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3.2. A POBREZA NA FRAGILIDADE INOCENTE

3.2.1 O princípio da obediência e da liberdade

Em José visualizamos dois princípios da paternidade que se tornam chave de leitura para os pais, hoje: a obediência e a liberdade. A paternidade é um dom de Deus condicionado a outra pessoa e não uma criação do sujeito individual. Consideramos, portanto, a obediência um eixo da paternidade em sintonia com as leis da natureza que, a priori, precisam do consentimento de Deus. A obediência está inerente ao princípio da paternidade. Sendo o dom da vida uma exclusividade de Deus, a pessoa deve a Ele essa dádiva recebida. Os filhos, por isso, pertencem a Deus, porque são participantes intermediários e responsáveis pela geração de uma nova vida a partir de um poder que não lhes é próprio, mas que lhes foi dado. Há uma obediência às leis de nossa própria natureza que deve servir de modelo a todo cristão que é o

grande exemplo de S. José para que tenha sempre diante de si o seu humilde, perfeito modo de servir e de participar ao plano de salvação. Considero, portanto que a participação do esposo de Maria, com as disposições que ele tinha, no futuro, será possível para a Igreja, reencontrar a sua identidade no plano da redenção, que tem somente seu fundamento no plano da encarnação (RC 1).327

Compreende-se a obediência num horizonte mais amplo e não apenas vinculado aos princípios da natureza humana. Propomos a obediência a Deus como referência à paternidade responsável por recebermos Dele o amor que gera amor, a vida que gera vida, a doação que sai de si e torna-se frágil para nos exaltar (o Verbo encarnado). O amor do Pai para com seus filhos é infinitamente incompreensível, porque se abaixa para nos elevar. O Pai vem ao encontro dos homens, entrega seu Filho e confia-O a outro pai, José, que se torna verdadeiramente pai e agrada a Deus. José, por causa da obediência ao Pai, foi guia e mestre

do próprio Jesus, que lhe obedecia em tudo. A justiça de José, tão propalada, está diretamente vinculada à sua obediência. Não haveria justiça plena se tivesse lhe faltado a obediência. Não se trata de uma obediência cega, sem liberdade ou cerceadora daquilo que é próprio do humano. Pelo contrário, a obediência de José, pelo fato de ser inteira naquilo que lhe era próprio, deu a ele a plenitude de sua paternidade. A obediência, portanto, tornou-se a grandeza de José confirmando sua justiça, que só poderia ser plena estando revestida pela força de Deus. Nesse aspecto, a obediência configura-se na entrega de si mesmo a outro Projeto que parte de Deus, sem excluir a própria participação, para acolher a vida que pede para ser cuidada. A completude da obediência gera a paternidade a partir da vontade do homem submetida à vontade Deus. Quando se obedece a uma força Superior, a inferioridade de nossa própria existência se eleva, a nossa pobreza se enriquece e a nossa capacidade de gerar vida ganha firmeza em seus próprios horizontes.

O segundo princípio da paternidade é a liberdade. A partir da normalidade da vida, a paternidade precisa incluir o princípio da vontade do homem. Deus é o primeiro a respeitar esse princípio. Por causa da liberdade, refletimos principalmente sobre a responsabilidade. Essa Liberdade envolve a vontade do homem e da mulher. O Plano de Deus a respeito da paternidade molda-se no âmbito da família por se apresentar como o grande sonho de Deus com as garantias de um amor impregnado pela Aliança eterna: o matrimônio. Sendo a paternidade não apenas um projeto pessoal, mas a geração de uma nova vida que vai mudar para sempre a relação que o homem terá com o mundo, parte-se do princípio da liberdade como a resposta por excelência ao dom recebido de Deus para gerar uma nova vida, sempre em sintonia com alguém, pois não há paternidade solitária, visto que o filho é resposta da comunhão.

Para sermos mais precisos, a paternidade é o dom da comunhão presenteado como resposta de amor, a partir da intimidade entre dois seres humanos que permitiram a presença do milagre da vida em seus corpos. Deus dá a vida, mas não a impõe. Até mesmo naquilo que é exclusivo Dele há participação do homem por meio da liberdade. A capacidade de amar e gerar nova vida brota espontaneamente no coração das pessoas, mas o compromisso com a vida exige transcendência da própria subjetividade. Em tudo é preciso liberdade para que o homem seja engrandecido. Por essa razão, afirmamos que é possível negar a capacidade de gerar, mas não podemos negar a vida gerada. Antes da paternidade há a possibilidade de não concretizá-la, mas depois da prole a liberdade torna-se mais exigente e reclama comprometimento com as opções feitas. Sem a responsabilidade a liberdade fica submersa, a pessoa violada em sua própria alma, a inocência maculada pelo abandono e Deus

“aprisionado” na sombra de nosso próprio orgulho. Podemos dizer que o pai só é livre plenamente quando assume a carne da própria carne, o sangue do próprio sangue com absoluta responsabilidade a partir do amor incondicional, renunciando os interesses pessoais em função do filho. Não há maior amor do que dar a própria vida pelos amigos.328 Pensando na família, Jesus é a referência principal de doação da própria vida, pois foi Ele a referência de José.

Deus pede aos pais que amem seus filhos como extensão da própria vida. Na prática, é preciso amar o próximo - o filho é o mais próximo do pai - como Ele nos amou.329 Deus nunca irá nos deixar órfãos.330 Por que ainda existe o abandono? Do ponto de vista legal, não é permitido abandonar – até mesmo os planos dos homens, que são inferiores ao de Deus, protegem a vida.331 Deus é o criador do próprio homem e Senhor absoluto da capacidade de criar que o homem possui e por essa razão a Lei de Deus tem precedência e nunca sacrificará a vida.332 Por isso: “Temer o Senhor: eis a sabedoria! Afastar-se do mal: eis a inteligência!” (Jó 28,28).