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O significado das grandes festas religiosas que eram celebradas durante o ano foi ensinado a Jesus por meio de José. Era costume entre os hebreus visitar Jerusalém três vezes ao ano: nas festas da Páscoa, de Pentecostes e dos Tabernáculos. Os que moravam distante de

107 Ibidem. 108 Ibidem.

Jerusalém tinham a obrigação de uma só viagem, justamente para os festejos da Páscoa.109 Quando já havia completado 12 anos, Jesus teve a oportunidade de participar pela primeira vez dos festejos da Páscoa na cidade santa de Jerusalém.110 Levar o filho pela primeira vez para participar oficialmente do culto ao verdadeiro Deus era motivo de alegria para os pais. As cerimônias desses dias tinham um significado marcadamente religioso, por isso, profundo. José, a exemplo de outras famílias de sua cidadezinha, preparou tudo para fazer a peregrinação a Jerusalém, comida para a viagem, tenda para pernoitar, afinal eram quatro dias de viagem pelos montes de Judá, percorrendo em média 35 quilômetros por dia, além do jumento para transportar a carga.111

Assim que chegaram a Jerusalém, o casal de Nazaré deparou-se com o palácio de Herodes com suas torres e muros, o formalismo dos fariseus e possivelmente se espantaram com o extraordinário número de peregrinos. Tudo ali se confundia: costumes, língua e gente diferente misturada com pobres, doentes, coxos e cegos que aproveitavam os festejos para mendigar. No dia do início dos festejos, José estava lá acompanhando Jesus, na parte do pátio do Templo reservada aos homens.

A Caravana dos peregrinos era constituída de uma fila interminável de homens, mulheres e crianças, a pé ou montadas em jumentos, cavalos e camelos, isolados ou em grupos de parentes ou habitantes da mesma aldeia; uma fila que podia estender- se por um ou mais quilômetros, sem ordem em contínua formação e desmembramento. Pelo que nos é dado saber, nenhuma obrigação havia de os homens andarem separados das mulheres. Também dessa vez, José contava entre os peregrinos um bom número de parentes e conhecidos. Tratava-se dos concidadãos de Nazaré.112

109 “O Código Eloísta da aliança. O calendário mais breve é o de Ex 23,14-17: “Três vezes no ano, todo homem se apresentará Diante do Senhor Iahweh”. Cf. DE VAUX, Op. cit., p. 509.

110 Jesus freqüentava muito o templo e demonstrava cumprir seu dever como judeu tomando parte do culto público. O episódio no qual ele se perdeu por três dias e foi encontrado no templo foi a ocasião para uma frase obscura “Não sabíeis que devo estar nas coisas de meu Pai?” A frase grega “as coisas de meu Pai”, é traduzida por alguns por “os negócios de meu Pai”, por outros por “a casa de meu Pai”. A tradução a “Casa de meu Pai” parece mais compreensível porque é uma resposta à pergunta de Maria: “Porque me procuráveis? Não sabíeis que devia estar no templo? O encontro com os escribas e os mestres da lei se passou provavelmente nos pórticos ou na escola do templo, que foi também o lugar onde Jesus ensinava no templo e discutia com os que o interrogavam, muitas vezes mencionados (Mt 21,23; 26,55; Mc 11,27. 12,35; 14,49; Lc 20,1; 22,53). Este ensino público é proclamado em Jo 18,20. cf. MCKENZIE, J. Templo, p. 916.

111 Não obstante o traço religioso, o templo na vida de Israel não recebeu adesão unânime. Logo de saída, ele foi encarado como uma importação estrangeira e, portanto, pagã. Concebido para sedentários, o templo poderia parecer uma infidelidade às raízes nômades de Israel, quando Deus caminhava com ele sem exigir uma “casa de cedro” (2Sm 7,7). Mais grave: aquilo não seria atentar contra a transcendência de Deus, que tem o céu por trono e a terra como escabelo de seus pés (Is 66,1)? Era preciso corrigir e dizer que o templo era o lugar onde Deus fazia habitar seu nome e sua glória. Cf. AUNEAU, J. Templo, In. LACOSTE, Dicionário Crítico de Teologia, p. 1697.

Terminados os festejos, que se prolongavam por mais dias, era tempo de retornar para casa. Os peregrinos de Nazaré se reuniam em caravana para a viagem de retorno, subdivididos em grupos de homens e mulheres. Jesus, porém, ficou na cidade, entre os pórticos do Templo, sem que seus pais percebessem, e ouvia os ensinamentos dos rabinos. Sua ausência na caravana provavelmente foi notada quase depois de um dia de viagem, quando devem ter parado para descansar junto à fonte de Berot.113 Imediatamente, os seus pais voltam a Jerusalém e o procuram por todos os lados, até que o encontram entre os doutores. Sua mãe, apreensiva, perguntou-lhe: “Filho, por que você procedeu assim conosco? Olha que teu pai e eu, aflitos, te procurávamos" (Lc 2,48). Nessas palavras de Maria fica evidenciada a paternidade real de José; não só os que ignoravam a divindade e a concepção admirável de Cristo chamam José de pai de Jesus, afirma Suárez, mas o próprio evangelista e também a Virgem Maria.114

Com 12 anos o jovem israelita já tinha alguma liberdade, inclusive, socialmente. Em vista de sua missão que é fazer a vontade do Pai, Jesus começa a despertar a consciência sobre os planos do Pai a seu respeito. Contudo, sente que ainda não está preparado, por isso aceita ser submisso a seus pais até o início da vida pública. Sua ida para o Templo foi importante para seu amadurecimento. Essa leitura é possível ser feita por causa da resposta que Jesus dá a seus pais na hora do encontro onde ocorreu o interrogatório sobre o seu “desaparecimento” da caravana: “Por que me procuráveis? Não sabíeis que eu devia estar na casa do meu Pai?” (Lc 2,49).

Observamos no relato de Lucas que Jesus ao ser encontrado desceu com seus pais para Nazaré e, no seio da Sagrada Família, “o menino crescia, tornava-se robusto, enchia-se de sabedoria; e a graça de Deus estava com ele” (Lc 2,40). Essas poucas palavras resumem o período da vida “oculta” que Jesus viveu à espera do cumprimento da sua missão messiânica. Durante esse tempo, Jesus permaneceu no âmbito da sua família, sob os cuidados de José, que tinha, conforme os deveres de um pai na época, a responsabilidade de alimentá-lo, vesti-lo e instruí-lo na lei e ensinar-lhe um ofício. Nesse contexto, Jesus crescia “em sabedoria, em estatura e em graça diante de Deus e diante dos homens” (Lc 2,52), tudo na docilidade total aos seus pais: “era-lhes submisso” (Lc 2,51). Correspondia, portanto, com todo respeito às atenções de seus pais e, destaca João Paulo II, “dessa forma, quis santificar os deveres da

113 STRAMARE, T. San Giuseppe nella teologia … p. 160.

família e do trabalho, que ele próprio executava ao lado de José” (RC 16). Os evangelistas silenciam completamente sobre os anos da “vida oculta” de Jesus em Nazaré.