito pelas fronteiras étnicas, realizando traçados que dividem claramente grupos aparentados e famílias para diferentes concelhos administrativos, como é o caso de Gabú e Bafatá, conforme a Figura-11. Sendo um período muito antes dos teatros das lutas de libertação dos anos sessenta, a organização administrativa ajustada às necessidades de então, justificou apenas a constituição de nove Concelhos e três Circunscrições Civis para província. Fig. 11- Divisão Administrativa da Guiné Portuguesa em 1942 (2003)

Fonte: MARQUES e DIAS, 2003, 580.

Em termos gerais, muitos projectos foram pensados para estruturar o urbanismo na Guiné, até finais dos anos cinquenta. Porém, conscientes da difícil situação económica que Portugal enfrentara logo após a II Grande Guerra (1939-1945), esse processo de urbanização e projectos de promoção social viram-se obrigados á uma desaceleração gradual no tempo. Por estes e por outros motivos, a década de sessenta ficou marcada por muitos cortes no financiamento para importantes obras públicas nas colónias e na Guiné em particular.

É bom lembrar ainda de que tudo o que viria afectar as colónias africanas começou com o colapso do Estado da Índia que lesou bastante “as imagens das

instituições militares portuguesas pelo modus faciendi da guerra” (Atlas da Lusofonia, 2001, 26). Fazendo com que, segundo a mesma fonte, quando eclodiram as guerras de libertação nas colónias africanas, o “pesadelo” da queda do Poder Português em Goa, Damão e Diu induziram as Forças Armadas à perspectivação convencional de “ganhar” ou “perder”, subestimando o poder e a capacidade combativa dos guerrilheiros do PAIGC. Sem surtir efeitos, essa posição arrogante foi corrigida e “as Forças Armadas passaram do conceito ganhar ou perder para o de “aguentar” para ganhar tempo e melhores condições para adopção de uma solução política” (Idem).

Foi nessa condição de ganhar tempo é que muitas oportunidades foram perdidas. Mas o General Spínola combinou a sua larga experiência militar com a capacidade de liderança para reestruturar toda a política governativa e militar na província, alegando ser urgente reajustar as directivas sobre o reordenamento e autodefesa. Para tal, começa pela “tentativa de retirar á subversão o substrato dinâmico de carácter social em que esta se apoiava, colocando-o ao serviço da contra-subversão” (Atlas da Lusofonia, 2001, 27). Esta estratégia do General visava os sectores da manobra militar, promoção socioeconómica e da manobra psicológica. Ou seja, criar condições de fomento e segurança no meio rural, com vista a ganhar confiança das populações para poder infligir pesados golpes ao inimigo, o que culminou com o desenvolvimento do seu célebre plano “Uma Guiné Melhor” (Idem).

Apesar das vicissitudes da guerra, foram realizadas muitas actividades de campo nos domínios de topografia e cadastro, trabalho esse que culminou na edição da obra “Ordenamento Rural e Urbana na Guiné Portuguesa”. Nela constam sessenta e um planos de zonamento com as respectivas memórias descritivas para os assentamentos que considerava de fácil acesso por parte dos homens do PAIGC. Foi tudo por uma questão de segurança e de melhoramento das condições de vida das populações. Antes de prosseguir com outras decisões, politicamente, achou por bem reajustar a divisão administrativa do território para garantir o bom funcionamento das estruturas do poder local, como forma de responder às necessidades que se impunha ver a figura-12.

Fig. 12- Divisão Administrativa da Guiné Portuguesa em 1971.

Fonte: BALDÉ, 2008, 20

Dos nove Concelhos e três Circunscrições Civis definidos anteriormente, com as alterações de 1942, no ano de 1971, a província passou a contar com uma Capital Provincial, doze Sedes de Concelho ou Circunscrição e trinta e duas Sedes de Posto Administrativo. Após ter seguido de perto as preocupações das populações do interior, o General resolveu avançar numa primeira fase com o processo de aldeamento que consistia em agrupar os pequenos grupos populacionais dispersos, em vários pontos ver a figura-13.

Fig. 13 – Processo de Aldeamento na Guiné Portuguesa, Concluído em 1972

Não pode haver um desenvolvimento económico sem o correspondente apoio do substrato social e não é possível elevar os padrões de vida e de bem-estar, nem do nível cultural sem que haja disponibilidade de recursos propiciados pela produção de rendimentos. Foi com base nisto que o governo provincial iniciou o ordenamento demo- geográfico a fim de promover um povoamento consentâneo para garantir a promoção social. Daí que deu prioridade ao substrato social de desenvolvimento, à custa dos recursos disponibilizados pelo governo central para satisfazer as necessidades básicas das populações.

Decidido em mudar o rumo dos acontecimentos, Spínola afirmou que “tem-se vivido a Província, sob o signo do improviso, ao sabor de rasgos de génio, de golpes de fortunas e de necessidades de circunstâncias. Os imperativos de previsão, planeamento e programação têm cedido quase sempre a preocupação muito nossa de personalizar as obras, sem cuidar que estas só são verdadeiramente úteis quando integradas numa linha determinante e consequente, visando finalidades que ultrapassam os estreitos horizontes pessoais” (Spínola in PROVINCIA DA GUINÉ, 1973, 8-9). Foi uma preocupação do general, considerar nobre a missão de continuar o que outros antes com capacidade, senso e visão previram e planearam, como ele mesmo dizia.

Sabe-se que ao longo dos anos sessenta, com o desenrolar da guerra de libertação, muitas famílias tiveram de abandonar as suas terras, refugiando-se no Senegal e Guiné Conakry, principalmente as que viviam junto das fronteiras com aqueles países vizinhos. Houve uma acentuada redução populacional na província, motivando a reacção do General Spínola em concentrar o habitat rural muito disperso em aldeamentos, com o melhoramento das condições de vida das pessoas como forma de impedir o constante relacionamento com os terroristas. Com a independência, muitos refugiados animados pelo entusiasmo e espectativas, regressaram às terras de origem, regresso esse que acabou por criar ao jovem governo, alguns problemas de difícil resolução. Foram problemas que se prendiam com a falta de experiência governativa, dificuldades financeiras e falta de habitações para acolher os regressados da guerra. Como se não bastasse, a política desacertada seguida pelo regime do Partido-Estado, não tardou a manifestação de descontentamento generalizado. É um assunto a desenvolver no ponto a seguir.

No documento Trabalho de Projecto Cali 16 Abril 2012 VF (páginas 48-58)